domingo, dezembro 27, 2015

Borgonha


Mapa do Reino Burgúndio, o primeiro Reino da Borgonha, entre 443 e 476.


A Burgúndia como parte do Império Franco entre 534 a 843.

Os Reinos da Alta Borgonha (ou Borgonha Transjurana) e Baixa Borgonha (inicialmente Reino da Provença e Borgonha) nos séculos IX e X.

Alta Borgonha, em 888
(Transjurana mais Condado da Borgonha)

Baixa Borgonha, em 879

Ducado da Borgonha de Ricardo, o Justiceiro

Reino da Borgonha

(em latim: regnum Burgundiae, em francês: royaume de Bourgogne) ou Burgúndia (em francês: Burgondie) é uma designação aplicada a sucessivas entidades de caráter nacional centradas no território histórico da Borgonha, que atualmente se encontra no sul-sudeste de França. O nome da região e do Reino deve-se aos Burgúndios, um povo de origem escandinavo.

Ao longo da história a Borgonha existiu como entidade política sob várias formas e diferentes fronteiras. Duas destas entidades foram conhecidas como Reino de Borgonha (a primeira cerca do século VI e a segunda por volta do século X-XI). Há ainda autores que consideram um Reino mais antigo, no século V, e no século XV esteve eminente a criação de um Terceiro Reino Borgonhês. Quase todas estas entidades, não só Reinos como Condados e Ducados, destacaram-se pela sua influência e riqueza.

Um primeiro Reino da Borgonha foi criado no século V pelos Burgúndios depois de se instalarem nas margens do lago Léman, na Sapaudia (ou Sabáudia, atual Saboia). O seu soberano mais glorioso, Gondebaldo, governou um território que se estendia de Langres a Marselha e do Reno ao Loire. Durante os seis séculos que se seguiram à instalação deste povo, os turbilhões da história originaram o aparecimento de diversas entidades geopolíticas de fronteiras em constante mudança que tomaram o nome de Borgonha. O Tratado de Verdun de 843 divide a região em duas grandes entidades territoriais, uma Borgonha franca a ocidente (que constituiria depois o ducado) e uma Borgonha Imperial a Oriente, da qual fazia parte, nomeadamente, o futuro Franche Comté (Franco-Condado) da Borgonha ou simplesmente Franco-Condado.

No século IX, a Borgonha Imperial assiste ao nascimento no seu seio de dois Reinos. O primeiro, a sul, estendia-se até às costas do mar Mediterrâneo e chamou-se "Borgonha-Provença" (Bourgogne-Provence) ou Reino de Arles. O segundo, chamado "Reino de Borgonha", situava-se originalmente na Helvécia (em Transjurânia, ou seja, para lá dos montes do Jura), mas integrou rapidamente outros domínios, como as terras da Diocese de Besançon.
Em 933, durante o Reinado de Rodolfo II, Rei da Borgonha Transjurana, o Reino da Borgonha e o Reino de Arles são unidos, tomando essa união o nome de Reino da Borgonha e de- Arles, que se submete à Suserania de Soberanos Germânicos.

O Reino dos Burgúndios

O Reino dos Burgúndios (Regnum Burgondionum), que se pode considerar o primeiro Reino da Borgonha, deve o seu nome ao povo burgúndio, que se instalou em 443 nas margens do lago Léman. Gondebaldo (r. ca. 542-516) e o seu filho Sigismundo (r. 516-524) foram os soberanos mais marcantes deste Reino. No seu apogeu, o Reino ocupou uma área considerável, que tinha os seus limites a Norte de Langres, e a Sul se estendia até Marselha. A ocidente estendia-se até Nevers e a nordeste até às margens do lago de Constança.

A sua existência foi efémera, de 444 até 534. As pretensões dos Francos durante o Reinado de Clóvis I, em 500 ou 501, foram continuadas pelos seus filhos Clodomiro, Rei de Orleães, Childeberto, Rei de Paris e Clotário, Rei de Soissons. Durante as campanhas militares levadas a cabo entre 532 e 534, os dois últimos acabaram por conseguir pôr termo ao Reino Burgúndio.
Reino da Borgonha Merovíngio

Os Merovíngios integraram o Reino Burgúndio nos diferentes Reinos Merovíngios, mas conservaram a sua individualidade. A Burgúndia apresentava-se sempre como uma entidade geopolítica, da mesma forma que a Nêustria ou a Austrásia. Os monarcas merovíngios instalaram Rei na Burgúndia. Os Reis Burgúndios mais conhecidos desse período foram Gontrão (r. 561-592) e Dagoberto (r. 629-639). Gontrano residiu principalmente em Chalon-sur-Saône, onde reuniu concílios, e em Saint-Marcel (Saône-et-Loire) mandou erigir uma Basílica e um Mosteiro.

Em 613, depois da captura e condenação a morte da Rainha Brunilda em Renève, deixou de haver Rei Residente na Borgonha. O Rei da Nêustria Clotário II (r. 584-629) juntou a Borgonha aos seus estados. Em 687, na sequência da «Batalha de Tertry», é a vez do Reino da Nêustria-Borgonha desaparecer. O vencedor, o Austrasiano Pepino de Herstal, leva a cabo a união dos Reinos Francos. Em 751, o Reino dos Merovíngios chega ao fim, com a Coroação de Pepino, o Breve, que inaugura a era dos Soberanos Carolíngios.

As personalidades Borgonhesas mais marcantes deste período foram a Rainha Brunilda e o Bispo Leodegário (m. 677 ou 678)

Os Condados Borguinhões sob os Carolíngios

O Reino da Borgonha desaparece como entidade geopolítica com os Carolíngios. O vasto território do antigo Regnum Francorum que perde o seu Rei é dividido por Carlos Martel (m. 741) em diversas partes, cada qual com o seu Governador. A Borgonha Transjurana, a Borgonha Cisjurana (que incluía a Provença), o futuro, Ducado e Condado da Borgonha. Alguns textos dessa época ainda mencionam a Burgúndia ou Regnum Burgundiae, mas estas denominações só têm expressão geográfica. A obra dos Carolíngios, marcada por uma forte centralização, consistiu em criar os Condados Borguinhões, os quais constituem as novas circunscrições administrativas, também chamadas pagi, decalcadas do modelo das antigas Civitates Galo-Romanas. À frente desses Condados estava um Conde, que dependia diretamente do Palácio, tal como os seus vizinhos congéneres. Os grandes da Borgonha, refratários a todo o tipo de autoridade centralizada, foram "postos na ordem" e forçados a obedecer.

Mas a Dinastia Carolíngia carregava nela própria os germes da sua destruição. As partilhas sucessivas do Reino entre os herdeiros destruíram a unidade da Monarquia que Carlos Magno e os seus antepassados tinham construído. As competições e as rivalidades, que abriram caminho ao feudalismo, irão permitir a emergência de dinastias condais ávidas de protagonismo.

O Reino da Borgonha e de Arles

O Tratado de Verdun de 843 rasga definitivamente a unidade do velho Império de Carlos Magno. A sua obra política desmorona-se. A mutilação a que tratado sujeita a Borgonha faz nascer, a Oeste do Rio Saône, uma Borgonha Francesa (ou Borgonha Franca) e a Leste do mesmo Rio uma Borgonha Imperial, quinhão do Imperador Lotário. Os herdeiros deste desaparecem um após outro sem descendentes, e cada um dos tios e irmãos tentam desapossar os seus parentes. Os Normandos assolam o norte, os Sarracenos ameaçam o sul, a Anarquia Reina por todo o lado e o Trono dos Francos subsiste com grandes dificuldades. A morte de Luís II, o Gago em 879 só agrava a situação.

O Reino da Provença dos Bivinidas (879-928)

Reino da Alta Borgonha (888-1032)

Ducado da Suábia (fundado em 917)

A 15 de outubro de 879, uma assembleia de notáveis e prelados reunida em Mantaille elege como Rei o cunhado de Carlos, o Calvo, Bosão, Conde de Autun que exercendo funções de Duque no Lyonnais, Viennois e na Provença. Apesar de receber o título Real, Bosão não assume a qualidade de Rei da Borgonha Cisjurana. O seu "Reino da Provença", também chamado "Reino de Arles", estendia-se desde as margens do Rio Doubs a norte até ao Mediterrâneo a sul, fazendo fronteira com a Helvécia e a Itália a leste e sudeste. Sob a sua coroa estavam reunidas uma parte da Borgonha, o Bugey, a Bresse, o Delfinado, a Tarentaise, a Provença e uma parte do Languedoc. Bosão instala a capital em Vienne e cria uma chancelaria dirigida por Adalgaire, o Abade de Flavigny.

