O Padroado português foi um acordo instituído
entre a Santa Sé e Portugal em que o Papa delegava ao rei de Portugal o
exclusivo da organização e financiamento de todas as atividades religiosas nos
domínios e nas terras descobertas por portugueses. O Padroado português remonta
ao início da expansão marítima portuguesa em meados da década de 1400 e foi
confirmado pelo Papa Leão X, em 1514. Através do Padroado o Rei de Portugal
podia construir igrejas e nomear os padres e os bispos, sendo estes depois
aprovados pelo Papa. Era também o Rei Português que impunha o barrete
cardinalício ao Patriarca de Lisboa. Assim, as estruturas do Reino de Portugal
tinham não só uma dimensão político-administrativa, mas também religiosa. Com a
criação do Padroado, muitas das atividades características da Igreja Católica
eram, na verdade, funções do poder político. Particularmente a Inquisição, que
nos Impérios de Portugal e de Espanha (que também beneficiava do regime de
padroado) funcionou mais como uma polícia do que a sua função inicial
religiosa. O Padroado Real, direito detido pelo rei de Portugal, foi instituído
no século XVI por Dom João III e abrangia as novas dioceses erigidas em
territórios conquistados por Portugal e criados pelo Rei, quer em Portugal quer
no Ultramar. Porém, o padroado excluiu as dioceses erigidas anteriormente. A
partir de 1212, o Papa Inocêncio III reservou aos reis de Portugal o padroado
das igrejas paroquiais portuguesas, que foi também incorporado ao Padroado
Real. Este padroado real substituiu o padroado colectivo exercido por um senhor
feudal, que esteve em vigor até ao século XIII. Todos os bispos das dioceses
portuguesas eram escolhidos e aprovados pela Santa Sé, apesar de ela aceitar
muitas vezes propostas do Rei para não causar conflitos. Reis como Dom Afonso
III, Dom Manuel I, Dom Sebastião, Dom Filipe I, Dom João IV e Dom Pedro II
tentaram constantemente usar o direito de padroado para imiscuir nos assuntos
que somente competiam à Santa Sé. Em 1740, o Papa Bento XIV confirmou o direito
real dos benefícios dos novos bispados, mas também reafirmou o antigo direito
pontifício de nomear os bispos, os cónegos e outras dignidades eclesiásticas
dos bispados antigos. No
início do século XV, o ‘Padroado Ultramarino Português’ abrangia as igrejas
católicas do Norte de África e da Madeira, que pertenciam à Ordem de Cristo.
Por isso, antes da morte do Infante Dom Henrique (1460), que foi o grão-mestre
da Ordem de Cristo, o padroado não estava formalmente na posse da Coroa
portuguesa. Depois de 1460, o governo do padroado passou efectivamente para a
Coroa. No
século XVI, o padroado começou a abranger também as igrejas católicas do
Oriente e todos os clérigos e missionários destacados para a África e a Ásia,
que passaram a estar subordinados ao rei de Portugal. Logo, o padroado permitiu
a Portugal exercer a sua influência e poder (ex: religioso e comercial) em
territórios não ocupados e não administrados por ele (ex: Japão e China). Ao
longo do tempo, estes privilégios oriundos do padroado foram confirmados em
várias bulas pontifícias de criação de novas dioceses (Diocese do Funchal,
Diocese de São Tomé, Diocese de São Salvador da Bahia, Diocese de Santiago de
Cabo Verde, Diocese de Goa, Arquidiocese de Cranganor, Diocese de Macau,
Diocese de Funay, Diocese de Pequim, Diocese de Nanquim, etc.). Porém,
no século XVII, a extensão do padroado foi delimitada aos territórios
conquistados, por Portugal, porque a Congregação de Propaganda Fide (Roma)
decidiu enviar directamente missionários para as terras infiéis não ocupadas
por europeus. Como por exemplo, esta decisão resultou na criação dos Vicariatos
Apostólicos de Tonquim e da Cochinchina, em 1659, cujos territórios eram
antigamente administrados pela Diocese de Macau. Os missionários protegidos por
Roma (ex: Sociedade para as Missões Estrangeiras de Paris) criaram conflitos
com os missionários protegidos por Portugal por causa dos métodos de
evangelização, criando uma série de controvérsias em vários países (ex:
controvérsia dos ritos na China). Em 1742, o Papa Bento XIV emitiu uma bula que
favorecia os missionários romanos e condenava definitivamente o método
português, concretamente dos jesuítas, porque este método respeitava e
adaptava-se demasiado aos costumes indígenas.
Em
1759, o marquês de Pombal dissolveu a Companhia de Jesus, que era o principal
evangelizador do padroado. E, em 1773, esta ordem religiosa foi desmembrada. Em
1834, o padroado sofreu outro grande revés: todas as ordens religiosas
masculinas foram extintas do Império Português. Mesmo assim, o padroado
conseguiu ainda subsistir, embora muito enfraquecido e com sérios problemas,
devido aos esforços de vários seminários, como o Seminário de Rachol (Goa), o
Seminário de São José (Macau) e o Colégio de Cernache. Ao longo dos séculos,
estes seminários (e muitos mais) formaram muitos missionários e bispos,
permitindo aos portugueses continuarem a desempenhar os deveres evangelizadores
do padroado, mesmo depois de ter perdido muitos dos seus antigos territórios
ultramarinos e muita da sua anterior influência. Foi
criada em 1514 a Diocese do Funchal, para onde foi enviado o bispo que passaria
a ser o responsável por todos os padres e frades que partissem para terras de
África, América ou Índia. Em
1533, reinava já Dom João III, havia tantos missionários e convertidos que foi
necessário criar uma segunda diocese ultramarina, que ficou instalada em Cabo
Verde. Esta diocese, que se chamava Santiago de Cabo Verde, foi resultado do
desmembramento da Diocese do Funchal. Em
1534, com a grande afluência de missionários à Índia, criou-se também a Diocese
de Goa. Ao longo do século XVI, criaram-se mais dioceses na Índia e na Ásia,
como por exemplo a Diocese de Macau, a partir da Diocese de Goa. Igreja da Sé,
a actual Catedral da Diocese de Macau, que foi a sede do Padroado Português no
Extremo Oriente.
