Duques de Bragança
8 de Maio de 1298-D. João Afonso de Meneses, 4.ºSenhor de Albuquerque-juro e herdade-(antes em vida, tendo sido renovado por 6 vezes)-D. Duarte Pio de Bragança
1. D. Afonso I-1º. Duque de Bragança
Afonso de Portugal, depois Afonso I de Bragança (Veiros - Estremoz, 10 de agosto de 1377 - Chaves, 15 de dezembro de 1461) foi o 8º conde de Barcelos, 2º conde de Neiva e o 1º Duque de Bragança. Supõe-se que Dom Afonso tenha nascido em Veiros, no Alentejo, como filho natural do Rei João I de Portugal e de Dona Inês Pires.
«Nas suas cavalarias alentejanas, à volta de alguma montaria aos lobos ou aos castelhanos», se perdera (o futuro rei), em Veiros, pela filha de Barbadão, Inês Pires Esteves, que amara, seduzira, trouxera para o convento de Santos, e de quem houvera um filho, Conde de Barcelos, depois Duque de Bragança, nascido aos 20 anos do pai: foi Afonso I de Bragança ou Afonso de Portugal (nascido em Veiros em 10 de agosto de 1377 e morto em 15 de dezembro de 1461 em Chaves, ali sepultado). Foi feito em 30 de dezembro de 1442 Duque de Bragança, também 8° Conde de Barcelos e Conde de Ourém.
O primitivo património dos Bragança formou-se com bens e terras com que dotou a filha o condestável Nuno Álvares Pereira (1360-1431), 7° Conde de Barcelos. Foi o fundador da casa de Bragança. O senhorio e o ducado de Bragança, solicitou-os ao regente D. Pedro, por ocasião de breve reconciliação entre ambos, que lhos concedeu no ano de 1442. Os descendentes foram Duques de Guimarães em 23 de novembro de 1470 e de Barcelos em 5 de agosto de 1562.
Na armada de Ceuta foi encarregado dos aprestos nas províncias de Estremadura e Entre Douro e Minho e capitão da capitania real. Do regresso de Ceuta, e pelos serviços, recebeu novas mercês de seu pai, João I de Portugal. Durante o reinado de Duarte I teve excelentes relações com o meio-irmão, mas não o conseguiu demover da trágica expedição a Tânger. Depois da morte de Duarte I e durante a regência da sua viúva Leonor de Aragão e Pedro, irmão do falecido rei, não foram boas as relações entre Afonso e Pedro, chegando quase ao campo de batalha em Mesão Frio, nas margens do rio Douro, luta que foi evitada pelo conde de Ourém, filho de Afonso. Em 1442, este obteve do regente o senhorio e ducado de Bragança. Era o terceiro ducado de Portugal (os dois primeiros foram criados por João I para seus dois filhos: o de Coimbra para Pedro e o de Viseu para o Infante D. Henrique). Depois da batalha de Alfarrobeira (1449), D. Afonso V concedeu ao Duque de Bragança outras importantíssimas mercês, e nove anos depois, quando partiu para África, deixou entregue ao duque o governo do reino na sua ausência. D. Afonso, o 1.º Duque de Bragança, deu origem à Casa de Bragança, que viria a reinar em Portugal três séculos mais tarde.
Casamento e posteridade.
Casou em Frielas em 1 de novembro de 1401 com D. Brites ou D. Beatriz Pereira de Alvim (1380-1415) condessa de Barcelos e condessa de Arraiolos, filha única do condestável D. Nuno Álvares Pereira e de Leonor de Alvim, a herdeira da casa mais opulenta do reino. Do primeiro matrimónio, com D. Beatriz Pereira de Alvim, teve três filhos;
I. Afonso, 4º conde de Ourém e 1º marquês de Valença (mercê de Afonso V) que faleceu ainda em vida de seu pai em 1460;
II. Fernando I que sucedeu no ducado de Bragança;
III. Isabel de Barcelos que casou com o seu tio o infante João filho de D. João I. Casou com Dona Constança de Noronha. Não houve descendência.
IV. D. Fernando I de Bragança, 2.º Duque de Bragança
Foi ainda Dom Afonso I, o responsável pela construção do Paço Ducal em Guimarâes.
Casou em 1420 com Constança de Noronha (morta em 1480 e sepultada em Guimarães), chamada a Pia ou a Condessa Santa, filha de Afonso Henriques, conde de Gijón e Noronha, filho do rei Henrique II de Castela, seu neto na sexta geração, D. João III, 8° Duque de Bragança, viria a tornar-se D. João IV de Portugal, 21° Rei. Recorde-se que este título de Bragança foi criado em 1442 por Afonso V, sobrinho do 1º Duque de Bragança.
2. Fernando de Portugal-Fernando I de Bragança
(1403-Vila Viçosa, 1 de abril de 1478) foi o 2º Duque de Bragança, filho segundo do 1º Duque D. Afonso I. Sucedeu no ducado por morte de seu pai, em 1464.
Nas partilhas do enorme património de seu avô, D. Nuno Álvares Pereira, pelos netos, coube-lhe o condado de Arraiolos. Viria posteriormente a receber os títulos de conde de Barcelos, conde de Neiva, fronteiro-mor do Reino, tendo ainda sido feito por Afonso V Marquês de Vila Viçosa (1455). Tomou parte na expedição de Tânger, sendo mais tarde governador de Ceuta por duas vezes. Acompanhou D. Afonso V em expedições ao norte de África, e com tanta galhardia, que o soberano lhe fez a graça de elevar Bragança à categoria de cidade. Por esse motivo, a cidade de Bragança erigiu-lhe uma estátua. Sendo apenas Duque duma vila, em oposição aos restantes Duques, que o eram de cidades, solicitou também por essa razão ao Rei a elevação de Bragança a cidade, o que o Rei consentiu. Foi Regente do reino em 1471, quando o rei partiu para a conquista de Arzila.
Casamento e descendência. Casou em 1429 com D. Joana de Castro, 3ª Senhora de Cadaval e Peral, filha de D. João de Castro, 2º Senhor de Cadaval e Peral, e de sua mulher Leonor de Acuña y Girón. Deste casamento nasceram:
I. D. Fernando II, 3º duque de Bragança (c. 1430-1483), sucedeu a seu pai na chefia da Casa de Bragança
II. D. João, 1º marquês de Montemor-o-Novo (c.1430-?), não deixou descendência
III. D. Afonso, 1º conde de Faro e 2º conde de Odemira jure uxoris (c.1435-?)
D. Álvaro, 4º Senhor de Cadaval e Peral, 1º Senhor de Tentúgal, Póvoa e Buarcos, 5º Senhor de IV. Ferreira de Aves jure uxoris, 4º Senhor de Arega jure uxoris e 2º Senhor da Quinta de Água de Peixes jure uxoris (c.1440-1504)
V. D. António de Bragança, morto da infância
VI. D. Isabel de Bragança, morta na infância
VII. D. Beatriz, Marquesa de Vila Real pelo casamento com D. Pedro de Menezes
VIII. D. Guiomar, Condessa de Viana (do Alentejo), Condessa de Viana (da Foz do Lima), Condessa de Valença e Condessa de Loulé pelo casamento com D. Henrique de Meneses
IX. D. Catarina de Bragança, morta na infância.
3. D. Fernando II de Bragança-3.º Duque de Bragança
Fernando II, Duque de Bragança (1430-Évora, 20 de junho de 1483) foi o 3º Duque de Bragança, filho mais velho de Fernando I, Duque de Bragança e sua esposa Joana de Castro.
Foi executado em Évora, em 1483, por ordem do Rei João II. Teve excelentes relações com Afonso V, foi feito fronteiro das províncias de Entre-Douro-e-Minho e de Trás-os-Montes. Recebeu o título de Conde de Guimarães que em breve se elevou a ducado. Acompanhou o rei em várias campanhas em África. Quando em 1478 sucedeu a seu pai no Ducado de Bragança, tornou-se titular do maior domínio senhorial, não só de Portugal, como de Castela, Navarra e Aragão. Com a subida ao trono de João II em 1481, que com os seus desejos de fortalecer o poder real e as providências que tomava contra as excessivas regalias das classes privilegiadas, levaram o Duque de Bragança, alcaide de numerosas fortalezas, a protestar, declarando-a lesiva da sua dignidade e excessivamente rigorosa, sendo, nesta atitude, acompanhado dos irmãos e do Duque de Viseu. Entre as escrituras existentes de doações e privilégios dados ao Ducado de Bragança e guardados num certo cofre em Vila Viçosa, o vedor da fazenda diz ter encontrado cartas onde o Duque de Bragança receoso da inimizade do novo Rei, tentava ganhar aliados em Castela. A partir das cópias mandadas executar por João II dessas mesmas cartas, o Duque de Bragança foi julgado em Évora, condenado à morte e executado em 20 de Junho de 1483. Manuel I viria a anular este processo mais tarde, em 1500, e a devolver as terras e os títulos ao seu filho, Jaime. Não se pode precisar se João II tinha razão ou se tudo não passou de pura suspeita, que aproveitou para se desfazer do duque e da Casa de Bragança, pois na sentença confiscou-lhe todos os bens que passaram para a coroa. Realmente, João II parece ter-se excedido nos cenários do julgamento, mandando até decorar a sala onde se procedeu ao julgamento no paço, onde o Rei se instalara, com panos onde figuravam cenas da história de Trajano, com exemplos de "severidade e justiça" desse imperador de Roma. O duque casara duas vezes; a primeira em 1447, tendo apenas 17 anos de idade, com Leonor de Meneses filha de Pedro de Meneses; a segunda (1472) com Isabel de Viseu, filha do infante Fernando.
Do primeiro matrimónio, com Leonor de Meneses, não houve filhos;
Do segundo, com Isabel de Viseu, os seguintes;
I. Filipe que morreu ainda criança
II. Jaime que foi 4.º duque de Bragança
III. Diniz que foi conde de Lemos pelo seu casamento
IV. Margarida
4. D. Jaime I de Bragança-4.º Duque de Bragança
Jaime I de Bragança (1479-20 de setembro de 1532) foi o quarto Duque de Bragança.
Secundogénito de Fernando II de Bragança, assistiu à decapitação do pai em Évora, ordenada pelo rei João II de Portugal, arqui-rival da casa ducal e do contra-poder que ela representava à centralização do Estado. Depois da execução de Fernando, Jaime fugiu para Castela com o resto da família, e aí permaneceu toda a adolescência até 1498. Nesse ano, o novo rei Manuel I de Portugal perdoou a família e concedeu-lhe de novo os títulos, terras e bens confiscados a seu pai. No entanto, Jaime decidiu partir acompanhado por um criado para Roma com o fim de anular o seu casamento e de se tornar monge capucho. Manuel I enviou mensageiros que o interceptaram em Calatayud e obrigaram a voltar para Portugal. Devido à importância da Casa Ducal de Bragança, em 1498, para não existir o risco da coroa de Portugal cair em rei estrangeiro, a pedido das cortes Jaime foi jurado Príncipe herdeiro de Portugal durante a viagem do rei Manuel I a Castela, em virtude deste não ter então ainda filhos. Desposou em primeiras núpcias Leonor de Guzmán filha do duque de Medina Sidónia em 1502, da qual teve dois filhos. Uma vez que fora um casamento combinado por motivos políticos, quando essa aliança deixou de lhe servir, engendrou um esquema para se livrar da duquesa, fazendo-a ser apanhada com um jovem escudeiro, e mandando assassinar (ou assassinando ele mesmo) o jovem casal como vingança.
Casou-se em segundas núpcias com Joana de Mendonça, filha de Diogo de Mendonça, Alcaide-mór de Mourão e sua mulher Brites Soares de Albergaria. Embora fosse dos mais altos nobres da corte portuguesa, sobre ele recaíram as suspeitas do assassinato. Para escapar aos foros da nobreza, o rei Manuel I ordenou-lhe que se redimisse entregando-se à guerra. Dessa forma, Jaime foi obrigado a custear pessoalmente uma expedição de 25 000 cavaleiros e 19 000 infantes transportados em 400 embarcações destinada a tomar Azamor, em Marrocos, em setembro de 1513, que foi facilmente conquistada pelos Portugueses.
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Foi ainda o responsável pela construção do Paço Ducal de Vila Viçosa.
Descendência do 1.º matrimónio
I, Teodósio I de Bragança, sucedeu-lhe no título
II.Isabel de Bragança, casou (1537) com Duarte, Duque de Guimarães (1515-1540)
Descendência do 2.º matrimónio
IV. Joana de Bragança (1521-1588), casou com Bernardino de Cardenas, 3. marqués de Elche
V. Constantino de Bragança (1528-1575), vice-rei da Índia
VI. Jaime de Bragança, clérigo
VII. Fulgêncio de Bragança, 11º Dom Prior da Colegiada de Guimarães
VIII. Teotónio de Bragança, arcebispo de Évora
IX. Eugénia de Bragança casa com D. Francisco de Melo, 2º marquês de Ferreira
X. Maria de Bragança
XI. Vicência de Bragança
5. D. Teodósio I de Bragança, 5.º Duque de Bragança
Teodósio I de Bragança (1505-22 de setembro de 1563) foi o quinto Duque de Bragança.
Primogénito do Duque D. Jaime I, sucedeu-lhe no ducado após a sua morte, em 1532. Teve por mestre Diogo Sigeu, varão muito erudito, considerado como um dos primeiros sábios do seu tempo. Depois do casamento de sua irmã D. Isabel, com o infante D. Duarte, a quem doou o ducado de Guimarães, instituiu com os seus bens patrimoniais um morgado importante que uniu aos que já existiam. Teodósio passa por ter sido um homem culto, típico do Renascimento, amante da pintura e da escultura, e gostava de estar ao corrente do que se passava nas outras cortes europeias. Enquanto viveu, não houve guerra em Portugal. A rainha regente Catarina de Áustria, nomeou-o general do exército que devia ir em socorro de Mazagão, mas ficou sem efeito, pois não se chegou a realizar a marcha destas forças para África. D. Teodósio fundou ainda alguns conventos.Casamento e descendência.
Casou em 1542 em primeiras núpcias com Isabel de Lencastre (1513-1558), filha de D. Dinis de Portugal-Castro (1481-morto em Ourense, na Galiza) e de Brites de Castro-Osório (1484-1560 Valladolid), de quem teve:
I. D. João I, 6º em ordem na sua Casa. Em 1559, casou-se com D. Brites ou Beatriz de Lencastre (1542-Leiria, 20 de Fevereiro de 1623), filha de D. Luís de Lencastre, de quem teve:
1º, Jaime de Bragança (Depois de 1559-4 de Agosto de 1578), morto na Batalha de Alcácer Quibir.
2ª. Isabel de Bragança (1560-?) casada com D. Miguel Luís de Meneses, (c. 1565-10 de Agosto de 1637), 1.º Duque de Caminha, 6.º Marquês de Vila Real, 5.º Conde de Alcoutim e Valença, e 8.º Capitão Geral da Praça de Ceuta, sendo filho de Manuel de Meneses, 5.º Marquês de Vila Real.
Teve uma relação com uma dama solteira do Paço Ducal de Vila Viçosa, da qual resultou Afonso Fayão, nascido por volta de 1558, filho bastardo que viria a ser Abade de Baltar. Afonso teve geração, que resultou em uma nobreza rural localizada na região do distrito do Porto, cuja descendência foi estudada por um genealogista portuense, Elísio Ferreira de Sousa. Em 1970, apresentou o estudo no seu livro Os Braganças da Província do Minho.
6. João I de Bragança-6º Duque de Bragança
6.º Duque de Bragança, nasceu em 1543, morreu em Vila Viçosa em 22 de Fevereiro de 1583. Em 1563 casou com D. Catarina, sua prima, filha do infante D. Duarte e de D. Isabel, irmã de seu pai. Quando D. Sebastião realizou a primeira ida a África quis que o duque o acompanhasse, ficando o governo do ducado a D. Catarina (1574), no que se dava à casa de Bragança a importância de um reino. O duque foi a essa expedição, levando 600 cavaleiros e 2.000 infantes das suas terras. Em 1576 sucedeu a seu cunhado como 11.º Condestável de Portugal. Preparava-se também para ir com o rei à segunda e desastrosa expedição de 1578 quando febres violentas o obrigaram a ficar. Enviou por isso, para acompanhar o rei, seu filho D. Teodósio, duque de Barcelos (título que D. Sebastião concedera em 1563 ao primogénito da casa de Bragança), o qual contava só 10 anos de idade. Durante o curto reinado do cardeal-rei D. Henrique entrou o duque de Bragança, juntamente com a duquesa, na pretensão da coroa, e nas cortes reunidas em Lisboa, jurou só obedecer ao rei que os Estados reconhecessem. Filipe II de Espanha, querendo afastá-lo da pretensão ao trono, mandou oferecer-lhe a realeza do Brasil, o cargo de grão-mestre da Ordem de Cristo, a licença de mandar todos os anos uma nau à Índia por sua conta, prometendo-lhe ainda o casamento de seu filho D. Diogo com uma das suas filhas. Mas o duque de Bragança, influenciado por sua mulher D. Catarina (herdeira do trono), rejeitou as propostas (1579). Morto o cardeal-rei, o duque acompanhou os governadores do reino a Lisboa e Setúbal, diligienciando para que fossem reconhecidos os direitos de sua mulher à coroa portuguesa, mas finalmente desistiu e aceitou as mercês do rei castelhano. Camilo Castelo Branco, escreveu: "Os sucessores do duque D. Fernando, degolado em tempo de D. João II, nunca puderam obter de D. Manuel, de D. João III, da rainha regente, de D. Sebastião e do cardeal, parte dos privilégios que o filho de D. Afonso V lhes jarretara. A absoluta independência da coroa, e o absoluto domínio em Vila Viçosa, nunca puderam os duques extorqui-lo à condescendência dos soberanos; obteve-o, porém, o avô de D. João IV, em Fevereiro de 1581 de Filipe II de Castela". Por alvará dado em Elvas em Novembro de 1581 o duque foi autorizado a criar magistrados seus, instaurar tribunais sem apelação nem agravo das sentenças dos seus juízes, e defender o ingresso de viandantes em seus domínios. Em 1584, sendo já duque D. Teodósio, Filipe II estendeu ainda mais os poderes judiciais dos duques, e mais tarde em 1587, foi-lhe permitido não cumprir as cartas dos corregedores da corte, avocar a sim as causas das suas terras e sentenciar como lhe parecesse. Depois da entrada de Filipe II em Portugal, o duque D. João serviu de condestável nas cortes de Tomar, onde o monarca espanhol, por suas próprias mãos, lhe deu o colar do Tosão de Ouro. Quando retirou do país, o mesmo soberano ainda lhe concedeu; para o herdeiro, o cargo de condestável do reino em três vidas; para o segundo filho o marquesado de uma cidade de Castela, para o terceiro filho, uma comenda de Castela e muitas outras mercês em dinheiro e concessões. Confirmou-lhe o tratamento de Excelência e a isenção dos direitos de chancelaria.
Descendência. De Catarina de Portugal:
I. Maria de Bragança (1565-?)
II. Serafina de Bragança (1566 - 1604), casada com João Fernandez Pacheco, 5º duque de Escalona
7. Teodósio II, 7º duque de Bragança
Teodósio II de Bragança (Vila Viçosa, 28 de Abril de 1568-Vila Viçosa, 29 de Novembro de 1630) foi o 7° Duque de Bragança. Era filho do Duque João II e da Infanta D. Catarina, neta do rei Manuel I. Ainda criança, Teodósio foi trazido para a corte e feito pajem do rei Sebastião de Portugal, que o fez Duque de Barcelos, por carta de 5 de Agosto de 1562. O rei estimava o pequeno Bragança e em 1578 insistiu na sua companhia durante a expedição ao Norte de África contra o rei de Marrocos. Teodósio permaneceu junto do rei na batalha de Alcácer-Quibir até a situação se tornar grave e o rei ordenar a retirada da criança para a segurança da retaguarda. Teodósio não ficou satisfeito e fugiu à primeira oportunidade, apanhando um cavalo e lançando-se a galope em direcção à linha de combate. Como muitos outros homens, acabou por ser ferido e feito prisioneiro pelos marroquinos. O Duque seu pai ficou estarrecido com os eventos e ofereceu uma fortuna pelo resgate do seu filho, chegando a pedir a Filipe II de Espanha para intervir em seu favor. Não seria necessário tanto alarme. O rei de Marrocos tinha ficado impressionado com a bravura do pequeno Teodósio e deixou-o regressar a casa em Agosto de 1579, via Espanha. Em 1580, por morte do Cardeal-Rei Henrique de Portugal, o jovem Teodósio parecia ser o aspirante ao trono português com mais hipóteses de herdar o trono. Talvez por isso mesmo, Filipe II só permitiu o regresso de Teodósio ao país, depois de ver assegurada a sua posição como rei. Esteve retido amigavelmente em casa do duque de Medina-Sidónia. Regressando depois a Vila Viçosa em 1580, quando Filipe II de Espanha subiu ao trono de Portugal (tornando-se no rei Filipe I de Portugal). Em 1582 o Rei nomeou-o 13º Condestável de Portugal. Teodósio tornou-se Duque de Bragança em 1583, por morte de seu pai, e cresceu para se tornar num fiel servidor dos reis espanhóis de Portugal. No início a sua mãe, D. Catarina, assumiu a chefia da Casa de Bragança, devido à tenra idade do filho. Filipe I de Portugal tinha entretanto proposto casamento a D. Catarina, que esta não aceitou. O motivo principal para esta recusa foi talvez o de preservar o direito que D. Teodósio tinha à coroa portuguesa, pois se este casamento se realizasse era sinal de que a Casa de Bragança aceitava o facto de Filipe II de Espanha ter sido aclamado rei de Portugal. Foi nomeado pela segurança do reino e defendeu Lisboa dos ataques de outros pretendentes incluindo António I, Prior do Crato, que tinha a ajuda do corsário inglês Francis Drake.