A atribuição do Título Real a Bosão provoca a união contra ele dos Carolíngios, cuja reação não tarda. Os Príncipes Carolíngios, entre eles, o Rei Carlomano, noivo da sua filha de Bosão, e Ricardo, o Justiceiro, irmão de Bosão, marcham sobre ele. No entanto, Bosão consegue manter a sua autoridade sobre uma parte dos seus domínios e conserva o seu título, bem como os territórios na Provença. O Norte da Borgonha, tendo escapado à sua autoridade, nunca faz parte deste Reino.

Quando Bosão morre em 887, é sucedido por Luís III, que é reconhecido como "Rei da Provença" em Valença em 890, sob a tutela da sua mãe Hermengarda e reúne durante algum tempo os títulos de Imperador e de Rei de Itália. Mas o seu rival Berengário, Duque de Friul manda rebentar-lhe os olhos em Verona em 905. Luís III, doente, delega a sua autoridade a Hugo de Arles, Conde da Provença, até ao ano de 926, quando Hugo ocupa o trono de Itália.

Em 928, quando morre Luís, o Cego, Hugo afasta Carlos Constantino, herdeiro legítimo, filho de Luís, e apodera-se do Reino da Provença. Carlos Constantino consegue manter o Governo de Vienne e do Viennois.

O Reino da Borgonha Transjurana dos Guelfos (888-933)

As quatro Borgonhas nos séculos XI e XII. De Norte para Sul. Ducado da Borgonha, Condado da Borgonha, Borgonha Transjurana e Borgonha Cisjurana mais Provença. As últimas três são territórios do Sacro-Império a partir de 1032

Em 888, a morte do último sucessor de Carlos Magno, Carlos III, o Gordo, desprezado por causa da sua fraqueza face aos Normandos, incapaz de reprimir a audácia dos grandes vassalos, abandonado por todos, dá o sinal para a separação geral de diversos Reinos que tinham estado sob o seu Governo. Na Germânia, Arnulfo é proclamado rei, enquanto os nobres franceses elegem Odo.

A Helvécia é o berço de uma nova monarquia, que forma um novo Reino Borgonhês. Os Borgonheses da Transjurana, a região situada entre o monte Jura e os Alpes Peninos, são liderados pelo duque Rodolfo. Este não é borgonhês; é membro à Casa de Guelfo. As peripécias da política permitiram ao seu pai Conrado II da Borgonha, conde de Auxerre, apoderar-se do governo do ducado da Transjurana.

Quando foi conhecida a morte de Carlos, o Gordo, os nobres laicos e eclesiásticos do antigo Ducado da Transjurana reuniram-se na Basílica de São Maurício e em Janeiro de 888 proclamaram Rei Rodolfo I. O novo Reino da Borgonha sobrevive apesar da fidelidade dos nobres ser vacilante e de enfrentar a hostilidade de Arnulfo. O Reino, formado originalmente por Condados sobre os quais Rodolfo exerce a sua autoridade, expande-se rapidamente integrando os Condados da Arquidiocese de Besançon (o futuro Condado da Borgonha), após um acordo concluído em Ratisbona entre Rodolfo e Arnulfo, embora a soberania de Escuens tenha sofrido oscilações. A morte de Arnulfo em 899, e depois do seu filho Zuentiboldo em 900 permite a Rodolfo desembaraçar-se da pressão exercida pelo Rei da Germânia sobre ele. Rodolfo morre a 25 de outubro de 912 e é sucedido pelo filho Rodolfo II.

Anexação do Reino da Provença ao Reino da Borgonha Transjurana (933-1032)

Os Reinos Francos e da Borgonha durante o Reinado de Hugo Capeto (r. 987-996)

Rodolfo II cai progressivamente na dependência Feudal do Rei da Germânia e alarga as suas possessões. O Reino da Borgonha compreende então a Suábia, Brisgóvia, Alsácia e Helvécia. Em 933, Rodolfo II, então em disputa com Hugo de Arles pela coroa de Itália, obtém deste a cessão do antigo Reino da Provença em troca do abandono das pretensões ao Trono Italiano.

Segundo o historiador medievalista René Poupardin, citando Liutprando de Cremona (século X), Rodolfo tinha sido contactado pelos Italianos que lhe ofereceram a coroa de Itália: «Quando o Rei Hugo soube disso, enviou-lhe emissários e deu a Rodolfo toda a terra que ele tinha tido na Gália antes de subir ao trono, ao mesmo tempo que recebia dele o juramento que jamais entraria de novo em Itália.» A partir daí, os dois reinos da Borgonha com as possessões dependentes da Provença são reunidos com o nome de "Reino da Borgonha e de Arles" sob a coroa de Rodolfo. O Reino é herdado pelo filho de Rodolfo II, Conrado III (925-993) e depois pelo filho deste, Rodolfo III (970-1032).

Em 1032 Rodolfo III morre sem deixar descendência e é Conrado II, o Sálico, Duque da Francónia e Imperador Romano-Germânico que herda o Reino da Borgonha, que na prática é anexado ao Sacro Império.

O Reino de Arles no seio do Sacro Império

A Realeza de Arles assegurada efetivamente pelos imperadores (1032-1250)

O Imperador toma posse do Reino da Borgonha e de Arles e o Reino passa a fazer parte do Sacro Império Romano-Germânico. Desde então os Imperadores da Alemanha vêm-se constantemente como Reis de Arles, em virtude da doação de Rodolfo. Contudo, o domínio Imperial é mais nominal do que Real, só sendo exercidos atos de soberania pontualmente.

O Castelo do Empéri, em Salon-de-Provence, residência oficial dos Arcebispos de Arles e dos Imperadores Germânicos

Os imperadores Conrado II, o Sálico e Henrique III, seu filho, são coroados sucessivamente em 1033 e 1038 Reis da Borgonha e de Arles. No século XII Lotário de Süpplingerburg (1075-1137), sucessor da Casa da Francónia, toma o título de Rei de Arles e nomeia como governador Conrado, Duque de Zähringen. Nesse século, os Condes da Provença e de Toulouse, apesar de supostamente os seus condados serem do Império, mostram grande relutância em render homenagem ao Imperador. Através de sucessivas usurpações, o Reino é reduzido à sua expressão mais simples, alguns Castelos na Provença e no Contat (Condado Venaissino).

Os imperadores Conrado III (1093-1152) e Frederico Barba-Ruiva (1122-1190) tentam restaurar uma suserania que é enfraquecida pela distância. Conrado III constitui em Feudos os Castelos que lhe restam na Arquidiocese de Arles em 1144, os Arcebispos de Arles tornam-se os representantes dos Imperadores na Provença. Conrado III e Frederico Barba-Ruiva aproveitam as dissensões entre as famílias dos Baux e dos Berengário para efetivarem a suserania sobre a Provença e aí serem homenageados. Em 1162 Frederico Barba-Ruiva, por uma carta assinada em Turim confirma a Hugo II de Baux a investidura que Conrado III tinha acordado com Raimundo I de Baux, dando-lhe o Condado da Provença e de Arles a título de feudo e reservando os direitos do Império. Em 1178 Barba-Ruiva faz-se Coroar Rei da Borgonha na Catedral de São Trofimo de Arles pelo Arcebispo Raimundo de Bollène.

Henrique VI (1165-1197), Otão IV (1177-1212) e Frederico II (1194-1250) sucedem a Frederico Barba-Ruiva. Logo que assume o trono, Frederico II declara-se Rei de Arles em Basileia, onde tem a sua corte, e tenta erguer o reino. Demasiado ocupados em guerras longínquas, os sucessores de Barba-Ruiva mostram-se incapazes de manter a soberania na Borgonha. Frederico II é o último Imperador a imiscuir-se com algum êxito nos assuntos da Provença.

Enfraquecimento da autoridade Imperial

Fachada da antiga Catedral de São Trofimo

A autoridade do Sacro Império sobre o "Reino da Borgonha e Arles" era mais honorífica do que direta e real. A suserania só era eficaz nas mãos dos Imperadores poderosos e capazes de intervir no leste e sul de França, mas eclipsava-se facilmente com os Príncipes fracos nos territórios mais distantes das Fronteiras Imperiais.

Depois de Frederico II, a autoridade Imperial não era mais do que uma sombra. O poder dos Arcebispos de Arles, privados de qualquer apoio material, declina com a queda da autoridade Imperial na Provença ao mesmo tempo que o poder dos Condes se reforça. Carlos I (1226-1285), da Casa de Anjou, sucede à de Barcelona. Carlos de Anjou é mais poderoso que qualquer dos seus predecessores e durante meio século a realeza arlesiana permanece adormecida.