Em
1576, a Diocese de Macau foi fundada para evangelizar e servir os católicos do
Extremo Oriente, exceptuando porém as Filipinas. Foi a sede do Padroado
Português no Extremo Oriente e lá operou o famoso Colégio de São Paulo, que
formava missionários católicos para vários países do Extremo Oriente, como a
China e o Japão. Em 1690, a partir da Diocese de Macau, foram erigidas as
dioceses de Nanquim e de Pequim, também vinculadas ao Padroado e dependentes da
Arquidiocese de Goa. Tinha assim o ‘Padroado Português do Oriente’ toda a
jurisdição religiosa sobre as missões e igrejas estabelecidas, nos territórios
ultramarinos que Portugal administrava.
As
dioceses do Padroado:
GOA
- Criada pelo Papa Clemente VII no consistório de 31 de Janeiro de 1533. Porém
só em 1534, o Papa Paulo III é expedida a bula. Circunscrevia a diocese de Goa;
Cabo da boa Esperança até à Índia e deste território ao Japão. A Santa Sé
concede a perpetuidade de posse da diocese ao Rei de Portugal e seus descendentes.
A de Fevereiro de 1557 a Constituição Apostólica eleva a dioceses de Goa a
arcebispado e a perpetuidade é mantida pela Santa Sé.
COCHIM
- Erguida em 4 de Fevereiro de 1557 pelo Papa Paulo IV. Acontece devido a Goa
ter sido elevada a arcebispado. A Sé de Cochim é denominada de ‘Santa Cruz’. A
bula papal decretava que o limite da jurisdição de Cochim e Malaca, deveria ser
da vontade do arcebispo de Lisboa. Entretanto a diocese de Cochim absorvia a
religiosidade da Costa do Malabar e a Costa Oriental da Birmânia.
MALACA
– Fundada na mesma data da diocese de Cochim a 4 de Fevereiro de 1557. A igreja
da Anunciação de Nossa Senhora de Malaca toma o nome de Sé Catedral. A bula
papal concede a Malaca os mesmos privilégios dos de Cochim.
MACAU
- A diocese é fundada nove anos depois das de Cochim e Malaca e a bula papal
emanada por Gregório XIII.
Prescrições:
1)
Apresentação do bispo pelo rei, dentro de dois anos.
2)
Apresentação real do deão, cónegos e mais prebendários.
3)
As dioceses ficam pertencendo ao Padroado.
4)
Ninguém pode derrogar este direito, a não ser que o Rei de Portugal dê o seu expresso
consentimento.
5)
Se a derrogação se fizer de qualquer outra forma não terá valor algum.
6)
Tudo quanto se atentar contra o direito do Padroado, a respeito desta diocese,
por quem quer, por qualquer autoridade que seja, será irrito e nulo.
FUNAY
– (Japão) tem lugar a fundação a 19 de Fevereiro de 1588, quando Portugal está
sob o domínio de Espanha e no reinado de Felipe II. A cédula consistorial que a
concede designa apenas. No Japão já existiam 150.000 cristãos e o trabalho de
Francisco Xavier, que tinha introduzido o cristianismo no Japão em meados do
século XVI, estava a produzir frutos. A jurisdição de Funay alargava-se até
todas as ilhas japonesas. Embora a bula se referia-se a Felipe de Espanha, a
dioceses de Funay seria propriedade do Padroado.
ANGAMALE
- Angamale a sede da igreja nestoriana sírio-caldaica do Malabar. Em 1594,
morre o arcebispo Mar Abraão e o frade Aleixo de Menezes, recebe ordens da
Santa Sé para que em Angamale, apenas fosse praticada a religião católica.
Ordens cumpridas; o catolicismo em Angamela toma raízes e a Santa Sé, como
tinha ordenado anteriores fundações de dioceses entrega-a ao Rei do Portugal.
Mas na prescrição a alínea 5 designa: “contudo, cessará o direito do Padroado
nesta diocese, se o Rei de Portugal faltar com o dote que lhe é prometido". Não
sabemos, qual seria o montante do tributo imposto pela Santa Sé dado que outras
bulas, papal, não se referiam a dotes. O que se compreende é que algo estaria a
mudar desde que Portugal passou a ser administrado pela coroa espanhola e a
Santa Sé a desviar-se do espírito com que as dioceses do Padroado tinham sido
criadas.
MELIAPOR
- Criada a diocese em 1608, através do consistório de 9 de Janeiro, por Paulo
V. Abrange Bengala, Coromandel, Oriza e Pegu. Fica com esta criação desmembrada
a diocese de Cochim. O Rei de Portugal (aqui Felipe de Espanha) a proceder às
delimitações. A prescrição na alínea 7 reza:
“Que
estes direitos são concedidos, não obstante o Concílio de Latrão ter proibido
acordos perpétuos, a não ser os permitidos pelo Direito”.