Descendência. De sua mulher, Dona Ana de Velasco y Girón:
I. João II ,8° Duque de Bragança (1604-1656), rei de Portugal em 1640 como D. João IV
II. Catarina de Bragança (1606-1610)
III. Alexandre de Bragança (1607-1637)
IV. Duarte de Bragança (1605-1649), Senhor de Vila do Conde
V. Catarina de Bragança (1606-1610)
VI. Alexandre de Bragança (1607-1637)
VII. Duarte de Portugal, 1º marquês de Frechilla
VIII. Alexandre de Bragança, arcebispo de Évora
IX. Querubina de Bragança (1572 - 1580)
X. Angélica de Bragança (1573 - 1576)
XI. Maria de Bragança (1573 - 1573)
XII. Filipe de Bragança (1581-?)
Reis de Portugal
Rei João IV de Portugal
D. João IV (Vila Viçosa, 19 de março de 1604-Lisboa, 6 de novembro de 1656) foi o vigésimo primeiro Rei de Portugal, e o primeiro da quarta dinastia, fundador da Dinastia de Bragança. Dados biográficos iniciais. Era filho de D. Teodósio II, sétimo duque de Bragança e da duquesa Ana de Velasco y Girón, nobre da corte espanhola e filha do duque Juan Fernández de Velasco, com a duquesa Maria de Téllez-Girón. D. João IV de Portugal herdou o senhorio da casa ducal em 1630 como João II e foi o 8.º Duque de Bragança, 5º Duque de Guimarães e 3.º Duque de Barcelos. Foi ainda 7.º Marquês de Vila Viçosa e Conde de Barcelos, Guimarães, Arraiolos, Ourém e Neiva, e também 14º Condestável de Portugal. Por via paterna, era trineto do rei Manuel I de Portugal, através da duquesa Catarina, infanta de Portugal, sua avó paterna. Ficou para a história como, "O Restaurador" (por haver sido restaurada a independência nacional, pois antes Portugal estava dominada por uma Casa Real estrangeira, a Casa de Habsburgo, tendo acontecido isto por casamentos entre a realeza portuguesa e a do Reino de Espanha) ou "O Afortunado" (por aparentemente, uma vez "caída a coroa na sua cabeça", não ter querido reinar, e só se ter decidido após a intervenção da esposa). Em «História de Portugal», volume V, Joaquim Veríssimo Serrão afirma - «de seu aio D. Diogo de Melo recebeu aprimorada educação e o gosto pela montaria; e do doutor Jerónimo Soares uma boa preparação nas letras clássicas e em teologia. Também se deu a estudos de música, ouvindo as lições do inglês Robert Tornar, que o duque Teodósio contratara para mestre da capela de Vila Viçosa.» A Casa de Bragança tinha grande prestígio no reino e o oitavo duque tinha a vantagem de beneficiar da crescente degradação do governo filipino e de um ambiente mais propício à revolta, haja vista os excessos da tributação lançada por Olivares. O duque ajudou a construir sua própria imagem de homem não comprometido e permitiu que o erguessem como reserva única da Nação sedenta de autonomia política, segundo Veríssimo Serrão em sua «História de Portugal», vol. V, página 13. Quando em agosto de 1633 visitou o marquês de Ferreira em Évora, com seu irmão Alexandre, «a cidade acolheu-o com as marcas próprias de um soberano, na desejada antevisão de sua realeza». Para Veríssimo Serrão, «pode aceitar-se que o projecto de uma revolta tenha depois ocorrido no Paço de Vila Viçosa, no convívio do duque com dois precursores da ideia: o secretário João Pinto Ribeiro e Pedro de Mendonça Furtado, alcaide de Mourão.» A versão de que não queria tomar a chefia do movimento por receio ou hesitação nasceu porque seu desejo, «por não sentir a madureza do fruto», estava em aquietar o povo, por entender que motins trariam a inevitável reação da coroa espanhola. Teria também havido uma sondagem junto de seu irmão Duarte, que combatia no exército imperial e chegou a Lisboa em 12 de agosto de 1638, para «concertar os negócios da sua fazenda», em viagem de carácter particular. Mas sabe-se que o duque não quis arriscar o futuro e se limitou a promessas de auxílio no caso de o movimento triunfar. Diz Veríssimo Serrão que «a aparente indecisão do duque encobria, desde a primeira hora, uma vontade firme de triunfo, servindo plenamente o desejo dos conjurados. Não era D. João o chefe de uma revolta, mas a figura a quem cabia exercer a realeza, tendo de estar acima da organização militar que lhe abria as portas do trono.» Restauração da independência.
Em 1640, quando a burguesia e a aristocracia portuguesas, descontentes com o domínio castelhano sobre Portugal que se propunha efectivar o valido Olivares, terminando com a monarquia dual, quiseram restaurar a dinastia portuguesa, foi ele o escolhido para encabeçar a causa. Dom João aceitou a responsabilidade com relutância, diz a lenda que incentivado sobretudo pela sua mulher Luísa de Gusmão. Este facto ter-se-á devido à prudência que se impunha na escolha da conjuntura favorável, e do tempo preparatório necessário para o efeito, visto Portugal nessa época estar quase desarmado, e Castela ser ainda ao tempo a maior potência militar na Europa. Luísa de Gusmão, sendo irmã do Duque de Medina Sidónia que sonhou revoltar-se com a Andaluzia de que chegou a sonhar ser rei, estaria talvez influenciada por ele. A nomeação do duque para governador-geral das armas de Portugal veio a ser o motor da revolta, propiciando-a. Nos fins de junho de 1639 esteve em Almada, sendo visitado por muitos nobres, desesperados alguns com as violências do governo filipino. Entre eles, Pedro de Mendonça Furtado, acima referido, Jorge de Melo (irmão do Monteiro-mor), Antão de Almada e o velho Miguel de Almeida (da casa de Abrantes). O plano da conjura teria sido então apresentado ao Duque: eles, e seus parentes e amigos, aclamavam-no em Lisboa, apoderando-se do Paço, matando o detestado Miguel de Vasconcelos. Mas o Duque recusou, pela consciência de que «não havia ainda ocasião» e aconselhou prudência aos mais exaltados.
No dia 1º de julho, o duque foi a Lisboa saudar a princesa Margarida e teve calorosa recepção da parte da nobreza, dos membros do clero e do povo. Eram factores vivos de revolta a forçada presença de muitos nobres portugueses em Madrid, e a novidade de um recrutamento de tropas lusitanas para irem ajudar a reprimir a independência recentemente declarada da Catalunha. Em agosto de 1640, Filipe III de Portugal pretendeu convocar Cortes nos seus outros reinos de Aragão e de Valência, para aquietar o espírito dos catalães, ordenando que o acompanhassem nessa jornada também fidalgos portugueses, sobretudo aqueles que eram comendadores das ordens militares. «Todos compreenderam que partindo para a Espanha iriam acelerar o processo de absorção política que o conde-duque de Olivares pretendia», segundo Veríssimo Serrão, e «na recusa de muitos em cumprir o mandado régio terá de ver-se o detonador do movimento que veio a estalar em 1º de dezembro seguinte.»
Houve então uma reunião em 12 de outubro em casa de Antão de Almada. Mendonça Furtado foi a Évora, sondar o Francisco de Melo, marquês de Ferreira, também ele, um Bragança, e outros nobres, e depois a Vila Viçosa, onde não escondeu ao duque a urgência dos conjurados em lançarem o movimento. Para a aceitação de Dom João teriam contribuído António Pais Viegas e a duquesa Luísa que, segundo a tradição romântica tardia, «de maneira varonil, quebrara os receios do marido ao afirmar que antes queria morrer reinando do que acabar servindo.» A 1 de dezembro deu-se o golpe palaciano e, em 15 de dezembro foi aclamado Rei de Portugal. Reuniões secretas. Depois da conversa definitiva com o Duque de Bragança, os conspiradores reuniram-se várias vezes em Lisboa para combinarem como e quando haviam de fazer a revolução. Essas reuniões tinham de ser feitas às escondidas para que não chegassem aos ouvidos da regente Duquesa de Mântua e do secretário de Estado Miguel de Vasconcelos. Se a notícia se espalhasse, seriam acusados de traição e condenados à morte. Mas, mesmo que não conseguissem provas para os incriminar, qualquer rumor acerca do que se preparava teria efeitos desastrosos porque os soldados castelhanos de guarnição em Lisboa ficariam em estado de alerta, eliminando-se o efeito surpreso. Todo o cuidado era pouco. As reuniões realizaram-se em 3 sítios. No palácio de Jorge de Melo, em Xabregas, no Palácio dos Duques de Bragança em Lisboa, no Chiado, e no Palácio Almada, de Antão de Almada, no Rossio (hoje mais chamado Palácio da Independência por essa razão).
Para não levantar muitas suspeitas os conspiradores nunca iam juntos e cada um seguia no seu coche com as cortinas corridas. Aclamação de João IV como Rei de Portugal. A fonte coeva fundamental sobre o assunto é o volume I da História de Portugal Restaurado da autoria do Conde da Ericeira, republicada modernamente no Porto em edição anotada e prefaciada por António Álvaro Dória, em 1945. Narra a tradição que Filipa de Vilhena, futura marquesa de Atouguia, armou cavaleiros na véspera da conjura, a fim de nela poderem participar, a seus filhos Francisco Coutinho e Jerónimo de Ataíde.
O mesmo diz ter feito outra intrépida fidalga, Mariana de Lancastre, armando cavaleiros pela mesma altura aos seus dois filhos Fernão Teles de Menezes, futuro primeiro conde de Vilar Maior, e António Teles da Silva, futuro governador-geral do Brasil. É costume afirmar que Miguel de Vasconcelos não soube da revolta, pelo que não tomou providências. Mas está provado, diz o historiador Joaquim Veríssimo Serrão, que lhe chegaram anteriormente rumores da conjura e que na véspera recebeu uma carta, que por descuido não abriu, com o nome dos conjurados. O número de fidalgos intervenientes no Primeiro de Dezembro é geralmente, dito, de quarenta, talvez por arrastamento mental do ano da revolução, afirmando no entanto alguns autores que foram em maior número do que esse. No dia 1 de dezembro, as 9 horas da manhã dirigiram-se os fidalgos e os seus criados, todos bem armados, ao Paço da Ribeira, aonde rompendo por ele dentro, entraram nos aposentos da princesa regente, a vice-rainha Margarida Gonzaga, duquesa viúva de Mântua, prima do rei Habsburgo, que facilmente dominaram, passando a procurar então a Miguel de Vasconcelos, o português traidor secretário de Estado, aliado do valido castelhano Olivares no seu recente projecto de anexação de Portugal e outros reinos a Castela, no quadro de uma centralização à francesa, inspirada no modelo de Richelieu, que desejava aplicar à multifacetada monarquia hispânica filipina em bloco.
O principal comando da operação parece ter estado nas mãos de Miguel de Almeida, futuro conde de Abrantes, de Jorge de Melo, irmão do Monteiro-mor, de Antão de Almada, que veio a ser o primeiro embaixador em Londres, e de João Pinto Ribeiro, agente do duque de Bragança em Lisboa. Após eles, outros fidalgos (todos filhos segundos) como João da Costa, Gastão Coutinho, João Saldanha da Gama, Manuel de Melo, os dois referidos irmãos António Teles da Silva e Fernão Teles de Meneses, António Mascarenhas e outros. Esta delegação da responsabilidade da insurreição nos filhos segundos das casas fidalgas, a exemplo do que em outras várias ocasiões sucedeu na História de Portugal até ao século XIX, permitia manter a salvo de consequências maiores e mais graves as mesmas, se a insurreição viesse a falhar, permanecendo oficialmente os chefes de casa fiéis à ordem reinante, e ignorantes da conspiração da juventude.
Naquele tempo as notícias viajavam por mensageiros e portanto demoravam a chegar ao destino. O Duque de Bragança aguardava no Palácio de Vila Viçosa o resultado da conspiração e, segundo os documentos da época, só soube a boa-nova no dia 3. Muitos outros mensageiros espalharam-se por todo o país a cavalo, levando consigo cartas para as autoridades de cada terra se encarregarem de aclamar o novo rei.
A aclamação em todo o território português fez-se, pacífica, e alegremente, desde Bragança ao Algarve, desde o Minho à Madeira, de Lisboa a Macau, passando pelo Brasil, África e Índia: excepto na cidade de Ceuta, que dependia excessivamente por então do suporte militar e alimentar por parte da sua vizinha Castela, a quem continuou ligada. Por todo o lado as populações explodiam de felicidade. Logo se escolheram os governadores provisórios do Reino, durante os poucos dias que decorreriam até à chegada de João à sua capital: Rodrigo da Cunha, arcebispo de Lisboa, Sebastião de Matos de Noronha, arcebispo de Braga, e o visconde de Vila Nova de Cerveira Lourenço de Lima, os quais deram ordem para os tribunais continuarem no exercício de funções, pois estava garantido o sossego da cidade. João IV chegou a Lisboa na noite de 6 de dezembro. Nos dias seguintes houve festejos, procissões e iluminações públicas. Enquanto se preparava a cerimónia da aclamação, o rei ocupava-se a nomear embaixadores, que deveriam partir a fim de que os países estrangeiros reconhecessem a alteração dinástica em Portugal, e generais, que deviam encarregar-se da defesa das fronteiras e dos portos. Ninguém tinha dúvidas que o tirano destronado Filipe III, e sobretudo o seu valido castelhano Olivares, não iriam cruzar os braços. Decerto este trataria de preparar exércitos para invadir Portugal. A notícia da aclamação da casa de Bragança chegou a Madrid a 7 de dezembro, levada por um estafeta castelhano ao serviço do governador de Badajoz. Como era de prever, os castelhanos acusaram de traição não só ao Duque de Bragança mas a todos os que tinham participado no movimento palaciano. No entanto, as tropas castelhanas não marcharam logo para a fronteira portuguesa porque estavam demasiado ocupadas e dispersas nos teatros da Guerra dos Trinta Anos, e nomeadamente com a revolta da Catalunha suportada militarmente pela França de Richelieu, o que deu tempo aos portugueses para se organizarem na defesa. No dia 15 de dezembro de 1640, foi alçado e aclamado solenemente em Lisboa João IV.
A cerimónia decorreu num grande teatro de madeira armada, revestido de preciosos panejamentos, contíguo à engalanada varanda do Paço da Ribeira, e com ela comunicante. Varanda pela qual saiu o novo rei em complicado e demorado cerimonial hierárquico para o Terreiro defronte aonde, diante da Nobreza, do Clero e do Povo de Portugal, jurou manter, respeitar, e fazer cumprir os tradicionais foros, liberdades e garantias dos Portugueses, violados pelo seu antecessor estrangeiro. Esteve o monarca rodeado dos mais altos oficiais-mores da corte portuguesa, fidalgos que em geral manteve nos cargos e dignidades áulicas que já exerciam anteriormente: o camareiro-mor João Rodrigues de Sá, o Condestável Francisco de Melo, marquês de Ferreira, o alferes-mor Fernão Teles de Meneses, 1º conde de Vilar Maior, o mordomo-mor Manrique da Silva, futuro, primeiro marquês de Gouveia, o reposteiro-mor Bernardim de Távora e o guarda-mor Pedro de Mendonça Furtado. A oração de praxe da aclamação, documento político-jurídico enunciando os direitos esbulhados da casa de Bragança ao trono português nesse dia restaurados, coube a um notável jurista que se destacaria depois também como diplomata, Francisco de Andrade Leitão. E depois do alferes-mor entoar em uníssono com todos os presentes, em alta voz, o triplo brado tradicional, Real, Real, por El-Rei Dom João de Portugal, o Conde de Cantanhede, presidente do Senado da Câmara de Lisboa, fez entrega ao rei das chaves da cidade, tendo então início o solene cortejo que processionalmente se dirigiu rumo à Sé, aonde foi celebrado um solene Te Deum de graças. É também de frisar que João IV, no acto da coroação, coroou rainha de Portugal a Nossa Senhora da Conceição, colocando-lhe aos pés a coroa de rainha, e que a partir desse momento ficou estabelecida como padroeira de Portugal. Esta acção repercutiu-se até hoje, na devoção dos portugueses a Nossa Senhora, patente no número largo de orações e cânticos que evocam Nossa Senhora e Portugal como pares. O irmão do rei. João IV tinha um irmão mais novo, Duarte de Bragança, infante de Portugal, que partira para a Áustria quatro anos antes da aclamação de seu irmão mais velho. Militar corajoso e competente, decidira participar na Guerra dos Trinta Anos. Em 1638 visitou Portugal e, como o Duque de Bragança nessa altura estava ainda renitente em aceitar a coroa e encabeçar uma rebelião, os conspiradores chegaram a pensar escolher Duarte para esse efeito, tal como haviam pensado, em último recurso, numa "República" estas ofertas no entanto podem não ter passado de oratória persuasiva por parte dos fidalgos mais jovens, junto da casa de Bragança, mais prudente. Seja como for, ainda não era hora, e caso este projecto relativo ao infante Dom Duarte tenha existido mesmo, sendo duvidoso que o aceitasse sem consentimento do irmão mais velho, o dito não se concretizou. Assim, aquele que alguns pensam que poderia ter tido hipótese de ter vindo a ser rei de Portugal acabou preso na Alemanha, porque o imperador Fernando III, também ele um Habsburgo, era aliado do destronado Filipe III de Portugal, seu primo. O pedido deste, em 1641, encarcerou o infante português. As esforçadas diligências diplomáticas portuguesas, arrastadas por muitos anos, não conseguiram libertá-lo, morrendo o infante solteiro e sem geração, ingratamente no cativeiro, à ordem do próprio soberano que fora servir.
Após a restauração, o problema militar era primordial. Um decreto de 11 de dezembro de 1640 instituiu o Conselho de Guerra formado por 10 membros com experiência militar: o conde de Óbidos, Matias de Albuquerque, Francisco de Faro, Gastão Coutinho, João Pereira Corte-Real, Álvaro de Abranches, Jorge de Melo, Fernão da Silveira, Jorge de Meneses e Vasco Fernandes César. Uma parte da nobreza e alguns prelados se mostraram hostis, e em Madrid assim que a «rebelião» do duque de Bragança foi conhecida, foi considerado traidor, versão que a diplomacia filipina espalhou nas capitais europeias. Os que viviam em Madrid recusaram a oferta de regresso e de perdão do monarca, «na inveja senhorial que mantinham pela casa de Bragança», segundo Veríssimo Serrão. Houve assim grave cisão no corpo da nobreza, que se confirma pelas tensas e lembranças concedidas desde 1641, e «a limpeza no tecido social alterou em muitas famílias o quadro da sucessão patrimonial, havendo muitos nobres que pagaram com o definitivo exílio o seu desamor ou falta de confiança na Restauração». A Guerra de Restauração foi um conjunto de confrontos armados travados entre o reino de Portugal e Espanha, com excepção da Catalunha, no período compreendido entre 1640 e 1668. Tiveram início no golpe de estado da Restauração da Independência de 1 de Dezembro de 1640 (que pôs fim à monarquia dualista da Dinastia Filipina iniciada em 1580) e terminaram com o Tratado de Lisboa de 1668, assinado por Afonso VI de Portugal e Carlos II de Espanha e no qual se reconhece a total independência de Portugal. Do decurso do reinado de D. João IV as hostilidades não se caracterizavam por encontros graves devido a coroa espanhola estar envolvida na Guerra dos 30 Anos e na revolta da Catalunha, pelo que não pôde dar uma resposta eficaz à revolta portuguesa. O que permitiu ao partido brigantino organizar e aperfeiçoar o seu exército com a chegada de novos efectivos e a utilização de oficiais e técnicos estrangeiros de qualidade. Houve lugar a vários confrontos na fronteira, maioritariamente na zona do Alto Alentejo, e ainda na Beira Alta.
A guerra arrastou-se durante 28 anos, vindo a paz a ser assinada já na regência de D. Pedro II. A 2 de Dezembro de 1640 D. João IV já se dirigia como soberano por carta régia datada de Vila Viçosa, à Câmara de Évora. O caminho a seguir era o da reorganização de todas as forças para o embate que se previa. Assim, resolve criar em 11 de Dezembro o Conselho de Guerra para promover em todos os assuntos relativos ao exército. Vem a seguir a Junta das Fronteiras que haveria de cuidar das fortalezas fronteiriças, da defesa de Lisboa, das guarnições e portos de mar. Dá-se, ainda em Dezembro de 1641, a criação da Tenência para assegurar o artilhamento das fortalezas com o produto das Terças dos concelhos. Posteriormente são restabelecidas as Leis Militares de D. Sebastião, visando reorganizar o exército. Paralelamente, desenvolve-se uma intensa actividade diplomática. Com as decisivas vitórias do partido brigantino, lograram-se criar condições para o reconhecimento da independência, o que viria a ser conseguido, em 1668, sendo já regente o infante D. Pedro (futuro Rei D. Pedro II). Neste último ano foi assinado o tratado de paz, terminado, assim, ao fim de 28 anos de luta, a Guerra da Restauração. Batahas:
Cerco de São Filipe
(1641-1642)
Comandante das forças portuguesas Francisco de Ornelas comandante do Forte de São Filipe.
Comandante das forças, espanholas Don Álvaro de Viveros comandante das forças espanholas.
Comandante das forças, espanholas Don Álvaro de Viveros comandante das forças espanholas.
Forças
Forças portuguesas-Desconhecido.
Forças espanholas-530 homens.
Baixas
Portuguesas-145 homens mortos e 172 homens desaparecidos.
Espanholas-342 homens mortos e 20 homens desaparecidos.
O cerco da Fortaleza de São Filipe, foi travada durante 11 meses a partir de 27 março de 1641 a 4 de Março 1642, perto de Angra do Heroísmo, Açores, entre Espanha e Portugal sobre o controle do referido forte. Depois de meses de intensos os combatentes portugueses foram vitoriosos e a guarnição espanhola foi derrotada com perdas muito pesadas. Quando da Restauração da Independência em Portugal (1640), as forças espanholas, sob o comando do Mestre-de-Campo D. Álvaro de Viveiros, aqui resistiram durante onze meses (de 27 de Março de 1641 a 4 de Março de 1642), ao cerco que lhes foi imposto por forças portuguesas, compostas pelas Ordenanças da Terceira às quais se juntaram as das demais ilhas, sob o comando de Francisco Ornelas da Câmara e João de Bettencourt. Tendo rendido-se com honras militares, foi-lhes permitido retirarem-se com as armas pessoais assim como duas peças de artilharia de bronze e respectiva munição. Os espanhóis deixaram para trás cento e trinta e oito peças de ferro e bronze de diversos calibres, trezentos e noventa e dois arcabuzes, cerca de quatrocentos mosquetes e copiosa munição. Na posse portuguesa, o conjunto foi colocado sob a invocação de São João Baptista, em homenagem a D. João IV de Portugal, erguendo-se a igreja, sob a invocação do mesmo padroeiro, a partir de 1645. Há notícia de que, em 1658, se fazia "um baluarte na parte mais necessitada desta fortaleza (...) com que fica fechada por todas as partes de que muito necessitava", embora não se consiga precisar a natureza dessas obras: se de construção, reconstrução ou manutenção. Do mesmo modo, em 1662 "corriam as obras do Castelo, cuja despesa de jornais e macames concernentes a elas valiam quase tanto como os mesmos soldos dos soldados e oficiais". Na segunda metade do século XVII, os paióis da fortaleza abasteciam de pólvora as demais fortificações da Ilha.
Na cidadela da fortaleza habitavam não apenas os militares solteiros, mas também os casados (com as respectivas famílias) e os reformados (solteiros ou não). Nas encostas do Monte Brasil, mantinham as suas culturas de subsistência. Em finais do século, a irmandade do Espírito Santo do Castelo constituía-se em uma das mais ricas da cidade.
Montijo
(1644)
Comandante das forças portuguesas, Matias de Albuquerque.
Comandante das forças, espanholas Marquês de Terrecusa.
Forças
Forças portuguesas-6.000 homens-1.100 cavaleiros-7 canhões.
Forças espanholas de 6.000 a 7.000 homens, de 2.100 a 2.500 cavaleiros, de 4 a 6 canhões.
Baixas
Forças portuguesas-900 homens.
