segunda-feira, agosto 31, 2015

A Guerra Naval



Entende-se por ‘Guerra Naval’ todo o combate decorrido nos mares, oceanos, ou noutras grandes superfícies aquáticas, tal como grandes lagos e rios de grande envergadura. O registo mais antigo de uma Batalha Naval teve lugar em cerca de 1210 A.C., ao largo de Chipre. Tal como acontece com as restantes formas de Batalha, as tácticas navais baseiam-se, sobretudo, em poder de fogo e mobilidade, que se pode traduzir na combinação eficiente do poder de fogo entregue, conseguida através dos batedores e ocupação das melhores posições no mar. A mobilidade é, efectivamente, uma componente crucial no combate. Na Guerra Naval, a chave encontra-se, sobretudo, em conseguir detectar o inimigo sem ser detectado. Existe também o conceito de ‘Área de Batalha’: a zona ao redor da força naval dentro da qual o comando assume que consegue detectar, perseguir, atacar e destruir as ameaças antes de estas constituírem perigo. É por este motivo que a Marinha prefere o combate em mar aberto, já que a presença de terra, aliado à topologia subaquática, diminui este espaço, limitando as oportunidades de manobra e, consequentemente, facilitando ao inimigo determinar a localização da frota, ao mesmo tempo que dificulta a detecção das forças inimigas.

Tiro de Enfiada



Na guerra naval, tiro de enfiada (em inglês raking fire) é o disparo dirigido paralelo ao eixo longo de um navio inimigo. Ou seja, alvejando as Naus ao comprido. Embora cada tiro seja dirigido contra o perfil de um alvo menor ao invés de se atirar no costado do navio e, portanto, mais propenso a errar o navio alvo tanto para um lado quanto para o outro, um único tiro de canhão que atinge o alvo irá passar por uma parte maior do navio, aumentando assim os danos ao casco, as velas, e a tripulação. Um tiro de popa causa mais danos do que um tiro de proa porque os tiros não são desviados pela proa curva (e reforçada). Nas batalhas, onde a maioria dos canhões se encontram ao longo do costado do navio, uma das maiores preocupações era evitar receber ‘Tiros de Enfiada’. Assim, como as áreas da proa e da popa de um navio eram altamente vulneráveis, a táctica de tiro de enfiada era o desejo furtivo de cada Capitão em Batalha. A eficácia desta táctica foi demonstrada na ‘Batalha de Trafalgar’. O ‘HMS Victory’ do Almirante Nelson, conduzindo a coluna de barlavento da frota britânica, quebrou a linha francesa bem na popa do ‘Bucentaure’ e logo a frente do ‘Redoutable’. O ‘Victory’ disparou em sua popa menos protegida e ele sofreu baixas de 197 mortos e 85 feridos (incluindo o capitão Megendie). O almirante Villeneuve teve sorte de sobreviver, e embora ele não tenha sido capturado por três horas, o tiro pôs o ‘Bucentaure’ fora da luta. A ‘Batalha de San Domingo’, em 1806, foi uma Batalha Naval das Guerras Napoleónicas. Nela se ilustra a situação na qual o navio que procura acertar um tiro de enfiada pode ser logo após alvo da mesma táctica. Nesta batalha, o navio ‘Alexandre’ danificado, de repente saiu fora de sua linha em uma tentativa de cruzar entre o ‘Spencer’ e o ‘Northumberland’ para disparar fogo de enfiada em ambos. O Capitão Robert Stopford do ‘Spencer’ antecipou-se e respondeu rapidamente, virando em arco atrás do ‘Alexandre’ e disparando ele, uma salva de enfiada. Durante a guerra anglo-americana de 1812, a fragata americana ‘USS Constitution’ entrou em combate com a fragata britânica ‘HMS Guerriere’. Após ter acertado o mastro da mezena, o navio britânico foi danificado. A fragata ‘Constitution’ veio em torno da proa do ‘Guerriere’ e acertou um pesado fogo de enfiada a curta distância, usando grapeshot, que acertou o pátio principal. A fragata britânica respondeu ao fogo, mas o lado britânico sofreu um número bem maior de baixas (78 baixas britânicas contra 14 baixas americanas). Apesar do fogo da ‘Guerriere’ ter sido pesado e a curta distância, as laterais do ‘Constitution’ eram reforçadas com ferro, o que lhe rendeu somente 7 mortos e 7 feridos. Por fim a fragata foi incendiada e afundada pelo ‘USS Constitution’.

Operação de Desembarque



Uma operação de desembarque é uma acção militar que tem como objetivo levar forças militares a uma margem ou trecho de terra, normalmente com o uso de lanchas de desembarque, com o propósito de projectar seu poder para o combate em terra firme. O termo ‘desembarque’ nos séculos anteriores ao século XX, referem-se a forças armadas para que desembarcam dos navios de guerra para combaterem em terra. Essas forças eram da exclusividade dos Fuzileiros da Frota. Uma operação de desembarque é uma acção militar que tem como objetivo levar forças militares a uma margem ou trecho de terra com o propósito de projectar seu poder para o combate em terra firme.

Navio de fogo



Navio de fogo é um navio não-tripulado de uma única vela, carregado de explosivos e substâncias inflamáveis o qual, levado pelo vento em direção ao adversário causa sérios danos na estrutura do casco do navio. O brulote é um navio de fogo carregado de matérias inflamáveis que era incendiado e lançado, evidentemente sem tripulantes, sobre a frota inimiga. Este tipo de arma teve papel importante na luta dos ingleses contra a Invencível Armada, em 1588.

A ‘Linha de Batalha’