A
Santa Sé, na concessão de novas dioceses estava de facto a conceder os mesmos,
anteriores, privilégios ao Padroado, mas em termo, “uma no cravo, outra na
ferradura”
NANQUIM
- Reina em Portugal Dom Pedro II (1648-1706). Pertencia toda a China há
dioceses de Macau. As missões da China atingem o máximo de prosperidade no começo
do século XVIII. Pouco antes, como tão risonho futuro diante de si, pede o Rei
de Portugal à Santa Sé a desmembração do imenso império chinês em duas grandes
dioceses: Nanquim e Pequim. A Sagrada Congregação da Propaganda opõe-se
abertamente ao pedido do rei de Portugal, fazendo ver ao Sumo Pontífice
Alexandre VIII “gravíssima motiva et praejudicía que militavam contra a erecção
das novas dioceses”. O Santo Padre, porém, não concordou com o parecer da
Sagrada Congregação e ordenou que se procedesse à erecção canónica das ditas
dioceses. A diocese de Nanquim foi assim erecta em 10 de Abril de 1690 pela
bula ‘Romanus Pontifex’. A bula é do teor das outras. Como, porém, ela foi
publicada após a oposição da Propaganda
Aqui damos a lista dos privilégios
concedidos:
1)
Pertence a dioceses de Nanquim ao Padroado do rei de Portugal.
2)
A delimitação das duas novas dioceses deve ser feita pelo mesmo Rei.
3)
A apresentação do bispo pelo Rei deve ser feita dentro de um ano.
4)
Este direito de Padroado não poderá ser degorrado, nem mesmo pela Santa Sé. ‘Etiam.
Consistorialiter’ sem o expresso consentimento do Rei de Portugal.
5)
Se for, tal degorração será inteiramente nula e irrita.
6)
Assim o não entenderem, todas as suas decisões serão nulas.
A
delimitação das duas novas dioceses foi feita em 1695.
PEQUIM
- Dioceses fundada na mesma data de Nanquim e a bula papal que a vai reger é
precisamente igual. As duas dioceses colocavam a China sob a jurisdição do
Padroado Português do Oriente. O catolicismo na China (天主教, Tianzhu jiao; literalmente
"Religião do Senhor dos Céus") tem uma história longa e turbulenta: o
cristianismo foi trazido para a China pelos 'missionários nestorianos' no século
VII, na dinastia Tang. Os termos usados para se referir a Deus em chinês são
diferentes entre os chineses. Ao chegarem, na China durante a dinastia Tang, os
primeiros missionários cristãos da Igreja 'Nestoriana' referiam-se à sua religião
no idioma como Jǐng jiào (景教;
literalmente o "ensino brilhante"). Quando os missionários católicos
começaram a chegar à China, principalmente a partir do século XVI, alguns deles
iniciaram o uso do termo Shangdi (上帝,
literalmente "O Imperador de Cima") para designar Deus, que seria
mais adequado à língua chinesa. Porém, a hierarquia católica e a maior parte
dos missionários (principalmente os jesuítas) acabaram por optar pelo termo
mais confucionista Tianzhu (天主,
literalmente o "Senhor dos Céus"), pelo menos no culto e nos textos
oficiais. Dentro da Igreja Católica na China, o termo Gōng jiào (公教, literalmente o ‘ensinamento
universal’) é comum, traduzindo literalmente o significado original da palavra ‘católico’.
Quando os protestantes chegaram à China, no século XIX, preferiram o termo
Shangdi, em detrimento de Tianzhu. Muitos protestantes também usam o termo
Yehehua (耶和华,
"Jeová ou Shen (神)
- que significa, de maneira genérica, ‘deus" ou "espírito’, embora os
padres católicos sejam também chamados de shen fu (神父, literalmente "pai
espiritual"). A transliteração de ‘Cristo’ no chinês mandarim, utilizada
por todos os cristãos, é Jidu (基督).
Os
primeiros registos da entrada de missionários europeus católicos na China datam
do século XIII, quando a China era governada pela dinastia Yuan. O padre
franciscano italiano João de Montecorvino chegou a Pequim (em mongol,
Khanbaliq) em 1294. Em 1299, ele construiu uma igreja e em 1305, uma segunda em
frente ao palácio imperial. Ele estudou e aprendeu a língua chinesa e começou a
traduzir, para o chinês, o Novo Testamento e os Salmos. Estima-se que estes
missionários conseguiram converter entre 6 mil a 30 mil. Em 1307, o Papa
Clemente V enviou sete bispos franciscanos para consagrar João de Montecorvino
como Arcebispo de Pequim. Os três que sobreviveram à viagem realizaram esta
consagração em 1308, tornando-se também sufragâneos de João. Em 1312, mais três
bispos franciscanos foram enviados, mas apenas um conseguiu chegar à China. A
missão católica na China, sob a orientação de Montecorvino, conseguiu grande
êxito na evangelização no Norte e no Leste da China, apesar da oposição 'nestoriana'. Além de três igrejas na região de Pequim, os missionários ainda
estabeleceram missões em Formosa e no porto de Xiamen. Segundo a tradição,
Montecorvino teria convertido até o Grande Khan e Imperador Khaishan Kuluk [terceiro imperador mongol da China; (1307 - 1311)]. Montecorvino morreu em 1328.