Forças espanholas-3.000 homens.Matias de Albuquerque
Matias de Albuquerque (Lisboa, c. 1580-Lisboa, 9 de junho de 1647) foi um administrador e militar superior português na Guerra da Restauração. Foi Governador da Capitania de Pernambuco, Governador Geral do Brasil e o primeiro e único Conde de Alegrete. Era neto de Duarte Coelho Pereira, o primeiro donatário da Capitania de Pernambuco, e primo de Matias de Albuquerque, 15.º vice-rei da Índia. No exercício do governo da capitania de Pernambuco, quando da primeira das Invasões holandesas do Brasil (1624-1625), à capital do Estado do Brasil, Salvador, foi designado interinamente pela Câmara (então refugiada na vila da Vitória, na Capitania do Espírito Santo) para o cargo de Governador-Geral dos Estados do Brasil, diante da captura e deportação do seu antecessor, D. Diogo de Mendonça Furtado (1621-1624). Assim que foi informado da nomeação, pretendeu partir imediatamente em socorro da capital ocupada. Atendendo a conselhos, permaneceu em Olinda, de onde enviou expressivos reforços para a guerrilha sediada no arraial do rio Vermelho e no Recôncavo. Em fins de 1626 transmitiu o cargo a seu sucessor, Diogo Luís de Oliveira (1626-1635). Chamado à Corte, diante dos rumores da preparação de uma grande expedição holandesa para invadir o nordeste do Brasil, foi nomeado Visitador e fortificador das capitanias do Norte, retornando em fins de 1629 ao Brasil com os pouquíssimos recursos que lhe foram disponibilizados para o encargo. Assim mesmo, enfrentou em fevereiro de 1630 a segunda das invasões holandesas, em Olinda e Recife, sendo forçado a recuar diante da superioridade dos atacantes. Incendiou os armazéns do porto do Recife, impedindo o saque do açúcar pela Companhia Holandesa das Índias Ocidentais (WIC). Reorganizou a defesa luso-espanhola a partir do Arraial Velho do Bom Jesus, a meia-distância entre Olinda e Recife, confinando os agressores ao perímetro urbano daquela povoação e vila até 1634. Após o cerco e destruição do Arraial do Bom Jesus, foi forçado a recuar com suas forças para a Capitania da Bahia. De passagem por Alagoas, reconquistou temporariamente Porto Calvo, capturando na ocasião Domingos Fernandes Calabar, que julgou e sentenciou à morte por enforcamento, pelo crime de traição. Intimado a retornar a Portugal, foi responsabilizado pela perda de Pernambuco e detido no Castelo de São Jorge. Libertado com a Restauração da independência em 1640, foi designado governador das armas para o Alentejo, onde complementou as defesas da Praça-forte de Olivença, da praça de Elvas e da praça de Campo Maior.
Ao vencer a batalha do Montijo contra os espanhóis (1644) confirmou os seus méritos de militar (general), sendo recompensado com o título de 1º conde de Alegrete. Acerca desse feito, em 26 de Maio, junto ao Montijo, assim teria exortado os soldados portugueses ao combate: "No sucesso de hoje, consiste a conservação de nossas vidas, a liberdade da nossa Pátria e a opinião da nossa monarquia... A pelejar, valorosos portugueses, que o inimigo vem chegando! A pelejar, que é o mesmo que mandar-vos a vencer!" Foi o único possuidor do título condal, que perdeu em 1646, vindo a falecer pouco depois, no ano seguinte (1647). Entrou o ano de 1644, e logo mostraram em Alentejo as prevenções de uma e outra parte, que havia de ser a guerra mais vigorosa e melhor disputada que a dos anos antecedentes. Mandou el-rei a Matias de Albuquerque, que partisse de Lisboa, onde estava, a continuar o seu Governo. Passou ele logo para Estremoz, levando consigo, além de outros aprestos, dinheiro para pagar aos soldados e para remonta da cavalaria, e certeza de se aumentarem os terços de infantaria com levas novas. Chegando a Estremoz, foi preparando com suma brevidade tudo o que julgou conveniente para conseguir os progressos da campanha futura.
O CONDE DA ERICEIRA DOM LUÍS DE MENESES
Este excerto sobre a batalha do Montijo mostra bem a capacidade historiográfica do conde da Ericeira, com a explicação clara do contexto da batalha, da intenção dos actores, e do resultado da acção, tudo num discurso claro e entrecortado de pormenores interessantes, com descrição de acções dramáticas que agarram o leitor, incluindo os discursos das principais personagens, exactamente como os historiadores clássicos o tinham feito e sobretudo Tucídides na sua História da Guerra do Peloponeso.
El-rei Católico, sentido das desgraças sucedidas o ano antecedente, mandou retirar o Conde de Santo Estêvão, e entregou o governo daquele exército ao Marquês de Torrecusa, avaliado em Castela por um dos melhores soldados e de valor mais conhecido que serviam aquela Coroa. Saiu ele de Madrid com todas as ordens necessárias para ajustar o exército e aumentar as tropas. Tanto que chegou a Badajoz, determinou, sem perder tempo, acreditar a grande opinião que havia adquirido. Juntou 1.500 cavalos e mil infantes e mandou interprender o castelo de Ouguela, de tão pequena circunvalação, como temos mostrado. Não se achavam nele mais que 45 soldados de guarnição, de que era capitão Pascoal da Costa. Chegou o inimigo quando rompia a manhã, e sendo sentido das sentinelas, se preveniram os da guarnição para a defesa do castelo. Arrimaram os castelhanos as escadas que traziam, e juntamente um petardo que levou a porta, que não puderam entrar os que a avançaram; e achando os que subiram valorosa resistência, depois de três horas de porfia se retirara;», deixando as escadas e 20 soldados mortos, e levando muitos feridos. Teve em Estremoz Matias de Albuquerque esta notícia, e brevemente passou a Elvas a dispor a satisfação. Mandou ao tenente general da cavalaria D. Rodrigo de Castro que, com 2.500 infantes e 260 cavalos, fosse queimar a vila de Montijo; e ao Monteiro‑Mor, que marchasse com 300 cavalos a dar calor a D. Rodrigo. Era Montijo de 300 fogos, rodeada de Lima trincheira muito levantada; tinha de guarnição quatro companhias de infantaria e uma de cavalos, fora os paisanos. Chegou D. Rodrigo a Montijo, e não obstando a defesa dos castelhanos, entraram os nossos soldados as trincheiras e começaram a saquear e pôr fogo à vila, quando apareceram mil cavalos do inimigo, que saíram de Badajoz ao rebate. Retirou D. Rodrigo a infantaria, e chegando o Monteiro‑Mor, marcharam formados a buscar os castelhanos.
Não querendo eles pôr o sucesso em contingência, voltaram as costas, e sendo carregados das nossas tropas levemente, por estarem muito distantes, passaram Guadiana, deixando alguns soldados mortos. Retirou-se o Monteiro‑Mor, e o Marquês de Torrecusa em contraposição deste sucesso mandou entrar um grosso de cavalaria pelo termo de Portalegre, que levou algum gado, não perdoando às vidas dos miseráveis lavradores. Matias de Albuquerque, querendo que os castelhanos sentissem por todas as partes os fios das nossas espadas, ordenou ao mestre de campo D. Nuno Mascarenhas, governador de Castelo de Vide, que fosse queimar o lugar de Membrilho, nove léguas distante daquela praça, abundante, rico e de 100 fogos. Para este efeito mandou incorporar com ele o tenente de mestre de campo general Diogo Gomes de Figueiredo, que levava 300 cavalos e alguns dragões. Com esta gente, a do seu terço e 150 cavalos mais, marchou D. Nuno e, mandando de vanguarda Diogo Gomes, chegou ao lugar que entrou logo, saqueou e queimou, com perda de sete soldados e nove feridos, em que entrou o capitão Inácio Pereira de Aragão. Deste lugar passou Diogo Gomes ao de Soloriño, que achou despovoado, e com grande despojo se tornou a incorporar com D. Nuno. Quando se retiravam, tomaram alguns cavalos de umas tropas que acudiram de Albuquerque. Passado este sucesso, logrou o Monteiro-Mor outro de muita reputação. Soube que alojava em Vila Nova de Barca Rota D. Francisco de Velasco, tenente general da cavalaria castelhana, com 500 cavalos. Ajuntou outros tantos, alguns dragões e 600 infantes, e marchou para Vila-Nova. Foi sentido antes de ter chegado, e D. Francisco de Velasco montou com todas as tropas, e ocupou um monte distante da vila para a parte oposta da nossa marcha. O Monteiro-Mor, vendo baldada a ocasião de desbaratar estas tropas, mandou ao mestre de campo Eustáquio Pich a reconhecer a vila e castelo. Achou ele o castelo capaz de maiores prevenções, e concordaram todos em atacar a vila que era de 700 fogos, e uma das melhores daquele distrito. Assim se executou, e sendo mal defendida, foi facilmente entrada. Saquearam-na os nossos soldados, e puseram-lhe o fogo, sendo as tropas inimigas testemunhas deste dano, que não custou mais que a vida de um soldado e 16 feridos. Retirou-se o Monteiro-Mor para Alconchel, nove léguas distante, e dentro de poucos dias passou a Campo Maior a se incorporar com Matias de Albuquerque, o qual, havendo gasto alguns dias em prevenir o que julgou necessário para sair em campanha, se resolveu a buscar caminho de desenganar a confiança do Marquês de Torrecusa. Passou de Elvas a Campo Maior, onde ajuntou 6.000 infantes, 1.100 cavalos e seis peças de artilharia, as munições necessárias e bagagens que levavam mantimentos para vinte dias.
Era o Barão soldado valoroso e prático, e levava a D. Dionísio Gusmão, general da artilharia, exercitando o posto de mestre de campo general. Dividiram os dois a infantaria em 9 corpos e a cavalaria em 34 esquadrões, e fazendo de toda esta gente uma só linha com duas peças de artilharia nos dois lados direito e esquerdo da infantaria, levando a forma de um meio círculo, marcharam a atacar a batalha, porque chegando o mestre de campo D. Francisco de Luna y Carcamo com nova ordem do Marquês para que pelejassem, se resolveu o Barão a não cansar a fortuna mais que com uma só experiência, tomando juntamente por fundamento investir com aquela grande frente, a frente e os flancos do nosso exército, supondo-o desbaratado tanto que o visse confundido. Tão pouco crédito conseguiu naquele tempo a nossa disciplina. Enquanto o Barão de Molingen se detinha nestas disposições, marchava Matias de Albuquerque por aquela campanha, com grande vagar, porque levava o exército em batalha. Havia dividido a infantaria em dez corpos e a cavalaria em onze batalhões; com seis ocupava o lado direito o Monteiro-Mor, e com cinco o esquerdo o comissário geral, Gaspar Pinto Pestana, entrando neles 150 cavalos holandeses, governados pelo capitão Piper. Entre as tropas marchavam mangas de mosqueteiros, e as seis peças de artilharia ocupavam os claros dos terços da vanguarda. As bagagens iam cobertas com os carros, e estes guarnecidos com 400 mosqueteiros. A infantaria marchava em duas linhas, a da vanguarda era na marcha a retaguarda, porque o inimigo ficava daquela parte. Caminhavam as carruagens na vanguarda do exército, para que, voltadas as caras ao inimigo (como sucedeu), ficassem na retaguarda dele. Aconselharam alguns oficiais práticos a Matias de Albuquerque que, na consideração da inferioridade do poder, arrimasse o exército a um bosque que lhe ficava pouco distante, e que sem dúvida o ganharia antes que o inimigo chegasse. Porém ele, ou tendo por arriscado presumirem os muitos soldados novos que levava que era receio esta arte, ou entendendo que para vencer lhe não era necessário melhorar de sítio, não quis usar do conselho e continuou a marcha sem alterar o passo nem mudar a ordem. Eram nove horas, quando os castelhanos chegaram à vista do nosso exército. Matias de Albuquerque, com aspecto constante e belicoso, com alentado espírito e diligência incomparável, mandou fazer alto aos soldados e que voltassem as caras aos castelhanos, proporcionou os claros, compassou as fileiras e perfilou as filas; cobriu com os carros o lado direito do exército e parte da retaguarda; todo o mais corpo ficou descoberto, podendo amparar-se dos mesmos carros, descuido que pôs a vitória em contingência.
Guarneceu as bagagens, fez preparar artilharia, e o tempo que o inimigo gastou em chegar a atacar a batalha, teve ele de animar aos soldados com as razões seguintes: «Privilégio antigo é da Nação portuguesa não depender de incentivos para as acções grandes. Porém, é necessário, valorosos soldados, que vos lembreis da justiça com que coroastes o Príncipe a que obedecemos, e da tirania com que fomos tratados o tempo que nos dominaram estes mesmos inimigos, que agora temos presentes. Pela primeira razão acharemos «propício ao Deus dos Exércitos que, além de assistir sempre à parte justificada, empenhou no Campo de Ourique a sua palavra na vossa defesa e duração deste Império. A segunda vos obriga a que, valorosos, vos satisfaçais dos agravos 60 anos padecidos. E como a alma, e a honra igualmente são nos portugueses os dois poios da vida, considerada a injúria e presente a causa dela, nem se pode escusar a batalha, nem duvidar da vitória. Esta é a mesma Nação que nossos antepassados sempre venceram, e estes são os mesmos castelhanos de que nos anos próximos em todas as fronteiras temos triunfado. Vêm eles a pelejar em uma só linha (temeridade nunca ouvida) e a causa é porque não puderam ajuntar mais que a gente que vedes. Peço-vos que resistais o primeiro impulso, e seguro-vos que tereis vencida a batalha, porque não ficam ao inimigo reservas donde se torne a formar a confusão deste primeiro impulso. Deve lembrar-vos que, com igual exército ao que temos no campo de Montijo, venceu o glorioso rei D. João I no campo de Aljubarrota a el-rei D. João I de Castela, que trazia trinta mil homens. Reparai ultimamente em que o Marquês de Torrecusa fica em Badajoz, não tendo causa que o impossibilite para se achar na batalha, mais que o temor de perdê-la. E se o general do exército inimigo vos confessa na imaginação a vantagem, como podereis vós deixar de conseguir na realidade a vitória? No sucesso de hoje consiste a conservação de nossas vidas, a liberdade da nossa Pátria e a opinião da nossa Monarquia. Bem conheço do vosso valor, que antes aceitareis morte infalível que vida afrontosa. E não vos peço que observeis as minhas acções, porque fio tanto do alentado espírito que a todos vos anima, que espero achar em cada braço vosso um conselheiro para o mundo e para comigo. E tempo de acreditardes esta opinião. A pelejar, valorosos portugueses, que o inimigo vem chegando! a pelejar, que é o mesmo que manda-vos a vencer!» Não estava neste tempo ociosa a diligência do Barão de Molingen, porque, enquanto marchava o seu exército com vagarosos passos a atacar a batalha, dizem que falou aos seus soldados neste sentido: «O antigo estilo, animosos soldados, de persuadir o valor com razões eloquentes em semelhantes conflitos, perde hoje totalmente o exercício, assim porque sendo nos castelhanos vida o pelejar e o vencer costume, como por serem os contrários, que se nos oferecem, pequeno triunfo apara os nossos braços. Com onze batalhões de cavalaria, como divisamos, trazendo nós trinta e quatro, e com igual número de infantaria, se resolvem os portugueses a esperar a batalha na campanha rasa. E tem tão pouca notícia da arte militar que, tendo carros para cobrir os flancos e a retaguarda, nos deixam para investir desembaraçado o corno esquerdo. Esta desatenção que observo me obriga a levar em uma só linha todo o exército porque com esta estendida e dilatada frente havemos de conseguir investir com tanto poder e tão furiosamente ambos os dois lados do exército dos portugueses, que sem dúvida, ou fugirão as suas tropas antes de avançarmos, ou, se aguardarem, serão desbaratadas, e ficará depois a infantaria fácil emprego dos nossos golpes. Nesta confiança vos dou desde logo graças do feliz princípio com que me hospedais nesta província, benefício que espero remunerar-vos sendo com Sua Majestade Católica verdadeiro mediador dos vossos interesses depois de restaurado Portugal, infalível consequência da vitória que brevemente conseguiremos. Segui-me todos, antes que os portugueses, arrependidos de aguardar a batalha, nos façam, voltando as costas, menos gloriosa a vitória.»
Fora desculpável este seu engano, se fora possível esquecerem-se da valorosa nação com que pelejavam, a qual neste dia, cobrando nova vida, conquistou imortal glória. Matias de Albuquerque, acudindo com invencível valor a todas as partes, lhe mataram o cavalo. Vendo Henrique de Lamorlaye, valoroso francês, capitão da sua guarda, o risco do seu general, defendendo-lhe a vida às cutiladas e desprezando gloriosamente a sua, se desmontou e lhe deu o seu cavalo, cobrando depressa e galhardamente outro. Montado, Matias de Albuquerque, se uniu com o general da artilharia D. João da Costa, o qual, excedendo a todo o encarecimento, havia pelejado como destríssimo capitão, e como soldado de valor incansável discorria por todas as partes, unindo estes e animando aqueles, e, encontrando-se com um capitão de cavalos castelhano, se investiram; matou-o às estocadas e recebeu das suas mãos uma grande cutilada na cabeça, querendo a fortuna que o mesmo sangue servisse ao seu valor de esmalte e de coroa. Tanto que se encontraram, ele e Matias de Albuquerque deliberaram restaurar o dano padecido ou sacrificar as vidas a tão glorioso empenho. Ajuntaram-se com os mestres de campo Luís da Silva, João de Saldanha, Francisco de Melo e Martim Ferreira, os quais com valor extraordinário haviam pelejado, e com o tenente de mestre de campo general Diogo Gomes de Figueiredo, que teve grande parte no sucesso deste dia, e tornaram a unir os terços, compondo-se os corpos que formavam dos soldados, de todos eles sem distinção. Com esta gente e 40 cavalos de várias tropas, que ajuntou Henrique de Lamorlaye, avançou Matias de Albuquerque e os que o acompanhavam, com as espadas na mão, contra os castelhanos, que andavam divididos despindo mortos e roubando carros. Tornaram logo a restaurar a artilharia que haviam perdido, e, fazendo-a D. João da Costa voltar brevemente contra o inimigo, jogou com maravilhoso efeito. Vendo os castelhanos, que eram investidos dos mesmos que julgavam sepultados, se assombraram de sorte que, depois de resistirem alguns menos ocupados do receio, foram todos desbaratados, e não dando a ira lugar à misericórdia, negaram os nossos soldados quartel a todos os inimigos que encontravam. Marcharam com este furor depois de seis horas de conflito, e obrigaram ao Barão de Molingen a passar Guadiana com nove tropas e três terços, que pôde ajuntar dos que fugiam, e com tanto desacordo se arrojaram os castelhanos ao rio, que muitos levou a corrente. Eram três horas da tarde quando se acabou a batalha. Mandou Matias de Albuquerque tocar a recolher, formou os terços e fez ajuntar os feridos, acomodou-os nos carros, e esteve formado na campanha até cerrar a noite, por que lhe não ficasse circunstância alguma de vitorioso. Enquanto durou a batalha, se havia ajuntado no bosque de Xévora a maior parte da nossa cavalaria, que se tinha retirado, e havendo entre os oficiais votos que tornassem a buscar o inimigo, antes de tomarem resolução, ouviram disparar a nossa artilharia quando a recuperámos, e, infelizmente, inferiram que era salva com que os castelhanos celebravam a vitória. Obrigados desta suposição detiveram o primeiro impulso, e mandaram oito alferes a reconhecer a campanha da batalha; e como estes, chegando ao exército, viram conseguida a vitória, não tornaram a voltar, e as tropas, tardando-lhes o aviso, se retiraram para Campo Maior. Matias de Albuquerque, tanto que cerrou a noite, se pôs em marcha, e mandou diante ao mestre de campo João de Saldanha, com o seu terço, a segurar o porto de Xévora, onde Matias de Albuquerque chegou na madrugada do dia seguinte, e achou incorporada com João de Saldanha a cavalaria, que havia voltado de Campo Maior. Depois de algumas horas de dilação, marchou o exército para esta praça, levando menos 900 soldados, entre mortos e prisioneiros. Os mortos de maior posto e qualidade foram os mestres de campo D. Nuno Mascarenhas e Aires de Saldanha, os quais pelejaram largo espaço com valor insigne e acções dignas de eterna memória; João de Saldanha da Gama, capitão de cavalos, estimado em todo o exército pelo grande valor e heróicas partes que era dotado; Bartolomeu de Saldanha, capitão de infantaria, Rodrigo Starch, capitão de cavalos holandês, e os sargentos-mores Jerónimo Ferrete e Belchior do Crato, oito capitães de infantaria e outros oficiais.
Os prisioneiros que levaram, logo que se começou a batalha, foram o mestre de campo Eustáquio Pich, os capitães de cavalos Fernão Pereira e o conde Francisco Fiesco, genovês, Manuel de Saldanha, Jorge de Melo e D. Francisco de Almada, capitães de infantaria; Nuno da Cunha e Francisco Correia da Silva, que serviam de soldados, com muitas feridas, e D. Diogo de Meneses, capitão de cavalos, o qual, antes de se começar a batalha, recebeu uma bala em uma perna, que encobriu aos seus soldados, e investiu logo tão valorosamente as tropas inimigas que, rompendo com alguns soldados as que achou diante, veio a cair com cinco feridas mortais na retaguarda de todas, e ficando na campanha toda a noite entre os mortos, foi o dia seguinte despido pelos paisanos de Lobon, e, reconhecendo que estava vivo, o levaram em um carro com excessiva moléstia a Badajoz, onde o curaram com tão pouco cuidado que, depois de um ano que esteve na cadeia da cidade de Carmona, veio a morrer em sua casa das feridas que recebeu na batalha. Os mais prisioneiros padeceram em Granada os excessos mais escandalosos que em tempo algum se experimentaram entre católicos, prevalecendo o ódio contra a piedade e comiseração de que sempre foram dotados os castelhanos. Perderam eles na batalha os mestres de campo D. José de Pulgar, D. Francisco de Luna, corregedor de Badajoz, D. Diogo Giraldino, irlandês, e João Rodrigues de Oliveira, português; nove capitães de cavalos, quarenta e cinco de infantaria, outros muitos oficiais e mais de três mil soldados.
Fora maior a perda se a nossa cavalaria voltara à batalha, como no bosque teve determinado. Recolheu Matias de Albuquerque 4.500 armas dos castelhanos mortos e dos que as largaram quando fugiram. Esta foi a primeira batalha que depois da Aclamação os portugueses ganharam aos castelhanos; e consideradas as notáveis circunstâncias dela, merece ser celebrada por uma das mais insignes acções que têm acontecido no mundo. Porque poucas vezes se tem visto ficar vencedor exército que no princípio da batalha foi tão desbaratado; e é certo que nem os nossos soldados souberam dar-lhe princípio, nem os castelhanos acaba-la, como depois confessou o Marquês de Torrecusa. De todos os que a ganharam se referem tantas acções heróicas, que é impossível o particularizá-las, e basta o sucesso para elogio de qualquer dos vencedores. Chegou a nova da vitória a Lisboa, e mandou El-Rei soleniza-la, com grandes festas e, repartindo as notícias pelas nações, cobraram maior reputação as suas armas. O Marquês de Torrecusa não conseguiu maior alívio na desgraça que padeceu o exército que governava que não se haver achado na batalha, e em adivinhar o futuro colheu o fruto das experiências militares que em tantos anos de guerra havia granjeado. Aplicou-se com grande atenção a levantar infantaria para tornar a formar os terços, e a comprar cavalos para remontar as tropas. Uma e outra diligência conseguiu brevemente, acudindo com grande prontidão a remediar o dano padecido. Vendo-se o Marquês com poder bastante para procurar alguma satisfação, ajuntou 5.000 infantes e 1.800 cavalos, e entregando-os ao Barão de Molingen, o mandou que fosse queimar as aldeias de Santo Aleixo e Sáfara, vizinhas à praça de Moura. O Monteiro-Mor, que já estava em Olivença, teve aviso de que o inimigo ajuntava poder.
Deu conta a Matias de Albuquerque, a quem El-Rei, pela vitória alcançada, havia feito mercê do título de Conde de Alegrete. Havia ele de Campo Maior passado a Elvas; tanto que recebeu esta notícia, despediu logo a D. Francisco de Sousa, já naquele tempo conde do Prado, e a Diogo Gomes de Figueiredo com os seus terços e duas tropas a guarnecer Moura, fazendo primeiro aviso a D. Henrique Henriques, que governava aquela praça, do poder que o inimigo juntava, para que estivessem prevenidas todas aquelas que recebessem esta notícia. Quando ela chegou a Santo Aleixo, já o inimigo vinha perto da aldeia, e não tiveram os moradores mais tempo para se prevenirem que o que bastou para guarnecer a fraca trincheira que a cercava e um pequeno e mal defendido reduto que rodeava a Igreja. Achavam-se na aldeia 200 homens, que podiam tomar armas, governados pelo capitão Martim Carrasco, e não estavam as aldeias guarnecidas de infantaria paga, porque o Conde de Alegrete havia mandado despovoá-las e passar a gente a Moura, ordem que eles não quiseram executar, fiados na resistência que haviam feito ao inimigo.