Os sobressaltos do Reino de Arles

As pretensões da viúva de São Luís, a Rainha Margarida (1221-1295), uma das filhas de Raimundo Berengário IV da Provença trazem de volta as lembranças do estado arlesiano. Após a morte da sua irmã Beatriz, esposa de Carlos de Anjou, Margarida tenta recuperar o Condado da Provença, fazendo com que o seu cunhado Carlos seja convocado à presença do Papa e do Imperador, Rodolfo de Habsburgo, a quem ela reconhece formalmente a suserania sobre a Provença. O Imperador não se imiscui na querela mas devido ao facto de Carlos de Anjou ignorar o seu apelo, aproveita a ocasião para afirmar os seus direitos em enfeuda a Provença a Margarida até que Carlos se entendeu com ele. Em 1280 Rodolfo acorda então com Carlos atribuir-lhe os Condados da Provença e de Forcalquier e confirma-lhe todos os privilégios acordados pelos seus antecessores aos Berengários.

Borgonha Transjurana

Alta Borgonha, em 888 (Transjurana + Condado da Borgonha)

Baixa Borgonha, em 879

West Frankish Ducado da Borgonha de Ricardo da Borgonha "o Justiceiro"

A Borgonha Transjurana é um espaço territorial localizado na actual França e que foi instituído como reino sob a denominação de Reino da Borgonha Transjurana também denominado Reino da Alta Borgonha ou Reino da Borgonha Transjurana, tendo existido entre 888 e 933.

Este reino medieval numa posição mais ou menos central no território da actual França, foi criado a partir dos antigos reinos dos burgúndios, em ambos os lados das montanhas do Jura, entre a Suíça ocidental de língua francesa, o Vale de Aosta, de língua italiana e do vale do rio Saône, tendo isto acontecido como resultado da decomposição da França política medieval resultante dos conflitos ocorridos após a morte do Imperador do Império Romano-Germânico, Lotário I (795-855).

Este reino foi o núcleo do Reino de Arles, também denominado como Reino de Borgonha, onde se integrou desaparecendo como assim como uma unidade política.

O território deste reino estendia-se por uma área corresponde a grande parte da Suíça (as partes a oeste da linha Brünig-Napf-Reuss, incluindo a Suíça romanda, os cantões de Berna e de Argau e Valais) e França as região de Franche-Comté, bem como partes adjacentes dos departamentos franceses de Alta Saboia e Ain, e o Vale de Aosta, que atualmente faz parte da Itália.

Origens do Reino

No Império Carolíngio após o Tratado de Verdun

O Tratado de Verdun assinado em 843 foi um acordo entre os filhos de Luís, o Piedoso, que dividiu o grande Império Carolíngio em três, duas entidades políticas bastante homogéneas e um conglomerado de territórios entre os dois primeiros.

França Occidentalis ficou para o filho mais novo, Carlos II de França, "o Calvo", no que será o precursor da atual França.

Frância oriental ficou para Luís, "o Germânico", e o germe da atual Suíça, Alemanha e Áustria.
França Média ficou para o filho mais velho e herdeiro do título imperial, Lotário I, o território que, em teoria, contendo a capital original do Império Carolíngio (Aachen), o cemitério imperial (Metz acolheu os restos mortais de Luís, "o Piedoso"), no norte da Itália e o protetorado do papa de Roma. Este território parecia destinado à supremacia imperial sobre os outros, no entanto tal não aconteceu e acabou dividido entre Carlos II de França e Luís, "o Germânico".

Conrado II da Borgonha

Conrado II da Borgonha, Duque de Borgonha Transjurana, de Conde de Auxerre

Nome completo-Conrado II da Borgonha

Pai-Conrado I de Auxerre Mãe-Adelaide de Tours

Nascimento    c. 835 Morte  876

Conrado II da Borgonha "o Jovem" (c. 835 - 876) duque de Borgonha Transjurana, de Conde de Auxerre.

Biografia

Foi o filho mais velho de Conrado I de Auxerre, Conde de Auxerre, que durante anos foi o conselheiro de seu sogro, o imperador Luís I, "o Piedoso" († 840) como o rei Luís, o Germânico, antes dele, juntamente com seus filhos e Hugo Abbas também conhecido por o abade Hugo, francês "Hugues l'Abbé" (? - 12 de maio de 886) e que foi um dos líderes do Reino Franco Ocidental, bem como o seu sobrinho Carlos II de França, "o Calvo".

Em 858, na persuasão de Carlos II de França, "o Calvo", seu primo, ele e o irmão traíram Louis o alemão quando este os enviou em missão de espionagem e passou para a corte de Charles, que os recompensou generosamente dado eles terem perdido as honras bávaras. Após este acontecimento passou a denominar-se como duque da Borgonha Transjurana e Auxerre até cerca de 864.

Relações familiares

Foi filho de Conrado I de Auxerre (nascido cerca de 800 - 22 de março entre 862 e 866) e de Adelaide de Tours (c. 805 - 866), filha de Hugo III de Tours (765 - 20 de outubro de 837) e de Eva de Auxerre (775 -?). Casou-se por duas vezes, a 1.ª com Judith de Friuli, filha de Eberhard de Friuli e a 2.º com Waldrada de Worms (801 - 20 de março de 851), também denominada como Ermentrude da Alsácia e de Orleans e Tours, então já falecida do seu 1º marido Roberto III de Worms (c. 800 - 834). Do 1.º casamento não terá tido filhos, no entanto do 2.º teve filhos.

Rodolfo I da Borgonha Transjurana (ca. Burgundia, França 859 - Juran, Burgundia, França 25 de outubro de 912) foi o 1º rei da Borgonha Transjurana de 888 até sua morte. Casou com Guila de Borgonha (dezembro de 873 -?), filha de Bosão da Provença (844 - 11 de janeiro de 887) e de Hermengarda de Itália (852 - 22 de junho de 896).

Adelaide da Borgonha Transjurana foi umas das 3 esposas de Ricardo II da Normandia (23 de agosto de 970, na Normandia, França – 28 de agosto de 1026, na Normandia), chamado de "O Bom" (Francês: Le Bon), foi o filho mais velho e herdeiro de Ricardo I o Destemido e Gunnora.




Rodolfo I da Borgonha

Foi o 1º rei da Borgonha Transjurana

Governo-Reinado

Dinastia  Foi o 1º rei da Borgonha Transjurana

Vida-Nome, completo. Rodolfo I da Borgonha. Nascimento-859. Morte-25 de outubro de 912 (53 anos) Território de Rodolfo I em 888.

Rodolfo I da Borgonha (em latim: Rudolphus I; ca. Borgonha, Frância 859 - Juran, Borgonha, 

Frância 25 de outubro de 912) foi o 1º rei da Borgonha Transjurana de 888 até sua morte.

Foi filho de Conrado II da Borgonha, conde de Auxerre e marquês da Borgonha Transjurana, e de sua esposa Valderada de Worms também denominada como Ermentrude da Alsácia e de Orleans e Tours (801 - 20 de março de 851). De seu pai, Rodolfo herdou a abadia leiga de Saint-Maurice-en-Valais, fazendo-o o magnata mais poderoso da Alta Borgonha, território da atual oeste da Suíça e o Franco Condado.

Após a deposição e morte do Imperador Carlos III, os nobres e o principal clero da Alta Borgonha reuniram-se em St. Maurice e elegeram Rodolfo como rei em janeiro de 888. Aparentemente na base de sua eleição, Rodolfo reivindicava a Lotaríngia inteira, mas sua reivindicação foi contestada por Arnolfo da Caríntia, o novo rei da Frância Oriental ou Germânia, que rapidamente forçou Rodolfo a abandonar a Lotaríngia prometendo reconhecê-lo como rei da Borgonha. As hostilidades entre ambos, porém, parecem ter continuado.

O relacionamento de Rodolfo com seus demais vizinhos era mais amistoso. Sua irmã Adelaide casou-se com Ricardo, conde de Autun, duque da Borgonha (a Borgonha atual, parte da Frância Ocidental), e suas filhas, Adelaide e Guilherma, casaram-se, respectivamente, Luís da Provença e Bosão de Arles e Avinhão, marquês da Toscana.

Rodolfo foi sucedido por seu filho Rodolfo II. Logo depois de sua morte, sua viúva, a rainha Guilherma, casou-se com Hugo de Arles, futuro rei da Itália.

Relações familiares

Foi filho de Conrado II da Borgonha, "o Jovem", (c. 835 - 876) conde da Borgonha e conde de Auxerre e de Waldrada de Worms (801 - 20 de março de 851), também denominada como Ermentrude da Alsácia e de Orleans e Tours, então já falecida do seu 1º marido Roberto III de Worms (c. 800 - 834). Casou com Guila de Borgonha (dezembro de 873 -?), filha de Bosão da Provença (844 - 11 de janeiro de 887) e de Irmengarda de Itália (852 - 22 de junho de 896), de quem teve:

Rodolfo II da Borgonha (? - 937), Rei da Borgonha Transjurana e casado com Berta da Suábia, filha de Buchard II da Suábia (883 - 926) e de Reginlinda (890 - 958)

Waldrada da Borgonha casada com Bonifácio de Spoleto, Conde de Bolonha.