Em 1338, a pedido do Grande Khan Toghun Temur (o último imperador mongol da
China), um total de 50 eclesiásticos foram enviados pelo Papa para Pequim,
entre os quais João de Marignolli. Porém, em 1368, foi implantada a Dinastia
Ming e os mongóis foram expulsos da China. Até 1369, todos os cristãos, quer
sejam católicos ou nestorianos, foram expulsos pelos novos governantes Ming. Matteo
Ricci é considerado o símbolo do primeiro contacto da China com as ciências e a
tecnologia europeias, do encontro pioneiro do Evangelho com os intelectuais da
raça Han, assim como um dos primeiros intercâmbios entre a cultura chinesa e a
ocidental. Durante a grande expansão do trabalho missionário em todo o mundo,
na altura da Contra-Reforma católica, os jesuítas e outros missionários
católicos tentaram outra vez entrar na China. Eles tiveram pouco sucesso no
início, mas acabou por ter um forte e duradouro impacto na China, especialmente
no diálogo e intercâmbio cultural, científico e artístico com os intelectuais
chineses e com a corte da dinastia Ming. Em
1576, o Papa Gregório XIII erigiu a Diocese de Macau, sendo esta a primeira
diocese na China, com jurisdição eclesiástica inicial sobre toda a China e o
Japão. Esta diocese, vinculada ao Padroado português, era sufragânea da
Arquidiocese de Goa até, quando ela passou a estar na dependência imediata da
Santa Sé. Desde a sua criação, a Diocese de Macau, que era na altura uma
colónia portuguesa, teve um papel fundamental na evangelização católica do
Extremo Oriente, nomeadamente da China. Foi em Macau que os jesuítas, chefiados
por Alessandro Valignano, fundaram o Colégio de São Paulo, que foi a primeira
instituição universitária de tipo ocidental no Oriente e em Macau. Esta
instituição tinha por principal objectivo a formação adequada dos missionários
destacados ao Extremo Oriente. Esta formação académica e espiritual incluía a
aprendizagem das culturas e línguas orientais (ex: chinês) e de diversas
disciplinas como a teologia, filosofia, matemática, geografia, astronomia,
Latim, Português, música e artes.
A
missão católica permanente em Pequim foi criada em 1601 pelos esforços de
Matteo Ricci. O seu método de evangelização foi bastante subtil e inteligente,
despertou primeiro o interesse do Imperador e dos intelectuais chineses pela
ciência e cultura ocidentais, fazendo desse interesse e curiosidade o ponto de
abertura para a doutrina católica. Ele também fez tentativas de conciliar o
catolicismo com os textos clássicos chineses do confucionismo (uma filosofia
que ele estudou profundamente), embora ele fosse hostil, juntamente com os
outros jesuítas, ao taoísmo e ao budismo. Ricci
morreu em 1610, mas a missão dos jesuítas conseguiu tornar-se numa parte
importante da burocracia imperial. Esta importância só acabou no século XVIII.
Em 1644, um jesuíta alemão, Adam Schall von Bell, foi nomeado Presidente do
Tribunal das Matemáticas pela nova dinastia Qing. Este organismo importante era
um conselho imperial para matérias científicas, nomeadamente para a organização
do calendário chinês, para a previsão de eclipses e para a observação
astronómica. O Tribunal das Matemáticas também foi presidido mais tarde por
outro jesuíta, o padre Ferdinand Verbiest. Outros jesuítas também foram
empregados pela corte imperial como matemáticos, astrónomos, mecânicos,
músicos, pintores, fabricantes de instrumentos (principalmente de relógios e
mapas), e em outras áreas que exigiam um grau superior de competência técnica. Os
jesuítas tiveram também um papel importante na assinatura do Tratado de
Nerchinsk (1689), considerado o primeiro tratado subscrito pela China com uma
potência da Europa, neste caso com o Império Russo. Sobre o engenho e
conhecimento científico dos jesuítas em Pequim, o famoso cientista Leibnitz
afirmou:
“Estes
matemáticos, mecânicos e engenheiros deixaram-nos máquinas de mover grandes
cargas, máquinas de escrever caracteres chineses, máquinas pneumáticas,
hidráulicas de aplicações variadas e de diferentes usos e até relógios
hidráulicos; um aqueduto de oito estádios ou seja de 330 metros”.