Arronches
(1653)
Comandante das forças portuguesas, André de Albuquerque Ribafria.
Comandante das forças, espanholas Bustamante.
Forças
Forças portuguesas-total-950 cavaleiros.
Forças espanholas-total 1.300 homens, 100 homens e 1.200 cavaleiros.
Baixas
Forças portuguesas-Desconhecido.
Forças espanholas- Muito Elevadas.
André de Albuquerque Ribafria
O historiador militar Gastão de MeIo de Matos traçou-lhe já, na sua monumental «Vida de André de Albuquerque Ribafria», as linhas de tão fulgurante carreira e os eventos da época em que viveu e que aqui transcrevemos: «Em princípios de 1641 foi nomeado capitão de infantaria para o Alentejo, onde ficou largos anos sem vir à Côrte, ao contrário do que faziam a maior parte dos oficiais. Tomou parte em muitas das operações de pequena guerra e em 1642 foi promovido a Mestre de Campo. Em 1643, os portugueses tomaram a ofensiva, apoderando-se de algumas praças secundárias, e tentando um infrutuoso ataque a Badajoz; em 1 de Setembro, no ataque de Alconchel, foi ferido André de Albuquerque, que em Outubro foi nomeado governador de Villa Nueva del Fresno, uma das praças conquistadas. Daqui passou com o seu terço à guarnição de Campo Maior e, mais tarde, à de Elvas. Em 1645 tomou parte numa empresa contra Badajoz. Durante todo este tempo, recebeu muitas cartas régias de agradecimento e em 1646, foi promovido a general de artilharia, com prejuízo de mestres de campo mais antigos. Como tal, comandou o ataque e tomada de Codesseira e teve papel importante noutras operações», exerceu por vezes interinamente, o governo das armas da província e foi, em 1650, promovido a general de cavalaria. Parece ter introduzido novos processos tácticos e, sobretudo, deu à Cavalaria uma capacidade de combate muito superior à que tivera, tornando-a melhor que a cavalaria espanhola. Comandou o vitorioso combate de Arronches. E se no violento recontro tombou o general espanhol Conde de Amarante, o próprio Ribafria foi gravemente ferido no rosto, atravessado de lado a lado por uma estocada, atropelado no chão da batalha por duas cargas de cavalaria e dado por morto, o que milagrosamente não sucedeu.
Vitoriosos os portugueses e praticamente decidida a batalha, «já em toda a parte hião os inimigos cedendo a vitória às nossas armas, estando a sua infantaria rôta e a cavalaria descomposta, quando a intempestiva desordem com que o terço foi perdendo o terreno na conquista de um forte que se defendia com valerosa constância, obrigou a vir àquela parte o General André de Albuquerque. Não sofreu o alentado coração de este herói que na sua presença dessem os nossos soldados o menor sinal de fraqueza, e, querendo animá-los com o exemplo, arrojou o cavallo ao fosso do forte». Neste transe os levou até junto da estacada, repelindo os fugitivos com a bengala ao mesmo tempo que com a mesma tocava as estacas mostrando como deviam ser arrancadas. Tendo um braço levantado uma bala de mosquete entrou-lhe por um sovaco, não protegido pela couraça, ferindo-o mortalmente. Já não pronunciou palavra e, não caindo imediatamente do cavalo, foi o corpo amparado pelo vedor-geral Jorge da Franca e pelo contador António de Torres, que valorosamente o acompanhavam. A batalha fora, entretanto, ganha, não tanto pela direcção de Marialva, que um informador francês da época desdenha, mas porque «exeoutée par les ordres et le courage de André Albuquerque». Estava dado o golpe mortal nas forças invasoras. Foi o cadáver de André de Albuquerque levado para Elvas onde esteve exposto na Igreja de Santa Maria de Alcáçova. Daí, com soleníssima pompa militar, foi levado a sepultar na Igreja de São Francisco dos Capuchos, no dia 16 de Janeiro, na Capela de Santo António. O Visconde de Vila Nova de Cerveira, em carta à Rainha D. Luísa de Gusmão terá, porventura, expresso do melhor modo o sentimento do geral dos contemporâneos: «... e beijo a Vossa Majestade os pés pelo sentimento que Vossa Majestade me significa do falecimento de André de Albuquerque Ribafria, tão digno da estimação que Vossa Majestade devia fazer do seu heróico valor e grandes serviços, logrou a felicidade de dar a vida pela defesa da Coroa de Vossa Magestade e pela liberdade da sua Pátria, ditoso e glorioso fim que o consumou em varão tão insigne como suas grandes partes mereciam».
Filho de, Gaspar Gonçalves de Albuquerque Ribafria (Sintra, cerca de 1576/1577-20 de Julho de 1636), cavaleiro da Ordem de Cristo (15 de Junho de 1633), 3.º Alcaide-Mor do Castelo e Vila de Sintra (30 de Agosto de 1632), senhor da Torre de Ribafria e da comenda de São Mamede de Sortes, filho de Gaspar Gonçalves Ribafria, 2.º Alcaide-Mor do Castelo e Vila de Sintra. D. Ângela de Noronha, natural de Elvas, filha de D. Pedro Lobo e de sua 2.ª mulher D. Brites da Silveira. Não casou André de Albuquerque Ribafria; o Conde da Ericeira diz-nos que à data da morte estava justo para casar com D. Ana de Portugal, que acabou solteira, filha de D. João de Almeida «o formoso» que foi Vedor da Casa de D. João IV, comendador da Ordem de Cristo, Alcaide-Mor de Alcobaça, Reposteiro-Mor de D. Afonso VI. Em Olivença e ainda muito novo, terá seduzido certa donzela com promessas de casamento; era ela D. Catarina de Monroy, de fidalga geração, filha do castelhano Alfonso Vasquez de Sotto, de Alconchel, e de sua mulher D. Joana de Brito e Monroy, de Elvas. Desses amores nasceu D. Ângela Maria de Albuquerque nascida na freguesia da Sé, em Elvas, cerca do ano de 1650 e recolhida no Convento de Santos sob os cuidados de sua tia paterna D. Francisca da Silva, que aí professara. Parece não ter sido legitimada, ainda que reconhecida e, ao que parece, beneficiada por disposições paternas. Sabe-se que, quer sua tia D. Francisca, quer o Conde de Soure, antigo companheiro de Ribafria, desde muito cedo se empenharam junto ao Trono para a beneficiar. E tanto assim que, dotando-a com várias tenças paternas e as comendas de S. Mamede de Sortes e da Redinha, lhe procurou o Monarca o casamento com D. António de Menezes Sottomayor «o de Formoselhe», Comendador da Ordem de Cristo e 5.º Alcaide-Mor de Sintra pelo seu casamento, cargo que ainda detinha em 1709. D. Angélica Maria de Albuquerque, que casara com cerca de 14 ou 15 anos, pouco viveu em Ribafria aonde se acolhera com o marido, morrendo muito nova sem filhos.
A Batalha de Arronches foi um choque de cavalaria envolvendo forças portuguesas e espanholas perto de Arronches, Portugal. Foi um dos episódios mais conhecidos da Guerra da Restauração, travado em 8 de Novembro de 1653 algures entre Arronches e Assumar (o local exacto não é conhecido com precisão, mas seria pouco distante de Arronches). A vitória obtida pela cavalaria portuguesa comandada por André de Albuquerque Ribafria abriu caminho a alguns meses de iniciativa e supremacia dos portugueses naquela fronteira de guerra, permitindo inclusivamente a tomada de Oliva.
Neste choque estiveram envolvidos 950 homens de lado português e 1.300 homens do lado espanhol, sendo 1.200 soldados de cavaria e 100 de infantaria, comandados pelo comissário geral Bustamante. Após a mesma refega o general André de Albuquerque teve se transportar numa liteira e um braço imobilizado para manter o comando e assim recuperar das pisaduras sofridas no combate (onde caíra do cavalo logo no início da refrega e fora atropelado pela sua própria cavalaria, tendo sido mesmo dado como morto) quando lhe foi atribuído o comando da operação.
Linhas de Elvas
(1659)
Comandante das forças portuguesas, D. António Luís de Meneses.
Comandante das forças, espanholas D. Luís de Haro.
Forças
Forças portuguesas-total-10.500 homens-8.000 homens de infantaria, 2.500 homens de cavalaria, artilharia 7 canhões.
Forças espanholas-total-17.500 homens-14.000 homens de infantaria, 3.500 homens de cavalaria, artilharia 19 canhões, e 3 morteiros.
Baixas
Forças portuguesas-200 homens.
Forças espanholas- 9.000 homens de infantaria e 4.700 de cavalaria.
Luís de Haro y Guzmán
A Batalha das Linhas de Elvas, foi travada em 14 de janeiro de 1659, em Elvas, entre portugueses e espanhóis. Em 1658, o exército espanhol, comandado por D. Luís de Haro, acampava na fronteira do Caia, com 14.000 homens de infantaria, 5.000 de cavalaria,19 canhões (na verdade apenas 18 entraram em batalha, pois um perdeu uma roda no meio do caminho) 3 morteiros (155 mm.) de artilharia. Alguns dias decorreram em preparativos quer no lado espanhol para o cerco de Elvas, quer por parte dos portugueses para defenderem a cidade. D. Luís de Haro distribuiu as suas tropas ao longo de entrincheiramentos cercando a praça, dando ordem para que fosse exercida apertada vigilância a fim de impedir que Elvas recebesse mantimentos ou qualquer outra espécie de auxílio vindo do exterior, de tal modo que só a chegada de um verdadeiro Exército poderia evitar mais cedo ou mais tarde, a capitulação da praça.
A rainha D. Luísa resolveu chamar D. António Luís de Meneses, conde de Cantanhede, para lhe entregar o comando geral das tropas portuguesas no Alentejo, e transferir para o mesmo teatro de operações D. Sancho Manuel, que foi assumir as funções de Mestre-de-campo-general. As tropas espanholas instaladas nas duas colinas mais próximas começaram a bombardear a praça de Elvas, causando pânico e grandes baixas na população. Mas o maior perigo era a peste que causava cerca de 300 mortes por dia. Mediante tal situação, o conde de Cantanhede, D. António Luís de Meneses reuniu em Estremoz um exército a fim de socorrer aquela praça do cerco espanhol. Apesar de grandes dificuldades, que o obrigaram a organizar recrutamentos em Viseu e na ilha da Madeira, e reunir as guarnições de Borba, Juromenha, Campo Maior, Vila Viçosa, Monforte e Arronches, o conde de Cantanhede conseguiu formar um exército de oito mil infantes, dois mil e novecentos cavaleiros guarnecidos por sete canhões.
Tendo ficado acordado, entre o conde de Cantanhede e D. Sancho Manuel, que o ataque às linhas de Elvas se faria pelo sítio conhecido por Murtais, o exército português saiu de Estremoz e marchou sobre a praça cercada. Os brigantinos ocuparam as colinas da Assomada, de onde se avistava a cidade de Elvas e as linhas inimigas, estas num majestoso arraial. No dia 14 de Janeiro, cerca das oito e quinze da manhã, os portugueses desencadearam o ataque como estava previsto pelo sítio dos Murtais. Manteve-se indecisa a vitória durante algum tempo, pois ao ataque respondiam os espanhóis com vigorosa defesa, mas a certa altura as tropas do conde de Cantanhede conseguiram romper irremediavelmente as linhas de trincheiras dos espanhóis, que começaram por ceder terreno e não tardaram a debandar. As perdas sofridas pelas tropas filipinas nas linhas de Elvas foram enormes.
Dos dezanove mil homens comandados por D. Luís de Haro, apenas cerca de cinco mil infantes e trezentos cavaleiros (sem contar com as mortes por infecção ou doença) conseguiram alcançar Badajoz. Nesta batalha distinguiu-se o conde de Cantanhede, que recebeu, entre outras mercês, o título de marquês de Marialva, por carta de lei de 11 de junho de 1661.
Ameixial
(1663)
Comandante das forças portuguesas, Conde de Vila Flor e o Conde de Shomberg.
Comandante das forças, espanholas D. João José de Áustria.
Forças
Forças portuguesas-total-22.000 homens.
Forças espanholas-total-26.000 homens.
Baixas
Forças portuguesas-1.000 homens, mortos e feridos.
Forças espanholas- 10.000 homens, mortos, feridos e prisioneiros.
Conde de Vila Flor
Conde de Vila Flor é um título nobiliárquico de Portugal que teve duas criações, ambas no Século XVII. O título reporta-se ao antigo concelho de Vila Flor, no Alto Alentejo, hoje integrado na Freguesia de Amieira do Tejo do Município de Nisa.
1ª Criação
(1606)
(1606)
O título de Conde de Vila Flor foi primeiro criado por D. Filipe I de Portugal, II de Espanha, por Carta Régia de 14 de Julho de 1606, a favor de Luis Enríquez de Almansa, filho de Juan Enríquez de Almansa, 2º marquês de Alcañices. O Conde era espanhol de origem e casando com Joana Quaresma, uma fidalga portuguesa, passou a Portugal, onde viveu até 1640, porquanto tomou partido pelos espanhóis aquando da Restauração e voltou a Espanha. Posteriormente o novo Rei D. João IV declarou vago o título.
Luis Enríquez de Almansa, 1º Conde de Vila Flor
2ª Criação
(1661)
(1661)
O título de conde de Vila Flor foi novamente instituído em 1659, por Decreto, e confirmado em 23 de Julho de 1661, em plena Guerra da Restauração, por Carta Régia de Rainha-Regente D. Luísa de Gusmão, em nome de seu filho D. Afonso VI, a favor do fidalgo D. Sancho Manuel de Vilhena e tornado de juro e herdade em favor do 2.º Conde D. Cristóvão.
1. D. Sancho Manuel de Vilhena (1610-1677), 1º Conde de Vila Flor.
2. D. Cristóvão Manuel de Vilhena (1640-1704), 2º Conde de Vila Flor
3. Martim de Sousa Meneses (1670-1733), 3º Conde de Vila Flor
4. Luís Manuel de Sousa e Meneses (1700-1752), 4º Conde de Vila Flor, usou o título, por mercê régia, ainda em vida de seu pai
5. António Francisco de Paula Manuel de Sousa e Meneses (1725-1791), 5º Conde de Vila Flor.
6. António de Sousa Manuel de Meneses Severim de Noronha (1765-1795), 6º Conde de Vila Flor
7. Marechal António José de Sousa Manuel de Meneses Severim de Noronha (1792-1860), 7º Conde de Vila Flor, 1º marquês de Vila Flor e 1º Duque da Terceira de juro e herdade e com Honras de Parente
8. D. Tomás Maria Martinho de Almeida Manoel de Vilhena, 8º Conde de Vila Flor,
9. D. Francisco Maria Martinho de Almeida Manoel de Vilhena, 9º Conde de Vila Flor, conde de Alpedrinha. Morou no Palácio Vila Flor à Costa do Castelo.
10. D. Maria Luísa da Conceição de Almeida Manoel de Vilhena, 10ª Condessa de Vila Flor, 2ª Duquesa da Terceira e 3ª Condessa de Alpedrinha; Condessa de Azarujinha, de cortesia, pelo casamento com Jaime Augusto Lasso de la Vega Dias de Freitas
11. D. Francisco Xavier Manoel de Vilhena Dias de Freitas, 11º Conde de Vila Flor, Conde de Azarujinha, Duque da Terceira, Cavaleiro de S. Miguel da Ala.
12. D. Lourenço da Bandeira Manoel de Vilhena de Freitas, 12º Conde de Vila Flor e 4º Duque-Parente da Terceira, de juro e herdade, 6º Conde de Azarujinha e 4º Conde de Alpedrinha
13. D. Sancho Manuel de Vilhena (1610-1677), Senhor e elevado à Grandeza como 1.º Conde de Vila Flor.
1. D. Sancho Manuel, 1º Conde, descendia por legítima varonia de Don Juan Manuel de Villena, Mordomo-mor do Imperador Carlos V e cavaleiro do Tosão de Ouro, descendente também por varonia de D. Henrique Manuel de Vilhena, Conde de Seia e Sintra, meio-irmão de D. Constança Manuel, casada com o Rei D. Pedro I de Portugal. Este era por sua vez filho do Infante Manuel e neto de João Manuel de Castela, Príncipe de Vilhena e Duque de Escalona e Penafiel, Regente de Castela, escritor, o autor do célebre El conde Lucanor, e por seu turno bisneto de Fernando III de Castela e Beatriz da Suábia, filha do Imperador do Sacro-Império Romano-Germânico, Rei dos Romanos, e neta de Inácio Angelo, Imperador Romano do Oriente, alegadamente remotamente descendente do Imperador Constantino e seu sucessor na Grão-Mestrado da Ordem Constantiniana. Serviu na Guerra da Restauração como Mestre de Campo General (posto hoje equivalente a Tenente-General), Governador das Armas (posto equivalente a Marechal) da Província do Alentejo e Comandante-Chefe das forças portuguesas, tendo sido vencedor da batalha do Ameixial em 1663, e tendo-se destacado ainda na Batalha das Linhas de Elvas em 1659. Foi nomeado Vice-Rei do Brasil, falecendo antes de tomar posse do cargo e foi do Conselho de Estado e da Guerra, Governador da Relação do Porto e da Torre de Belém. Era senhor de Vila Flor, Alcaide-Mor de Alegrete, Comendador de Santa Maria de Pernes e ainda senhor das comendas de S. Nicolau de Celorico de Basto, de Santo Adrião, de Penafiel, e de Santa Maria do Marmeleiro e ainda anteriormente a comenda das Maças de D. Maria. Pelo seu casamento com Ana de Noronha, filha de Gaspar de Faria Severim, Secretário de Estado das Mercês, veio a herdar a família a casa Severim de Noronha. Morou no Palácio de Arroios.
2. D. Cristóvão Manuel de Vilhena (1640-1704), 2.º Conde de Vila Flor, tornando-se o título de juro e herdade, morou no Palácio de Arroios, Senhor de Vila Flor, Senhor da Zibreira, Alcaide-Mor de Alegrete e Comendador de Santa Maria de Pernes, de S. Nicolau de Celorico de Basto, de Santo Adrião, de Penafiel, e de Santa Maria do Marmeleiro e ainda anteriormente a comenda das Maças de D. Maria. Foi igualmente militar, com a patente de coronel, e foi um dos toureiros presentes no casamento de D. Pedro II de Portugal (a par do Conde da Atalaya), apresentando-se então com mais de "150 lacaios". Nessa ocasião lançou em praça moedas preciosas de ouro e prata como quem ceifava trigo, e anos depois ainda estava a pagar essa prodigalidade. Era seu, irmão o grande Príncipe-Grão-Mestre da Ordem Soberana e Militar de Malta, D. António Manuel de Vilhena, um dos mais importantes na história da Ilha de Malta. Mandou construir o Forte Manuel e o Teatro Manuel na capital Valeta, o Palácio Vilhena na velha capital Mdina, etc., tendo dado o seu nome igualmente ao Burgo Vilhena fora das muralhas da capital. Por estas e outras construções as armas da família são hoje uma vista comum nessas paragens. Floriana em Malta foi criada em homenagem a seu pai o Conde de Vila Flor. Foi seu filho D. Sancho Manoel de Vilhena, 2.º Senhor da Zibreira, Alcaide-Mor de Alegrete e Comendador de Santa Maria de Pernes, de S. Nicolau de Celorico de Basto, de Santo Adrião, de Penafiel, e de Santa Maria do Marmeleiro e ainda da comenda das Maças de D. Maria. Foi um dos convidados para a Sagração da Basílica de Mafra, foi cunhado de D. Luiz da Cunha e pai de D. Cristóvão Manoel de Vilhena, Senhor da Zibreira e da demais casa do seu pai, Tenente-General efectivo, Governador de Cascais casado com uma filha do Marquês de Pombal.
3. Martim de Sousa Meneses (1670-1733), 3.º Conde de Vila Flor. A sua filha D. Mariana foi Camareira-Mor de D. Maria I e 1.ª Marquesa de Vila Flor.
4. Luís Manuel de Sousa e Meneses (1700-1752), 4.º Conde de Vila Flor, que usou o título, por mercê régia, ainda em vida de seu pai.
5. António Francisco de Paula Manuel de Sousa e Meneses (1725-1791), 5.º Conde de Vila Flor.
6. António de Sousa Manuel de Meneses Severim de Noronha (1765-1795), 6.º Conde de Vila Flor. Foi governador do Maranhão.
7. António José de Sousa Manuel de Meneses Severim de Noronha (1792-1860), 7.º Conde de Vila Flor, foi elevado a 1.º Marquês de Vila Flor (1827, confirmado por Carta de 1833) e 1.º Duque da Terceira (1832), de juro e herdade, com Honras de Parente do Rei. Morreu sem descendência. Morou no Palácio de São João da Praça. Foi Marechal do Exército e herói das Guerras Liberais e foi por quatro vezes Presidente do Conselho de Ministros. Foi o vencedor da Batalha da Asseiceira, entrou em Lisboa dia 24 de Julho e assinou em nome de D. Pedro IV de Portugal a Convenção de Évora Monte. Teve a excepcional honra de ser sepultado no panteão real.
Frederico Armando de Shomberg ou em alemão Friedrich Hermann von Schoenberg (16 de Dezembro de 1615-1 de Julho de 1690), conde e duque de Shomberg, foi um general alemão que, contratado pelo conde de Soure, em 1660, veio para Portugal reorganizar o Exército Português, tendo contribuído para algumas vitórias como a Batalha do Ameixial e a Batalha de Montes Claros, em 1665. Teve algumas desinteligências com o 3.º conde de Castelo Melhor e com o marquês de Marialva. Em 31 de Março de 1668 obteve o título de conde de Mértola através do rei D. Afonso VI de Portugal.