Em guerra naval, a ‘Linha de Batalha’ é uma táctica em que os navios da frota formam uma linha do início ao fim. Uma forma primitiva foi utilizada pelos portugueses sob o Capitão-Mor Vasco da Gama em 1502 perto de Malabar contra uma frota muçulmana. Embora seja bem documentado que Martin Tromp tenha usado pela primeira vez na Acção de 18 de Setembro de 1639, isto ainda é disputado por alguns. As primeiras instruções escritas em qualquer linguagem adoptando a formação estavam contidas nas instruções de combate da Marinha Inglesa, escritas pelo almirante Robert Blake e publicadas em 1653. Capitães individuais em ambos os lados da ‘Primeira Guerra Anglo-Holandesa’ parecem ter experimentado esta técnica em 1652, possivelmente incluindo Blake na ‘Batalha de Goodwin Sands’. Para alguns autores a linha de batalha e os navios de linha propriamente ditos são uma invenção inglesa. Na ‘Batalha de Gabbard’ em 1653 a frota inglesa deixou de lado os últimos traços de suas velhas tácticas e lutou em uma simples linha a frente. A ‘Linha de Batalha’ leva vantagem sobre as tácticas navais anteriores nas quais os navios se aproximavam entre si para combate individual (porque cada navio na linha pode disparar de seu costado sem medo de atingir um navio amigo). Portanto, em qualquer período determinado de tempo um número maior de tiros podia ser disparado pela frota inteira. Outra vantagem é que um movimento relativo da linha em relação a alguma parte da frota inimiga permite uma concentração sistemática de fogo sobre essa parte. Para afastar esta possibilidade a outra frota pode, também, se mover em uma linha, com o resultado típico para ‘Batalhas Navais desde 1675’, duas frotas velejando lado a lado na mesma direção ou em rumo oposto. Um navio poderoso o suficiente para ficar na Linha de Batalha veio a ser conhecido como um "navio de linha". A linha é a sua mais eficaz quando se movendo perpendicular ao eixo de movimento da frota inimiga, por exemplo, "cruzando o T" ou quebrando a linha inimiga e movendo-se através dela (por exemplo: ‘Batalha de Quatro Dias’, ‘Batalha de Schooneveld’, ‘Batalha de Trafalgar’), ao tentar cortar e isolar parte da linha do inimigo e concentrando uma força mais forte sobre ele (por exemplo: ‘Batalha de Texel’, ‘Batalha de the Saintes’), ou ao tentar 'dobrar' os navios do inimigo (por exemplo: ‘Batalha de Beachy Head’). Desta forma, os navios inimigos bloqueiam a linha de fogo uns dos outros. A partir de meados do século XVI, o canhão gradualmente se tornou a mais importante arma na guerra naval, substituindo acções de abordagem como factor decisivo no combate. Ao mesmo tempo, a tendência natural no projecto de galeões foi a construção de navios mais compridos com castelos mais baixos, o que significa vasos mais rápidos e mais estáveis. Estes navios de guerra mais recentes poderiam montar mais canhões ao longo dos lados de suas cobertas, concentrando seu poder de fogo ao longo de seu costado. Até meados do século XVII, as tácticas de uma frota eram muitas vezes partir em ‘carga’ contra o inimigo, usando canhões de proa, o que não usava o costado do navio para melhor efeito. Estes novos vasos necessitavam novas tácticas, e "uma vez que... Quase toda a artilharia é encontrada sobre os costados de um navio de guerra, portanto, é a viga mestra que deve, necessariamente e sempre estar voltada para o inimigo. Por outro lado, é necessário que a visão deste último nunca deva ser interrompida por um navio amigo. Apenas uma formação permite que os navios da mesma frota satisfaçam plenamente essas condições. Esta formação é a linha de frente [coluna]. Essa linha, portanto, é imposta como a única ordem de batalha, e, conseqüentemente, como base de todas as táticas da frota.". A táctica de ‘Linha de Batalha’ favorecia navios muito grandes que podiam navegar de forma constante e manter seu lugar na linha em face ao fogo pesado. A mudança em direção ao uso da táctica de linha de batalha também dependia de uma disciplina maior da sociedade e das exigências de um governo centralizado forte para manter frotas permanentes lideradas por um corpo de oficiais profissionais. Esses oficiais eram mais capazes de gerir e se comunicar entre navios que eles comandavam do que as tripulações com experiência em navios mercantes que muitas vezes compunha grande parte da força de uma marinha. O novo tipo de guerra que se desenvolveu durante a Idade Moderna foi marcado por uma organização sucessivamente mais rigorosa. Formações de batalha tornaram-se padronizadas, com base em modelos ideais matematicamente calculados. O aumento da potência dos estados à custa dos proprietários individuais levou a exércitos e marinhas cada vez maiores. O principal problema com a ‘Linha de Batalha’ era que, quando as frotas são de tamanho similar, as acções navais a usando eram geralmente indecisas.


Guerras com Castela 1368-1414

Situação político-militar


Sob o ponto de vista político-militar este período é marcado pelas tentativas de união de Portugal e Castela e pelo começo da interferência dos Ingleses nos negócios da Península Ibérica. Duas linhas de força que daí para a frente, vão condicionar a política externa portuguesa praticamente até ao século XX. Tudo começa pelo facto de D. Fernando, quando sobe ao trono, encontrar os cofres cheios de dinheiro e ter à sua disposição uma armada que seria, possivelmente, a mais forte da época. Confiado, nestes dois factores de força e ignorando que Castela era pouco vulnerável ao poder naval e que disponha de um exército superior ao nosso, deixa-se envolver nas lutas pela sucessão ao trono daquele país e lança-se levianamente na guerra em 1369, para valer os seus direitos. Mas faltam-lhe os dotes militares indispensáveis pra conduzir uma empresa de tão grande envergadura. A armada portuguesa estiola-se ingloriamente no bloqueio de Sevilha sem contrapartidas apreciáveis de ordem estratégica e o nosso exército não se atreve a enfrentar os Castelhanos numa batalha campal. A guerra entra num impasse e a intervenção do Papa põe termo às hostilidades em 1371. De notar que esta guerra não foi motivada por razões de política nacional ainda que mal concebidas mas unicamente, como geralmente acontecia durante a Idade Média, por razões de ordem pessoal do monarca. Foi apenas para satisfazer a sua vaidade pessoal de cingir simultaneamente as coroas de Portugal e Castela que D. Fernando deu inicio a uma guerra que quer ganhasse, ou perdesse poderia acarretar, a união dos dois países e a consequente perda da independência nacional. O pior de tudo é que não aprendeu a lição. Dominado por um sentimento mesquinho de frustração fica à espera de uma condição propícia para se desforrar da humilhação que sofrera. É, esse, o estado de espirito que o leva em 1372, a apoiar as pretensões do Duque de Lencastre ao trono de Castela. Faltando vergonhosamente aos compromissos que assumira no ano anterior, entra de novo em guerra com aquele país em apoio dos ingleses. Mas desta vez, as operações militares ainda são mais desfavoráveis aos Portugueses. O rei de Castela Henrique II marcha sobre Lisboa e perante passividade de D. Fernando, põe cerco à cidade. O que vale aos Portugueses é que Henrique II encontra.se preocupado com a situação interna de Castela e com a pressão que os Ingleses auxiliados pelo rei de Navarra, exercem sobre as suas fronteiras orientais. Desejoso de pôr termo à guerra com Portugal, aceita mais uma vez, a mediação do Papa para fazer a paz com D. Fernando em 1373. Mas este não desiste. Consegue fazer uma aliança com os Ingleses e em 1381, na sequência da morte de Henrique II, procura de novo fazer vingar os seus direitos ao trono de Castela pela força das armas. A sorte não lhe sorri. A armada portuguesa sofre inesperadamente uma tremenda derrota em Saltes e o próprio estuário do Tejo è ocupado pelas armadas de Castela. Felizmente, alguns dias antes, tinha chegado a Lisboa um importante contingente de tropas inglesas. Graças a essa ajuda os Portugueses conseguem equilibrar a balança das forças terrestres. Os castelhanos não ousam arriscar-se a uma batalha decisiva e pela terceira vez, com os beligerantes esgotados e fartos, de uma guerra estúpida, é celebrada a paz … sem o conhecimento dos Ingleses (!). que abandonam Portugal indignados com o procedimento de D. Fernando. Após a morte deste em 1383, invertem-se os papéis. Agora é D. João I de Castela que apoiado pela maioria da nobreza Portuguesa, faz valer os seus direitos ao trono de Portugal. Estala em Lisboa a revolução popular e burguesa que levanta o Mestre de Avis por Defensor e Regedor do Reino. O rei de Castela vem pessoalmente pôr cerco à cidade de Lisboa por terra e por mar e começa a quarta guerra em 1384, e com ela a gesta do povo Português, lutando desesperadamente pela manutenção da independência. Por fim graças ao auxílio dos frecheiros ingleses vindos por mar e ao génio táctico de Dom Nuno Alvares Pereira, os Castelhanos são decisivamente batidos na memorável batalha de Aljubarrota. A partir daí, a guerra arrasta-se até 1411 sem operações militares de vulto D. João I de Portugal que celebra o tratado de Windsor em 1386, limita-se a defender as nossas fronteiras com o auxílio dos Ingleses sem procurar interferir na política interna de Castela. Desde então, qualquer ideia de união com este país ou de expansão territorial pra leste ou norte à sua custa é definitivamente posta de parte pelos Portugueses, embora o contrário não se verifique. A absorção das regiões periféricas da Península continua a ser uma das traves mestras da política castelhana.