Guilda da Borgonha casada com Bosão de Arles e Avinhão (855 - 936), filho de Teobaldo de Arles (860 - 895) e de Berta de França (863 - 8 de março de 925), filha ilegítima do rei Lotário II da Lotaríngia e de Teutberga de Valois (? - 875), filha de Boso de Valois "O Velho" conde de Valois (800 - 855)

Luís da Borgonha (? - Depois de 937), Conde de Thurgau

Adalberto da Itália

Conde de Saboia

Governo-Reinado-Marquês de Ivrea e rei da Itália. Consorte-Gerberga de Chalon

Vida. Nome, completo. Adalberto da Itália

Nascimento-931. Morte-975 (44 anos)

Pai-Berengário II de Itália. Mãe-Vila III de Arles

Adalberto da Itália ou Adalberto II de Ivrea (931 – Autun, 975) foi o sexto marquês de Ivrea e rei da Itália, de 950 a 962 (a partir de 951, em disputa com imperador Romano-Germânico, Oto I da Germânia).

Adalberto foi levado ao trono da Itália por seu pai, em 950. Vencido seu pai, em 963, por Oto I, Adalberto continuou a luta contra o imperador, mas acabou por ter de se refugiar em Constantinopla ao saber que perdera a contenda.

Relações familiares

Filho Berengário II de Itália também denominado Berengário de Ivrea (ca. 900 - Bamberg, 6 de julho de 966) que foi marquês de Ivrea, entre 928 e 950 e rei da Itália, de 950 a 961, e de Vila III de Arles (912-970), filha do conde da Provença e marquês de Toscana, Bosão de Arles e Avinhão (885-936), e de Vila II de Borgonha, filha do rei de Borgonha Rodolfo I da Germânia (1 de maio de 1218 - 15 de julho de 1291) e de Vila de Provença.

Por volta de 960, Adalberto casou-se com Gerberga de Chalon (947 - 980), filha de Lamberto de Chalon (930- 22 de fevereiro de 979), e de Adelaide de Vermandois (925 - 980), filha de Roberto I de Vermandois (c. 910 - 966) e de Adelaide Verra da Borgonha (930 - 987), de quem teve:

Otão Guilherme de Borgonha (c.960-1026), que, ainda criança quando o pai morreu, foi adotado pelo segundo esposo de sua mãe, de quem herdou o Condado da Borgonha.

Gisele de Borgonha (983-1020) casada com o marquês Anselmo I de Montferrat, senhor de Montferrat

Harduíno de Borgonha (? - 1015) marquês de Ivrea,

Gilberto de Borgonha (? - 1030) marquês de Ivrea,

Amadeu de Borgonha


Em 972, após a morte do marido Gerberga voltou a casar, desta feita Odo-Henrique, Duque da Borgonha (946 - 15 de outubro de 1002), conde de Nevers, duque de Borgonha.


sábado, dezembro 26, 2015

ANNALES PORTUCALENSES VETERES

Crónica dos Godos



Nota: As datas apresentadas são da «Era Hispânica» contada a partir de 1 de Janeiro de 38 A.C. e não da «Era Cristã», adoptada em Portugal só em 22 de Agosto de 1422, no Reinado de D. João I de Portugal. Por isso, para se descobrir o ano correcto do acontecimento referido é preciso retirar 38 anos à data.

Era de 349:  Saíram os Godos da sua terra.

Era de 366:  Entraram na Hispânica, e aí Reinaram durante 387 anos. Levam, porém, 17 anos a chegar da sua terra à Hispânica.

Era de 739:  Em outro lugar 740, foram expulsos do Reino da Hispânica, no Reinado de Vitiza.

Era de 749: Em outro lugar 750, os Sarracenos apoderam-se da Hispânica no Reinado de Rodrigo, antes do Reinado de Pelágio os Sarracenos imperaram na Hispânica durante 5 anos.

Era de 754:  O Rei Pelágio, filho do Duque Fávila, governou durante 19 anos.

Era de 773:  O Rei Fávila, filho daquele, Pelágio, governou durante 2 anos e 6 meses.

Era de 776:  O Rei Afonso I, filho do Duque Pedro, governou durante 19 anos.

Era de 785: O Rei Fruela I, filho daquele, governou 11 anos e 3 meses. Alcobaça, 11 anos, 5 meses e 22 dias.

Era de 806:  O Rei Aurélio, primo daquele, governou durante 6 anos e 6 meses.

Era de 812: O Rei Silo governou 9 anos, e no décimo ano, morreu. Alcobaça, 8 anos, 1 mês e 1 dia.

Era de 821: O Rei Mauregato Reinou 6 anos e morreu. Alcobaça, governou 5 anos e 5 meses, em outro lugar 6 meses, e acrescentara que sob a autoridade de um só se passam 81 anos.

Era de 826: O Rei Bermudo I governou 3 anos. Este renunciou ao governo voluntariamente e fez Rei seu primo Afonso II, que Mauregato expulsara do Reino.

Era de 828:  O Rei Afonso II Reinou durante 52 anos.

Era de 888:  O Rei Ordonho I, filho do Rei Ramiro I, Reinou 16 anos.

Era de 904: O Rei Afonso III, filho de Ordonho I, Reinou 18 anos. Este no primeiro ano do seu Reinado e no décimo quarto de idade é destronado por usurpação do apóstata Froilão, Conde da Galiza, mas o Rei foi para Castela e algum tempo depois, tendo sido morto em Oviedo pelos súbditos fiéis do Rei Afonso III o Rei usurpador e desgraçado, Froilão, aquela criança volta de Castela cheia de glória e é colocada felizmente no trono do pai. Desde o princípio do seu Reinado sempre considerou os inimigos como fautores de vitórias. No tempo dêle um numerosíssimo Exército veio a Leão sob o Comando de Al-mundhir, Califa de Córdova, neto do Califa Abde Arrahmane, irmão de Maomet, mas pouco dano lhe causou, porque, quando chegou, já muitos milhares de soldados tinham sido mortos e o restante exército pôs-se em fuga. No tempo dele outro exército entrou em Berdigo, mas graças a Deus foi destruído sem prejuízo daquele Rei. E este Rei dilatou o seu Império com o acrescentamento de muitas terras dos inimigos, efectivamente tomou o Castelo que se denomina Nazam. Durante a paz apoderou-se de Antenea, despovou Coimbra, ocupada pelos inimigos, e em seguida povoou-a de gente da «Raça Galaica», conquistou igualmente muitos outros Castelos. No seu tempo a Igreja prosperou, o Reino ampliou-se. Igualmente são povoadas de Cristãos algumas Cidades, como Braga, Portucale, Anco, Viseu, Emínio e assolando a ferro e fome outras terras da Lusitânia até Mérida, despovoou e cobriu de ruínas a costa. Ficou de pé o Reino da Hispânica dos Cristãos até ao Califa, Al mançor no ano 1024.

Era de 1026: A 29 de Junho o Califa Al mançor Benamet tomou Coimbra e, assim como o ouvimos a muitos velhos, ficou deserta durante 7 anos, sendo depois reedificada e ocupada pelos Ismaelitas.

Era de 1028:  A 2 de Dezembro, O Califa Al mançor tomou Montemor.

Era de 1033: O Califa Al mançor tomou o Castelo de Aguiar, que está na margem do Sousa, na província Portucalense.

Era de 1046:  A 6 de Outubro. Foi morto o Conde Mendo.

Era de 1054: A 6 de Setembro vieram os Normandos ao Castelo de Vermuim que está na província Bracarense. Era aí que o Conde Alvito Nunes que morreu a lutar contra os Normandos.

Era de 1056: Morreu o Rei D. Afonso III em Viseu. E no mesmo ano morreu o grande Conde Nuno Álvares.

Era de 1072: A 14 de Outubro o Conde Gonçalo Trastamariz tomou Montemor e entregou-o aos Cristãos.

Era de 1076:  A 1 de Setembro o Conde Gonçalo Trastamariz foi morto em Avenoso.

Era de 1083: A 23 de Março o Rei D. Bermudo II teve uma vitória sobre os Mouros, lutou com eles e aprisionou-lhes aí o Califa Cémia na povoação de César, no território do Castelo de Santa Maria.

Era de 1085:  Morreu o mesmo Rei Bermudo II.

Era de 1095: O Rei Don Fernando o Magno com sua esposa, a Rainha Donna Sancha, tomou Lamego a 29 de Novembro na festividade de Santo Saturnino, ao amanhecer de um sábado. O Rei Don Fernando começou o ataque á Lusitânia Ocidental. O Conde Sisnando Davides acompanha a comitiva Real.