Don Juan José de Áustria
Don Juan José de Áustria, também conhecido em português por João José de Áustria, ou ainda antigamente por D. João d´Áustria, o Moço (Madrid, 7 de abril de 1629-Madrid, 17 de setembro de 1679), foi filho bastardo do rei Filipe IV, e o único por ele reconhecido (1642). Sua mãe era a atriz Maria Inés Calderona ou La Calderona. Se dizia que era amante do Duque de Medina de las Torres, poderoso confidente do Rei, o qual acabaria desterrado. Filipe IV a conheceu em 1627 aos 22 anos, casado havia sete; ela teria 16 anos e era atriz no Curral de la Pacheca, entrou mais tarde para o mosteiro de Valfermoso, no vale de Utande, onde morreria abadessa. Durou dois anos a relação. O menino lhe foi retirado e entregue a um humilde casal em Leão, sendo depois levado a Ocaña. Reconhecido Infante e Grão Prior da Ordem de Malta em Leão e Castela (Ordem de São João) com residência em Consuegra de Toledo aos 13 anos, jovem prior de Consuegra, em cujo castelo juntou pequena corte. Recebeu educação principesca em Ocaña; teve influência durante a menoridade do rei Carlos II, seu meio-irmão. Dedicando-se a empresas de caráter militar, distinguir-se-á apenas em Nápoles; terá fracassos em Flandres e em Portugal. Em 1647 foi nomeado Príncipe do Mar, o mais alto cargo da Marinha; em 1648 foi nomeado vice-rei de Nápoles e da Sicília. A intervenção na guerra da Catalunha, de onde foi Vice-rei foi seu segundo êxito: dedicou 1651 e 1652 à pacificação da Catalunha, obtendo a rendição de Barcelona em 11 de outubro de 1652. Vice-reinou ali até 1656. Neste ano de 1656, quando o Arquiduque Leopoldo Guilherme se demitiu como Governador de Flandres, foi nomeado comandante até março de 1659. Manteve a guerra contra a França, em circunstâncias difíceis. Com a colaboração do Marquês de Caracena conseguiu restabelecer a situação, liberando a praça-forte de Valenciennes. Derrotou Turenne em Cambrai. Entretanto, em 14 de junho de 1658, sofreu nas Dunas uma derrota grave, perdendo Dunquerque. Pouco depois, foi relevado deste cargo para tarefa ainda mais difícil, a de recuperar Portugal. Em 20 de Fevereiro, de 1661, seu pai emitindo-lhe oficialmente o título de "Capitão Geral da Conquista do Reino de Portugal". Desse ano a 1665 passou quatro anos de luta sem êxito na Estremadura, junto à fronteira portuguesa, acusado de preguiçoso. A situação só acabará pela inversa, quando lhe é permitido actuar, invadindo Portugal com grande exército, sofrendo uma pesada derrota na Batalha de Ameixial em 8 de Junho de 1663, desfeita que terminou sua vida militar. Em Setembro de 1665, viu morto o rei, com quem mantinha frias relações nos últimos anos. Liderou então a oposição contra sua madrasta a rainha Mariana. Em 1677 conseguiu expulsar o seu favorito, padre João Everardo Nithard, jesuíta austríaco. Por sete anos haveria dois centros políticos distintos, quase duas cortes, a madrilena, onde a Rainha e seu novo valido Fernando de Valenzuela imperavam, e a de Saragoça, onde D. Juan José se preparava para ocupar o governo. Em 6 de Novembro de 1675, na maioridade aos 14 anos de Carlos II, tudo parecia se encaminhar a uma solução pacífica, pois conseguiu ser nomeado primeiro-ministro - mas tudo ficou no papel, de modo que se sentiu desmoralizado, voltou a Saragoça, preparou um golpe de Estado, voltou com tropa e em 23 de Janeiro de 1677 alcançou enfim ser primeiro-ministro, começando um governo que duraria 31 meses. Logo a 17 de setembro de 1678 foi forçado à Paz de Nimègue com Luís XIV. Perdeu a saúde, retirou-se da corte e viveu confinado em Aragão. Deixou uma filha também bastarda, dona Maria Catarina Isabel de Áustria, que viveu retirada em um mosteiro em Berlemon e morreu em Bruxelas, a 26 de Novembro de 1714.
A Batalha do Ameixial foi travada, em Santa Vitória do Ameixial, a 8 de
Junho de 1663, entre o exército espanhol e o exército português. O exército espanhol,
comandado por D. João José de Áustria, invadiu Portugal saindo de Badajoz e pôs
cerco a Évora que se rendeu. Era composto por 26,000 homens e pretendia
dirigir-se depois a Alcácer do Sal para dividir Portugal em dois e alcançar a
sua capital Lisboa. Ficou livre apenas a estrada de Santiago
do Cacém-Melides-Comporta, para comunicação do Baixo Alentejo e Algarve com o
resto do país. No entanto, na retaguarda do exército espanhol mantinha-se
o português, sob o comando de D. Sancho Manoel Conde de Vila Flor, auxiliado
pelas preciosas ajudas do Conde de Schomberg e o Conde da Ericeira, entre
outros oficiais superiores.
Os dois exércitos encontraram-se em 8 de Junho nos campos de Ameixial a 5
km de Estremoz. Derrotados, os espanhóis retiraram-se para Arronches e depois
para Badajoz. Assim, graças à vitória desta batalha, terminou um dos mais
perigosos ataques espanhóis da Guerra da Restauração. O exército inimigo
mudou a forma devido à falta da gente com que guarneceu Évora, e assim a 1ª
linha da infantaria não tinha mais do que 7 esquadrões, o de D. Anielo de
Gusmão e D. Luís de Frias tinha o corno direito, seguia-se-lhe o Conde de
Escalante, a cujo cargo estava também o terço de D. Gonçalo de Córdova, morto
no Degebe. O 3º era o de D. Rodrigo Moxica. O 4º de D. João Henriques e D. Lopo
de Abreu. O 5º do Conde de Charni e do Conde de Losestain. O 6º do Marquês de
Casin. O 7º de D. António Guindaço e D. Camilo de Dura. Da cavalaria tinha
a 1ª linha do corno direito da vanguarda 20 batalhões, os 4 das guardas dos
generais e do tenente-general D. Diego Correa, 5 com o comissário geral D.
Miguel Ramona, 5 com o comissário geral D. Luís de Sey e 5 com o comissário
geral D. António Montenegro. A 2ª ala deste corno estava à ordem do
tenente-general D. Belchior Porticarrero, tinha com a sua companhia 15
batalhões, porque 6 mandava o comissário geral D. João de Novales, 4 D. Josef de
la Reatagui e 4 D. João de Ribera. A 1ª ala do corno esquerdo tinha o mesmo
número que o direito, com o tenente-general D. António Moreira e os comissários
gerais João Ângelo Valador e D. Francisco de Aguiar. A 2ª linha tinha a mesma
igualdade que a do corno direito a que correspondia, a cargo do tenente-general
D. Juan Jacome Mazacan e do comissário geral D. Hieronimo Garcia. Na reserva,
que também tinha cuidado dos rendidos de Évora, estavam 12 batalhões com o
comissário geral D. João Cortéz de Linhen. Oito peças de artilharia em 4
postos coroavam as eminências; a retaguarda do exército cobria inumerável
carriagem.
A densa vegetação que hoje cobre o terreno impede que se tenha uma
percepção clara do espaço de cerca de 500 metros que separava os dois exércitos. Pouco
diferente sítio coube ao nosso exército, pois soube ganhar uma colina não
eminente às do exército contrário, mas quase igual, se contendeu a maior parte
da manhã, e à viva força chegaram a ocupá-la pelas 11.00 do dia o mestre de
campo João Furtado de Mendonça com o seu terço, e o coronel James Apsley com o
seu regimento. Nesta e nas planícies que se estendem por seus lados formámos o
nosso exército sem mais alteração, que por ser a campanha pelo corno direito
dele asperíssima, impossibilitando o manejo da cavalaria, se incorporou toda no
corno esquerdo, ficando no direito só 5 batalhões à ordem do comissário geral
Matias da Cunha. E porque se tinha tirado da 1ª linha para interpolar com a
cavalaria o terço do mestre de campo Lourenço de Sousa, que depois ao dar da
batalha tornou ao seu posto, puxaram da 2ª para aquele lugar com o seu terço ao
mestre de campo D. Diogo de Faro e Sousa. A mesma dificuldade de terreno
achou o inimigo e usou da mesma união da cavalaria, deixando porém com menos
número o seu corno esquerdo. E por ser chegado ao exército o terço do
mestre de campo Bernardo de Miranda, depois de o formar o reservou para a sua
pessoa o Conde de Vila Flor, para o empregar aonde fosse maior a necessidade, e
se incorporou na reserva. Era a crescença do dia, e a calma [grande calor]
afadigava tanto aos soldados, que pareceu a todos não começar por então a
atacar a batalha. Estavam os exércitos propícios à contenda, quando D.
João de Áustria mandou intimar por um papel aos seus cabos, e que eles o
fizeram manifesto aos seus soldados, mostrando-lhe nele a razão que tinham
pelejarem com aquela constância que esperava dos corações espanhóis, e como
deviam entrar na contenda com as esperanças em Deus, e para que lhes fosse
favorável encomendava a todos o interior arrependimento dos vícios, e a
exterior satisfação deles, e como a causa era justa, assim esperava de justiça
a vitória. Persuadia mais o papel a observância das ordens militares, e algumas
não piedosas, pois ordenava se não desse quartel a ninguém na batalha, mais que
ao general português [Conde de Vila Flor], dando sinais de sua pessoa, e
prometendo premiosa sua prisão.
O que D. João de Áustria fez por um papel, obrou o Conde de Vila Flor por
sua pessoa, e a esquadrão por esquadrão assegurou a todos a vitória, e animou à
peleja, ainda que foi supérflua esta segunda persuasão, porque cada soldado se
exortava a si próprio ao combate; mostrou-lhes a justiça que defendiam para ter
propícia a vontade divina, a liberdade que nos usurpavam, para que fosse
constante a peleja; os companheiros cativos, para que com ânsia os resgatassem,
a campanha destruída, para que com raiva se satisfizesse, os despojos que
levavam, para que o desejo os incitasse; as vezes que foram por nós vencidos,
para que os desbaratassem com confiança. A estas razões exortatórias se
seguiram as ordens militares, e dado o nome, que mais nos podia assegurar a
vitória que muitas ordenanças, pois foi o da purissima Conceição da Virgem
Santa, nossa padroeira e protectora deste Reino. Valorosa e porfiadamente
esperavam todos o sinal da batalha. Às três da tarde começou o exército
inimigo dar mostras de querer retirar-se, e o podia fazer pelo caminho de
Veiros a Arronches, deixando o nosso exército pelo lado direito; mas o Conde de
Vila Flor entendendo esta resolução, mandou aos generais da cavalaria Dinis de
Melo e Manuel Freire, começassem a atacar a batalha, que recebiam mais a ordem
como alvitre aos seus desejos, que preceito a suas obediências. Opôs-se o
inimigo valorosamente à resistência, e passando os nossos uma pequena sanja,
começaram a travar a peleja. Era dobrado o número da cavalaria inimiga, assim
foi forçoso que os generais fossem o maior exemplo para os soldados. Assistiam
nesta refrega todos os cabos da cavalaria e demais a pessoa do mestre de campo
general Pedro Jacques de Magalhães, e todos eram necessários, porque se
pelejava pessoa por pessoa, esquadrão por esquadrão, linha por linha. Não sucedia o mesmo à
cavalaria castelhana, porque lhe faltava a pessoa do seu general, que como
temos dito, exercia juntamente o posto de mestre de campo general; e enquanto
assistia por este ofício à ordem do exército, faltava ao outro no combate da
cavalaria, e se quisesse acudir a esta, áquele poderia suceder se desordenasse.
Não sei a que attribua isto que seguem os mais dos governos do mundo, julgando
um sujeito capaz de muitos lugares e os mais deles encontrados. Intercalo aqui a
narrativa de D. Jerónimo Mascarenhas, vertida para português (o original
encontra-se em castelhano):
Marcharam contra os espanhóis, com muito sossego, os
seis batalhões [de cavalaria inglesa e francesa, pois foram os primeiros a
entrar em acção] referidos, e com a própria gravidade as duas linhas que os
seguiam, talvez para não cansar com o trote os infantes das mangas [isto é, as
mangas de mosqueteiros e arcabuzeiros que os portugueses intercalaram entre os
seis batalhões de cavalaria da vanguarda], e atacando os primeiros a outros
tantos batalhões espanhóis do corno direito, que era o mais luzido da primeira
linha (pois entravam neles as guardas de couraças e arcabuzeiros do Senhor Don
Juan, compostas na maior parte de reformados escolhidos e soldados de
satisfação), ao passar das armas de fogo às espadas logo se descompuseram.
Culparam alguns da desordem a pouca prática do Marquês de Espinardo, seu
capitão, que ainda que procurou luzir os brios do seu sangue e a circunstância
de haver começado a militar com aquele emprego, não o pôde lograr senão com
feridas mortais e perda de seu cavalo, ficando desbaratadas as suas
tropas. Com a mesma fatalidade e exemplar ao momento que com bem breve
intervalo carregou a primeira linha dos portugueses, que seguiam os seis
batalhões, toda a dos espanhóis caiu posta em fuga sobre a segunda e a
desbaratou completamente. O Duque de San Germán via atónito este mau princípio
desde o alto da colina, detrás do esquadrão do mestre de campo Don Anielo de
Guzmán, que era o primeiro da vanguarda do corno direito, e querendo-o
remediar, despachou de imediato um tenente de mestre de campo general, mandando
que um terço só da infantaria italiana, que ocupava a retaguarda, baixasse a
deter o ímpeto dos vencedores. E como ele destacou um terço só de um esquadrão
que se compunha de diferentes terços, era operação que requeria mais tempo do
que o apresto necessitava, voltou o mesmo [Duque de San Germán] a todo o galope
para ordená-lo com mais eficácia em pessoa. Mas persuadindo-o a confusão que
via de caminho naquelas tropas, que o caso não tinha remédio, tomou sem parar
(senão para perguntar por guias) o caminho de Arronches, acompanhando-o o
tenente de mestre de campo general Don Luís de Venegas, e alcançando-o pouco
depois um mestre de campo e outros oficiais de menor esfera. Pouco diferente sítio
coube ao nosso exército, pois sobre ganhar uma colina não eminente às do
exército contrário, mas quase igual, se contendeu a maior parte da manhã, e à
viva força chegaram a ocupá-la pelas 11.00 do dia o mestre de campo João
Furtado de Mendonça com o seu terço, e o coronel James Apsley com o seu
regimento.
Nesta e nas planícies que se estendem por seus lados formámos o nosso
exército sem mais alteração, que por ser a campanha pelo corno direito dele
asperíssima, impossibilitando o manejo da cavalaria, se incorporou toda no
corno esquerdo, ficando no direito só 5 batalhões à ordem do comissário geral
Matias da Cunha. E porque se tinha tirado da 1ª linha para interpolar com a
cavalaria o terço do mestre de campo Lourenço de Sousa, que depois ao dar da
batalha tornou ao seu posto, puxaram da 2ª para aquele lugar com o seu terço ao
mestre de campo D. Diogo de Faro e Sousa. A mesma dificuldade de terreno
achou o inimigo e usou da mesma união da cavalaria, deixando porém com menos
número o seu corno esquerdo. E por ser chegado ao exército o terço do
mestre de campo Bernardo de Miranda, depois de o formar o reservou para a sua
pessoa o Conde de Vila Flor, para o empregar aonde fosse maior a necessidade, e
se incorporou na reserva. Era a crescença do dia, e a calma [grande calor]
afadigava tanto aos soldados, que pareceu a todos não começar por então a
atacar a batalha. Estavam os exércitos propícios à contenda, quando D.
João de Áustria mandou intimar por um papel aos seus cabos, e que eles o
fizeram manifesto aos seus soldados, mostrando-lhe nele a razão que tinham
pelejarem com aquela constância que esperava dos corações espanhóis, e como
deviam entrar na contenda com as esperanças em Deus, e para que lhes fosse
favorável encomendava a todos o interior arrependimento dos vícios, e a
exterior satisfação deles, e como a causa era justa, assim esperava de justiça
a vitória. Persuadia mais o papel a observância das ordens militares, e algumas
não piedosas, pois ordenava se não desse quartel a ninguém na batalha, mais que
ao general português o Conde de Vila Flor, dando sinais de sua pessoa, e
prometendo premiosa sua prisão. O que D. João de Áustria fez por um papel,
obrou o Conde de Vila Flor por sua pessoa, e a esquadrão por esquadrão
assegurou a todos a vitória, e animou à peleja, ainda que foi supérflua esta
segunda persuasão, porque cada soldado se exortava a si próprio ao combate,
mostrou-lhes a justiça que defendiam para ter propícia a vontade divina, a
liberdade que nos usurpavam, para que fosse constante a peleja, os companheiros
cativos, para que com ânsia os resgatassem, a campanha destruída, para que com
raiva se satisfizesse, os despojos que levavam, para que o desejo os incitasse,
as vezes que foram por nós vencidos, para que os desbaratassem com confiança. A
estas razões exortatórias se seguiram as ordens militares, e dado o nome, que
mais nos podia assegurar a vitória que muitas ordenanças, pois foi o da
purissima Conceição da Virgem Santa, nossa padroeira e protectora deste Reino.
Valorosa e porfiadamente esperavam todos o sinal da batalha. Às três
da tarde começou o exército inimigo dar mostras de querer retirar-se, e o podia
fazer pelo caminho de Veiros a Arronches, deixando o nosso exército pelo lado
direito; mas o Conde de Vila Flor entendendo esta resolução, mandou aos
generais da cavalaria Dinis de Melo e Manuel Freire, começassem a atacar a
batalha, que recebiam mais a ordem como alvitre aos seus desejos, que preceito
a suas obediências. Opôs-se o inimigo valorosamente à resistência, e passando
os nossos uma pequena sanja, começaram a travar a peleja. Era dobrado o número
da cavalaria inimiga, assim foi forçoso que os generais fossem o maior exemplo
para os soldados. Assistiam nesta refrega todos os cabos da cavalaria e demais
a pessoa do mestre de campo general Pedro Jacques de Magalhães, e todos eram
necessários, porque se pelejava pessoa por pessoa, esquadrão por esquadrão,
linha por linha. Não sucedia o mesmo à cavalaria castelhana, porque lhe
faltava a pessoa do seu general, que como temos dito, exercia juntamente o
posto de mestre de campo general; e enquanto assistia por este ofício à ordem
do exército, faltava ao outro no combate da cavalaria, e se quisesse acudir a
esta, áquele poderia suceder se desordenasse.
Não sei a que atribua isto que seguem os mais dos governos do mundo,
julgando um sujeito capaz de muitos lugares e os mais deles
contrários. Intercalo aqui a narrativa de D. Jerónimo Mascarenhas, vertida
para português (o original encontra-se em castelhano): Marcharam contra os
espanhóis, com muito sossego, os seis batalhões [de cavalaria inglesa e
francesa, pois foram os primeiros a entrar em acção] referidos, e com a própria
gravidade as duas linhas que os seguiam, talvez para não cansar com o trote os
infantes das mangas [isto é, as mangas de mosqueteiros e arcabuzeiros que os
portugueses intercalaram entre os seis batalhões de cavalaria da vanguarda], e
atacando os primeiros a outros tantos batalhões espanhóis do corno direito, que
era o mais luzido da primeira linha (pois entravam neles as guardas de couraças
e arcabuzeiros do Senhor Don Juan, compostas na maior parte de reformados
escolhidos e soldados de satisfação), ao passar das armas de fogo às espadas
logo se descompuseram. Culparam alguns da desordem a pouca prática do Marquês
de Espinardo, seu capitão, que ainda que procurou luzir os brios do seu sangue
e a circunstância de haver começado a militar com aquele emprego, não o pôde
lograr senão com feridas mortais e perda de seu cavalo, ficando desbaratadas as
suas tropas. Com a mesma fatalidade e exemplar ao momento
que com bem breve intervalo carregou a primeira linha dos portugueses, que
seguiam os seis batalhões, toda a dos espanhóis caiu posta em fuga sobre a
segunda e a desbaratou completamente. O Duque de San Germán via atónito este
mau princípio desde o alto da colina, detrás do esquadrão do mestre de campo
Don Anielo de Guzmán, que era o primeiro da vanguarda do corno direito, e
querendo-o remediar, despachou de imediato um tenente de mestre de campo
general, mandando que um terço só da infantaria italiana, que ocupava a
retaguarda, baixasse a deter o ímpeto dos vencedores. E como ele destacou um
terço só de um esquadrão que se compunha de diferentes terços, era operação que
requeria mais tempo do que o apresto necessitava, voltou o mesmo [Duque de San
Germán] a todo o galope para ordená-lo com mais eficácia em pessoa. Mas
persuadindo-o a confusão que via de caminho naquelas tropas, que o caso não
tinha remédio, tomou sem parar (senão para perguntar por guias) o caminho de
Arronches, acompanhando-o o tenente de mestre de campo general Don Luís de
Venegas, e alcançando-o pouco depois um mestre de campo e outros oficiais de
menor esfera. Voltando ao texto de António Álvares da Cunha: Enquanto
as cavalarias contendiam tão fortemente, não estava ociosa a infantaria, nem a
artilharia que a fazia empregar com todo o excesso o seu general D. Luís de
Meneses. Era a 1ª linha muito larga, pela qual razão necessitava de mais cabos
que a levassem em ordem, e por isso se encomendou o corno direito dela ao Conde
da Torre, que governava a segunda, ficando governando o esquerdo André Furtado,
que aquela manhã tinha chegado de Estremoz, para onde o tinha mandado o general
na noite de 5, quando o inimigo se alojou no Espinheiro depois do recontro do
Degebe, persuadindo-se poderiam os castelhanos ir com algum troço áquela praça,
que estava a seu cargo. Em ambas as jornadas o acompanharam o mestre de campo
Manuel de Sousa de Castro e Jerónimo de Mendonça Furtado. Com a sobredita
ordem abalou o Conde Schomberg à 1ª linha, e se resolveram os esquadrões a
trepar pelas ásperas colinas donde estava formado o inimigo, e começaram pica a
pica e corpo a corpo os portugueses a investir, e os castelhanos a defender. E
vendo que em largas horas de combate se não conhecia diferença de vitória a
favorecer ambas as partes, se abalaram ambas as segundas linhas, e porque a
campanha era asperíssima, não conservavam aquela primeira forma estas batalhas,
porque chegavam a contender primeiro aqueles esquadrões que acharam menos
impedimento nos penedos, para não o acharem nos combates, com o que os
esquadrões que governavam o Conde da Torre, que eram dos mestres de campo
Sebastião Correia, Lourenço de Sousa de Meneses, Miguel Barbosa da Franca e D.
Diogo de Faro e Simão de Sousa. Começaram a coroar a colina em que estava a
artilharia inimiga, sendo o mestre de campo Simão de Sousa o primeiro que lhe
pôs as mãos, donde saiu ferido de uma rigorosa bala, que quis com o seu sangue
este dia esmaltar este sucesso, assim como com o seu voto sempre motivar esta vitória.
E porque a 2ª linha castelhana, que estava favorecendo aquela parte, poderia
ocasionar algum destroço, a carregou os batalhões que comandava o comissário
geral Matias da Cunha, e esta cavalaria, com a infantaria que o Conde da Torre
governava, achando pouca resistência na cavalaria inimiga que cobria aquele
lado, obrigou a voltar as espaldas aos castelhanos, que os rompeu até à última
fileira da sua segunda linha, sem resistir a esta fúria a mesma pessoa do seu
generalíssimo, que por vezes se pôs a pé a ser companheiro de seus soldados.
Estavam os nossos por esta parte tão avançados, que se enganavam os oficiais
castelhanos, e muitos se aprisionaram, mandando por suas as nossas mangas, e um
deles se chegou tanto ao Conde da Torre, que desconhecendo-o, o mandava como
soldado seu, mas a obediência que esperava, foi contenda em que perecera se se
não valera mais dos pés do cavalo, que dos braços próprios. Foi conhecido, e
confessado pelos seus por tão grande pessoa, que se dissera neste papel o seu
nome, a não se haver já dito a retirada. Seguiam ao Conde da Torre em
todas estas árduas contendas D. Pedro Mascarenhas e o mestre de campo Roque da
Costa, já convalescido, cujo terço foi rendido em Évora, e nelas mataram o
cavalo a D. Pedro, que entre todo o risco recobrou outro para continuar nos
progressos da vitória.
Achou mais resistência a parte que mandava Afonso Furtado, que como tinha o
seu lado coberto com a sua cavalaria, só pela frente era o combate. Os mestres
de campo que contendiam por aquela banda eram Fernão Macarenhas, Tristão da
Cunha, Francisco da Silva de Moura, João Furtado de Mendonça e o coronel James
Apsley, que com o seu regimento sofrendo uma carga de um terço de espanhóis,
que lhe ficou por frente, com o apoio que lhe dava o mestre de campo Paulo
Freire de Andrade com o seu terço, que pela razão sobredita se tinha adiantado
da reserva, o degolou todo, sem que nenhum pudesse dar conta do sucesso.