Os
missionários católicos, nomeadamente os jesuítas, conseguiram estabelecer-se em
várias cidades chinesas e converteram muitos chineses, em 1617, a Igreja
contava com 13 mil convertidos, em 1650, já conseguiu 150 mil novos convertidos,
e de 1650 até 1664, o número de convertidos aproximava-se dos 255 mil. Em 1650,
abriu-se a primeira igreja pública em Pequim, cuja construção foi financiada
pelo Imperador Shunzhi, que era um grande simpatizante e protector de Adam
Schall. Esta igreja, construída no sítio onde esteve a primeira capela de
Pequim (construída por Matteo Ricci), tornou-se mais tarde na Catedral da
Imaculada Conceição, que é a actual sede da Arquidiocese de Pequim. Em 1692, o
Imperador Kangxi publicou o ‘Édito de Tolerância ao Cristianismo’, que concedia
a liberdade religiosa aos católicos. Devido ao grande dinamismo e crescimento
da Igreja chinesa, o vicariato apostólico de Nanquim foi erigido em 1659 pelo
Papa Alexandre VII, a partir da Diocese de Macau. E, em 1690, o Papa Alexandre
VIII promoveu este vicariato a diocese de Nanquim e, a partir do vicariato
apostólico, erigiu a diocese de Pequim. A partir desta profunda restruturação
eclesiástica, o território chinês passou a ser servido e abrangido por 3
dioceses: Nanquim, Pequim e Macau, todas elas vinculadas ao Padroado português
e dependentes da Arquidiocese de Goa. Mais tarde, estas dioceses perderam
território para constituir novos vicariatos apostólicos. Até 1622, a missão
católica na China estava sob protecção exclusiva de Portugal, ou seja, estava
vinculada ao Padroado português. Porém, em 1622, foi fundada em Roma a ‘Congregação
de Propaganda Fide’, que passou a ser responsável pela coordenação e envio de
missionários para terras não-conquistadas por europeus. E, em 1659, foram erigidos
3 vicariatos apostólicos (Tonquim, Cochinchina e Nanquim) a partir da Diocese
de Macau, mas todos eles chefiados por missionários franceses da Sociedade para
as Missões Estrangeiras de Paris, que era apoiada pela ‘Congregação de
Propaganda Fide’. Porém, em 1690, o vicariato apostólico de Nanquim foi
promovido a Diocese de Nanquim e esta diocese foi novamente vinculada ao ‘Padroado
português’. O Padroado português sofreu um novo golpe em 1685, o Rei francês
Luís XIV começou a proteger e enviar jesuítas franceses para a China, rivalizando
com os restantes jesuítas e missionários protegidos por Portugal. Esta
crescente rivalidade entre a França e Portugal contribuiu também para a
controvérsia dos ritos na China. Por isso, grande parte da evangelização na
China passou a ser da responsabilidade dos missionários protegidos por França. A
tentativa pragmática dos jesuítas (protegidos por Portugal) de conciliar a
prática dos ritos chineses e o confucionismo com o catolicismo levou a
conflitos com as outras ordens religiosas, principalmente com os dominicanos
(protegidos por Espanha), que chegaram a Pequim das Filipinas em meados do
século XVII. Este conflito veio chamar-se de "Controvérsia dos ritos na
China" e arrastou-se até ao século XVIII, quando o método pragmático dos
jesuítas acabou por ser condenado definitivamente pelo Papa Clemente XI (em
1715) e pelo Papa Bento XIV (em 1742). Devido à controvérsia e às condenações
papais, o Imperador Kangxi proibiu as missões cristãs na China, em 1721. O
Imperador Yongzheng, filho e sucessor de Kangxi, publicou em 1724 um edital que
ordenava o exílio para Cantão de todos os missionários, excepto aqueles que
trabalhavam na Corte imperial (na sua maioria, eram jesuítas). Em 1736, o
Imperador Qianlong, filho e sucessor de Yongzheng, publicou um edital que
proibia o ensino da doutrina católica, sob pena de morte. A partir de 1746,
agravaram-se as perseguições aos católicos, primeiro nas cidades e
posteriormente no meio rural. E estas perseguições variavam muito de
intensidade e de frequência, podendo haver períodos de relativa tolerância
entre as vagas de perseguição, visto que tudo dependia da maior ou menor
tolerância dos vários imperadores ou do zelo dos mandarins regionais em aplicar
os decretos imperiais. Com a supressão da Companhia de Jesus (1762-1773) e a
consequente retirada da China desta dinâmica força missionária, a Igreja
Católica na China, que naquela altura já contava com 300 mil católicos, ficou
ainda mais exposta às sucessivas ondas de perseguição. Em 1784, houve uma nova
onda de perseguição aos católicos, com a expulsão de mais missionários e enfraquecendo
ainda mais a Igreja, como por exemplo, em 1788, ainda conseguiram sobreviver 30
mil cristãos em Nanquim, mas só havia um missionário "meio cego e
surdo" e um padre chinês saudável para os servir. Nas províncias de
Guangdong e Guangxi, cuja evangelização era da responsabilidade da Diocese de
Macau, havia 15 mil cristãos, mas os seus onze missionários foram todos
expulsos ou mortos. Estas perseguições tornaram-se ainda mais severas durante o
reinado de Jiajing (1796-1820), muitos católicos chineses e clérigos foram
martirizados e um decreto imperial, que foi publicado em 1811, ordenava à busca
e captura de missionários estrangeiros (europeus). Naquela altura, só restavam
7 missionários a residirem na Corte imperial com a condição de não
desempenharem nenhuma actividade missionária. Mesmo com todas estas
dificuldades, a Igreja Católica conseguiu sobreviver clandestinamente na China.
O
‘Padroado, no Oriente’, está representado com nove instituições, religiosas, cujo
míster é a divulgação e prática do cristianismo. Porém não estão subjugadas ao
Vaticano embora acolhesse missionários estrangeiros. Mas os tempos correram e a
vontade dos papas mudaram. A gratidão da Santa Sé para com Portugal e Igreja
tem início de quando os portugueses desalojaram os mouros de Portugal e os
empurraram para o norte de África. As guerras dos credos, católicos e
muçulmanos, duraram vários séculos na Península Ibérica. A Santa Sé teve todo o
interesse que os Portugueses tivessem colocado em debandada a ‘moirana’ e,
ainda a conquista de terras marroquinas. As ideias expansionistas do Rei Dom
Sebastião (educado na corte pelo clero, a este, ter-lhe-ia, deteriorado o cérebro
e manter na sua mente em constante ódio aos mouros), foram atrozes depois dos
portugueses serem derrotados em Alcácer Quibir o monarca, um jovem, ficou por
lá prisioneiro ou morto na peleja. O que levou o Cardeal Dom Henrique (um
clérigo já velho e ‘caduco’) ascender ao trono de Rei de Portugal e, depois da
sua morte, por razões de linhagem monárquica, Portugal ter tido a tragédia de
ser governado por 60 anos pelos reis de Espanha. O povo português nunca lhe perdoou:
“Viva
el-rei Dom Henrique/No inferno muitos anos/Pois deixou em testamento/Portugal
aos Castelhanos.”