Situação económica

Durante este período, a situação económica de Portugal deteriora-se consideravelmente. Um povo que, pelos padrões da época, vivia em relativa abastança vê-se em poucos mais de uma dezena de anos reduzido á pobreza. Para isso contribuíram diversos factores. O primeiro resultou directamente do rápido crescimento económico verificado durante a última fase do, período anterior reinados de D. Dinis, de Afonso IV e de D. Pedro I. A prosperidade crescente dos grandes centros comerciais e marítimos de Lisboa e Porto transformara-os progressivamente em pólos de atração irresistíveis para as populações das zonas rurais. Os camponeses começam a fugir para as cidades, onde muitos deles sobrevivem à custa do exercício de actividades parasitárias ou de vadiagem e os campos ficam abandonados. Em consequência disso diminui a produção agrícola, que é um dos principais sustentáculos da nossa economia e tudo o resto se ressente.


D. Fernando tenta corrigir através de medidas intervencionistas tomando obrigatório o cultivo das terras abandonadas, fixando os salários rurais, proibindo a emigração para as cidades, etc. Mas sem qualquer resultado palpável.


O segundo factor que arruinou a economia foi a guerra. Em consequência da insegurança dela resultante o comércio marítimo que havia sido o motor do desenvolvimento espectacular verificado durante o período anterior decresce consideravelmente. Nas zonas onde têm lugar as operações militares, nomeadamente em Lisboa e seus arredores, a perda de bens incluindo a destruição de numerosas hortas e pomares representa um prejuizo económico incalculável. Por último o lançamento no mercado de grandes quantidades de moeda que o rei tinha entesourado dos preços dos produtos para pagar as despesas da guerra junto ao aumento dos preços dos produtos agrícolas resultante da diminuição da produção, dá origem a uma inflação galopante.

Estrutura social


Este período é particularmente importante no que toca à evolução, da estrutura social. Em resultado da prosperidade económica alcançada no, período anterior, tinham surgido dois novos grupos sociais que dia após dia iam ganhando mais peso na vida social, os grandes comerciantes e os artificies citadinos. E, será legítimo supor que se a Paz se mantivesse e o crescimento económico continuasse, a influência desses grupos continuaria a crescer em detrimento da nobreza que, não havendo guerras se tornaria uma classe inútil. Mas o que aconteceu foi precisamente o contrário. A crise económica, se bem tenha abalado todas as classes sociais, abalou ainda mais fortemente a burguesia e o proletariado urbano. Por outro lado, a guerra, sobretudo a quarta em que se jogava a sobrevivência nacional, veio dar novo alento à nobreza de raiz militar, elevando-a novamente à condição de classe imprescindível. 


Quer dizer que em termos de estrutura social se retrogradou em vez de progredir. A estrutura social portuguesa voltou a ser exclusivamente constituída pelas três classes características da Idade Média. Nobreza, Clero e o Povo. A revolução de 1383, que representa para muitos, uma manifestação de poupança de novas classes sociais em gestação, não foi mais, quanto a nós do que uma manifestação do estertor dessas mesmas classes, cuja influência na vida portuguesa se torna insignificante a partir desse momento.

Ambiente cultural


Durante este período consolida-se definitivamente o sentimento nacional. Para isso terá contribuindo de forma definitiva a vitória de Aljubarrota. Mais do que a vitória de um exército ou de um rei, ela é a vitória de um Povo, que escolhera e coroara esse rei e nele, reflectivo o seu desejo de independência. É a partir dessa altura que a ideia de Pátria se torna mais forte do que qualquer ideia de classe ou grupo social. Poderemos talvez dizer, para sintetizar, que a partir de Aljubarrota os Portugueses deixam de se definir como sendo os súbditos do rei de Portugal. O rei de Portugal é que passa a ser definido como rei dos Portugueses.

Marinha


Durante este período não se verificam alterações significativas nem no material naval, nem na organização da Marinha, nem nos processos de navegar. D. Fernando procura fomentar o crescimento da marinha de comércio promulgando diversas leis em seu favor, nomeadamente no que diz respeito à construção de naus e aos seguros marítimos. Mas é provável  que a nossa marinha mercante durante o seu reinado e o seguinte, pelo menos até 1385, tenha sido fortemente afectada pela insegurança resultante da guerra. Quanto à marinha militar, devido à forma defeituosa como foi utilizada, por D. Fernando, tanto sob o ponto de vista estratégico com táctico, sofre um acentuado declínio ao longo do período. Na primeira guerra com Castela, Portugal dispunha de superioridade naval incontestável que foi esbanjada no perlongado bloqueio de Sevilha. Nas três guerras seguintes essa já não se verifica sobretudo depois da derrota de Saltes, e são as armadas de Castela que bloqueiam por diversas vezes Lisboa com efeitos devastadores. De resto, em qualquer guerra com Castela (mais tarde com a Espanha) as forças terrestres são claramente mais importantes para a defesa de Portugal do que as forças navais.



domingo, agosto 30, 2015

Batalhas Navais-1296

Cabo de Sines
(Verão de 1296) 


Rezam as crónicas que durante o Reinado de Dom Dinis foi intensa a actividade da recém-criada Marinha de Guerra para a defesa das costas e da navegação contra os ataques dos corsários e piratas mouros, mas não referem qualquer combate importante. O único combate naval deste reinado que os cronistas mencionam é o que terá tido lugar durante a curta guerra que Dom Dinis travou com o rei de castela, de 1295 a 1297. Durante o Verão de 1296, estando o rei em campanha, provavelmente acompanhado pelo seu Almirante, conforme as cláusalas da carta de nomeação, uma armada castelhana entrou de supresa no Tejo apressando diversos navios, que levou consigo. Com os poucos cavaleiros e homens de armas que haviam ficado em Lisboa armaram-se à pressa algumas Galés que foram ao encalço da armada de Castela e a conseguiram alcançar por alturas do cabo de Sines. Ai se travou um curto combate, que terminou pela vitória dos portugueses, que regressaram ao tejo com algumas das Galés inimigas capturadas e as presas recuperadas.


sábado, agosto 29, 2015

Batalhas Navais-1337

Cabo de São Vicente
(21  de Julho de 1337)


O desprezo a que o rei de castela, Afonso XI, votara sua mulher, a infanta Dona Maria, filha do rei Afonso IV de Portugal, juntamente com outros agravos que lhe fizera, levaram este a entrar em guerra com Castela no ano de 1336. Os Portugueses iniciaram as hostilidades enviando uma armada de vinte Galés, provavelmente acompanhadas por algumas naus, a assolar a costa da Andaluzia. Mas a expedição resultou num fiasco, perante a intrépida resistência dos Castelhanos que rechaçaram as várias tentativas de desembarque feitas pelos nossos. Recolhida ao Tejo, a armada foi destroçada por um violentíssimo temporal, que igualmente dispersou e causou grandes avarias numa poderosa armada castelhana que saíra de Sevilha para combater a armada portuguesa. Em terra, os Portugueses começaram por fazer uma incursão à Galiza, à qual, posteriormente, os Castelhanos responderam com incursões, no Minho, em Badajoz e no Algarve, sem que daí tivesse resultado qualquer encontro importante. Possivelmente para aliviar a pressão que o inimigo estava exercendo na fronteira norte, Dom Afonso IV enviou a sua armada, sob o comando do Almirante Manuel Pessanha, a assolar as costas da Galiza e das Astúrias, onde apressou numerósas embarcações de pesca. No ano seguinte, ou seja em 1337, logo que terminou o Inverno a armada portuguesa largou de Lisboa com rumo ao Algarve, na força de trinta Galés, sob o comando do Almirante Pessanha. Aproximadamente pela mesma altura saiu de Sevilha, tamdém com destino à costa Algarvia, a armada castelhana, na força de quarenta Galés sob o comando do prestigiado Almirante Afonso Jofre Tenório. Mas os fados tinham decidido que o encontro entre ambas só teria lugar alguns meses depois. Outro violento temporal apanhou em cheio as duas armadas, metendo-lhes no fundo várias Galés e avariando-lhes de tal modo as restatantes que ambos os Almirantes se viram obrigados a regressar à base. 


