Ciência Náutica
Apesar da ciência náutica portuguesa remontar ao século XIII, a expansão portuguesa obrigou a uma evolução bastante rápida, uma vez que se tornou necessário superar novos obstáculos, tendo a investigação e evolução estado a cargo de uma elite de astrónomos, pilotos, matemáticos e cartógrafos, entre os quais se destacaram Pedro Nunes (com os estudos sobre a forma de determinar as latitudes por meio dos astros, entre outros) e Dom João de Castro (que investigou o magnetismo da Terra).
Arquitectura Naval
Barcas
e Barinéis
Até ao século XV, os Portugueses praticavam uma navegação de cabotagem, utilizando a barca embarcação pequena e frágil. A Barca era um navio com uma só coberta e um só mastro, que podia levar ou não cesto de gávea, com vela quadrangular fixa suspensa numa verga colocada sobre o mastro. À vela quadrada chama-se também vela redonda, porque enfunava com o vento e ficava arredondada como um balão.
A Barca, destinada a viagens pequenas de cabotagem e pesca estão associadas aos primórdios dos Descobrimentos, a viagens à Ilha da Madeira, Açores, Canárias, e à exploração do litoral africano até pelo menos às alturas de Arguim na actual Mauritânia. Foi ainda numa barca que Gil Eanes dobrou o Cabo Bojador em 1434. Estes barcos não conseguiam dar resposta às dificuldades que surgiam no avanço para Sul, como os baixios, os ventos fortes e as correntes marítimas desfavoráveis. Seria sucedida pela caravela.
Caravelas
Era de navegação fácil e melhor capacidade de bordejar, dado ter um
aparelho latino. No entanto a sua capacidade limitada de carga e a necessidade
de uma grande tripulação eram os seus principais inconvenientes, que, no
entanto, nunca obstaram ao seu sucesso.
Este deve-se em boa parte à evolução
técnica registada no século XV e graças às múltiplas viagens de exploração da
costa atlântica africana, substituindo definitivamente as barcas e os barinéis
naquelas actividades de navegação. Entre as caravelas famosas estão a Caravela
Anunciação e a Caravela Vera Cruz.
Naus
e Carracas
"Nau"
era o sinónimo arcaico de navio, nave ou barco de grande porte destinado a
longos percursos. Durante a época dos Descobrimentos, houve uma evolução dos
tipos de navio utilizados. Na Baixa Idade Média, entre o século XIII e a
primeira metade do XV, as naus, ainda tecnicamente longe daquilo que seriam nos
Descobrimentos, serviam essencialmente para transportar mercadorias que provinham
dos portos da Flandres para a península Itálica, no Mar Mediterrâneo, e
vice-versa. À época de Fernando I de Portugal as naus desenvolveram-se de forma
assinalável em Portugal.
Devido à pirataria que assolava a costa portuguesa e ao esforço nacional de criação de uma armada para as combater, as naus passaram a ser utilizadas também na marinha de guerra. Nesta altura, foram introduzidas as bocas-de-fogo, que levaram à classificação das naus segundo o poder de artilharia: naus de três pontas (100 a 120 bocas) e naus de duas pontas e meia (80 bocas).
A capacidade de transporte das naus também aumentou, alcançando as
duzentas toneladas no século XV, e, as quinhentas, no século seguinte. Com a
passagem das navegações costeiras às oceânicas, e à medida que se foi
desenvolvendo o comércio marítimo e se tornou necessário aumentar a capacidade
do transporte de mercadorias, armamento, marinheiros e soldados, foram sendo
modificadas as características. Surgiam então as caravelas de armada e,
posteriormente, as naus.
Em 1497 partiu Vasco da Gama para a Índia já com três
naus e uma caravela. De grande porte, com castelos de proa e de popa, dois,
três ou quatro mastros, com duas ou três ordens de velas sobrepostas, as naus
eram imponentes e de armação arredondada. Tinham velas latinas no mastro da ré.
Diferentes das caravelas, galeões e galé, as naus tinham, em geral, duas
cobertas. No século XVI tinham tonelagem não inferior a 500t, embora, segundo o
testemunho do Padre Fernando de Oliveira, no seu livro da Fábrica das Naus, em
meados desse século as naus eram armadas com crescente tonelagem.
Carraca
era um tipo de navio utilizado no transporte de mercadorias referenciado em
documentos dos séculos XV e XVI, vulgarizado sobretudo no Mediterrâneo,
utilizado no transporte de mercadorias. As carracas eram navios de velas
redondas e borda alta, e possuíam três mastros. Os primeiros exemplares tinham
uma capacidade de 200 a 600 toneladas, mas na época em que os portugueses as
utilizaram na carreira da Índia atingiu valores de 2000 toneladas.