A
Santa Sé, no Vaticano e de que por lá nem tudo era cristandade ou bondade,
coloca-se ao lado dos espanhóis durante os 60 anos da usurpação da coroa
portuguesa. Põe à margem o clérigo português e o Padroado Português do Oriente.
Não ordena bispos ou cardeais de nacionalidade portuguesa e os missionários do
Padroado, no Oriente, ficam órfãos e sem pai que é o chefe supremo da Igreja
Católica. A partir de meados do século XVII os franceses tiveram pouca
influência no Oriente. Os ingleses e os holandeses, principiaram a expandir-se
e a dominar o comércio no Oriente nos anos: (1595 Holanda na Indonésia e 1612
os ingleses na Índia). A Inglaterra dominava a Índia e a Holanda, já era a
senhora das Índias Orientais. Luis XIV com as suas ideias expansionistas,
pretende que a França venha a ser o pêndulo que balançasse a forças inglesas na
Índia e as holandesas na Batávia (Indonésia). O monarca francês sabia de antemão
que para que se concretizassem as suas ideias seria através dos missionários, jesuítas
das “ Missões Estrangeira de Paris”. Gregório XV, em 1622, institui a nova 'Congregação de Propaganda Fide', cujo sistema mentor pertencia a 13 cardeais e
dois prelados, ajudados por um secretário e um consultor. Ora
toda a Ásia a sua evangelização pertencia ao Padroado e sob a jurisdição dos
Reis de Portugal. Gregório XV, decretava que a 'Congregação de Propaganda Fide' seria para colaborar na evangelização do Oriente com o Padroado, sob os
auspícios do mesmo, retirar o Padroado a Portugal e restringi-lo. Começa,
então, a guerra entre o Vaticano e Lisboa. O papa tinha desferido uma
“punhalada mortal” no Padroado Português do Oriente. As peias consolidadas
pelos pontífices, seus predecessores, tinham sido desmoronadas e o missionários
do Padroado, além de principiarem a sofrer humilhações de outras congregações
estrangeiras e, os missionários destas a tomarem-lhe o lugar na evangelização. Luis
XIV, conhecido pelo Rei-Sol, está no apogeu e pretende a todo custo e dinheiro
infiltrar-se no Oriente. Não lhe era desconhecido que os portugueses dominavam
não só a cristianização dessas terras, como assim o comércio. Os sessenta anos
de ocupação espanhola tinha levado os missionários do Padroado a viverem em
extrema pobreza e abandonados pela Santa Sé. Surgem as viagens descritas pelo
Padre Alexandre Rhodes, jesuíta francês, à Ásia, incita e cria entusiasmo nos
missionários viajarem para as terras orientais e envolverem-se na divulgação do
cristianismo nas terras onde os missionários do Padroado já sa haviam instalado
havia muito. Sabiam esses clérigos que teriam um forte apoio de Luis XIV. Surge
o Padre François Pallu, inteligente e apoderado de enorme patriotismo viajou
até Roma, apresentou os seus planos à Santa Sé para o derrube do 'Padroado
Português do Oriente'. O Pallu fez as propostas, dentro de certa astúcia, à
Santa Sé e sem as ter comunicado à hierarquia das 'Missões Estrangeiras de
Paris'. Durou
a luta ao Pallu cinco anos (dado que a Santa Sé estava renitente em eliminar e
restringir os privilégios do Padroado), para que o Vaticano abençoasse a sua
pretensão. O Padre Rego, nesta matéria pronuncia-se:
“Podemos,
pois, afirmar que a Santa Sé se deixou levar nesta matéria pelo élan, francês.
A iniciativa, certamente, não lhe pertence”.
Em
17 de Agosto de 1658 são nomeados os dois primeiros vigários apostólicos;
François Pallu, bispo de Heliópolis e Motte Lambert, bispo de Berito, para as
missões de Tonquim e da Cochinchina e países vizinhos.
O
Primeiro embate entre os missionários do Padroado e os franceses. Aconteceu no
Reino do Sião. Monsenhor de la Motte Lambert chegou a Ayuthaya em Agosto de
1662 e Monsenhor Francisco Pallu em Janeiro de 1664. La Motte não teve boa
recepção dos missionários portugueses que já havia cerca de 150 anos se tinham
estabelecido com três paróquias no Ban Portuguete: São Domingos, São Francisco
e Jesuítas. Tinham sido, também, os primeiros a terem a permissão do Rei do
Sião de divulgarem e a converter, livremente, ao catolicismo os siameses. O
vigário geral, do Padroado, que administrava o Sião, pediu a de la Motte
Lambert para que lhe mostrasse os papéis os quais lhe davam a autonomia, para
exercer tais funções, administrativas, clericais, no Sião. Em princípio
recusou-se mas acabou por ceder, em sinal de boa vivência e colaboração, mútua,
no futuro. Ficou assim o vigário geral do Padroado, elucidado, da realidade dos
factos de que a ordem tinha origens do Vaticano. Os
missionários do Padroado não se resignam e, continuadamente opõem-se para que
as suas acções de evangelização continuassem e eles, de forma alguma, sob o
jugo dos franceses. De la Motte não desarma e envia, em 1665, ao Vaticano um
dos seus padres, De Bourges, para que pedisse à Propaganda que confiasse o Sião
à sua jurisdição, isto porque a situação geográfica assim o aconselhava e, também,
porque a tolerância da prática de outros cultos, que não fossem de índole
budistas eram tolerados pelo monarca siamês. De la Motte, analisa, ao mesmo
tempo ser o Sião, uma base estratégica e bem colocada e um ponto de partida
para os missionários franceses se se ramificarem para outras terras entre elas:
a China e a Indochina e que mais tarde a França viria a colonizar o Camboja,
Laos e Vietname. A Santa Sé está relutante dado que temia aumentar as iras de
Portugal. De la Motte não desarma ou desanima perante a recusa da Santa Sé.