E toda a Primavera foi consumida em fabricos e reaquipamento. Nos começos de Julho voltaram as armadas de Portugal e Castela a fazer-se ao mar, a primeira reduzida a cerca de vinte Galés e a segunda a cerca de trinta. Provavelmente, da armada castelhana faziam parte algumas Naus, já que se destinava a operar longe das suas costas. Navegando em busca uma da outra, vieram a encontrar-se ao largo do cabo de São Vicente, no dia 21 de Julho de 1337. Atacando impetuosamente, as Galés portuguesas conseguiram ao fim de pouco tempo render nove das contrárias. Depois houve qualquer acontecimento que fez inverter o rumo dos acontecimentos. Uma hipótese a considerar é que tenham chegado as Naus castelhanas, que tenham começado a abalroar algumas das nossas Galés que estavam atracadas à inimigas, afundando umas tantas, e que tenham aferrado outras, lançando-lhes para dentro do alto dos seus castelos, grande quantidade de pedras, barras de ferro, setas e virotões. A verdade é que esta táctica já havia sido utilizada com êxito pelo Almirante Tenório, alguns anos antes numa batalha em que derrotara os Mouros. Só seria de admirar que não voltasse a utilizá-la desde que as circustâncias o permitissem, isto é, desde que houvesse, vento para as Naus poderem manobrar à vontade, o que normalmente acontecia durante o mês de Julho na região do cabo de São Vicente. Seja como for , em dado momento da batalha os portugueses começaram a sentir grandes dificuldades, apesar do elevado nùmero de Galés inimigas que já tinham conseguido tomar.


Duas Galés castelhanas aferraram por ambos os bordos a nossa capitânia e depois de uma luta prolongada tomaram-na, abatendo o estandarte real português e aprisionando o Almirante Pessanha e seu filho. Vendo o chefe render-se, os portugueses desanimaram e puseram-se em fuga, perseguidos durante algum tempo pelos castelhanos. Em resultado da extraordinária bravura com que ambos os contendores se bateram, o número de mortos e feridos de ambos os lados foi muito elevado. Os Portugueses terão tido, além disso oito Galés tomadas e seis afundadas. O elevado número das afundadas parece confirmar a hipótese de terem sido abalroadas pelas Naus castelhanas. As Galés portuguesas capturadas foram levadas para sevilha, onde chegaram a reboque das castelhanas com os pendões a arrastar pela água em sinal de derrota. O Rei Don Afonso XI foi pessoalmente àquela cidade para receber e felicitar o Almirante Jofre Tenório pela grande vitória que alcançara. Os prisioneiros portugueses que ascendiam a alguns milhares, foram obrigados a desfilar pelas ruas de sevilha com cangas ao pescoso, à exepção do Almirante Pesanha e de seu filho. A bandeira real portuguesa tomada na batalha ficou exposta na igreja de Santa Maria. Em resultado da tremenda derrota sofrida pela sua armada o Rei de Portugal viu-se forçado a aceitar a mediação de um delegado do Papa e concordou com uma trégua de um ano, que acabou por ser prolongada até à conclusão da paz. De notar que pela sua parte o rei de castela estava desejoso de terminar a guerra com Portugal, porque tinha notícias de que os Mouros estavam a passar muita gente para a Península, o que fazia prever para breve uma nova ofensiva em larga escala contra os Cristãos.

sexta-feira, agosto 28, 2015

Batalhas Navais-1341

Ceuta
(Julho (?) de 1341)


Depois da estrondosa vitória alcançada pelo Almirante Dom Jofre Tenório, em 1337, sobre os Portugueses, o rei de Castela ordenou-lhe que fosse para o estreito de Gibraltar a fim de evitar que os Mouros continuassem a passar tropas para a Península em grande número como vinham fazendo. Porém, nessa altura as armadas de Granada e Marrocos, em conjunto, eram muito superiores à castelhana. Por isso, viu-se o Almirante Jofre Tenório forçado a actuar com extrema cautela e os Muçulmanos continuaram a desembarcar na Península contingentes cada vez maiores. Aborrecido com a estratégia do seu Almirante, Dom Afonso XI acusou-o de excessiva prudência. Ferido no seu brio e na sua honra, Dom Jofre saiu imeditamente para o mar e sem olhar à desproporção de forças, foi dar combate às armadas de Granada e de Marrocos. O resultado deste acto de desespero foi o que seria de esperar. A armada de Castela sofreu uma tremenda derrota, morrendo o próprio Almirante Tenório na batalha. Apenas cinco Galés, muito destroçadas, conseguiram escapar-se. A partir daí, os Muçulmanos ficaram senhores do mar e intensificaram a passagem de tropas do Norte de África para a Península com vista a uma ofensiva em grande escala contra os reinos cristãos. Estima-se que entre 1337 e 1340 tenham desembarcado do lado de cá do estreito cerca de trezentos mil homens e de sessenta mil cavalos. Na Primavera de 1340, o rei de Granada abriu as hostilidades indo pôr cerco a Tarifa, o que levou Dom Afonso XI a pedir auxílio aos Reis de Portugal e de Aragão. Estes, apesar das desanvenças recentes que tinham tido com o soberano de Castela, acorreram prontamente ao seu chamamento. O Rei Dom Afonso IV de Portugal enviou imediatamente uma armada de dez Galés, que foi utilizada na defesa de tarifa. Pouco depois, foi o próprio Rei que à frente de uma hoste numerosa se foi reunir em sevilha ao exército de Afonso XI. Aí, num gesto de amizade, foi devolvida aos Portugueses a bandeira real que lhes havia sido tomada, três anos antes, na batalha do cabo de São Vicente. Uma vez reunidos todos os exércitos cristãos foi resolvido ir ao encontro dos Muçulmanos que estavam cercando Tarifa. Estes, por sua vez, conhecedores dos movimentos dos Cristãos, foram esperá-los com forças numerosas junto de um pequeno rio chamado Salado.


Ali se travou a última grande batalha campal da Reconquista na qual os Muçulmanos foram completamente derrotados, distinguindo-se os Portugueses, e mais particularmente o Rei Dom Afonso IV, pela extraordinária bravura com que se bateram. Na Primavera de 1341, foi novamente enviada em auxilio dos Castelhanos uma armada portuguesa de dez Galés sob o comando do Almirante Manuel Pesanha. Entretanto, a armada de Castela havia sido reconstituída. Afonso XI tinha contratado em Génova quinze Galés, de que era comandada pelo Almirante Gil Bocanegra, e mandara construir Galés novas cujo número deveria oscilar entre uma a duas dezenas. Quer dizer que a força da armada combinada, de que era chefe supremo o Almirante Genovês, deveria ascender a cerca de quarenta Galés, preparando-se, além de doze Naus da Galiza e das Astúrias. Por essa altura as armadas de Granada e de Marrocos encontravam-se reunidas em Ceuta, num total de oitenta e três Galés, preparando-se para efectuar novos transportes de tropas para Algeciras e Estepona. Tendo sido Informado de que o rio de Bullones, a oeste da baía de Algeciras, estavam mais outras doze Galés mouras aprotando-se para seguir para Ceuta, o Almirante Bocanegra destacou para lá dez das suas, que bem poderiam ter sido as Galés portuguesas, a fim de as destruir antes que se fossem juntar às que se encontravam concentradas naquela cidade. O combate teve lugar dentro do rio. Os Muçulmanos, apanhados de surpresa, foram completamente derrotados, perdendo todas as Galés, das quais duas foram afundadas, provavelmente por abalroamento, quatro incendiadas e seis tomadas. Pouco tempo depois, outras dez Galés foram mandadas contra treze mouras que haviam saído de Algeciras e, mais uma vez, a sorte das armas foi favorável aos Cristãos. Duas dessas Galés foram capturadas, quatro afundadas e todas as restantes obrigadas a varar na costa.