Contendiam os demais porfiadamente, e com o favor da nossa segunda, e terceira
linha, ganhadas ambas as colinas e a artilharia delas, a mandou logo voltar
contra o inimigo o general D. Luís de Meneses, que em toda a parte estava, e
começaram a sentir a sua perda dos mesmos instrumentos que traziam para suas
vitórias. Desbaratadas de todo as primeiras linhas da cavalaria com
perda considerável do regimento inglês, e com a morte do seu tenente-coronel
Michael Dongan, puxou o general Dinis de Melo (que bem mostrou na fúria do
combate o valor com que defendia o seu parecer, que foi sempre de que se esse
esta batalha, e o mestre de campo general Pedro Jacques de Magalhães, já ferido
em uma mão) pelo restante dela, e com valor e constância os meteram na peleja.
Estava já ferido mortalmente pela cabeça com uma bala o general Manuel Freire,
que lhe havia tirado de todo a fala, e ainda assim com os acenos mandava, e
morreu 3 dias depois da batalha em Estremoz (tendo estado na campanha os tendo
dias necessários à segurança dela).
Não havia já corpo de cavalaria de uma e de outra parte formado, mais que
os batalhões da reserva, que mandava o tenente-general D. Manuel de Ataíde e os
comissários gerais João do Crato e Gonçalo da Costa de Meneses, que ficando
muitas vezes entre o inimigo, não descompondo nunca a forma, foi sempre
ganhando terreno. As tropas inglesas e francesas, obrando maravilhas, se
avantajavam às portuguesas, senão no excesso do combate, na razão da peleja,
que se os portugueses pelejavam pela vitória, também defendiam a liberdade, e
eles só pela vitória contendiam, e tão bizarramente com o exemplo do Barão de
Schomberg e seu irmão [filhos do Conde de Schomberg], nos quais se verificou
aquele provérbio, que as águias não produzem pombas. Obrou esta
cavalaria e estes cabos e os fidalgos portugueses que assistiam naquele
exército acções nunca vistas em nenhuma batalha, pois repetidas vezes os
soldados soltos e desbaratados os encorporavam diante da reserva, e tornavam á
contenda; e esta é a razão porque tão pouco número prevaleceu contra quase
dobrada gente, pois foi cada batalhão várias vezes novo com multiplicadas
forças. Estava já o dia nas últimas horas quando o general Dinis de Melo,
que desde as primeiras da batalha até aquelas estvera sempre diante dos seus batalhões,
fazendo pelejar a todos, para concluir de todo com a vitória, ordenou ao
tenente-general D. Manuel de Ataíde cerrasse com os três batalhões que
conservava, com sete que ainda o inimigo tinha formados. E vendo o Conde de
Vila Flor a disparidade do número, mandou o mestre de campo Bernardo de Miranda
com o seu terço, conduzido pelo sargento-mor de batalha Diogo Gomes de
Figueiredo, a quem havia dito por vezes que aquele terço lhe havia de dar a
vitória, que carregasse rijamente aquela cavalaria.
O que fez a tão bom tempo e com tão bom sucesso, que as cargas do terço, e
a fúria com que o tenente-general os carregou, os obrigou a deixar o campo e a
declarar-se a vitória por Portugal, a qual por espaço de meia légua foi
aclamando o tenente-general entre os mesmos inimigos. Esta foi a celebrada
vitória do Canal, que assim se chamava o lugar donde se conseguiu, tanto antes
esperada dos portugueses; na qual os castelhanos perderam toda a sua
infantaria, bagagem e artilharia, quarenta bandeiras, vinte estandartes, entre
eles o do generalíssimo [D. Juan de Áustria], que um francês valorosamente
tomou, apesar de quem o defendia (costumada é esta nação a alcançar estes
troféus). A extensa carriagem de D. Juan de Áustria seguia pela estrada
que serpenteava por entre as elevações que se vêem ao fundo, bem como os
prisioneiros portugueses trazidos de Évora, que acabariam por ser libertados na
confusão da fuga do que restava das forças invasoras.
Castelo Rodrigo
(1664)
Comandante das forças portuguesas, Pedro Jacques de Magalhães.
Comandante das forças, espanholas Duque de Ossuna.
Forças
Forças portuguesas-total-3.000 homens.
Forças espanholas-total-5.000 homens.
Baixas
Forças portuguesas-1 homem, morto.
Forças espanholas- 3.300 homens, mortos, feridos e prisioneiros.
Pedro Jacques de Magalhães
Pedro Jacques de Magalhães (1620-1688), 1.º visconde de Fonte Arcada, foi um dos militares da Guerra da Restauração, que se destacou na Batalha de Castelo Rodrigo. O militar, revelando-se como um firme opositor ao domínio filipino, foi preso na América espanhola a seguir ao golpe de 1 de Dezembro de 1640, juntamente com outros portugueses, de entre os quais figurava João Rodrigues de Vasconcelos e Sousa, 2.º conde de Castelo Melhor, quando tentavam apoderar-se de uma frota espanhola carregada de prata, tendo como objectivo conduzi-la a Portugal. Pouco depois consegue fugir, regressando à Pátria, onde é provido no cargo de governador de Olivença. Ocupava este cargo em 1646 quando foi ferido num ataque militar a Valência. A 4 de Novembro de 1649 D. João IV confiou-lhe o almirantado da esquadra que escoltou a primeira frota da Companhia Geral do Comércio do Brasil, composta por 40 naus, que largou do Tejo com destino a esta colónia e ancorou em Pernambuco sem quaisquer incidentes com os holandeses. No dia 20 de Dezembro de 1653 voltou ao mesmo local da costa brasileira, desta feita como capitão-general, em parceria com Francisco de Brito Freire, com uma armada de 60 navios «bem aparelhados», numa missão de clara intimidação aos holandeses, a respeito dos quais haviam chegado à corte notícias de ataques a algumas naus da jovem Companhia Geral e de objecções diplomáticas aos seus direitos naquelas águas. Pedro Jacques de Magalhães não hesitou perante a oportunidade que assim se lhe oferecia para intervir nas lutas contra as invasões holandesas do Brasil. A sua acção de maior relevo ao comando dessa armada foi o auxílio que prestou ao mestre de campo general de Pernambuco, Francisco Barreto de Meneses, no cerco de Recife, em 1654. Voltando de novo a Portugal, «aparece-nos envolvido na maior parte dos combates que se vão travar até ao fim da Guerra da Restauração». Com efeito, em 1658 surge como general de Artilharia do exército do Alentejo e no ano seguinte toma parte na Batalha das Linhas de Elvas, ocupando a patente de 1.º mestre de campo deixada vaga pelo general André de Albuquerque Ribafria, que aí foi mortalmente ferido. Em 1663, sendo já mestre de campo general da Beira, acorre outra vez ao Alentejo com as suas forças em socorro do exército do 3.º conde de Castelo Melhor, governador das Armas desta província, o qual temia pela sua segurança, em consequência da recente ofensiva de D. João de Áustria. Toma, então, parte na conquista de Évora, de onde sai novamente ferido. É assinalada a sua presença «no Ameixial, voltando depois à Beira, e tomando parte, em 1664, na conquista de Alcântara, onde foi ferido mais uma vez, ficando aleijado duma perna» para o resto da vida. O infortúnio de Alcântara não parece ter refreado os ânimos do intrépido militar que, tendo sido promovido, nesse mesmo ano de 1663, a governador das armas da província da Beira, aliás no comando único dos dois partidos, o partido de Almeida e o de Penamacor, viria a colher a maior glória da sua carreira do sucesso que logrou obter na célebre batalha de Castelo Rodrigo, a 7 de Julho de 1664. Haja em vista a descrição coeva que no Mercúrio Português o seu redactor, António de Sousa de Macedo, fazia dos factos. Em Outubro de 1665, temendo-se uma reacção dos castelhanos no Norte, Pedro Jacques de Magalhães juntou as suas forças com as dos condes de São João e de Miranda e foi com eles guarnecer a fronteira do Minho, de onde aproveitaram para fazer algumas incursões da Galiza, chegando a ocupar a fortaleza de La Guardia. Em retaliação, foças castelhanas irromperam pela raia de Trás-os-Montes, assolando as terras de Barroso, Montalegre e Chaves. Em 1668 fez parte das cortes de Lisboa que sancionaram a deposição de D. Afonso VI e juraram o infante D. Pedro príncipe regente e governador do reino. Não terminava ainda a acção deste militar ao serviço da coroa portuguesa, que entretanto pareceu ao conselho de D. Pedro II sobejamente meritória pelo que, por carta datada de 6 de Fevereiro de 1671, o monarca, aliás regente, lhe concedeu o título de 1º visconde de Fonte Arcada. Em 21 de Julho de 1675 Pedro Jacques de Magalhães, provido no posto de capitão-general da armada real, comandou de uma esquadra de 11 navios de guerra que D. Pedro II ordenou fosse aprestada para patrulhar as águas do litoral entre o Cabo de São Vicente e as Berlengas onde actuavam os corsários mouros de Argel. A rota traçada visava amedrontar os mouros, mas «não se viram os resultados de tão custosa empresa», pois eles continuaram a atacar as frotas da carreira da Índia e do Brasil. Nesse mesmo ano «foi enviado em socorro dos espanhóis que os mouros cercavam em Oram e conseguiu introduzir o socorro na praça, à custa de inúmeras dificuldades, sendo esta a última acção conhecida da sua agitada e notável carreira militar, que terminava com a sua morte em 1688». A 5 de Novembro do mesmo ano de 1675 foi admitido como familiar do Santo Ofício. Dando por terminada a sua carreira militar em 1676, afigura-se-nos após essa data mais empenhado em assegurar a integridade do seu património, pois em 1681 instituiu formalmente o morgadio da Terrugem, o qual integrou o imponente palácio da Flor da Murta que havia sido construído pelos senhores de Alconchel, da família Pereira Faria, depois passado aos Meneses. A medida, porém, não resultou visto que o imóvel regressaria à posse desta nobre família por via do casamento de uma das suas filhas, Antónia Madalena de Vilhena, com D. António de Meneses de Sotto Mayor. Por essa altura, para além de senhor da casa dos Jacques de Magalhães, já seria comendador da ordem de Cristo e membro do conselho real e da junta do comércio. Relativamente à comendadoria da ordem de Cristo, mencionada por Felgueiras Gaio no Nobiliário das Famílias de Portugal, podemos concretizar, crendo nas anotações do Pe. António da Costa, que se tratava das comendas de São Pedro de Joanes e da Foz de Arouce. De acordo com a mesma fonte, usaria ainda o título de alcaide-mor de Castelo Rodrigo, e também «por mercè del Rey D. Pedro o Segundo». Em 1684, na qualidade de general do mar, Pedro Jacques de Magalhães destacava-se no conselho de guerra dos restantes conselheiros de Estado, ao lado de outras figuras de proa desse conselho, que também deixaram bom nome na guerra da Restauração, designadamente Nuno da Cunha, conde de Pontével, Dinis de Melo e Castro, governador das armas do Alentejo e Francisco Barreto. Era a devida homenagem ao homem que consumira a sua vida nas mais encarniçadas batalhas para a a reconstrução da soberania nacional. Pedro Jacques de Magalhães foi o único filho varão de Henrique Jacques de Magalhães e de Violante de Vilhena. Desconhece-se a data precisa do seu nascimento, apontando-se o ano de 1620 como provável, mas é certo que faleceu no dia 8 de Dezembro de 1688. Pelo lado paterno foi bisneto de Henrique Jacques, cavaleiro da Ordem de Cristo e trineto de Pedro Jaques, fidalgo da Casa Real que esteve na batalha de Toro com D. Afonso V e instituiu o morgadio da Bordeira. Do lado materno descendia da aristocracia castelhana, pois seu trisavô foi Sancho de Tovar, intitulado 6.º senhor de Cevico, que detinha o senhorio de Boca de Huérgano e de Cevico e seu avô foi o homónimo deste, Sancho de Tovar, copeiro-mor de D. Sebastião. Casou primeiro com Luísa Freire de Andrade que lhe deu dois filhos, sendo primogénito Henrique Jacques de Magalhães que foi alcaide-mor de Castelo Rodrigo e desempenhou outros importantes cargos militares e administrativos. Casou depois com Maria de Vilhena, de cujo enlace nasceram mais seis filhos, o terceiro dos quais, Manuel Jacques de Magalhães, veio a ser o 2.º visconde de Fonte Arcada. Cumpre no entanto observar que antes de receber o título de visconde, Pedro Jacques de Magalhães havia já sido homenageado no campo da Salgadela onde se decidiu a vitória das armas portuguesas na batalha de Castelo Rodrigo, pois foi aí, próximo da localidade de Mata de Lobos, que João da Fonseca Tavares erigiu o monumento comemorativo que é hoje vulgarmente conhecido como «a cruz de Pedro Jacques». O monumento da praça dos Restauradores, em Lisboa é uma homenagem ao colectivo dos heróis da Restauração, mas outras homenagens, póstumas lhe têm sido particularmente prestadas em vários pontos do país, através de adopções toponímicas e patronímicas, sendo exemplos disso a existência de ruas e escolas que receberam o seu nome, assim em Figueira de Castelo Rodrigo, como em Alverca do Ribatejo.
Duque de Ossuna
O Ducado de Osuna é um título nobiliárquico espanhol, com Grandeza de Espanha, criado a 5 de Outubro de 1562 pelo rei Filipe II de Espanha e outorgado ao 5º Conde de Ureña, D. Pedro Téllez-Girón, senhor da cidade andaluza de Osuna. A casa ducal foi crescendo em importância e riqueza e, no século XIX tornara-se na casa nobre mais importante de Espanha, ao reunir-se na pessoa do Duque de Osuna os ducados de Arcos, Béjar, Benavente, Gandía, Infantado e Medina de Rioseco.
Duques de Osuna
1. Pedro (I) Téllez-Girón (1562-1590).
3. Pedro (II) Téllez-Girón, referido como Grão-Duque de Osuna (1600-1625).
6. Francisco María de Paula Téllez-Girón (1694-1716).
7. José María Téllez-Girón (1716-1733).
8. Pedro (III) Téllez-Girón (1733-1787).
9. Pedro (IV) Téllez-Girón (1787-1807).
10. Francisco de Borja Téllez-Girón (1807-1820).
11. Pedro (V) Téllez-Girón (1820-1844).
12. Mariano (I) Téllez-Girón (1844-1882).
13. Pedro (VI) Téllez-Girón, príncipe de Anglona, (1882-1901).
14. Luis María Téllez-Girón, duque de Uceda, (1901-1909).
15. Mariano (II) Téllez-Girón (1909-1931).
16. Ângela María Téllez-Girón (1931-2015).
A Guerra da Restauração desenvolveu-se quase completamente no Alentejo onde se registraram importantes embates como a Batalha das Linhas de Elvas, a Batalha do Ameixial e a Montes Claros. Mal sucedidos no Alentejo, e desejosos de vingar o saque da vila espanhola de Sobradillo pelas forças portuguesas sob o comando de Pedro Jacques de Magalhães, uma força de 3.000 homens sob o comando do duque de Ossuna, forçou a sua entrada em território português pela fronteira da Beira, tendo imposto cerco à vila de Castelo Rodrigo. O Castelo de Castelo Rodrigo encontrava-se guarnecido, na ocasião, por uma pequena guarnição de apenas 150 homens.
Avisado, Pedro Jacques de Magalhães reuniu às pressas o maior número de forças portuguesas disponíveis e acorreu em defesa de Castelo Rodrigo. A batalha desferiu-se a 7 de Julho de 1664, no lugar da Salgadela, freguesia da Mata de Lobos, no termo do concelho de Castelo Rodrigo (donde o nome alternativo por que é conhecida (batalha da Salgadela) e onde consta um padrão comemorativo. Repelido o primeiro assalto, o comandante português, aproveitando o cansaço das tropas espanholas, contra-atacou, obrigando as forças espanholas à retirada. Embora a tradição local afirme que o duque de Ossuna e o próprio D. João de Áustria conseguiram escapar com vida disfarçados de frades, concretamente permaneceram em mãos portuguesas valiosos despojos, incluindo o arquivo do duque de Ossuna, com documentos do maior interesse histórico. Para assinalar a vitória, o referido padrão comemorativo no local informa aos passantes: SVB 6º REGE / ALPHONSO / CITIANDO O / EXércitº DE CASTelª / Que GOVERNAVA / O DVQue DE USUNA / A PRAÇA DE CASTelº / Rodrigo FOI SOCURIDA POR / Pedrº JACQUES DE MAG" /G'alhães DESTA PROVINCIA / Que O VENCEU EM / BATALHA NESTE / LUGAR,COM DES/IGUAL PODER A / 7 DE JULHO / DE 1664. E no reverso: E PARA FAZER / IMORTAL E / STA VICT/ORIA JOA/N DA FON/Seca TAVares M/ANDOV A/QVI LEVA/NTAR ES/TE PADRA/M NO SO/BREDITO / ANNO DE / 1664.
Montes Claros
(1665)
Comandante das forças portuguesas, Marquês de Marialva.
Comandante das forças, espanholas Marquês de Caracena.
Forças
Forças portuguesas-total-20.500 homens.
Forças espanholas-total-22.600 homens-15.000 infantes e 7.600 cavaleiros.
Baixas
Forças portuguesas-total-2.700 homens-700 mortos e 2.000 feridos.
Forças espanholas-total-10.000 homens-4.000 mortos e 6.000 prisioneiros.
Marquês de Marialva
O título de Marquês de Marialva foi um título nobiliárquico de Portugal criado a 11 de Junho de 1661 por D. Afonso VI, a favor de D. António Luís de Meneses, 3.º Conde de Cantanhede pelo seu papel importante na Guerra da Restauração (1640-1668), nomeadamente a sua grande vitória na Batalha das Linhas de Elvas em 1659. Este título de Conde de Cantanhede por sua vez fora criado a 6 de Agosto de 1479 por D. Afonso V, a favor de D. Pedro de Meneses. O título substituiu o de senhor de Cantanhede, e como tal foi absorvido pelo marquesado; foi então usado, tal como era prática corrente, pelo herdeiro do marquesado em vida do pai. Os Meneses de Cantanhede descendiam da mais alta nobreza da Península Ibérica.
O título foi referido por D. António Caetano de Sousa nas Memorias Históricas e Genealógicas dos Grandes de Portugal no século XVIII, incluindo os ramos de Cantanhede e Marialva; da Ericeira e Louriçal; e de Tarouca e Penalva; e ainda o de Vila Real; e vários ramos menores. O mais conhecido de todos os titulares será sem dúvida D. Pedro de Alcântara de Meneses, o famoso 4.º Marquês de Marialva, estribeiro-mor de D. José I. Considerado o melhor cavaleiro de Portugal do seu tempo, teve um papel decisivo no aperfeiçoamento da Picaria Real e da arte equestre em Portugal na segunda metade do século XVIII. Na obra magna de cavalaria do século, a portuguesa Luz da Liberal e Nobre Arte da Cavallaria (1790), ele pode ser visto em várias das belas estampas demonstrando exercícios da alta escola. A sua arte equestre, frequentemente apelidada de arte de Marialva em Portugal, tem hoje uma digna sucessora na Escola Portuguesa de Arte Equestre. Para além deste, o membro mais importante da linhagem foi justamente D. António Luís de Meneses, o 3.º Conde de Cantanhede, um dos principais chefes militares na última década da Guerra da Restauração e comandante supremo, como foi dito, do exército português na Batalha das Linhas de Elvas, e por isso feito primeiro Marquês de Marialva. As origens dos Meneses senhores e condes de Cantanhede, e mais tarde marqueses de Marialva, remontam aos grandes Meneses do século XIV, cujas lutas pelo poder tão bem relatadas foram nas crónicas de Fernão Lopes. Os senhores de Cantanhede descendem assim de D. Gonçalo Teles de Meneses, o primeiro Conde de Neiva, irmão do sexto Conde de Barcelos, D. João Afonso Telo, e da rainha D. Leonor Teles. Os Condes de Cantanhede e Marqueses de Marialva tinham assim a mesma ascendência que os Condes da Ericeira e Marqueses de Louriçal, que era um ramo desta Casa. E também os Condes de Tarouca e Marqueses de Penalva eram parentes destes títulos, visto serem descendentes de D. João Afonso Telo de Meneses, o primeiro Conde de Ourém, tio dos mencionados Conde de Neiva, Conde de Barcelos, e D. Leonor Teles. Senhores de Cantanhede. Entre os Meneses de Cantanhede do final de Quatrocentos, é justo referir D. João de Meneses (ca. 1460-1514), filho do 4.º senhor de Cantanhede e irmão do primeiro conde. Tal como grande parte da alta nobreza portuguesa de então, participou nas campanhas em Marrocos, sendo capitão de Arzila e de Azamor, onde faleceu.
1. D. Gonçalo Teles de Meneses, primeiro Conde de Neiva em 1373.
2. D. Martinho de Meneses.
3. D. Fernando de Meneses.
4. D. João de Meneses.
5. D. Pedro de Meneses (ca. 1450-1518), primeiro Conde de Cantanhede em 1479.
Como refere Braamcamp Freire, o Conde de Neiva havia casado, antes de 1372, com D. Maria Afonso de Albuquerque, filha do grande D. João Afonso de Albuquerque, o do Ataúde, aio e mordomo-mor de Pedro I de Castela. Braamcamp Freire continua. Em atenção a êste casamento, e para se distinguirem dos Meneses da linha de Vila Rial, [isto é, os Condes de Vila Real (1424)] formaram os descendentes do Conde de Neiva o escudo das suas armas, sobrepondo o escudete de oiro liso, armas antigas da família, ao escudo dos Albuquerque. Ficou então o seu brasão constituído pela seguinte forma: esquartelado: o I e IV das armas do reino com um filete de negro sotoposto em barra, o II e III de vermelho, cinco, flores-de-lis de oiro; sôbre o todo, de oiro liso. Condes de Cantanhede (1479). A concessão do título condal em 1479 ao 5.º senhor de Cantanhede enquadra-se na onda de mercês decorrente da Batalha de Toro (1476), em que D. Pedro de Meneses esteve presente. No entanto, o título apenas foi renovado quase século e meio mais tarde, em 1618, no seu quarto neto homónimo, D. Pedro de Meneses, 9.º senhor de Cantanhede. Pouco depois este último foi o encarregado de reunir o contingente militar da região de Coimbra destinado a incorporar a famosa Jornada dos Vassalos: a grande armada luso-espanhola que reconquistou Salvador (Bahia) dos holandeses em 1625, após a conquista da então capital portuguesa do Brasil no ano anterior. No final da sua vida o 2.º Conde de Cantanhede foi Presidente do Senado da Câmara de Lisboa. Nomeado ainda em 1639, antes da Restauração a 1 de Dezembro o ano seguinte, logo aderiu à aclamação de D. João IV, e permaneceu no cargo até 1643. Faleceria no ano seguinte.
1. D. Pedro de Meneses 1.º Conde de Cantanhede.
2. D. Pedro de Meneses (†1644), 2.º Conde de Cantanhede; quarto neto do anterior.
3. D. António Luís de Meneses (1603-1675), 3.º Conde de Cantanhede e 1. º Marquês de Marialva; filho do anterior.
4. D. Pedro António de Meneses (1658-1711), 4.º Conde de Cantanhede e 2.º Marquês de Marialva; filho do anterior.
5. D. Joaquina Maria Madalena da Conceição de Meneses (1691-1740), terceira Marquesa de Marialva; filha do anterior. Casou em 1712 com D. Diogo de Noronha, filho segundo do 3.º Marquês de Angeja, sendo a varonia da Casa substituida pela dos Noronhas.