Medir
o tempo
Um
dos diversos instrumentos que o homem concebeu para medir o tempo foi a
ampulheta. Também conhecido por relógio de areia a sua invenção é atribuída a
um monge de Chartres, de nome Luitprand que viveu no séc. VIII. No entanto as
primeiras referências deste tipo de objecto aparecem apenas no século XIV. É
constituída por duas ampolas de vidro unidas pelo gargalo e de modo a deixar
passar a areia de uma para outra num determinado intervalo de tempo através de
um orifício. Até meados do século XVIII as duas ampolas eram fabricadas
separadamente colocando-se entre os gargalos de ambas uma pequena peça metálica
com um orifício devidamente calibrado para a passagem da areia. A ligação era
feita com cabedal ou uma pinha (um entrelaçado feito com cabo). Para proteger o
conjunto era usada uma armação em madeira ou latão. Mais tarde as ampulhetas
foram feitas de uma só peça de vidro com um orifício para a passagem da areia
que podia ser branca ou vermelha, desde que fosse fina, seca e homogénea. A
proveniente de Veneza tinha grande reputação. Além de areia também se podia
usar cascas de ovo moídas, pó de mármore, pó de prata e pó de estanho calcinado
misturado com um pouco de chumbo. Este último aconselhado para as ampulhetas de
vinte e quatro horas. A vida a bordo era regulada por este instrumento.
Existiam ampulhetas para tempos de uma, duas ou mais horas mas as mais usadas
eram as de meia hora também conhecidas por relógio, de boa precisão a ampulheta
era no entanto afectada pelos balanços, temperatura (por isso devia ser
colocada à sombra) e o alargamento do orifício desgastado pela passagem da
areia. Mas quem a manejava era ainda o maior culpado. Um esquecimento, um
atraso ao virar ou ainda, e a mais frequente, motivada pela pressa em encurtar
a duração de um quarto fazia que quem estivesse de turno, a virasse antes de
esgotar toda areia. Este fato era conhecido entre os marinheiros por comer a
areia. Ao virar a ampulheta, o marinheiro tocava o sino; uma badalada às meias
horas e pares de badaladas correspondentes à hora de quarto. Um par à primeira,
dois à segunda, etc. Falta dizer que cada quarto era, e ainda hoje é assim, de
quatro horas. Aos quartos da noite também se davam nomes. Das oito da noite à
meia-noite era chamado de prima, seguia-se a modorra da meia-noite às quatro e
por fim, a alva das quatro às oito da manhã, e o acerto era necessário e
fazia-se com o astrolábio ao meio-dia através do sol, quando o tempo o
permitisse. Para a obtenção da latitude bastavam as tabelas de declinação e a
medição da altura do sol. A longitude, até ao séc. XVIII, era obtida por
estimativa a partir da distância/rumo percorrida pelo barco. A velocidade
necessária para o cálculo era obtida com uma barquinha e uma ampulheta de 30
segundos. Este método era pouco rigoroso para a obtenção daquela coordenada
geográfica, e até à invenção do cronómetro no séc. XVIII, para obtenção da
longitude, foram pensados vários métodos. Um deles, proposto pelo padre
italiano Bruno Cristóvão, professor de astronomia em Coimbra e em Lisboa no
início do séc. XVII, usava uma ampulheta de longa duração, marcada com linhas
indicando as diversas horas. Acertava-se à saída de um porto e calculava-se a
diferença entre as horas do meridiano do local e do meridiano de referência,
transformando depois o tempo em arco, tal como se faz hoje. A ideia era
perfeitamente correta mas tecnicamente impossível, pois a ampulheta não tinha
uma tal precisão.
Cartografia
Jehuda
Cresques (1350-1427), também conhecido por Jafuda Cresques e Jaume Riba, também
conhecido por Jaime de Maiorca, filho do cartógrafo Abraão Cresques,
judeu-catalão, foi um dos notáveis cartógrafos ao serviço do Infante D.
Henrique. Após as perseguições de Aragão de 1391, tendo adoptado o nome Jaume
Riba (Jacobus Ribus, em Latim) é tido como possível coordenador português, e há
o registro de um Mestre Jacome de Malhorca com essa posição. A maior parte dos
peritos crê que terão sido a mesma pessoa.
A carta atlântica de 1504 de Pedro
Reinel (1462) é a primeira carta náutica conhecida com uma indicação de
latitudes. Dele é também a mais antiga carta de marear portuguesa assinada (c.
1485). Trata-se de um portulano representando a Europa Ocidental e parte de
África, que reflecte as explorações efectuadas pelo navegador Diogo Cão ao
longo da costa africana. Com o seu filho, Jorge Reinel, e o cartógrafo Lopo
Homem, participou na elaboração do atlas conhecido por Atlas de Lopo
Homem-Reinés ou Atlas de Miller, de 1519. Ele e o seu filho foram considerados
dos melhores cartógrafos do seu tempo, a ponto do imperador Carlos V os desejar
a trabalhar para si. As cartas e atlas destes cartógrafos encontram-se
espalhados pelo mundo, desde a Biblioteca Nacional de França até à Biblioteca
de Munique e à British Library.