Era de 1096: A 29 de Julho, no dia de S. Cucufate, o Rei D. Fernando tomou a Cidade de Viseu, depois os Castelos, de Ceiça, S. Martinho de Mouros, Travanca, Penalva e outros Castelos das vizinhanças das fronteiras Cristãs, no que gastou 8 anos a atacar e a reconquistar as Terras da Lusitânia Ocidental.

Era de 1102: A 25 de Julho, 6.ª feira, na véspera de São Cristóvão o Rei Don Fernando o Magno tomou Coimbra. Estava novamente nas mãos dos Cristãos o Condado Conimbricense. A Fronteira Cristã deslocou-se novamente para o Rio Mondego.

Era de 1103: O Rei D. Fernando o Magno morreu e foi sepultado na Cidade de Leão a 26 de Dezembro.

Era de 1103: A 26 de Novembro morreu o Conde Mendo Gonçalves, varão ilustre de grande autoridade em todo o Portugal, filho do Conde Gonçalo Trastamariz.

Era de 1109: A 18 de Janeiro, os Portugueses travaram Batalha contra o Rei Don Garcia, filho do Rei Don Fernando o Magno e Rei da Galiza que incluía o Condado da Galiza, o Condado Portucalense e o Condado de Coimbra. Naquela guerra contra o Rei, os Portugueses eram chefiados pelo Conde Nuno Mendes. Este morreu aí e todos os seus fugiram. O Rei alcançou sobre eles uma vitória num lugar denominado Pertalini, entre Braga e o Rio Cávado.

Era de 1110: Foi morto o Rei Sancho II, filho do Rei D. Fernando, em frente da cidade de Zamora, depois de cuja morte seu irmão Don Sancho II e o aprisionamento do Rei Garcia o Rei D. Afonso VI, ocupou o Trono da Hispânica. Este durante muitos anos moveu muitas guerras contra os Sarracenos, inimigos dos nossos Cristãos. A uns fazia guerra, de outros recebia tributos.

Era de 1115:  No mês de Setembro o mesmo Rei Afonso VI tomou a Cidade de Cória.

Era de 1123: A 25 de Maio o Rei D. Afonso VI tomou a Cidade de Toledo, depois a de Talavera e todos os Castelos que estão na Carpetânia, província de Cartago, ao sul da Cidade Régia de Toledo, que é a Capital do Império Hispânico.

Era de 1125: O Imperador Don Afonso VI travou uma grande Batalha com o Califa dos Sarracenos luçufe Bennamarim, da outra banda do mar, em frente da cidade de Badajoz num lugar chamado Sacrálias, onde voluntariamente se vieram juntar com o nosso Rei os Cristãos das partes dos Alpes e muitos Francos o vieram auxiliar, mas, por intervenção diabólica, um grande medo invadiu muitos dos nossos, e muitos milhares deles se puseram em fuga, sem que ninguém os perseguisse. O Rei, porém, ignorando a sua fuga, confiadamente entrou na Batalha em que se encontravam todas as tropas Sarracenas da Hispânia inteira. O próprio Califa Iuçufe Bentaisafim, que tinham tomado por seu chefe, trouxera consigo muitos milhares de bárbaros de além-mar, Moabitas e Árabes, cujo número nem o seu chefe nem homem algum podia saber, senão Deus.

E assim o Imperador D. Afonso VI e os que com ele tinham ficado lutaram contra os Sarracenos até à noite e nenhum dos inimigos conseguiu aguentar o ataque dele, os Sarracenos, cerrando fileiras, matavam grande número de Cristãos. Tantas vezes, porém, o Imperador atacou o Castelo e os arraiais dos Sarracenos, matando-os e dispersando-os, que os repeliu para um e outro lado, até que chegou ao lugar onde estava levantada a tenda do Califa Iuçufe e fortificada à volta com uma grande trincheira. Enquanto o Imperador atacava este lugar com toda a coragem e insistia no ataque chegou um dos seus e anunciou-lhe: «Sabes, Senhor meu rei, que, enquanto aqui combates, as ciladas dos Sarracenos invadem os teus castelos». Ouvido isto e tomando conselho com os seus, o Imperador deixou o Califa Mouro e afastou-se da tenda dele. Pressuroso, por isso, com os seus que junto de si se encontravam, dirigiu-se para os Sarracenos que tinham atacado os seus Castelos e matou muitos deles e valorosamente os expulsou dos Castelos. Ali muitos Cristãos morreram e os que ficaram juntaram-se ao Imperador. Mas como o Imperador tinha sido ferido por uma lança e tinha muita sede por causa do fluxo de sangue que corria da ferida, deram-lhe vinho em vez de água, por não terem encontrado água, pelo que sofreu um desmaio e voltou para Cória com aqueles que os acompanhavam. Os Sarracenos também voltaram cada um para o seu lugar.

Era de 1129:  A 25 de Agosto morreu o Conde Don Sisnando, em Coimbra.

Era de 1131: A 29 de Abril, num sábado, às 9 horas, o Imperador D. Afonso VI tomou a cidade de Santarém no 6° dia do mês do 28° ano do seu Reinado. E na mesma semana, a 6 de Maio, uma quinta-feira, tomou Lisboa. Três dias depois, a 8 de Maio tomou Sintra e entregou-a ao governo de seu genro o Conde D. Raimundo, marido de sua filha a Rainha D. Urraca e sob a direcção deste o Conde Sueiro Mendes. O próprio Imperador, voltou para a Cidade Régia de Toledo.

Era de 1147:  A 29 de Junho morreu o Imperador da Hispânica Don Afonso VI, filho do Rei Don Fernando o Magno.

Era de 1147: No mês de Julho novamente foi tomada Sintra pelo Conde de Portugal D. Henrique, genro do Imperador D. Afonso VI, marido de sua filha, a Rainha D. Teresa. Sabendo, porém, os Sarracenos da morte do Imperador D. Afonso VI recomeçaram a guerra.

Era de 1148:  Aconteceu uma grande desgraça aos Cristãos que iam para Santarém num lugar denominado Vatalandi. Quando os Cristãos queriam ali levantar as suas tendas e descansar, de repente, uma multidão de Sarracenos, de Moabitas e de Árabes, tendo-lhes chegado aos ouvidos o reduzido número daqueles, caem sobre eles e, encontrando-os despercebidos, mataram muitos deles, tendo ali ficado mortos o Conde Soeiro Fromariguiz, pai do Conde D. Nuno Soeiro, que os comandava e o Conde Mido Cresconiz, pai do Conde D. João Mido.

Era de 1149:  O Califa Cir tomou Santarém a 26 de Maio.

Era de 1151: Nasceu o Infante Don Afonso, filho do Duque da Borgonha e Conde de Portugal, Don Henrique e da Rainha, Donna Teresa e neto do Imperador Don Afonso VI.

Era de 1152:  A 1 de Maio morreu o Duque da Borgonha e Conde de Portugal, Don Henrique.

Era de 1154: Foi tomado pelos Sarracenos o Castelo de Miranda e feita nos Cristãos grande carnificina e aprisionamento.

Era de 1154: A 7 de Julho foi tomado pelos Sarracenos o Castelo de Santa Eulália, que está situado ao pé de Montemor, e aí capturado o Cavaleiro Diogo, por nome o Galinha, e o grande aprisionamento de Cristãos aí feito, foi transferido dali para além-mar.

Era de 1155: O Califa dos Sarracenos, Ali Ibn luçuf, vindo do outro lado do mar com um numeroso Exército, cercou Coimbra, tendo-se-lhe juntado também todo o Exército que aquém-mar estava, sendo o número dos seus soldados grande como o da areia do mar e só de Deus conhecido. Efectivamente cercou a Cidade Fortificada de Coimbra, e durante vinte dias quotidianamente a atacava ardorosamente com todo o seu Exército, mas, por vontade de Deus, não pôde fazer-lhe mal e a Cidade ficou ilesa e os habitantes nela.

Era de 1160:  Houve uma grande fome na Cidade de Coimbra e em toda a Região Portucalense, desde o Minho até ao Tejo.

Era de 1163: O ínclito Infante Don Afonso, filho do Duque da Borgonha e Conde de Portugal Don Henrique e da Rainha Donna Teresa e neto do Imperador da Hispânica Don Afonso VI, tendo cerca de catorze anos de idade, na praça da Cidade de Zamora tomou por suas próprias mãos, do altar da Igreja de S. Salvador, as armas militares e ali mesmo, no altar, as vestiu e cingiu, assim como os Reis costumam fazer no Santo Dia de Pentecostes. Vestiu-se com a Cota assim como Gigas, que era de grande corpulência, e cingiu-se com as suas armas de guerra. Nas batalhas tornou-se semelhante ao Leão nas suas acções e tal qual o filho do Leão rugindo diante dos caçadores.