Animado pelas vitórias alcançadas e dispondo agora de, pelo menos mais oito Galés, o que elevaria o total das Galés da armada cristã a cerca de cinquenta, o Almirante Bocanegra decidiu ir desafiar as Galés inimigas que estavam em Ceuta, confiando, provavelmente, que as doze Naus de que dispunha compensariam amplamente a inferioridade em que se encontrava no respeitante ao número daqueles. Logo que a armada cristã se apresentou diante de Ceuta, as Galés de Granada e de Marrocos sairam para o mar ao seu encontro. Nesse dia é provavel que o vento estivesse a soprar com certa força, o que terá permitido às Naus da Galiza e das Astúrias adiantar-se e começar a abalroar as Galés inimigas, das quais seis foram metidas no fundo. Nessa faina foram as Naus por diverças vezes aferradas por Galés mouras. Mas logo que estas acostavam começavam a ser alvo de uma chuva de pedregulhos, barras de ferro e flechas que os das Naus lhes atiravam do alto dos seus castelos, e, ao fim de pouco tempo, eram obrigadas a afastar-se cheias de mortos e feridos. Não obstante, o combate com as Galés não permitia que as Naus manobrassem à vontade e, em cosequência disso, três delas chegaram-se demais a terra e encalharam. em seu socorro foram algumas Galés genovesas, das quais duas também encalharam. Aproveitando a sota, os tripulantes das Naus encalhadas lançaram-lhes fogo e passaram-se para as Galés que tinham ido em seu auxílio. Certamente depois de grande confusão as Galés genovesas conseguiram safar as que haviam encalhado e, todas juntas, foram reunir-se ao resto da armada. É provável que o combate com as Naus tenha absorvido duas ou três dezenas de Galés mouras, pelo que terão sobrado somente ciquenta ou sessenta para combater com as Galés cristãs.


O embate entre as duas linhas de Galés deve ter sido tremendo, dado que no total ascendiam a mais de uma centena. Imediatamente se formaram diversas molhadas de navios firmemente aferrados uns aos outros, levados pelo vento e pela corrente onde se desenrolavam combates furiosos, acompanhados por uma gritaria infernal. Porém, neste tipo de luta, em espaços restritos, as armas mais pesadas dos cristãos conferiam-lhes marcada suprioridade e, uma após outra, as Galés muçulmanas iam sendo rendidas. Quando os Almirantes de Granada e de Marrocos foram mortos e os seus estandartes abatidos as restantes Galés mouras abandonaram a contenda e refugiaram-se em ceuta. Não dizem os cronistas qual foi o número de mortos e feridos, mas é de presumir que tenha sido elevado de ambos os lados. Além das três Naus que encalharam, os Cristãos não perderam mais quaquer outro navio. Os Muçulmanos perderam um total de vinte e seis Galés, entre afundadas e capturadas. Para maior satisfação dos vencedores foi encontrada a bordo de uma das Galés capturadas uma enorme quantia de moedas de ouro destinada a ser transportada para a Península para pagamento das tropas que para lá tinham sido enviadas. Pouco dias depois da batalha, de acordo com o que fora anteriormente estipulado, a armada portuguesa retirou para lisboa, apesar dos rogos de Afonso XI para que continuasse a operar em conjunto com a castelhana e a genovesa. A verdade é que o Almirante Pessanha e, por certo, todos os portugueses que o acompanhavam, apesar de se terem batido com galhardia, andavam de muito má vontade na companhia dos Castelhanos por terem ainda fresca na memória a pesada derrota sofrida, no cabo de São Vicente e as humilhações a que, na sequência dela, tinham sido sujeitos. Ao fim e ao cabo, a saída dos portugueses não chegou a enfraquecer a armada cristã, porque, poucos dias depois, chegou a armada de Aragão, na força de vinte Galés, o que permitiu àquela conservar o domínio do estreito de Gibraltar que ganhara na batalha de Ceuta. Graças a esse domínio, que os Moçulmanos nunca mais tiveram possibilidade de contestar, tornou-se impraticável transportar para a península tropas em quantidade suficiente para que aqueles pudessem lançar uma nova ofensiva em grande escala contra os Reinos Cristãos. A partir de então tornou-se claro que a expulsão definitiva dos Muçulmanos da Penìnsula Ibérica era apenas uma questão de mais ou menos tempo.


quinta-feira, agosto 27, 2015

Batalhas Navais-1369-1370

Bloqueio a Sevilha
(Verão de 1639-Outono de 1370)


Na sequência das lutas travadas entre Pedro, "o Cruel" e Henrique de Trastâmara pela posse do trono de castela e que terminaram pelo assassinato do primeiro, o Rei Dom Fernando de Portugal resolveu fazer valer os seus direitos àquela coroa pela força das armas. Nessa altura, a armada portuguesa era composta por trinta e duas Galés das quais quatro genovesas, o que lhe conferia nítida vantagem sobre a castelhana. A guerra começou com a invasão da Galiza pelo exército de Dom Fernando, apoiado por mar por uma armada de oito Galés e, possivelmente, algumas Naus. Porém, apesar de ter encontrado naquela província considerável apoio à sua causa, o nosso Rei viu-se forçado a embarcar na armada e a regressar a Portugal logo que o exército castelhano penetrou profundamente no nosso território. Afinal, não se chegou a travar qualquer batalha entre os dois exércitos por, entretanto, Henrique II ter sido obrigado a abandonar Portugal para ir acudir à sua fronteira andaluza ameaçada pelos Mouros. 


Procurando então tirar partido da superioridade naval que dispunha Dom Fernando enviou a sua armada para o Sul com a missão de assolar a costa Andaluza e bloquear Sevilha. Da armada faziam parte trinta Naus das quais certo número seriam da Galiza, guarnecidas por partidários de Dom Pedro e, portanto, de Dom Fernando. Depois de ter saqueado Cádis e algumas povoações de menor importância, a armada portuguesa dirigiu-se para a foz do Guadalquivir, onde terá capturado uma Nau carregada de azeite e uma Galé castelhana, à qual foi posto o nome de "Bem Ganhada", talvez porque só tenha sido tomada depois de uma vigorosa resistência. No entanto, as versões dos cronistas acerca deste episódio não são concordantes. As Galés portuguesas foram fundear dentro do rio, ao passo que as Naus se conservaram próximo de Sanlucar de Barrameda. Com este dispositivo ficaram cortadas as comunicações por mar com Sevilha, do que resultaram grandes prejuízos para esta cidade.