Consegue a permissão do Rei do Sião que lhe doasse um terreno em Mahapan, nos
arredores de Aiutaá, onde deu início à construção, precária de um seminário. O
Sião, apesar de todos os malabarismos de la Motte continuava sob a jurisdição
do Padroado e acaba por reconhecer, em 1688 que o Sião estava sob a tutela de
Malaca e já conquistada pelos holandeses em 1641. O bispo de Malaca tinha
morrido e em sua substituição o vigário geral. O católico de Ayuthaya, siameses
e luso-tailandeses a espiritualidade, religiosa é-lhes ministrado pelos
missionários dominicanos, franciscanos e jesuítas. Os missionários franceses já
estabelecidos com uma igreja e um seminário a cerca de dois quilómetros do Ban
Portuguete (Aldeia dos Portugueses), mas uma vez insistem perante a Santa Sé e
a estratégia que culmina no pedido; se poderiam administrar os sacramentos aos
cristãos na sua igreja que ficava a 4 ou 5 milhas de distância, da mesma forma
como os padres do Padroado, o faziam nas suas paróquias. O
Vaticano concede-lhes esta prática; principia, com isto, a existência de duas
jurisdições, católicas, em Ayuthaya. Perde com isto alguma autonomia, no Sião,
o Padroado Português do Oriente. Guerras frias e surdas virão a ser travadas
entre os missionários franceses e portugueses. Os franceses e bom de entender
eram, considerados, uns intrusos em Aiutaá. O jesuíta do Padroado António
Quintana Duega escreveu um livro cuja leitura viria a ser censurada por de la
Motte Lambert. Houve conflitos silenciosos e de poucas palavras. O Papa depois
de examinar o conflito e deu razão a de la Motte Lambert, dado que a matéria
inserida no livro de António Quintana era contrária ao cânones e à tradição da
Igreja. O reparo e a censura de Monsenhor de la Motte Lambert não ficaram
esquecidos ou deitados em saco roto pelos missionários do Padroado. A
Inquisição, para observar a pureza da fé e os bons costumes, como representante
no Sião, era o Frade Luiz Fragoso, da congregação dominicana. O Frade Fragoso
não aceitou a censura do Lambert e considerou-o ter atentado contra a sua
autoridade. Acusou-o
de várias opiniões teológicas falsas. Excomunga o Lambert e foi afixado, um
edital, numa igreja de Aiutaá onde o excomungava. Lambert, apresentou queixa ao
Santo Ofício que dá sem efeito a excomunhão e repara o escândalo do Frade
Fragoso, depondo-o do cargo de inquisidor e obriga-o abandonar o Sião. Mas as
ordens do Vaticano não foram no seu todo cumpridas e Lambert, mais uma vez,
envia um enviado o missionário Charles Sevin, com uma nota dirigida ao Clemente
X. Em 10 de Novembro de 1673. Uma bula papal faz desligar os vigários
apostólicos de toda a jurisdição do arcebispo e da Inquisição de Goa. Clemente
X queixa-se, a Goa e num comunicado ‘Cum per litteras’ refere-se que os missionários
portugueses residentes no Sião tinham:
a)
Obrigado o bispo de Berito (Monsenhor de la Motte Lambert), a mostrar as suas
bulas, como se ele estivesse sujeito a Goa e não directamente à Santa Sé.
b)
Excomungado e multado em duzentas moedas os cristãos que com ele tratassem. O
Papa estranha a atitude e solicita ao arcebispo de Goa que não seja exercido
qualquer acto de jurisdição contra os vigários apostólicos e seus missionários.
Adverte também das gravíssimas penas, pela privação do ofício, fora do
território português.
Esta
machada desferida por Clemente X ao Padroado, provoca uma ferida profunda que
jamais vai encontrar o caminho da cura. Apoia, as futuras, queixas dos
franceses redigiu vários textos de comunicados, importantes, de 1670 e 1673,
que mandou publicar e os mesmos enviados aos vigários apostólicos. Nas
proximidades do Natal de 1673 um outro comunicado ‘Sollicitudo pastoral’
declara que a Inquisição de Goa não possuía autoridade alguma nos territórios
que não estavam sujeitos à Coroa portuguesa. Derroga todos os privilégios
anteriores, embora tenham sido conferidos por papas ou concílios. Os
missionários, do Padroado, barafustam apresentam os antigos privilégios e a
total submissão ao Rei de Portugal. Ignoram as ordens do Papa Clemente X, para
a rebelião, silenciosa, não produziu efeito. Vale mais um papa vivo que um papa
morto. O papa estava ao lado e as satisfazer a vontades de Luiz XIV para que o
permitisse concretizar o projecto da infiltração no Reino do Sião e na sua
cabeça a ideia de o colonizar. Tal nunca viria acontecer. No
Reino do Sião a língua franca era a portuguesa, o Padroado Português do
Oriente, tinha criado raízes durante os quase 150 anos de evangelização no
reino. Mas além disto já uma numerosa comunidade luso-tailandesa, calculada em
mais de 2.500 almas, que era assistida pelos missionários do Padroado,
portugueses e estrangeiros residiam no Ban Portuguete onde estavam erigidas 3
paróquias. Descrição do Padre António Rego:
“A passagem do Sião para os vigários apostólicos não se fez sem repugnância, sem
resistência. O caminho vinha sendo preparado já por uma longa serie de
documentos pontifícios todos êles a favor dos vigários apostólicos. Esses
documentos, como nota Launay, eram publicados na igreja francesa de São José de
Juthia (Aiutaá). Os jesuítas e os dominicanos, entrincheirados nos mesmos
redutos de sempre, declaravam-nos falsos e inventados pelos missionários
franceses, e por conseguinte nulos, sem valor algum, porque não tinham passado
pela corte de Lisboa.”