Em 1517 o rei D. Manuel I de Portugal passou a
Lopo Homem, cartógrafo e cosmógrafo português, um alvará (revalidado em 1524
por D. João III) que lhe dava o privilégio de fazer e emendar todas as agulhas
(bússolas) dos navios. Em caso de ser outra pessoa a efectuar estas tarefas,
teria de pagar, assim como o contratador, vinte cruzados ao cartógrafo. Em 1524
participou na Junta Badajoz-Elvas, estabelecida pelas Coroas de Portugal e
Espanha para demarcar os limites de navegação dos dois países. A obra mais
antiga conhecida deste cartógrafo é um planisfério, descoberto em Londres em
1930. Em Florença existe outro planisfério, datado de 1554, e na Biblioteca
Nacional de Lisboa há também uma carta marítima. Na terceira fase da antiga
cartografia náutica portuguesa, caracterizada pelo abandono da influência de
Ptolemeu na representação do Oriente e por uma melhor precisão na representação
das terras e continentes, destaca-se Fernão Vaz Dourado (Goa-1520-1580), cuja
obra apresenta extraordinária qualidade e beleza, conferindo-lhe a reputação de
um dos melhores cartógrafos de seu tempo. Muitas de suas cartas manuscritas são
de grande escala. São conhecidos, seis atlas náuticos do período de 1568 a
1580. Diogo Homem (1520-1576) foi um cartógrafo português, filho de Lopo Homem
e provavelmente primo de André Homem, ambos cartógrafos portugueses. A sua obra
cartográfica foi produzida entre 1557 e 1576, destacando-se o chamado
"Atlas de Diogo Homem", com vinte e nove páginas manuscritas em
pergaminho iluminado.
Dele conhecem-se numerosas cartas. Diogo Soares (Lisboa,
1684 - Goiás, 1748), foi um cartógrafo português, e padre jesuíta, responsável
pelo primeiro levantamento das latitudes e longitudes, de uma vasta área do
território brasileiro. É nomeado cartógrafo régio e, em 1729, segue para o
Brasil por ordem de D. João V, com o objectivo de elaborar mapas. Ambos eram
designados por padres matemáticos, ou astrónomos. Um dos seus principais
trabalhos, são as denominadas Cartas Sertanistas, rascunhos em que Soares foi
apontando as descobertas de novos territórios, ou regiões, com alguma
importância económica, nomeadamente Minas Novas do Fanado (ou do Araçuaí), no
norte, e a Zona da Mata, no Sul. Também se incluem nestas Cartas, o desenho das
duas principais vias de comunicação entre o Rio de Janeiro, e as Minas de Ouro
(actualmente o Estado de Minas Gerais): Caminho Velho (por Parati e Taubaté), e
Caminho Novo (de Porto de Estrela para Minas Gerais, construído entre 1698 e
1704).
Navegação Astronómica
No
século XIII eram já conhecidas as regras de navegação através da posição solar,
como transparece nos ‘Libros del Saber de Astronomia’ compilados pelo rei
Afonso X de Castela e em outras obras de cariz similar, assim como no Tratado
de Tordesilhas se menciona o Regimento do Sol. Derivando e aproveitando este
saber, a ciência náutica portuguesa consistiu num somatório progressivo de
preceitos relativos à navegação astronómica no Oceano Atlântico durante o
século XV, tendo contribuído para esta compilação a experiência dos pilotos. A
navegação era feita num período inicial por estimativa do piloto, e
posteriormente através da comparação das alturas da Estrela Polar, apesar de
poder ser tomada uma outra estrela bem visível como referência. Evoluindo,
foram sendo adicionadas sete posições diurnas da mesma Estrela e elaborado o
inovador Regimento da Estrela do Norte ou da Polar que no século XV compilou
todas as normas de navegação segundo este sistema. Após a edição deste manual
iniciou-se uma navegação que tinha em consideração as latitudes, que foram
também calculadas através da altura meridiana e das tabelas de declinação do
Sol. A toleta de marteloio deu origem a uma obra mais perfeita, o
"Regimento das Léguas", que permitia calcular a quantidade de léguas
navegadas entre dois paralelos, tendo também contribuído para a ciência náutica
portuguesa os catálogos das declinações de estrelas e outras normas práticas. Em
1492, o astrónomo e matemático Abraão Zacuto refugiou-se em Lisboa após a
expulsão dos judeus de Espanha, trazendo consigo as tábuas astronómicas que
ajudariam os navegadores portugueses. Nomeado Astrónomo e Historiador Real pelo
Rei D. João II, Abraão Zacuto foi o autor de um novo e melhorado Astrolábio,
que ensinou os navegantes portugueses a utilizar, e também de melhoradas tábuas
astronómicas que ajudaram a orientação das caravelas portuguesas no alto-mar,
através de cálculos a partir de observações com o Astrolábio. As tábuas
indicavam os "lugares" dos astros. Equivalente à longitude celeste
actual, para vários anos de um ciclo, variável com o planeta (no caso do Sol
era de quatro anos). Quando se introduziram na náutica as observações
astronómicas que a revolucionaram, em particular a observação de altura
meridiana do Sol para com o conhecimento da declinação solar, se poder calcular
a latitude do lugar, recorreu-se às tábuas Almanach Perpetuum, do astrónomo
judeu Abraão Zacuto, publicadas em Leiria em 1496. Neste livro viriam as tábuas
astronómicas para os anos de 1497 a 1500, que foram utilizadas, juntamente com
o seu astrolábio melhorado de metal, por Vasco da Gama e Pedro Álvares Cabral
nas suas viagens.