Prolongou-se o bloqueio por mais de um ano, sendo a nossa armada reabastecida a partir do Algarve e de Lisboa, onde, por vezes, iam alguns dos seus navios. Durante todo tempo que durou o bloqueio de Sevilha as guarnições dos navios portugueses sofreram grandes trabalhos e privações e, devido ao escorbuto provocado pela falta de alimentos frescos, e a outras doenças provocadas pela falta de higiene, tiveram muita gente doente e um número considerável de mortos. No Outono de 1370 o rei de Castela dirigiu-se a Sevilha, nomeou Almirante da armada castelhana o genovês Ambrósio Bocanegra e deu-lhe ordem para armar vinte Galés que havia na cidade e ir combater os Portugueses. No entanto, o aprontamento dessas Galés fez-se com muita dificuldade porque a maioria da sua palamenta, nomeadamente os remos tinha sido levada para a vila de Carmona que estava ainda nas mãos dos partidários de Dom Pedro. Por essa razão, as Galés castelhanas foram equipadas com pouco mais de metade dos remos da dotação normal. Em compensação, embarcaram mais gente de armas do que o habitual. Logo que teve a armada pronta, Ambrósio Bocanegra começou a descer o Guadalquivir acompanhado pelo próprio rei que, à frente do seu exército, marchava pela margem, pronto para fornecer gente de reforço às Galés logo que elas entrassem em combate com a armada portuguesa. Apercebendo-se das intenções do inimigo, o Almirante português Lançarote Pesanha, que nessa altura teria consigo apenas dezasseis Galés e cujas guarnições estavam muito desfalcadas e enfraquecidas pela doença e pelo cansaço, resolveu, acertadamente, ir juntar-se às Naus que estavam na foz do rio e sair para o mar, onde ficou à espera dos castelhanos.


Mas, nestas condições, o combate não convinha ao Almirante Bocanegra, que, além de ter a capacidade de manobra das suas Galés muito reduzidas por falta de remadores, não desejava combater com as Galés e as Naus portuguesas juntas, que, depois de reunidas, eram em número muito superior ao das suas Galés. Gorada a hipótese de uma batalha em condições favoráveis à armada de Castela, o Rei e Bocanegra conceberam um novo plano. Equipou este o melhor que pôde sete Galés e com elas, numa das noites seguintes, saiu sorrateiramente do Guadalquivir e dirigiu-se para a Biscaia. Parece que o Almirante Pesanha não se apercebeu deste movimento e, quando constatou que as Galés e o exército castelhano tinham regressado a Sevilha, retomou o seu anterior dispositivo de bloqueio com as Galés dentro do rio e as naus junto à foz. O Almirante Bocanegra chegou sem novidades à Biscaia, que era então a região marítima por excelència do Reino de Castela, e aí armou um número elevado de Naus, que juntou às suas Galés ficando assim a dispor de uma poderosa armada com a qual se apressou a regressar ao Guadalquivir. No seu caminho para Sul, a armada castelhana encontrou nas imediações do cabo Espichel uma Nau portuguesa que apresou, após um breve combate. Levava essa Nau uma avultada quantia em dinheiro destinada ao pagamento dos soldos da nossa armada. Quando a armada castelhana, regressada da Biscaia, chegou à vista de sanlucar de Barrameda, as Naus da armada portuguesa que estavam fundeadas na foz do Guadalquivir deixaram-na entrar sem fazerem qualquer tentativa para a deter, Parece que a razão disso terá sido o facto de entre as Naus da nossa armada se encontrarem várias da Galiza, tripuladas por partidários de Dom Pedro que não quiseram terçar armas com as da Biscaia, suas vizinhas.


Poderá também ter acontecido, muito simplesmente, que o vento não desse para as nossas Naus irem ao encontro da armada castelhana. O certo é que esta entrou à vontade no Guadalquivir e engarrafou as nossas Galés que lá se se encontravam. Com grande presença de espírito, o Almirante Pessanha esperou pela noite e mandou  pôr fogo a dois pequenos navios carregados de azeite que apresara pouco antes e que depois largou ao sabor da corrente em direcção à armada castelhana regressada da Biscaia. Os navios desta que se sentiram mais ameaçados picaram apressadamente as amarras e afastaram-se, criando uma brecha por onde passaram não só os improvisados brulotes mas também todas as Galés portuguesas, navegando na sua esteira, que deste modo, conseguiram juntar-se às suas Naus. Provavelmente no dia imediato o Almirante Ambrósio Bocanegra, tendo juntado a si as treze Galés que deixara em sevilha, saiu para o mar disposto a travar batalha com a armada portuguesa, mas o nosso Almirante não esperou por ele. Em face da superioridade inimiga, da falta de vontade de combater das Naus da Galiza e, sobretudo, por ter as tripulações muito desfalcadas e depauperadas optou, quanto a nós sensatamente por bater em retirada para Lisboa, onde deve ter chegado em fins de 1370. É possivel que três Galés e duas das nossas Naus se tenham atrasado e tenham sido capturadas pelos castelhanos. Pelo menos, é esta a versão dos cronistas espanhóis. Os portugueses são omissos a este respeito.


Durante o Inverno de 1371, os navios que compunham a nossa armada permaneceram desarmados com as Galés em seco nas tercenas. Em Março desse mesmo ano foi assinado o Tratado de Alcoutim que pôs termo à guerra. O demorado bloqueio de Sevilha, se bem que tenha constituído uma demonstração inequívoca do poder naval português, desgastou consideravelmente a nossa armada sem ter acarretado em contrapartida quaisquer benefícios de ordem estratégica.

quarta-feira, agosto 26, 2015

Batalhas Navais-1381

Batalha da ilha de Saltes
(17 de Julho de 1381)