6. D. Pedro José de Alcântara de Meneses Noronha Coutinho (1713-1799), 6.º Conde de Cantanhede e 4.º Marquês de Marialva; filho dos anteriores.
7. D. Diogo José Vito de Meneses Noronha Coutinho (1739-1803), 7.º Conde de Cantanhede e 5.º Marquês de Marialva; filho do anterior.
8. D. Pedro José Joaquim Vito de Meneses Coutinho (c. 1775-1823), 8.º Conde de Cantanhede e 6.º Marquês de Marialva; filho do anterior. Sem geração.
Em data incerta, os Condes de Cantanhede modificaram as armas mencionadas supra 1 no I e IV quartel, retiraram o filete em barra; no II e III, substituíram as armas pelas armas reais de França; e por fim, introduziram no escudete um anel. Estas são as armas que se podem ver na obra de D. António Caetano de Sousa, que as descreve da seguinte forma. As Armas deſta Caſa ſão o Eſcudo eſquartelado das Armas de Portugal, e no outro tres Flores de Liz de Ouro em campo azul, e no meyo o Eſcudo dos Menezes, que he em campo de ouro hum anel, e por timbre, por Timbre uma Donzella veſtida de Ouro com o Eſcudo nas maõs. Este II e III quartel eram as armas reais da França, note-se, no entanto, que não existia qualquer parentesco com esta. Note-se que estas armas são idênticas às dos Marqueses de Louriçal.
Marqueses de Marialva
(1661)
(1661)
O 3.º Conde de Cantanhede era um acérrimo adversário político do Conde de Odemira, figura então de grande influência na corte. Por essa razão, sempre até a morte de D. João IV em 1656 recusou qualquer cargo de relevo na corte. Após a morte do monarca, a regente D. Luísa de Gusmão nomeou-o em 1658 Capitão-General do exército que foi em auxílio da praça de Elvas, sitiada pelo exército espanhol. Graças à importante vitória que foi a Batalha das Linhas de Elvas, em 1659, foi então o Conde de Cantanhede elevado a Marquês de Marialva em 1661. Poucos anos mais tarde, seria novamente o comandante supremo do exército português que ganhou a grande vitória da Batalha de Montes Claros (1665), a última grande batalha da guerra. O 4.º marquês foi o famoso "Marquês de Marialva", exímio cavaleiro e estribeiro-mor de Sua Majestade Fidelíssima. O 6.º Marquês de Marialva foi diplomata. Com a sua morte sem descendência em Paris em 1823, numa época já de dificuldades para a alta nobreza, acentuadas pela Revolução Liberal do Porto em 1820, e mais tarde pelo resultado das Guerras Liberais (1828-1834), a representação do título passou aos Duques de Lafões, graças ao casamento da irmã do último marquês com D. João Carlos de Bragança, o 2.º Duque de Lafões.
1. D. António Luís de Meneses (1603-1675), 1.º Marquês de Marialva e 3.º Conde de Cantanhede; filho do anterior.
2. D. Pedro António de Meneses (1658-1711), 2.º Marquês de Marialva e 4.º Conde de Cantanhede; filho do anterior.
3. D. Joaquina Maria da Conceição de Meneses (1691-1740), 3. ª Marquesa de Marialva e 5.ª Condessa de Cantanhede; filha do anterior. Casou em 1712 com D. Diogo de Noronha, filho segundo do 3.º Marquês de Angeja, como ficou dito supra.
4. D. Pedro José de Alcântara de Meneses Noronha Coutinho (1713-1799), 4.º Marquês de Marialva e 6.º Conde de Cantanhede; filho dos anteriores.
5. D. Diogo José Vito de Meneses Noronha Coutinho (1739-1803), 5.º Marquês de Marialva e 7.º Conde de Cantanhede; filho do anterior.
6. D. Pedro José Joaquim Vito de Meneses (c. 1775-Paris, 1823), 6.º Marquês de Marialva e 8.º Conde de Cantanhede; filho do anterior. Sem geração. As armas dos Marqueses de Marialva eram as dos Condes de Cantanhede supra. No entanto, Braamcamp Freire refere um serviço de louça, que teria pertencido ao último marquês, já de varonia Noronha, com as seguintes armas: escudo esquartelado: o I Portugal; o II de vermelho, três flores-de-lis de ouro (Albuquerque modificado); o III Noronha; o IV Coutinho. No entanto, na Luz da Liberal e Nobre Arte de Cavallaria, de 1790, as armas do 4º marquês são sempre vistas como sendo as descritas e ilustradas por D. António Caetano de Sousa, o que sugere que assim teriam sido, pelo menos, durante todo o século XVIII.
A batalha de Montes Claros constitui o último episódio relevante da guerra de 28 anos que Portugal manteve contra a monarquia dos Habsburgos espanhóis. A batalha é a última na sequência de vitórias portuguesas que acabaram definitivamente com as pretensões de Filipe IV da família Habsburgo de voltar a reinar em Portugal, onde tinha permanecido durante um período de 60 anos entre 1580 e 1640. Preparam-se os espanhóis para um ataque que tudo levasse de vencida, mas por seu lado os governantes portugueses tomaram todas as cautelas e providências indispensáveis para a defesa do reino.
Calculando que a tentativa de invasão seria feita através das fronteiras do Sul, isto é pelo Alentejo, foi nessa província que se tomaram as maiores precauções. Três mil e quinhentos homens foram sem demora enviados de Trás-os-Montes, constituindo quatro terços de infantaria e catorze companhias de cavalaria. Simão de Vasconcelos e Sousa levou de Lisboa trezentos cavaleiros e dois mil infantes e Pedro Jacques de Magalhães apresentou-se com mil e quinhentos soldados de infantaria e quinhentos de cavalaria. O conjunto representava um reforço de sete mil e oitocentos homens, o que dotava António Luís de Meneses, Marquês de Marialva com o comando total de vinte mil e quinhentos combatentes. O Marquês de Caracena havia planeado nada menos do que ocupar Lisboa, tomando em primeiro lugar Vila Viçosa e a seguir a cidade de Setúbal. Então pôs em movimento o seu exército, que se compunha de quinze mil infantes, sete mil e seiscentos cavaleiros e as guarnições de catorze canhões e dois morteiros O ataque era no entanto esperado pelos portugueses, que aguardavam que este se desse pelo Alentejo, região que tinha sido previamente preparada no sentido de dificultar a progressão das forças invasoras.
À região do Alentejo, acorreram forças de várias regiões do país, com «terços» ou batalhões enviados desde Trás-os-Montes, Lisboa e de outras regiões do país. As forças espanholas que marchavam contra Portugal seguiam o plano de sempre. Entrar em Portugal por Vila Viçosa (lugar de importância por se tratar de lugar de residência dos Duques de Bragança), seguindo depois como noutras alturas para Setúbal, para posteriormente atacar Lisboa. Carregando em massa, a cavalaria espanhola abriu brechas nos terços de infantaria da primeira linha, mas foi recebida com uma chuva de metralha disparada pela artilharia comandada por D. Luís de Meneses. Os esquadrões de Castela, obrigados a recuar refizeram-se e lançaram segunda carga sobre o terço de Francisco da Silva Moura, causando a morte deste e de mais trinta soldados portugueses. O Marquês de Marialva não estava disposto a ceder terreno ou a perder o ânimo. Sob as suas ordens, as brechas abertas pela cavalaria espanhola foram colmatadas, enquanto a artilharia não cessava de fazer fogo sobre os castelhanos. Uma segunda carga igualmente impetuosa, conseguiu no entanto levar os cavaleiros espanhóis até ao mesmo ponto onde fora detida a primeira, mas as perdas sofridas foram de tal ordem que tiveram de deter-se também, sem que a segunda linha portuguesa comandada pessoalmente pelo Marquês de Marialva, tivesse sequer sido molestada.
O Conde de Shomberg esteve prestes a cair em mãos espanholas, quando um tiro abateu o cavalo que ele montava. Os espanhóis que pareciam ter contado com a fúria dos primeiros ataques em massa, executados em especial pela cavalaria, viram-se em situação de perigo. Deram ainda uma terceira carga, mas o ímpeto inicial tinha-se perdido e o desânimo apoderava-se deles. Ao cabo de sete horas de luta, os atacantes começaram a debandar, e o próprio general Caracena, reconhecendo que a batalha estava perdida, fugiu para Juromenha, de onde seguiu depois a caminho de Badajoz. Em coordenação com as forças do Marquês de Caracena, uma poderosa esquadra espanhola tinha saído do sul de Espanha, para de forma coordenada chegar a Setúbal quando a cidade estivesse a ser sitiada pelas forças terrestres. As forças espanholas entram em Portugal e sitiam Vila Viçosa, que embora com fraca guarnição, resiste às forças espanholas. O cerco de Vila Viçosa leva a que as forças portuguesas se dirijam naquela direcção com o intuito de reduzir a pressão exercida sobre aquela praça. Mas antes de atingir Vila Viçosa as forças portuguesas param na área de Montes Claros a meio caminho entre Estremoz e a vila sitiada de Vila Viçosa, onde aparentemente as posições tácticas no terreno são favoráveis.
Ao ter conhecimento da presença do exército português nas proximidades, as forças de Caracena, compostas por 22.600 homens de infantaria e cavalaria abandonam o cerco a Vila Viçosa e dirigem-se ao encontro das tropas portuguesas. À vista das forças portuguesas, o general espanhol manda a cavalaria atacar de frente as linhas da lusa, mas o ataque frontal e furioso, depara com a barreira da artilharia portuguesa, que fulmina e destroça parte do ímpeto do ataque espanhol, que embora atinja e chegue a perfurar as linhas da infantaria, acaba por ser rechaçado, forçando os espanhóis a retirar para se reorganizarem. Os espanhóis rapidamente lançam novo ataque sobre as linhas portuguesas, atingindo as primeiras linhas, mas não logrando atingir a segunda linha das forças portuguesas. Este segundo ataque espanhol foi tão violento quanto o anterior, mas os espanhóis tiveram muito mais baixas no segundo ataque que no primeiro. À medida que as horas íam passando, as forças espanholas, que precisavam vencer a batalha para se dirigirem para Setúbal, tinham que manter a iniciativa, enquanto as forças portuguesas podiam assumir posições claramente defensivas e ainda mais com a utilização de artilharia bem posicionada que permitia causar grandes perdas aos espanhóis. Cientes da sua superioridade, os espanhóis iniciaram a batalha com grande ânimo, mas à medida que o tempo passava, a segurança na vitória foi dando lugar ao descrédito e à dúvida.
A batalha durou entre sete a oito horas e para o fim do dia começou a notar-se o claro desânimo por parte das forças espanholas, cansadas e incapazes de prosseguir. Sabendo que não seria possível derrotar as forças portuguesas e tendo sofrido uma clara derrota a poucos quilómetros da fronteira, Caracena entendeu que nunca conseguiria completar o resto do plano. Ao fim do dia a situação era insustentável e as forças portuguesas podem passar ao ataque, o que poderia colocar em perigo tudo o que resta do exército espanhol. O próprio Caracena foge em direcção à fronteira, passando depois para Badajoz. As forças portuguesas sofrem 2.700 baixas (700 mortos e 2000 feridos). As forças espanholas perdem 10.000 homens, quase metade do exército (4.000 mortos e 6.000 prisioneiros).
Na fuga, as tropas espanholas abandonaram quase toda a artilharia no terreno. Poucos meses mais tarde, o próprio monarca Habsburgo Filipe IV, segundo muitos historiadores, deprimido com a situação de decadência a que conduziu o seu país, morre em Madrid. A derrota espanhola na batalha de Montes Claros, foi o toque de finados nas pretensões dos Habsburgos espanhóis à coroa de Portugal. A longa guerra de 28 anos teria o seu fim em 1668, três anos depois, quando finalmente os Habsburgos aceitaram a independência portuguesa, reconhecendo a Casa de Bragança como família reinante em Portugal. A longa noite, iniciada no tenebroso ano de 1580 tinha finalmente terminado.
Berlengas
(1666)
Comandante das forças portuguesas, António Avelar Pessoa.
Comandante das forças, espanholas Diego Ibarra.
Forças
Forças portuguesas-total-28 homens.
Forças espanholas-total-1.500 homens-15 navios.
Baixas
Forças portuguesas-total-5 homens-1 mortos e 4 desaparecidos.
Forças espanholas-total-41 homens-11 mortos e 30 desaparecidos.
A Batalha das Berlengas travada em 1666, durante a Guerra da Restauração, junto ao Arquipélago das Berlengas, foi uma luta entre os defensores portugueses do Forte de São João Baptista, sob a chefia do cabo António Avelar Pessoa, e o ataque de uma frota espanhola comandada por Diego de Ibarra. Este último estava sediado nessas águas porque tinha por objectivo raptar a rainha D. Maria Francisca de Sabóia na sua chegada ao Reino de Portugal, à época do seu casamento com D. Afonso VI. A frota invasora, que tinha destruído as pescas portuguesas, bombardeado, cidades ao longo da costa continental e cortado o fornecimento de alimentos por via marítima em um mês, era composta por 15 embarcações com centenas de homens, enquanto no forte era composto por um efetivo de pouco mais de duas dezenas de soldados. Numa operação combinada de bombardeio naval e desembarque terrestre os atacantes perderam, em apenas dois dias, 400 soldados em terra e 100 nos navios (contra um morto e quatro feridos pelos defensores), sendo afundada a nau Covadonga e seriamente avariadas outras duas, afundadas no regresso a Cádiz. Após enorme e heróica resistência foi destruído e toda a guarnição foi capturada. Mesmo assim, para isso para a praça ser ocupada teve que ser traída por um desertor, por ter ficado sem mais munição e mantimentos, e finalmente quando tinha perdido nove das peças da sua artilharia capturadas pelos invasores. Quanto ao militar português, provavelmente ferido durante o comando, foi preso e acabou por morrer a bordo de um barco da esquadra quando era conduzido ao porto de Cádiz, em Espanha. Hoje o barco que faz a ligação a Peniche tem o seu nome. Depois deste ataque, cem anos depois, o rei português mandou reparar a fortaleza, aumentando o poder de fogo da mesma, como atesta a inscrição na porta de armas.
Pese embora a conjura de 1641 contra o novo rei, da qual resultou uma severa
punição para os seus responsáveis, João IV teve o apoio da grande maioria da
sociedade portuguesa, o que lhe permitiu criar novos impostos, desvalorizar a
moeda e recrutar voluntários para fazer face às necessidades monetárias e
humanas de um confronto militar que se adivinhava próximo com a vizinha
Espanha. João IV enviou também diplomatas às principais cortes europeias com o
objectivo de conseguir o reconhecimento da independência e de obter apoios
financeiros e militares. Sendo necessário justificar que João IV não era um
rebelde mas sim o legítimo herdeiro do trono, que havia sido usurpado por
Filipe II de Espanha. João IV assume-se como o herdeiro de Catarina de
Bragança, candidata ao trono e afastada por Filipe II em 1580. Das Cortes de
1641 saiu uma nova doutrina que defendia que o poder provinha de Deus através
do povo, que, por sua vez, o transferia para o rei. Em caso de usurpação ou
tirania, o povo tinha o poder de destituir o rei, precisamente o que aconteceu
com Filipe IV. Em 1641 verificaram-se também os primeiros confrontos. O
Alentejo era visado, como parte mais vulnerável do Reino e principal domínio da
Casa de Bragança, além de porta natural da foz do Tejo. O conde de Vimioso
concentrou em Elvas os meios de defesa mas, tendo-se fortalecido em Badajoz, o
conde de Monterrey atacou Campo Maior e Olivença. Vimioso foi substituído por
um militar com experiência ultramarina, Matias de Albuquerque, que providenciou
a defesa das praças, do Marvão a Serpa. Em 1642 houve ataque ao sotavento algarvio,
Alcoutim e Castro Marim, mas o perigo foi conjurado. Na Beira Alta e no Alto
Minho houve apenas escaramuças. Na primavera de 1644 os espanhóis concentraram
seu poderio em Badajoz, e a primeira grande vitória do exército português se
deu em 26 de maio na Batalha do Montijo, além de uma tentativa fracassada dos
espanhóis no cerco de Elvas. Montijo revigorou o ideal da Restauração,
e Matias de Albuquerque recebeu o título de conde de Alegrete. A Espanha estava
fortemente mergulhada na Guerra dos Trinta Anos, «a cuja paz a nação
vizinha aspirava para poder lançar seu peso militar contra Portugal», pelo
que foi preciso esperar pelo fim da guerra entre franceses e espanhóis, em
1659, para que os espanhóis pudessem concentrar todas as suas atenções na
anulação da Restauração portuguesa. Os anos até 1656 foram salvadores para
Portugal, ajudando a coroa a empreender o grande esforço militar e financeiro
para assegurar o triunfo. Momento perigosíssimo para a política deste rei foi
1648-1649, o da reconquista de Angola e São Tomé por Salvador Correia de Sá e
Benevides, a assinatura da Paz de Munster tornara-se um perigo para a
Restauração, pois a Espanha reconhecia aos holandeses a posse das capitanias do
Brasil, o que era de molde a comprometer a dupla política real. O Rei chegou
por um momento a encarar a hipótese de se transferir para a ilha Terceira, a
fim de salvar a coroa da ameaça militar que Filipe IV lançaria sobre o
reino. Chegou a aventar-se o pagamento de uma indemnização para que a
Holanda deixasse o Nordeste brasileiro. E foi do Brasil que veio a solução
militar que em breve iria pôr fim ao domínio flamengo. Em 19 de fevereiro de
1649 ocorreu a segunda vitória dos Guararapes, que tornou irreversível, cinco
anos depois, a expulsão dos holandeses. América portuguesa. Em 1640, por
ocasião da Restauração Portuguesa, o novo monarca, Dom João IV, enfrenta três
desafios de política externa: 1º Reconhecimento da independência lusitana e dos
direitos da dinastia Bragança, 2º Defesa das fronteiras contra a Espanha;
3. Reivindicação de colónias perdidas no ultramar para as Províncias Unidas dos
Países Baixos.
Terreiro do Paço
Rei Dom João IV a caminho do Paço Real
A fonte do Terreiro do Paço
Mestre-de-Campo
Alferes-Porta-Bandeira
Sargento
Piques
Na conjuntura da Trégua dos Doze Anos (1609-1621), até o final da União Ibérica, o comércio com o Brasil formava um núcleo de interesses que seria vital, a partir de 1640, para sustentar a independência recobrada. De oriental, o Império tornava-se atlântico, mudando a base econômica das especiarias ao açúcar. Em termos de Brasil e de colónias espanholas, a trégua dos Doze Anos funcionou bem. Se os zelandeses instalaram-se nas Guianas, o avanço luso-brasileiro sobre o delta do Amazonas, com a fundação de Belém (1615), os isolou e neutralizou. A trégua foi fundamental para a consolidação do Atlântico português. O término da trégua, seguida da criação da Companhia das Índias Ocidentais (1621), que fora protelada durante aqueles anos, desencadeou a ofensiva neerlandesa contra o Brasil. Em 1625, os espanhóis conquistam Breda (Flandres) e restauram a Bahia.
A Rendição de Breda, de Velásquez, retrata o episódio. A esquadra ibérica Jornada dos Vassalos força a retirada neerlandesa de Salvador. Contudo, em 1630, o poder espanhol já não era o mesmo: o fosso entre recursos financeiros e compromissos internacionais aprofundara-se. Somente em 1637, Madrid despacha a Esquadra do Conde da Torre, cujo fiasco abriria espaço para a insurreição de Catalunha e a Restauração Portuguesa em 1640.
O Rei Felipe IV da Espanha e seu ministro o Duque de Olivares ofereceram o reconhecimento do Brasil. A Guerra Luso-Holandesa (por vezes também referida como Guerra
Luso-Neerlandesa) foi um conflito armado entre forças Holandesas da Companhia
Holandesa das Índias Orientais ou VOC e da Companhia Holandesa das Índias
Ocidentais ou WIC, com o Império e colónias portugueses. Fazendo parte da
Guerra da Restauração, entrou para a História como o primeiro grande conflito à
escala planetária. Travada de 1595 a 1663, caracterizou-se principalmente
pelas invasões das companhias majestáticas holandesas aos territórios do
império português nas Américas, África, Índia e extremo oriente. Os confrontos
foram iniciados durante a dinastia Filipina, a pretexto da Guerra dos Oitenta
Anos, travada então, na Europa, entre a Espanha e os Países Baixos. Portugal
foi envolvido no conflito por estar sob a coroa Espanhola dos Habsburgos,
durante a chamada União Ibérica, mas os confrontos ainda perduraram, mesmo
vinte anos após o 1º de dezembro de 1640 da Restauração da
Independência. O conflito estaria pouco relacionado com a guerra na
Europa, servindo principalmente o propósito de estabelecer um império
ultramarino holandês, assim como o domínio do comércio das especiarias,
aproveitando a vulnerabilidade dos Portugueses. Forças Inglesas, rivais de
Espanha e livres da aliança que os ligava aos portugueses durante a União
Ibérica, também auxiliaram os holandeses em certos momentos, até à restauração,
altura em que a aliança voltou vigorar. A guerra resultou na perda do
domínio português no oriente e na fundação do império colonial holandês nos
territórios conquistados. As ambições holandesas noutros teatros de competição
económica, como o Brasil e Angola, foram em grande parte invertidas pelos
esforços Portugueses. Os interesses Ingleses beneficiaram também do conflito
prolongado entre os seus dois principais rivais no
oriente. Antecedentes. Em 1581, um ano após a União Ibérica, os
territórios que formavam a União de Utrecht, também sob domínio dos Habsburgos,
revoltaram-se e depuseram Filipe II de Espanha declarando a República das Sete
Províncias Unidas dos Países Baixos.
Após a derrota da Invencível Armada espanhola em 1588 deu-se uma enorme
expansão do comércio marítimo, com os holandeses a transpor a revolta para os
domínios marítimos espanhóis. O império português, sem autonomia e formado
sobretudo de assentamentos costeiros, vulneráveis a ser tomados um a um,
tornou-se um alvo fácil. O surgimento da potência marítima holandesa foi
rápido e extraordinário: durante anos, marinheiros holandeses haviam
participado em viagens portuguesas ao oriente. Jan Huygen van Linschoten, que
vivera em Lisboa, teria recolhido relatos, informação e mapas, ao integrar a
comitiva de frei Vicente da Fonseca, em 1583, que fora nomeado arcebispo de
Goa. Em 1598, regressaria aos Países Baixos, onde publicou as suas observações
sobre o oriente e a navegação. Cornelis de Houtman, que também passara por
Lisboa, seguiria as suas indicações na primeira viagem exploratória holandesa,
assinando um tratado com o sultão que dominava o estreito de Sunda, entre Java
e Sumatra. Os Países Baixos são geralmente considerados como o agressor,
pois o seu ataque às possessões Portugues as foi unilateral, e a iniciativa da
guerra coube sempre ao lado holandês. Por outro lado, poderia ser invocado que,
estando Portugal sob domínio Espanhol durante o curso da maior parte do
conflito (depois de herdada a coroa de Portugal por Filipe II de Espanha) e
dado que a Espanha combatia os holandeses na Flandres, tentando sufocar a
guerra da independência dos Países Baixos, parece legítimo que os holandeses
levassem a guerra a todos os cantos do Império Espanhol. Esse argumento é,
entretanto, contrariado pelo facto de a Guerra Luso-Holandesa ter prosseguido
depois da Restauração Portuguesa (1640). Como será visto mais à frente, a
verdadeira motivação da guerra foi a tentativa holandesa de tomar o controle do
comércio de especiarias da Índia, o que não é consistente com nenhuma
justificação técnica de defesa militar.