Vários
incidentes se deram, todos eles bem lamentáveis, da resistência dos missionários
portugueses que se viam colocados entre dois fogos. Por um lado, deviam
obediência a Goa; por outro, eram admoestados pelos vigários apostólicos, em
nome da obediência suprema devida a Roma. Esta política dúplice havia de ser
adoptada pelos anos fora pela Propaganda e com bons resultados. No Sião, porém,
houve solução radical. A Santa Sé, por meio dos seus decretos, resolveu que os
portugueses residentes no Sião ficassem debaixo dos vigários apostólicos. Esta
nova concessão foi muito bem acolhida em Paris e Monsenhor Pallu aconselhou aos
seus missionários toda a prudência para não suscitar novas susceptibilidades. Os
dominicanos submeteram-se em 1678, os jesuítas em 1681 e os franciscanos que
também lá trabalhavam, se bem que em menor número, um bocado mais tarde. Os
missionários portugueses, porém, nunca abandonaram o Sião. Tais missionários
recebiam os seus poderes ora dos vigários apostólicos, ora directamente de Goa.
A cinza crepitava ainda, quando atiçada por qualquer faúlha. As autoridades do
Padroado viam-se obrigadas a reconhecer a situação de facto, mas protestavam de
vez em quando contra o desaire sofrido. Padre
António da Silva Rego em diversas considerações descritas ao longo do seu
valioso livro que se recomenda aos historiadores e interessados na história da
expansão portuguesa no Oriente lê-lo (se porventura o encontrem em alguma
biblioteca), entre muitas passagens encontramos esta que nos merece atenção:
“O missionário não é um «João-sem-terra». Tem uma pátria que ama profundamente.
É natural que deseje que outros a amem igualmente. Aconteceu isto com os
missionários portugueses. É verdade que em toda a parte onde êles chegaram
espalharam o bom nome de Portugal, favoreceram as relações entre esses países e
o seu.”
Lastima:
“Na Índia nunca Portugal tentou penetrar para o interior e conquistar
terminantemente para si esses territórios. O plano de Francisco de Almeida, de
se manterem feitorias espalhadas pelas costas do Oriente, foi aperfeiçoado por
Afonso de Albuquerque que estabeleceu fortalezas nos pontos estratégicos.
Assim, o ponto básico da política de, Francisco de Almeida, que eram as
armadas, casou-se com o de Albuquerque, as fortalezas, para impor
definitivamente o prestígio do nome português. Nunca, porém, se tentou fazer no
Oriente o que se fez ao Brasil, ou o que os espanhóis fizeram na América do Sul
(...) A decadência de Portugal, a queda fatal do império português veio quando
os mares deixaram de ser sulcados por naus portuguesas”.
E
para terminar, o império começa a ser derrubado depois da tragédia de Alcácer Quibir
(1578) e que pouco depois Portugal perderia a independência e é administrado
pela coroa espanhola. Portugal. Antes, daquela fatídica derrota, possuía uma
potência naval, impar na Europa. Fortalezas e feitorias tinham sido construídas,
na costa Atlântica, Indico, Índia, Coromandel até ao Japão. A ‘Armada
Invencível’ empresa de Filipe I, se afundou no Canal da Mancha e era parte do
espólio marítimo português e sem ele viria a contribuir para o abandono, em
parte, do comércio oriental. Mas
um grande mal que grassa na sociedade portuguesa, depois de começar a descobrir
as terras de além-mar, foi o mundo fantasioso das vaidades em que de um momento
para outro, os fidalgos, ou pelo mérito deles ou pelos favores da casa real
portuguesa, voltam ricos e opulentos da noite para o dia. Pouco, mesmo nada se
interessam para preservar os sentimentos de Afonso de Albuquerque que desejou
um Portugal rico e retirar os portugueses da miséria em que viviam antes das
caravelas de Cristo navegarem nos oceanos do Mundo da época. Voltando
aos missionários das ‘Missões Estrangeiras de Paris’ em Aiutaá, desde que ali
se instalaram erigindo uma rudimentar igreja e também um seminário, foi graças
a eles que os católicos do Ban Portuguete têm sido assistidos espiritualmente.
A Igreja de São José que conhecemos há mais de duas dezenas de anos, tinha sido
restaurada em 1883. Já nesta altura funcionava, em construção de madeira uma
escola onde aprendia umas dezenas largas de alunos, filhos de pais católicos,
budistas e muçulmanos. Eles foram soldados, artilheiros, guardas do palácio
real e ocupados em várias artes que graças a esta boa gente, ajudaram a
transformar o Sião.
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