A ‘Batalha da Ilha de Saltes’ ou ‘Batalha de Saltes’ foi um combate naval travado em 17 de Julho de 1381 entre uma esquadra portuguesa e outra castelhana, do qual a segunda saiu vitoriosa. A Batalha desenvolveu-se fundamentalmente em águas próximas da ilha de Saltes, na ria de Huelva, Andaluzia, Espanha, durante a Terceira Guerra Fernandina. A Frota castelhana comandada por Dom Fernando Sánchez de Tovar infligiu uma derrota decisiva à frota portuguesa comandada por Dom João Afonso Telo, que resultou na destruição do poder ofensivo naval de Portugal e na afirmação da supremacia naval castelhana no oceano Atlântico. Na sequência da morte de Dom Pedro I de Castela, Reinou desde 1350 a 1369, Dom Fernando I de Portugal declarou guerra a Castela pela posse do trono castelhano, iniciando uma série de conflitos que ficou conhecida como ‘Guerras Fernandinas’. Em 1373, a segunda dessas guerras terminou com assinatura do ‘Tratado de Santarém’ entre o Rei Dom Fernando e Dom Henrique II de Castela. No entanto, após a morte do Rei Henrique II em 1379 e a ascensão ao trono castelhano de Dom João I, apesar do parecer contrário dos seus principais conselheiros, o Rei Dom Fernando I decide atacar Castela. Para tal, em 1380 ou início de 1381, por intermédio de Dom João Fernandes Andeiro, então a viver em Inglaterra, enceta negociações com o jovem Rei Ricardo II de Inglaterra para obter o apoio deste contra Castela. O Duque de Lencastre João de Gante, amigo pessoal do Conde Andeiro, que desde 1371 reclamava também o trono castelhano, viu nesse acordo um meio de reforço da sua causa, e enviou para Lisboa 2.000 soldados ingleses sob o comando do Conde de Cambridge Edmundo de Langley para apoiar a incursão portuguesa em território castelhano. Iniciava-se assim a Terceira Guerra Fernandina. Para evitar que o contingente inglês fosse interceptado no mar pela Marinha de Castela, o monarca português preparou um bloqueio naval. Em meados de Julho de 1381 zarpou de Lisboa uma Frota Portuguesa comandada por Dom João Afonso Teles de Menezes, Conde de Barcelos, que se dirigiu para a foz do Guadalquivir para impedir a passagem da Frota Castelhana, que estava ancorada em Sevilha. Entretanto, o Almirante Castelhano Dom Fernando Sánchez de Tovar zarpou da sua base em Sevilha rumo às costas portuguesas. A 17 de Julho as duas frotas navegando em sentidos contrários avistaram-se ao largo do Algarve. Depois de avaliar a situação, o Almirante Castelhano considerou ser muito improvável conseguir uma vitória naquelas circunstâncias, pelo que ordenou a mudança de rumo de volta para um porto castelhano. Os portugueses viram nisso uma oportunidade única de vencer o inimigo e iniciaram a perseguição da frota castelhana. Ficou patente a inteligência tática do Almirante Sánchez de Tovar como marinheiro, que ordenou aos seus homens que remassem em ritmo acelerado, forçando os seus perseguidores a maximizarem os seus esforços para bater a velocidade do oponente, as diferentes velocidades a que os navios portugueses avançavam fariam com que eles ficassem cada vez mais separados uns dos outros e rompessem a sua formação. Após aproximadamente duas horas, a exaustão, a sede e o calor do verão fizeram-se sentir nos remadores portugueses, e muitos dos seus navios ficaram para trás. Oito deles, a vanguarda da frota portuguesa, atacaram a pequena ilha de Saltes, perto de Huelva, e destruíram propriedades dos pescadores nas proximidades. Vendo que os seus oponentes tinham caído na sua armadilha, Dom Sánchez de Tovar lançou os seus navios em formação compacta contra o inimigo e capturaram facilmente as galés portuguesas. O resto da frota portuguesa aproximou-se desordenadamente, com um navio de cada vez, e foi igualmente capturada sem dificuldade. Por fim, só uma das 23 galés portuguesas logrou escapar aos homens de Dom Sánchez de Tovar. O Almirante Fernando Sánchez de Tovar entrou triunfalmente com as 22 galés capturadas no porto de Sevilha, sendo aclamado pelos habitantes. Este facto permitiu que os ingleses desembarcassem em Lisboa a 19 de julho sem qualquer incidente. Mais tarde, as tropas inglesas do Duque de Lencastre aparelharam os seus navios para enfrentarem a frota de Dom Sánchez de Tovar, mas ao saberem que ele tinha voltado para Sevilha, voltaram para Inglaterra, deixando em Lisboa as forças terrestres inglesas, as quais foram, na sua maior parte, enviada para o Alentejo, onde se tinham iniciado os combates no final da primavera, com escaramuças, seguidas de um ataque mal sucedido a Badajoz, a que se seguiu um cerco castelhano a Elvas iniciado a 13 de julho e que duraria 35 dias. A retumbante vitória do Almirante Espanhol Dom Sánchez de Tovar teve consequências óbvias na ‘Terceira Guerra Fernandina’, por ter anulado a capacidade ofensiva naval de Portugal e ter obtido a supremacia naval castelhana no Atlântico. Nesse ano os portugueses não conseguiriam armar mais frotas contra Castela, que em contrapartida, não necessitava de o fazer, pelo que os castelhanos exerceram um controlo efectivo do mar. Por conseguinte, a Batalha marcou o fim da campanha militar naval portuguesa de 1381. Os efeitos da derrota portuguesa também se fizeram sentir no ano seguinte, quando, numa altura em que estava mais fraco do que habitualmente, Portugal teve que enfrentar um vigoroso ataque castelhano por mar e por terra. A Armada Castelhana entrou no Tejo a 7 de Março e, limitando-se a defesa portuguesa à capital muralhada, os arredores foram extensivamente saqueados pelos invasores, que provocaram grande destruição, que se estendeu até Sintra e Palmela. Os combates, sobretudo na fronteira, prosseguiram até Julho, na forma de escaramuças, com ambos os lados a evitarem confrontos decisivos. Finalmente, depois de várias negociações, inicialmente informais entre prelados e nobres dos dois lados, e oficiais a partir de Agosto, foi posto fim à guerra com o ‘Tratado de Elvas’, assinado em 9 de agosto de 1382 sem conhecimento dos ingleses. Este tratado estipulava, entre outras cláusulas, o casamento da Infanta Dona Beatriz de Portugal com o segundo filho de Dom João de Castela, o futuro Rei Dom Fernando I de Aragão. O casamento não se chegou a realizar, tendo Beatriz acabado por casar com Dom João de Castela, o que esteve na origem da crise dinástica portuguesa de 1383-1385.


terça-feira, agosto 25, 2015

Batalhas Navais-1384 I

Tejo
(18 de Julho de 1384)


Logo que foi aclamado pelo povo de Lisboa «Defensor e Regedor do Reino» viu-se o Mestre de Avis a braços com a tarefa ingente de defender Portugal contra a invasão de Castela, tendo apenas pelo seu lado uma pequena parte da nobreza, as cidades de Lisboa e Porto e a província do Alentejo, já que a maior parte da nobreza e o resto do País eram pela filha legitima de Dom Fernando e consequentemente, pelo seu marido, o Rei Dom João I de Castela. Nesse tempo, para efeitos militares, Portugal era Lisboa. Isso mesmo compreendera Henrique II de Castela quando na guerra de 1372-1373 lhe veio pôr cerco. Também o terá compreendido o Mestre de Avis ao concentrar todos os recursos de que dispunha na sua defesa. Mas para defender eficazmente Lisboa, eram precisas duas coisas, uma boa muralha que a protegesse do lado de terra, uma forte armada que garantisse o domínio do estuário do Tejo, pois que nada adiantaria cercar a cidade pelo lado de terra deixando francas as comunicações, através do rio, com Santarém, Barreiro, Almada, etc. Na guerra de setenta e dois, a muralha então existente era ainda a velha muralha dos primeiros reis que de resto a cidade já há muito havia galgado. Agora dispunha o Mestre de Avis da nova muralha que Dom Fernando mandara erigir, depois daquela guerra, fazendo jus ao ditado, «casa roubada, trancas à porta!»


Quanto à armada, dispunha o Mestre, além de algumas Naus, das Galés que tinham sido capturadas em Saltes e mais tarde devolvidas a Portugal por certo muitas delas em mau estado. Com notável visão estratégica, reconhecendo que a armada era o elemento essencial para a defesa de Lisboa e que Lisboa era o elemento essencial para a defesa de Portugal, mandou imediatamente armar todas as Galés e Naus que estavam na cidade, encarregando dessa tarefa o enérgico Bispo de Braga, Dom Lourenço. E, graças à incansável actividade deste, foi conseguido organizar em pouco tempo uma armada de doze Galés e sete Naus, às quais se juntaram uma Galé e uma Galeota vindas do Algarve. A guarnição total desta armada era de cerca de três mil marinheiros e remadores e oitocentos homens de armas. Esforço deveras notável se atendermos à situação em que se encontrava a cidade, prestes a ter de suportar um novo cerco. Apesar de tudo, foi considerado que a armada não era suficientemente forte para se bater com a de Castela, acabando por ser decidido em conselho enviá-la ao Porto a fim de se reforçar com as Naus e gente de armas que lá houvesse e depois, voltar ao Tejo com maior probabilidade  de vencer a armada castelhana. A 14 de Maio de 1384 largou a nossa armada rumo ao Porto sob o comando de Dom Rodrigues de Sousa. Chegada àquela cidade, contribuiu decisivamente para repelir as forças castelhanas que a pretendiam ocupar. Na sequência dessa acção, as nossas Galés dirigiram-se para as costas da Galiza, onde andaram às presas durante alguns dias. Entretanto, no Porto trabalhava-se febrilmente para reforçar a armada com navios e gente de armas e mantimentos. Quanto a navios, foram-lhe acrescentadas mais quatro Galés e dez Naus, o que é deveras importante. Mas no que diz respeito a gente de armas e a mantimentos as difilculdades foram maiores, porque, exeptuando o Porto, todo o resto do Norte estava ainda por Dona Beatriz.