Mas quem poderá falar dignamente de tão grande e tão ilustre varão?

Ninguém. Na verdade foi um homem valente na guerra, versado na língua, muito prudente nas suas acções, de inteligência esclarecida, formoso de corpo, belo de fisionomia, de olhar encantador, todo Católico na Fé de Cristo, respeitador dos Ministros da Religião, muito benévolo e devoto, defendeu Portugal inteiro com a sua espada, alcançou o Trono e, como Senhor, dilatou as fronteiras dos Cristãos e alargou os territórios dos povos fiéis desde o Rio Mondego, que corre junto dos muros de Coimbra, até ao Rio Guadalquivir, que banha a cidade de Sevilha, e desde o Oceano Atlântico até ao Mediterrâneo.

Resumidamente anotaremos a maneira como conquistou o Reino, os Castelos e as Fortalezas que aí construiu e também as Cidades e os Castelos que aos Sarracenos tomou, porque ninguém podia descrever as Batalhas que travou, pois foram muitas e inumeráveis não só com pagãos, mas também com Cristãos que, demasiado cobiçosos, lhe queriam arrebatar e invadir o Reino, a todos levando vantagem e sempre ficando vencedor, de todos triunfando sempre, ajudado da bondade divina.

Era de 1166: No mês de Junho, na festa de S. João Baptista, o ínclito Infante D. Afonso, filho do Duque da Borgonha e Conde de Portugal D. Henrique e da Rainha D. Teresa, neto do grande Imperador da Espanha, D. Afonso VI, com auxílio do Senhor, pela bondade divina, mais pela sua diligência e trabalho do que por auxílio ou vontade dos pais, tomou na sua mão forte o Condado de Portugal. Porquanto, morto seu pai o Conde de Portugal D. Henrique da Borgonha, como ele ainda fosse criança de dois ou três anos, alguns indignos estrangeiros usurpavam o Governo de Portugal, com o consentimento de sua mãe, a Rainha D. Teresa, querendo ela própria presunçosamente Governar no lugar do seu marido, afastando o filho dos negócios do Condado. Valente como era, tinha já bastantes anos e um bom carácter, de maneira nenhuma sofria esta afronta demasiadamente vergonhosa, tendo convocado os seus amigos Cavaleiros e os mais Nobres de Portugal com as suas ostes, que sobremaneira preferiam o governo dele ao da mãe e dos indignos estrangeiros, travou com aqueles a «Batalha no Campo de S. Mamede», que fica próximo do Castelo de Guimarães e foram destroçados e derrotado por ele, uns fugiram da sua vista e a outros mandou prendê-los. Ocupou ele o Governo do Condado de Portugal.

Era de 1168:  Morreu a Rainha D. Teresa, mãe do Conde D. Afonso, no dia 1 de Novembro no segundo ano do seu Governo no Condado.

Era de 1169: O Conde Bermudo Peres, cunhado da Rainha D. Teresa, quis revoltar-se no Castelo de Seia. Mas foi mal sucedido, porque o Infante Don Afonso tendo disto, conhecimento, foi ao encontro dele com os seus soldados e expulsou-o do Castelo.

Era de 1170: O Infante Don Afonso, começou a construir o Mosteiro de Santa Cruz nos subúrbios de Coimbra e uma ponte no rio junto da cidade no quarto ano do seu Governo do Condado.

Era de 1173:  A 10 de Dezembro o supramencionado Infante D. Afonso começou a construir o Castelo de Leiria, no sétimo ano do seu Governo, pois via as frequentes incursões e depredações que se faziam pelos campos de Coimbra, e, querendo refreá-las com mão forte e braço extenso, procurou um lugar próprio e que servisse de defesa para o seu Condado e apropriado para prejuízo dos seus inimigos. Encontrou, por isso, aquele monte num lugar de vasta solidão, situado nas proximidades de Santarém e de Coimbra, distante do Castelo de Santarém umas quarenta milhas e cerca de cinquenta do Castelo de Coimbra. Primeiramente construiu aí um Castelo e colocou nele, habitantes, como chefe pôs-lhes um valente Cavaleiro, de nome Paio Guterres. Por isso a força e a audácia dos Sarracenos, por intermédio deste, começou a enfraquecer, porque na verdade viam outro Cipião Africano que os esmagaria, esfrangalharia e sujeitá-los-ia como a palha sob os malhos na eira.

Era de 1175:  Aconteceu um infortúnio aos Cristãos em Tomar.

Era de 1177:  A 25 de Julho na festa de S. Tiago Apóstolo, no undécimo ano do seu Governo, o mesmo Infante D. Afonso travou uma grande Batalha com o Califa dos Sarracenos, de nome Esmar, num lugar que se chama Ourique. Efectivamente aquele Califa dos Sarracenos, conhecendo a coragem e a audácia do Infante D. Afonso, e vendo que ele frequentemente entrava na terra dos Sarracenos fazendo grandes depredações e vexava grandemente os seus domínios, quis se fazê-lo pudesse, travar Batalha com ele e encontrá-lo incauto e despercebido em qualquer parte. Por isso uma vez, quando o Infante D. Afonso com o seu Exército Condal entrava por terras dos Sarracenos e estava no coração das suas terras, o Califa Esmar, tendo congregado grande número de Mouros de além-mar, que trouxera consigo e daqueles que moravam aquém-mar, no termo de Sevilha, de Badajoz, de Elvas, de Évora, de Beja e de todos os Castelos até Santarém, veio ao encontro dele para o atacar, confiando no seu valor e no grande número do seu Exército, pois mais numerosos era ainda pela presença aí das mulheres que combatiam à laia de amazonas, como depois se provou por aquelas que no fim se encontraram mortas. Como o Infante D. Afonso estivesse com alguns dos seus acampado num promontório fortificado, foi cercado e bloqueado de todos os lados pelos Sarracenos de manhã até à noite. Como estes quisessem atacar e invadir o acampamento fortificado dos cristãos, alguns soldados escolhidos destes investiram contra os Sarracenos, combatendo valorosamente, expulsaram-nos do acampamento, fizeram neles grande carnificina e separaram-nos. Como o Califa Esmar visse isto, isto é, o valor dos Cristãos, e porque estes estavam preparados mais para vencer ou morrer do que para fugir, ele próprio se pôs em fuga e todos os que estavam com ele, e toda aquela multidão de infiéis foi aniquilada e dispersa quer pela matança quer pela fuga. Também o Califa deles fugiu vencido, tendo sido preso ali um seu sobrinho e neto do Califa Ali, de nome Omar Atagor.

Com muitos homens mortos também da sua parte, D. Afonso, com a ajuda da graça de Deus, alcançou um grande triunfo dos seus inimigos, e, desde aquela ocasião, a força e a audácia dos Sarracenos enfraqueceu muitíssimo.

É durante este episódio que Don Afonso é reconhecido pelo Exército Português, pelos seus Cavaleiros mais chegados e pela Nobreza Portucalense, como seu chefe e senhor e á maneira dos Godos, levantaram-no em cima do seu escudo e aclamado Rei dos Portugueses. Todos os homens gritaram pelo seu nome e saudaram-no como Rei e seu Senhor. A partir desta data o Infante intitula-se Rei de um Reinado independente. O Reino de Portugal.

Era de 1178: No ano primeiro do seu Reinado, o Califa Esmar, sabendo que o Rei D. Afonso estava além de Guimarães, perto de Tui nas partes da Galiza, e estava ali muito ocupado em alguns negócios de que não podia facilmente desembaraçar-se, animado pelo conselho de um dos seus oficiais que estavam em Santarém, de nome Auzecri, tendo juntado grande número de gente de Badajoz, de Évora e de Santarém, veio de repente e atacou o Castelo de Leiria e lançou-lhe o fogo, tendo matado aí alguns soldados e levando outros consigo em cativeiro. Também o Conde Paio Guterres, a cujo cuidado fora confiada a guarda do Castelo, foi aprisionado.

Ao mesmo tempo o Imperador D. Afonso VII, filho do Conde Raimundo da Borgonha e da Rainha D. Urraca, filha do grande Imperador D. Afonso VI, tendo reunido todo o seu Exército de Castela e Galiza, quis entrar no Reino de Portugal e vieram até um lugar que se chama Valdevez. Mas o Rei D. Afonso foi ao seu encontro com o seu Exército e ocupou o caminho por onde aquele queria vir, e armou as suas tendas, uns de uma parte e outros de outra. E como alguém viesse do lado do Imperador para provocar uma escaramuça que os populares chamam «Bufúrdio», imediatamente alguns saíam do lado do Rei de Portugal, indo ao encontro deles e, com eles, escaramuçando.