Instrumentos
de Navegação
Para
a navegação astronómica os portugueses, como outros europeus, recorreram a
instrumentos de navegação árabes, como o astrolábio e o quadrante (um quarto de
astrolábio munido de um fio de prumo), que aligeiraram e simplificaram.
Inventaram ainda outros, como a balestilha, ou "bengala de Jacob"
(para obter no mar a altura do sol e de outros astros), que não utiliza a
graduação de um arco de circunferência mas um segmento deslizante ao longo de
uma haste, com o olho do observador em linha recta com o astro observado. Mas
os resultados variavam conforme o dia do ano, o que obrigava a correcções,
feitas de acordo com a inclinação do Sol em cada um desses dias.
Por isso os Portugueses utilizaram tabelas de inclinação do Sol no século XV ou Tábuas astronómicas. Eram preciosos instrumentos de navegação em alto-mar, tendo conhecido uma notável difusão, como outras tabelas que continham correcções necessárias ao cálculo da latitude através da Estrela Polar.
Por isso os Portugueses utilizaram tabelas de inclinação do Sol no século XV ou Tábuas astronómicas. Eram preciosos instrumentos de navegação em alto-mar, tendo conhecido uma notável difusão, como outras tabelas que continham correcções necessárias ao cálculo da latitude através da Estrela Polar.
Os
descobrimentos portugueses do início do século XV não se limitarem à exploração
científica e comercial do litoral africano; houve também viagens para o mar
largo em busca de informações meteorológicas e oceanográficas que permitissem o
regresso dos navios da costa africana por zonas de ventos mais favoráveis. Foi
nestes trajectos que se descobriram os arquipélagos da Madeira e dos Açores, o
Mar dos Sargaços ou Mar da Baga, e a volta da Mina ou seja, a rota oceânica de
regresso de África. O conhecimento do regime de ventos e correntes do Atlântico
Norte e a determinação da latitude por observações astronómicas a bordo,
permitiu nova singradura no regresso de África, cruzando o Atlântico Central
até à latitude dos Açores, onde os ventos de Oeste facilitavam o rumo directo
para Lisboa, possibilitando assim que os portugueses se aventurassem cada vez
para mais longe da costa. "Volta do mar" ou "Volta do mar
largo" é o nome de uma manobra de navegação utilizada em longas viagens
oceânicas, que remonta aos descobrimentos portugueses do século XV. Esta
técnica consiste em descrever um largo arco para evitar a zona central de
calmaria e aproveitar os ventos e correntes permanentes favoráveis, que giram
no sentido dos ponteiros do relógio quando no hemisfério norte, e em sentido
contrário no hemisfério sul, devido à circulação atmosférica e ao efeito de
Coriolis.
O
nome "volta do mar largo" foi cunhado pelos navegadores portugueses
no Oceano Atlântico Norte, quando eram obrigados, no regresso das costas
equatoriais africanas, a afastar-se para o mar largo, evitando o mar dos
sargaços e ganhando o Atlântico Central, para depois rodarem para lés-nordeste
vindo cruzar as águas dos Açores. No caso do Atlântico Norte, não era possível
a navegação directa para as costas europeias, pelo que qualquer navio vindo do
hemisfério sul (incluindo os vindos da Índia, China e outras regiões da Ásia
via Cabo da Boa Esperança) ou das Caraíbas, era obrigado a cruzar as alturas
dos Açores ou um pouco a norte daquelas ilhas. A "volta do mar" é
também invocada nas controvérsias sobre o descobrimento do Brasil,
considerando-se que a sua realização terá levado os portugueses a tomar
conhecimento da costa sul-americana antes da viagem oficial de descobrimento de
Pedro Álvares Cabral.
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