Em face disso, mandou o Mestre recado a Nuno Álvares Pereira para seguir para aquela cidade, com toda a sua hoste, a fim de embarcar na armada. Por seu lado, os chefes desta, para remediar a falta de gente, enviaram um emissário ao alcaide da cidade de Coimbra, Dom Gonçalo, oferecendo-lhe o comando da armada, em substituição de Rodrigues de Sousa, que havia sido deposto, se quisesse passar-se para o partido do Mestre. Depois de ter posto certas condições que foram aceites, Dom Gonçalo acedeu e marchou para o Porto com gente de armas de Coimbra, embarcando-se na armada. E porque lhe parecesse que já dispunha de força bastante para bater os castelhanos ou porque receasse que, em chegando Nuno Álvares, o Mestre transferisse para ele o comando, decidiu sair desde logo do Porto, no que foi apoiado por Rui Pereira, que embora tio de Nuno Álvares, também não estava disposto a servir sob as suas ordens. Recorde-se que Nuno Álvares Pereira nessa altura tinha apenas vinte e quatro anos. Em vão Nuno Álvares, que se dirigia em marchas forçadas para o Norte escreveu cartas a Dom Gonçalo e a Rui Pereira pedindo-lhes para esperarem por ele, primeiro no Porto, depois em Buarcos. Ambos fizeram orelhas moucas e apressaram a viagem quanto puderam. Entretanto, em Lisboa o rei de Castela, ao saber que a nossa armada largara do Porto, reuniu imediatamente em conselho os seus principais chefes navais a fim de decidir a estratégia e a táctica a adoptar para lhe fazer frente. O Almirante Sanchez de Tovar e o comandante das Galés eram de opinião de que se fosse esperar a armada portuguesa no mar, a sul das Berlengas. O comandante das Naus era da opinião de que se deveria combater dentro do rio, dada a dificuldade em se aguentar numa posição de espera no mar, em que seria obrigado a fazer constantes viragens de bordo debaixo de nortada. Pensava que as Naus acabariam por descair para sul da barra do Tejo, o que deixaria as Galés sozinhas. O rei preferiu não correr riscos e decidiu que se desse o combate dentro do rio. Ficou então assente que a armada castelhana se conservaria fundeada junto da margem norte e se lançaria ao ataque da armada portuguesa, a favor da nortada, logo que aquela começasse a entrar na parte mais estreita do rio. A 17 de Julho chega a nossa armada a Cascais, onde fundeia, na força de cinco grandes Naus de guerra, dezassete Galés e doze naus mais pequenas. Os Castelhanos são imediatamente avisados por intermédio de duas Galés que tinham de vigia nas imediações do cabo Raso e, nessa mesma tarde, começaram a organizar o seu dispositivo de batalha mudando o fundeadouro da maior parte dos seus navios para junto da margem norte, na zona compreendida entre Belém e Santos. A frota castelhana era constituida por quarenta Naus e treze Galés. Dada a forma como se veio a desenrolar o combate, é de supor que próximo de Belém estivessem fundeadas um certo número de Naus, possivelmente as mais fortes, depois as Galés e mais perto de Santos o resto das Naus. Em todos os navios deverá ter sido embarcada muita gente de armas de reforço, retirada das tropas que cercavam a cidade. Aproveitando o afrouxamento do bloqueio resultante da alteração do dispositivo inimigo, nessa mesma noite veio de Cascais um batel para dar novas da armada e concertar com o Mestre a forma de actuar no dia seguinte. Ao saber que Nuno Álvares não tinha embarcado, o Mestre ficou muito pesaroso e, parecendo-lhe muito arriscado travar um combate decisivo com as guarnições dos navios desfalcadas, deu ordem para que, na manhã seguinte, a armada se limitasse a tentar furar o bloqueio e atingir Lisboa, evitando, tanto quanto posível, o combate.


Depois de desembarcados os mantimentos e embarcada gente de armas da cidade, se iria contra os Castelhanos. Com estas ordens foi despedido o batel, que regressou a Cascais sem novidades. Ao outro dia, 18 de Julho, pelas nove horas da manhã, com maré a encher e vento bonançoso a fresco de oeste, começou a despontar a nossa armada por detrás da ponta de São Julião. Ao chegar a Belém, admitimos que viesse formada em três colunas paralelas, melhor ou pior organizadas, a primeira composta por cinco grandes Naus sob o comando de Rui Pereira, a segunda constítuida pelas dezassete Galés, navegando à vela, por estibordo da primeira, a terceira formada pelas doze Naus mais pequenas, navegando por estibordo da segunda, relativamente perto da margem sul. Dada a força e a direcção do vento e o facto de a maré estar a encher, todos os navios deviam vir a andar bem. Ao chegar próximo de Belém, as Naus de Rui Pereira, possivelmente porque se teriam adiantado, guinaram para bombordo durante algum tempo, reduzindo a velocidade e permitindo que o resto da armada se aproximasse. Pouco depois, as Naus de Castela que estavam fundeadas próximo de Belém levantaram ferro e foram ao encontro das nossas. Porém, como o vento era de oeste, só poderiam governar a SE ou ESE, o que quer dizer que possivelmente, terão cortado a proa às suas Galés, atrasando a partida destas para o ataque. Pelo mesmo motivo só deverão ter abalroado as Naus de Rui Pereira com elas já bem dentro do rio. Seis Naus Castelhanas aferraram três das cinco Naus portuguesas, com as quais travaram um furioso combate, no qual perdeu a vida Rui Pereira. Enquanto as nossas três Naus suportavam todo peso do inimigo, acabando por ser tomadas, o resto da armada, torneando pelo sul a zona de combate, escapou-se para Lisboa. Pela razão acima apontada, ou por qualquer outra causa fortuita, as Galés Castelhanas não conseguiram alcançar nenhum dos nossos navios. Quanto às Naus de Castela que se encontravam fundeadas mais próximo de Santos, dada a direcção do vento e o estado da maré, é possivel que nem sequer tenham largado do fundeadouro com receio de serem levadas pelo rio acima. Logo que a armada portuguesa foi avistada de Lisboa, o Mestre de Avis meteu-se numa Nau com quatrocentos homens de armas e, na companhia de outras Naus mais pequenas e Barcas cheias de soldados, procurou ir em seu auxílio.


Mas as embarcações começaram a ser levadas para montante pelo vento e pela corrente e só com muita dificuldade conseguiram voltar à cidade, onde a população que enchia as muralhas acompanhava os acontecimentos com natural ansiedade. A batalha naval do Tejo poderá classificar-se como um sucesso táctico para os Portugueses, porque embora tivessem perdido três Naus, conseguiram furar o bloqueio, o que deu novo ânimo aos defensores de Lisboa e, possivelmente, terá abalado a confiança em si próprios dos sitiantes. De qualquer forma, sob o ponto de vista estratégico, nada adiantou. Sob o ponto de vista logístico, a situação da cidade piorou, já que a armada vinda do Porto poucos mantimentos trouxe e, por outro lado, fez aumentar muito o número de bocas dentro das muralhas. No entanto, o plano do Mestre de Avis continuava de pé. Logo que o pessoal recuperou das fadigas da viagem e das emoções da batalha, começou activamente a preparar a armada para travar um combate decisivo com a armada de Castela. Mas estava escrito nos livros do Destino que tal combate nunca haveria de ter lugar. Poucos dias depois chegaram ao tejo mais vinte e uma Naus e três Galés Castelhanas, o que elevou os efectivos totais da armada de castela para sessenta e uma Naus e dezasseis Galés. A partir daí, o Mestre abandonou a ideia do combate naval e resignou-se a jogar tudo por tudo numa sortida contra o exército castelhano em conjugação com um ataque que Dom Nuno Álvares Pereira, vindo do Alentejo, haveria de lançar por outro lado. Afinal, nada disso foi preciso. A peste que já grassava no campo castelhano obrigou o rei de Castela, no último instante, a levantar o cerco e a regressar ao seu país.