Estes prenderam o Infante Don Fernando Furtado, irmão do Imperador Don Afonso VII, o Cônsul Pôncio de Cabreira, o Conde Don Vermudo Peres e Varela, filho do Conde Don Fernando Joanes, irmão do Conde Don Paio Curvo, e o Conde Don Rodrigo Fernandes, pai do Conde Don Fernando Rodrigo, e o Conde Don Martinho Cabra, sobrinho do Cônsul Don Pôncio, e outros, muitos que com eles vinham. Por isso vendo o Imperador que tudo corria próspero ao Rei de Portugal e que uma boa estrela o guiava e que Deus o ajudava e que a si tudo lhe corria ao contrário, e que, se quisesse continuar a luta, maiores seriam os seus prejuízos, mandou enviados à presença do Arcebispo de Braga, D. João, e a outros homens bons e pediram-lhes que viessem ter com o Rei de Portugal para que fizesse e firmasse uma boa paz e para sempre. Assim aconteceu e chegaram a um acordo. Efectivamente numa tenda tanto o Imperador como o Rei de Portugal se beijaram mutuamente, comeram e beberam vinho, e falaram a sós secretamente e, assim, cada um deles retomou a sua paz.

Também na mesma ocasião, inesperadamente, vieram das partes das Gálias alguns navios cheios de guerreiros, no propósito de irem a Jerusalém. E, como tivessem chegado ao porto de Gaia e tivessem entrado no Rio Douro, o Rei ouviu esta notícia com que se regozijou. Efectivamente eram cerca de setenta embarcações, e com eles firmou o acordo de que aqueles se dirigiriam a Lisboa por mar, e ele com o seu Exército por terra e lhe poriam cerco. Talvez aprouvesse ao Senhor entregá-la nas suas mãos. E assim, feito esse acordo, dirigiram-se todos a Lisboa, aqueles por mar e o Rei com seu Exército por terra, cercaram-na e atacaram-na, mas nada puderam contra ela, porque ainda não chegara a ocasião de ser entregue às mãos dos Cristãos, mas atacaram os arredores, destruíram muitas vinhas, incendiaram as casas e fizeram grande dano naquela terra. Vendo então que não era fácil a sua tomada nem durante longo espaço de tempo, embora permanentemente cercada, pois estava bem fornecida de provisões, era muito populosa e não lhe faltavam animosos defensores, deixaram-na. O Rei voltou com o seu exército para a sua terra e aqueles marinheiros seguiram a sua rota para Jerusalém, para onde tencionavam ir.

Era de 1180: O mesmo Rei dos Portugueses D. Afonso começou a construir o Castelo de Germanelo, no terceiro ano do seu Reinado. Com efeito, vendo D. Afonso que os habitantes de Coimbra estavam aterrorizados e não ousavam sair para os seus trabalhos nos arredores, nas vilas de Germanelo, Alvor e Ateanha, por causa das frequentes incursões e depredações que, diariamente, ali faziam os Sarracenos, por tal motivo achou bem, fazer aquele Castelo no coração daquela terra, para segurança e defesa dos trabalhadores cristãos e para dano dos salteadores Sarracenos, colocou aí soldados que o guardassem e servissem de protecção e defesa aos Cristãos.

Pelo mesmo tempo levantaram-se os Ismaelitas contra os Moabitas, isto é, os Andaluzes contra os Árabes, e expulsaram-nos das suas Cidades e Castelos. Chegara já efectivamente o tempo em que o Senhor haveria compaixão do Povo Cristão e afastaria deles a sua ira que sobre eles lançara no tempo do Rei Rodrigo, por causa dos seus pecados e mandara contra eles os Sarracenos, para que destruíssem os Cristãos e ocupassem a sua terra. Agora, porém, o Senhor amerceou-se e tornou-se propício ao seu Povo Cristão, afastou dele a sua ira e lançou a sua espada entre os Ismaelitas e Moabitas, isto é, Andaluzes e Árabes, para aniquilar o seu Califado e destruir o seu poder e força, que contra os Cristãos prevaleciam.

Morto o Califa Herico, que estimava mais os Árabes que os Andaluzes, que antepunha aqueles a estes, e àqueles entregava os comandos, os Andaluzes, não podendo aguentar o jugo dele, porque era demasiadamente pesado e insuportável, os Andaluzes, todos, unanimemente se levantaram contra os Árabes e expulsaram-nos das Cidades e dos Castelos e, depois de expulsos, obrigaram-nos a sair da Hispânica e a passar para além-mar. Isto, porém, operava-se por obra da bondade divina, para aliviar os Cristãos e dilatar as suas terras. Desde que, na verdade, os Árabes passaram para aquém-mar e vieram à Hispânica por causa dos pecados dos Cristãos, estes passaram maus bocados. Mas o Senhor mandou a sua espada para o meio deles para destruir-lhes o seu Califado e fortalecer o Reino dos Cristãos que, até aqui, tinham sido espezinhados e humilhados. Depois que os tinham expulsado, o Rei de Portugal, D. Afonso, fortemente os devastava e assolava a terra daqueles guerreiros, humilhando-os e aniquilando-os. Por isso, contra vontade, vieram ter com ele e, prestando-lhe homenagem, pagavam-lhe tributo e o Censo das Cidades e Castelos de Santarém, de Lisboa e dos seus vizinhos, até que chegou o tempo de o Senhor entregar nas mãos dos Cristãos essas Cidades e Castelos.

Era de 1182:  O Rei de Portugal D. Afonso começou a reedificar o Castelo de Leiria no mesmo lugar em que primeiramente fora construído no quinto ano de seu Reinado.

Era de 1183: O mesmo Rei D. Afonso casou com a Condessa D. Matilde, filha do Conde Amadeu de Moriana e a esta se ligou em legítimo casamento no ano sexto do seu Reinado e dela houve três filhos e três filhas, uma das quais D. Urraca, depois casou com o Rei de Leão, D. Fernando II, outra, porém, casou-a com o Cônsul da Flandres. A outra morreu na sua juventude, dois dos seus filhos morreram, apenas ficou um o Infante D. Martinho, por sobrenome Sancho.

Era de 1185: O mesmo Rei de Portugal D. Afonso, no oitavo ano de seu Reinado, revestido de audácia e valor, atacou corajosamente, com alguns poucos dos seus, o Castelo de Santarém, confiado no auxílio divino e recuperou-o para si e para a Cristandade, tendo matado e expulsado dali os Sarracenos que nele habitavam. Por vontade de Deus se deu este acontecimento a 11 de Maio, ao cantar do galo, ao amanhecer de um sábado. E no mesmo ano, no mês de Julho cercou Lisboa. Em seu auxílio, e por obra da bondade divina que do alto céu a tudo provê, veio súbita e inesperadamente das partes das Gálias, e conduzido por mão divina, um grande número de navios. Grandemente confiado neste auxílio, cercou a cidade durante cinco meses, atacando-a e assaltando-a valentemente por terra e por mar, não permitindo que ninguém saísse ou entrasse. Finalmente, porém, a 24 de Outubro, numa sexta-feira, ao meio-dia, tomou a cidade na sua mão forte e extenso braço com o auxílio da piedade divina e ajuda do Senhor Jesus Cristo, tendo sido expulsos dali os Sarracenos.

E em épocas e anos diferentes tomou os fortíssimos Castelos de Sintra, Almada e Palmela, e com os seus guerreiros conquistou-os para si e para a Cristandade.

Naquele tempo aconteceu por obra do Senhor o milagre mais extraordinário de todos os que Deus operou no mundo por meio dos Reis antigos, seus servos. O Rei D. Afonso, com 60 homens de armas de Santarém, sem armadura alguma a não ser apenas os escudos, as lanças e as espadas, sem couraças nem capacetes, nem sapatos de ferro, confiado no auxílio de Deus e ajudado da bondade divina, lutou com 500 soldados Sarracenos bem armados e cobertos de ferro e bem instruídos no serviço militar e com quarenta mil peões bem armados, nos campos de Alcácer e venceu-os, matou muitos deles e outros fugiram para dentro da Fortaleza. Ele foi aí ferido pelos Sarracenos numa perna com uma lança. Em poucas palavras contarei como isso aconteceu.

Era de 1192:  Nasceu o Infante Sancho, filho do Rei D. Afonso e da Rainha D. Matilde na noite de S. Martinho, uma quinta-feira, e por isso no baptismo deram-lhe o nome de Martinho, e depois foi cognominado Sancho. Nasceu aos 26 anos de idade do pai.

Era de 1195: No mês de Setembro morreu o Imperador D. Afonso VII, filho do Conde da Borgonha D. Raimundo e da Rainha D. Urraca.

Era de 1196:  A 24 de Junho, segunda-feira, no dia de S. João Baptista foi tomado o Castelo de Alcácer pelo Rei D. Afonso. Já anteriormente lhe pusera cerco por duas vezes ajudado por grande número de navios que vieram das partes do Norte, isto é, da França e regiões vizinhas daquelas, mas Deus ainda não apartara deles, os infiéis, a sua comiseração. Agora, porém, já estava, completa a sua maldade e iniquidade, afastou deles a sua face e entregou-os às mãos dos Cristãos. O Rei D. Afonso cercou-o só com o seu Exército, durante quase dois meses, atacando-o valorosamente todos os dias, e no dia de S. João Baptista o Senhor entregou-lho, sendo dali expulsos todos os Sarracenos, no ano 19 do seu Reinado.

Era de 1196: A 3 de Dezembro, uma quarta-feira, às 9 horas, morreu a ilustríssima serva de Deus, a Rainha de Portugal D. Matilde, de preclara e nobilíssima linhagem, filha do muito famoso Conde Amadeu, esposa de Don Afonso, Rei dos Portugueses, para a qual haja verdadeiro descanso, Amem, no décimo nono ano do Reinado de D. Afonso.

Era de 1200: A 30 de Novembro na noite de S.to André Apóstolo, a Cidade de Pace, isto é, Beja, é assaltada de noite pelos homens do Rei de Portugal, D. Afonso, certamente o Cavaleiro Fernando Gonçalves e alguns outros soldados plebeus, e corajosamente é tomada e ocupada pelos Cristãos no ano 23 daquele Reinado.

Era de 1204: A cidade de Évora é tomada e saqueada de noite e ocupada pelo Chefe Geraldo, denominado Sem-Pavor, e pelos ladrões, seus companheiros, e entregou-a ao Rei D. Afonso. Pouco tempo depois o próprio Rei tomou Moura, Serpa, Alconchel e mandou reedificar o Castelo de Voruche, no ano 27 do seu Reinado.

Era de 1206: Aconteceu uma infelicidade ao Rei D. Afonso e ao seu Exército em Badajoz no ano 29 do seu Reinado.

Era de 1209: No mês de Agosto nasceu o Infante D. Afonso, filho do Rei Fernando II e da Rainha D. Urraca, neto do Rei de Portugal D. Afonso.

Era de 1212: O Infante D. Sancho casou com a filha de D. Raimundo, Duque de Barcelona, D. Dulce, irmã do Rei de Aragão, D. Afonso, no ano 35 do Reinado de seu pai.

Era de 1216: O Infante D. Sancho dirigiu-se a Sevilha com o seu Exército e entrou em Triana, antiga cidade de Sevilha, destruiu as muralhas desta cidade e saqueou-a no ano 39 do Reinado de seu pai.

Era de 1217: No mês de Outubro veio Iacube, filho de Elmunimo, Emir dos Sarracenos, e seu irmão Frocem, até junto do Castelo de Abrantes, com um Exército de tanta gente que ninguém podia contar. Cercaram o Castelo e assaltaram-no. Retiraram-se porém dali 4 dias depois com grande prejuízo do seu Exército, tendo sido mortos muitos dos seus soldados. Durante o cerco, por vontade de Deus, apenas nove Cristãos foram mortos. Aconteceu isto no ano 40 do Reinado do Rei D. Afonso.

Era de 1218: Vieram de novo subitamente sem serem esperados ao Castelo de Coruche e ocupando o destruíram, tendo matado ou levado em cativeiro todos os habitantes dele, no ano 41, daquele Reinado.

Era de 1222: No ano 45 do Reinado do Rei de Portugal D. Afonso, Iusef Abeujacob Emir Elmunimo segundo, Emir dos Sarracenos, filho de Ali Abelmuine, que foi chamado Califa do burro, porque, passeando sempre num burro era tido por todo o povo como profeta e santo, no ano 32 do seu Califado, depois que submetera os Califados da outra Banda e se apoderara das maiores regiões de além-mar, por exemplo, Gafsa e Gumera, que pertenceram ao Califa Ali, e de todo o Califado de Marrocos, e, no aquém-mar, de todo o Reino que pertencera ao Rei Lobo, por exemplo, Valência, Múrcia, Granada e das restantes Cidades e Castelos, que ao Rei Lobo foram pertencentes, vendo que ninguém havia que lhe pudesse resistir e porque o terror dele invadira todos os povos, até às partes orientais, encheu-se de orgulho e pensou vir à Hispânica e Reconquistar as Cidades e Castelos que outrora estiveram na posse dos Sarracenos, como Lisboa, Sintra, Santarém, Évora, Alcácer e muitos outros castelos, ou vir a Coimbra. E assim, subjugada finalmente toda a Lusitânia até ao Douro, subindo pela margem deste Rio, vir até Toledo e não desistir deste feito, embora o Rei da França, o Rei de Inglaterra, o Rei de Aragão, o Rei de Castela, o Rei da Galiza e o Rei de Portugal entrassem em pacto e o combatessem. E enquanto pensava nisto e estudava este plano com seus amigos, conselheiros e príncipes junto de si, enviou mensageiros a todos os Califas que havia além-mar e a todos os Califados ultramarinos para que todos viessem em seu auxílio e acorressem e ajudassem a congregar todos os esforços para destruir a Cristandade e exaltar e glorificar os da sua fé, prometendo que daria abundante e suficientemente a todos, que a ele se juntassem, víveres e mantimentos e todas as coisas necessárias para um ano. Ouvindo isto todos, com excepção de todo o seu Exército de Marrocos, juntaram-se-lhe o Exército de Cúmia, o Exército do Algarve, o Exército de Guma, o Exército de Cenhega, o Exército de Umivener, o Exército de Vinihuhialgar, o Exército de Chinierne, o Exército de Hela, o Exército de Héscora, o Exército de Henchega, o Exército de Harga, o Exército de Henchegar e de muitas outras terras e províncias que não posso enumerar. Ainda também um outro Exército, grande e forte, e bem instruído, veio em seu auxílio, assim como muitos Califas, o Califa Auzchi de Abde Arrahmane, o Califa Azum, irmão daquele, o Califa Hecie Aben Musa, o Califa Abuzach, o Califa Ismael e Abenjusef, irmão daquele, Abde Arrahmane Califa de Zuz, Zoleima e Aburabe, Califa de Chedala e o Califa de Búgia. Todos estes Califas do ultramar prepararam também muitos navios de guerra e de carga trazendo armas, trigo e máquinas para escavar as muralhas e transpô-las. Mandou também cartas e mensageiros a seus filhos que estavam aquém-mar, isto é, a Abozac, que era Califa de Sevilha e Abdacu Abvialne, que era Califa de Córdova e Abdarrhama Abuzeide que era Califa de Granada, e a Gamo, que era Califa de Múrcia e de Valência, que todos se preparassem para a Batalha e, no dia em que ele atravessasse o mar e chegasse a Sevilha, que todos igualmente se lhe juntassem, e marcou-lhes o tempo e o mês. Como tudo aquilo que havia de ser necessário a todo o Exército estivesse pronto de um lado e do outro, os navios preparados e todo o Exército dos que vinham de partes diversas estivesse já igualmente congregado, o próprio Emir dos Sarracenos Emir Elmunimo lucef Abenjacob, subindo para os navios com todas as suas tropas passou o piar e chegou a Sevilha. Também Jacob, filho daquele Abenjucef, que depois dele havia de ser Califa, a quem ele deixaria todo o seu Império depois da morte, veio com ele, e outro filho Abozabz, que era Califa a quem fez senhor não só do Algarve, mas também de todos os Árabes, tendo-se juntado todos em Sevilha, isto é, os que vieram de além-mar e aqueles que se lhe tinham juntado de aquém-mar. Não se quis demorar aí mais tempo, mas imediatamente construiu o acampamento, temendo que os Cristãos, sabendo disto, preparassem agora as suas Cidades e Castelos para resistirem. Não quis por isso dar-lhes tempo para levantarem muros, aprovisionarem víveres, ou construírem máquinas, mas vinham com rapidez, vinham em tão grande número e tantos como as estrelas do céu e, como se julgava, mais que a areia do mar, que se não pode contar por ser tal a quantidade. O próprio Emir Elmunimo passara vista nos livros das crónicas de todos os Califas Sarracenos, que houve antes dele e vieram à Hispânica desde o tempo em que primitivamente aí vieram e muitas vezes a assolavam, e tendo contado o maior Exército daqueles que a tinham invadido até aos Alpes, ele julgava que tinha consigo um exército muito maior, trazendo com ele mais de 78 mil homens. Efectivamente era enormíssimo e forte o seu Exército, ocupando montes e vales e toda a superfície da terra, cujo número só Deus, que pode contar as gotas da chuva, poderia conhecer.