Guerra Luso-Holandesa
Em 1602, foi fundada a Verenigde Oost-Indische Compagnie ou VOC, com o objectivo de partilhar os custos da exploração das Índias Orientais e eventualmente restabelecer o comércio das especiarias, vital fonte de rendimentos da novíssima República das Sete Províncias Unidas. As Sete Províncias Unidas encontravam-se, na altura, em luta contra os Habsburgo pela sua independência, e a razão pela qual os holandeses procuraram apoderar-se do comércio das especiarias foi a sua sobrevivência económica: até à união das coroas Portuguesa e Espanhola, os mercadores Portugueses usavam os Países Baixos como plataforma para introdução das especiarias no norte da Europa, através de uma feitoria em Antuérpia, cidade forçada a render-se aos espanhóis em 1585.
Depois de anexar Portugal, a Espanha declarou um embargo a todas as transacções comerciais com as Províncias Unidas, territórios secessionistas desde a União de Utrecht. Isto significava que, a partir de então, todo o comércio seria feito através dos Países Baixos do Sul, os quais, de acordo com a União de Arras (ou União de Utrecht) eram fiéis ao monarca Espanhol e professavam o Catolicismo Romano, contrastando com o norte holandês, protestante. Isto significava ainda que os holandeses acabavam de perder o seu mais lucrativo parceiro comercial e a sua mais importante fonte de financiamento da guerra contra Espanha. Adicionalmente eles perderiam o seu monopólio de distribuição na França, no Sacro Império Romano-Germânico e norte da Europa. A sua indústria de pescas do mar do Norte e as actividades comerciais cerealíferas no Báltico não seriam simplesmente suficientes para manter a República. A West-Indische Compagnie (WIC) seria fundada, em 1621, para assegurar o monopólio do comércio com as colônias ocidentais. Sua criação foi uma iniciativa de calvinistas flamengos e brabanteses que se haviam refugiado na República das Sete Províncias, para escapar à perseguição religiosa,
Depois de anexar Portugal, a Espanha declarou um embargo a todas as transacções comerciais com as Províncias Unidas, territórios secessionistas desde a União de Utrecht. Isto significava que, a partir de então, todo o comércio seria feito através dos Países Baixos do Sul, os quais, de acordo com a União de Arras (ou União de Utrecht) eram fiéis ao monarca Espanhol e professavam o Catolicismo Romano, contrastando com o norte holandês, protestante. Isto significava ainda que os holandeses acabavam de perder o seu mais lucrativo parceiro comercial e a sua mais importante fonte de financiamento da guerra contra Espanha. Adicionalmente eles perderiam o seu monopólio de distribuição na França, no Sacro Império Romano-Germânico e norte da Europa. A sua indústria de pescas do mar do Norte e as actividades comerciais cerealíferas no Báltico não seriam simplesmente suficientes para manter a República. A West-Indische Compagnie (WIC) seria fundada, em 1621, para assegurar o monopólio do comércio com as colônias ocidentais. Sua criação foi uma iniciativa de calvinistas flamengos e brabanteses que se haviam refugiado na República das Sete Províncias, para escapar à perseguição religiosa,
Cronologia
1595 - Encerramento dos portos portugueses aos navios
holandeses por ordem de Filipe II.
1597 - A guerra Luso-Holandesa começa com um ataque a
São Tomé e Príncipe.
1603 - A nau portuguesa "Santa Catarina" foi
capturada ao largo de Singapura pela recém criada Companhia das Índias
Orientais (VOC). O feito gerou protestos internacionais e serviu de pretexto
para contestar a política de Mare Clausum, em defesa do Mare Liberum, o que
daria sustentação ideológica para que os holandeses quebrassem vários
monopólios comerciais para, em seguida, estabelecerem o seu próprio monopólio,
mediante o uso da sua potência naval.
1605 - Mercadores da VOC capturaram o forte português
de Ambão nas ilhas Molucas. No ano seguinte investiram sobre Malaca, que
resistiu a um cerco de quatro meses.
1607 - Tentaram tomar Moçambique, sem sucesso.
1619 - A VOC conquista Jacarta, a que chamou Batávia,
tornando-a a sua base no oriente. Nos vinte anos seguintes Goa e Batávia
batalharam incessantemente entre si, como capitais dos rivais Estado Português
da Índia e da VOC.
1622 - Macau, várias vezes atacada, resistiu à
tentativa de conquistar a cidade, após dois dias de combate, no que seria a
maior derrota holandesa
1624 - Uma força de 26 navios de uma nova companhia
criada em 1621, a Companhia Holandesa das Índias Ocidentais, ou WIC, sob o
comando do Almirante Jacob Willekens e de Piet Hein conquista a cidade de
Salvador (Bahia), capital do Estado do Brasil. O Governador é capturado e o
governo passa para as mãos de Johan van Dorth. A resistência portuguesa
reorganiza-se a partir do Arraial do rio Vermelho, contendo os invasores no
perímetro urbano de Salvador.
1625 - A Coroa espanhola envia uma poderosa armada
luso-espanhola de cinquenta e dois navios com doze mil homens, sob o comando de
Fadrique de Toledo Osório, conhecida como Jornada dos Vassalos. Esta bloqueia o
porto de Salvador, obtendo a rendição holandesa. Nesse ano Piet Hein tentou um
ataque à Vila de Vitória, na Capitania do Espírito Santo, que foi frustrado
pela iniciativa da jovem Maria Ortiz. Ruma então a Luanda, que ataca.
1630 - A capitania de Pernambuco no Brasil é
conquistada pela WIC, sob comando de Hendrick Lonck. O território ocupado é
renomeado Nova Holanda, abrangendo sete das dezanove capitanias do Brasil à
época. João Maurício de Nassau-Siegen foi nomeado Governador da colónia. No
entanto, grande parte do Brasil permaneceu em mãos portuguesas, que foram uma
constante ameaça ao domínio holandês.
1638 - Os holandeses tomaram São Jorge da Mina na
Guiné, iniciando os ataques nos postos comerciais da costa oeste africana,
visando assegurar escravos para a produção de açúcar nos territórios
conquistados no Brasil.
1640 - Uma armada luso-espanhola falhou o
desembarque em Pernambuco, sendo destruída perto da ilha de Itamaracá. A guerra
pelo Brasil recomeça. Entretanto os holandeses conquistam São Tomé e Príncipe e
Luanda, em Angola, centros fornecedores de escravos. No mesmo ano, após o
golpe de estado do 1º de dezembro, começou a Guerra da Independência de
Portugal, a União Ibérica termina e D. João IV de Portugal ascende ao trono e é
assumida a sua independência do governo castelhano. Nessa altura foram enviados
embaixadores a França, Inglaterra e à República Holandesa, visando formar
parcerias com estes países na luta contra Espanha. Ceilão seria cercada
pela VOC partir de 1640.
1641 - A 12 de junho foi firmado o primeiro Tratado de
Haia, estabelecendo uma trégua de dez anos entre o Reino de Portugal e a
República Holandesa. Foi um Tratado de Aliança Defensiva e Ofensiva entre ambas
as partes. O tratado incluía a formação de uma frota conjunta destinada a
atacar o Reino da Espanha. Na prática a trégua, originalmente firmada para
todos os territórios de ambos impérios, limitou-se ao continente europeu, sendo
ignorada por ambas as partes no resto do mundo.
1641 - A 14 de julho, após uma dura luta que durou
cinco meses, Malaca foi conquistada pelos holandeses da VOC, no que foi o
culminar da guerra e o maior golpe no império português do oriente, privando-o
do importante controlo do estreito.
1641 - Em agosto Luanda é cercada e tomada pela WIC.
1642 - Os holandeses tomam o Axim, no actual Gana.
1645 - Eclode a Insurreição Pernambucana de
luso-brasileiros descontentes com a administração da WIC. Entre 1648-1649 são
travadas as Batalhas dos Guararapes, vencidas pelos luso-brasileiros no Estado
de Pernambuco. A primeira batalha ocorreu em 19 de abril de 1648, e a segunda
em 19 de fevereiro de 1649. As forças lideradas pelos senhores de engenho André
Vidal de Negreiros e João Fernandes Vieira, pelo africano Henrique Dias e pelo
indígena Felipe Camarão, terminam as invasões holandesas do Brasil.
1648 - No Rio de Janeiro, Salvador Correia de Sá e
Benevides prepara uma frota de 15 navios sob o pretexto de levar ajuda aos
portugueses sitiados pelos guerreiros da rainha Nzinga em Angola. Partiram do
Rio de Janeiro a 12 de maio e, através de contactos com padres Jesuítas,
conseguiram reconquistar Luanda em 15 de agosto. A campanha prolongou-se de
1648 a 1652, recuperando Angola e a ilha de São Tomé para os portugueses.
1650 - Os holandeses instalaram-se no Cabo da Boa
Esperança. Em 1652, Jan van Riebeeck, da VOC, instalou aí uma base de apoio à
navegação para o oriente, vindo mais tarde a transformar-se na Cidade do Cabo.
1654 - Em 26 de janeiro de 1654 é assinada a
capitulação holandesa no Brasil, Capitulação do Campo do Taborda, no Recife, de
onde partiram os últimos navios holandeses, que só provocaria efeitos plenos em
6 de agosto de 1661, com o segundo Tratado de Haia.
1658 - Os últimos portugueses abandonam Ceilão,
perdida para os holandeses.
1661 - É assinado o segundo Tratado de paz de Haia.
Portugal aceitou as perdas na Ásia, comprometendo-se a pagar oito milhões de
Florins, equivalente a sessenta e três toneladas de ouro, como compensação pelo
reconhecimento da soberania portuguesa do Nordeste brasileiro, ex-Nova Holanda.
Este valor foi pago em prestações, ao longo de quarenta anos e sob a ameaça de
invasão da Marinha de Guerra. Neste ano Bombaim foi cedida à Inglaterra como
dote do casamento entre a princesa Catarina de Bragança e Carlos II de
Inglaterra.
1662 - Cochim é tomada pelos holandeses quebrando o
acordo assinado. Os Holandeses, temendo perder os territórios já conquistados,
acabariam por selar definitivamente a paz em 1663. Holandês em troca da
retirada do apoio a Lisboa e a Barcelona em 1640. Aclamado João IV, Portugal
tratou de obter apoio da coalizão antiespanhola: França, Províncias Unidas,
Dinamarca, Suécia. Embaixadas especiais foram ainda enviadas à Inglaterra
e à Santa Sé. Só com Inglaterra e Suécia não havia contencioso que dificultasse
o entendimento. O litígio colonial constituía um estorvo à normalização das
relações entre Portugal e Províncias Unidas, ainda que ela fosse de interesse
tanto da Haia quanto de Lisboa. Portugal insistia que a posse injusta não
poderia gerar títulos. Como Madrid haveria usurpado o Reino, Haia deveria
restituir o que lhe tomou. As relações luso-neerlandesas restabeleceram-se sob
o signo da desconfiança mútua. Em 1641, um tratado consagrou uma trégua de dez
anos. Ele pode ser considerado benéfico aos portugueses, já que o estado de
guerra convinha à Companhia das Índias Ocidentais e à Companhia das Índias
Orientais. Porém, foi recebido, no Reino, como uma derrota diplomática.
Esse acordo de trégua de dez anos congelou o “status quo” territorial, previu a cooperação naval contra a Espanha, bem como a compra de armamentos e o recrutamento de tropas nas Províncias Unidas. Quanto à restituição das colónias, o artigo 24 previa eventual reivindicação. O tratado ainda normalizou o comércio, assim como garantiu liberdade religiosa aos comerciantes neerlandeses em Portugal. A trégua vigoraria no ultramar a partir da data de recebimento nas colônias do comunicado oficial de ratificação. Não havia artigo relativo à devolução de colónias tomadas após a assinatura do tratado, como Sergipe (gado), Maranhão (fortaleza militar) e Angola (escravos) entre 1641 e 1642. Apenas em julho de 1642, o Brasil Holandês recebeu o comunicado oficial da trégua, após haver-se expandido. Ao generalizar-se a ideia de que os neerlandeses não eram confiáveis e de que o restante do Brasil corria risco, a opção pela restauração militar do Nordeste tomou fôlego. Nesse contexto, o decreto régio que criou o Conselho Ultramarino, em 1643, visava rever as relações de força no Atlântico sul. Um plano insurrecional no Brasil holandês começou a ser aventado, uma vez que o confronto direto resultaria em derrota lusitana. O plano não adveio dos conselhos da Coroa, senão de cabala palaciana protagonizada pelo conde de Penaguião (camareiro-mor de Dom João IV). Malgrado veto do Conselho de Estado, órgão administrativo central, a trama prosperou. Nomeado governador-geral do Brasil, António Teles da Silva chegou a Salvador, em agosto de 1642, com o objetivo de articular a insurreição.
Enviou Vidal de Negreiros a Recife para sondar ânimos e verificar o estado militar. A trégua de 1641 foi recebida com decepção ainda maior entre os luso-brasileiros do Brasil holandês que na metrópole. Já em 1641, um grupo de homens, inclusive João Fernandes Vieira, havia tomado a iniciativa de despachar uma carta a Lisboa, informando-o de que estavam prontos para a restauração no Brasil holandês. Enquanto Maurício de Nassau governava, a conspiração fora contida por sua ampla aceitação. Contudo, sua partida deu fôlego à trama. Quanto, em 1648, a questão pernambucana tiver atingido seu auge em Lisboa, os pareceres em prol da continuação terão a convalidação do rei. O plano insurrecional foi tramado em sigilo. Provas de cumplicidade régia com os colonos foram evitadas. Na metrópole, o Conselho Ultramarino foi marginalizado dessas decisões. Poucos sabiam do que transcorria. Na expectativa do desfecho das operações em 1645, João IV ordenou a suspensão dos entendimentos diplomáticos na Haia.
O triunfo a meias da insurreição revelou-se um desastre diplomático. Não reconquistar tudo de uma vez era pior que reconquistar nada, o rei arcava com o ônus da violação da trégua. Em abril de 1646, Sousa Coutinho oficializou a proposta de compra aos Estados Gerais, que não arredavam o pé da restituição. Em fins de 1646 e em 1647, o rei decidiu-se por sustentar a insurreição de modo que a utilizasse como pressão diplomática sobre os Estados Gerais.
O jesuíta António Vieira aconselhou o monarca a elevar a proposta de compra, com receita adicional para suborno. Sucederam-se negociações sobre entrega do Nordeste, em face de preocupações com a hostilidade espanhola. O Acordo da Haia visava à paz com as Províncias Unidas ao preço da entrega do Nordeste. Muitas vozes protestaram no Reino: a aristocracia, a Igreja, a burocracia régia, o Conselho de Estado e a praça de Lisboa. As oscilações de João IV em face do negócio do Brasil devem ser entendidas no contexto da fragilidade de seu trono. A restauração fora um golpe dos estratos médios da nobreza contra a alta nobreza, maior beneficiária da União Ibérica no lado lusitano. A consolidação ocorreria apenas com o tratado de paz com a Espanha (1668). Importa notar que, até 1706, o processo decisório baseava-se em um demorado trâmite entre os conselhos, de cujos pareceres dependiam a decisão régia. A função do rei era arbitral entre os estamentos. A entrega do Nordeste viera a exasperar a fibra sebastianista do Reino, que fora reanimada pela restauração oito anos antes. Os partidários da paz logo perderiam a parada para os “valentões”, que queriam a guerra. António Vieira manteve-se em defesa do Acordo. Seria acusado de “entreguista” por toda a vida.
Os argumentos críticos ao texto da Haia prevaleceram, e o tratado foi rejeitado:
1. A ideologia de expansão ultramarina, a saber, a propagação da fé católica, favorecia a intervenção do Reino.
2. Quer por ter começado com ordem régia, quer por proteção contra usurpadores estrangeiros, o rei teria o dever moral de apoiar a insurreição.
3. O acordo seria injusto. Ressarcia as Províncias Unidas pelo Nordeste, mas ignorava prejuízos lusitanos em Angola, São Tomé e Ceilão.
Em 1649, a Companhia Geral de Comércio do Brasil foi criada por João IV, em aberta oposição do Santo Ofício. A empresa teve origem em uma ideia de António Vieira, que idealizara uma companhia semelhante às companhias das índias ocidentais e das índias orientais. Foi o procurador da Fazenda, Pedro Fernandes Monteiro quem reuniu os “assentistas”, comerciantes que financiavam a Coroa, em torno do projeto. Em troca do monopólio do fornecimento de quatro gêneros (trigo, vinho, azeite e bacalhau) para a colónia por 20 anos, da concessão do estanco régio sobre pau-brasil e da cobrança de taxas e fretes, a companhia geral manteria uma escolta protetora de 36 vasos de guerra. Vieira foi contrário ao resgate do projeto, pois defendia o Acordo da Haia.
1649 é, aliás, o ano da primeira denúncia contra Vieira, junto ao Santo Ofício. Nos anos de 1660, ele seria encarcerado. As conseqüências do segundo conflito anglo-neerlandês (1652-1654) constituem exemplo de interferência de uma sequência histórica em outra, e não de acaso. Esboçou-se uma aliança anglo-portuguesa em detrimento das Províncias Unidas. A Companhia das Índias Ocidentais perdeu o Recife e as praças costeiras. Não que o conflito tivesse interrompido as comunicações entre a república e o Brasil holandês, mas estorvou o envio de ajuda devido à concentração de forças na Europa. Ao surgir diante de Recife, em 1653, a armada da Companhia Geral de Comércio deparou-se com poucos navios inimigos.
A demanda por embarcações bem artilhadas de grande porte no Brasil, durante a guerra holandesa no Brasil, deu impulso à influência inglesa no Reino. O acordo luso-inglês de 1654 é o primeiro de uma série que culminaria em Methuen, consolidando a hegemonia comercial da Inglaterra em Portugal. Seria danoso aos interesses lusitanos, pois concedia mais favores ao comércio inglês que ao português. Em maio de 1654, conhecida nas Províncias Unidas, a capitulação de Recife, Haia reagiu por meio da emissão de cartas de marca contra a navegação portuguesa ao norte da linha equatorial, e a Companhia das Índias Ocidentais continuou a pregar a recuperação do Brasil holandês. Não obstante, amiudavam-se em Portugal os rumores de represálias batavas. Havia receios de operações anglo-neerlandesas, após a paz, contra o reino católico. Quando da paz de Westminster, ventilou-se a ideia de reconhecimento inglês do Brasil holandês. Na agenda exterior batava, o Brasil holandês não poderia ter prioridade sobre o Báltico, onde Estocolmo atritava com Haia. Porém, Portugal não fora esquecido. Finda a guerra com a Inglaterra, os neerlandeses rearmam e reorganizam sua marinha. Solucionada a questão báltica, o poder batavo poderia virar-se contra o reino.
O Tejo chegou a ser bloqueado por forças neerlandesas. Acuado, Portugal aceitou o Tratado da Haia, de 6 de agosto de 1661, que convencionou a indenização pelo Nordeste. A coroa adiou o quanto pôde a sua divulgação. A implementação foi motivo de dissídio de lado a lado. Portugal postergava: não havia como o Reino honrar as cláusulas financeiras, quanto às comerciais, além de ruinosas, requeriam negociações de recompensas à Inglaterra. Como não dispunha de recursos para comprar a paz com as Províncias Unidas e a aliança com a Inglaterra simultaneamente, Portugal ratificou o tratado da Haia de modo a descumpri-lo. A comunicação oficial da paz ao Brasil tardou até 1663.
As cortes em Lisboa em 1653, juraram herdeiro Afonso, futuro Afonso VI de Portugal, dada a morte aos 19 anos de seu irmão, o brilhante príncipe Teodósio e permitiram um novo esforço militar e financeiro que esteve na base das vitórias alcançadas um decénio mais tarde. Morte e juízo dos cronistas. O rei faleceu em 6 de novembro, devido ao «mal da gota e da pedra» de que fala o conde da Ericeira, doença que se manifestara em 1648. Jaz no Panteão Real da Dinastia de Bragança, no mosteiro de São Vicente de Fora, em Lisboa. No seu testamento, datado de 2 de novembro de 1656, confiou a regência à mulher, Luísa de Gusmão. Diz Veríssimo Serrão que «a historiografia liberal procurou denegri-lo na acção de governo, mas as fontes permitem hoje assentar um juízo histórico completamente diferente. (...) Deve pôr-se em relevo a acção do monarca na defesa das fronteiras do Reino (....). Também providenciou no envio de várias embaixadas às cortes europeias, para a assinatura de tratados de paz ou de trégua, a obtenção de auxílio militar e financeiro e a justificação legítima de 1640.» Deve-se-lhe a criação do Conselho de Guerra (1640), da Junta dos Três Estados (1643), do Conselho Ultramarino (1643) e da Companhia da Junta de Comércio (1649), além da reforma em 1642 do Conselho da Fazenda. E a regulamentação dos negócios da Secretaria de Estado, para melhor coordenação das tarefas de Governo. Esta em 29 de novembro de 1643 foi dividida em Secretaria de Estado, de um lado, que coordenava toda a política interna e externa, e à «das Mercês e Expediente», do outro, que tratava de «consultas, despachos, decretos e ordens não dependentes da outra Secretaria. Promulgou abundante legislação para satisfazer as carências de governo na Metrópole e no Ultramar. E, para além do monarca e do restaurador, impõe-se considerar nele o artista e o letrado, o amador de música que, no seu tempo, compondo o hino Adeste Fideles, esteve à altura dos maiores de Portugal.». Títulos e estilos (19 de Março de 1604-29 de Novembro de 1630); Sua Excelência, Dom João de Bragança. (29 de Novembro de 1630-1 de Dezembro de 1640); Sua Alteza, O Sereníssimo Duque de Bragança, etc. (1 de Dezembro de 1640-6 de Novembro de 1656); Sua Majestade, O Rei de Portugal e dos Algarves.
O estilo oficial de D. João IV enquanto Rei de Portugal. Pela Graça de Deus, João IV, Rei de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor(a) da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Honrarias. Enquanto monarca de Portugal, D. João IV foi Grão-Mestre das seguintes Ordens. Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ordem de São Bento de Avis. Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem de Sant'Iago da Espada. Antiga e Muito Nobre Ordem da Torre e Espada. Genealogia-Ascendência. Ancestrais de João IV de Portugal. Casamento e descendência. Não tendo vingado o projeto de casamento com Mademoiselle de Nevers, encaminhado pelo cônsul francês Saint-Pé (1625), veio a escolher mulher na Casa de Medina-Sidónia (uma das maiores de Espanha), recebendo Luísa de Gusmão por esposa em 12 de janeiro de 1633 em cerimônia de grande fausto.
Casou em Elvas com Luísa de Gusmão, batizada Luísa Maria Francisca, nascida em Sanlucar de Barrameda 13 de outubro de 1613, que morreria em 27 de fevereiro de 1666 no claustro de Xabregas, em Lisboa. Era filha primogênita de Juan Manuel Perez de Guzman, 8º duque de Medina-Sidonia e Joana de Sandoval, filha do 1.º duque de Lerma Francisco Sandoval, de grande nobreza, neta pelo lado paterno dos duques de Bejar e de Pastrana, e pela mãe dos duques de Gandia e de Medina Coeli. Trouxe grande dote e inteligência, dando-lhe sete filhos. A ratificação do casamento realizou-se com grande pompa em Elvas a 12 de janeiro de 1633, celebrante o bispo Sebastião de Matos Noronha, futuro Arcebispo de Braga, havendo grandes festas em Vila Viçosa. O casamento respondia ao desejo do conde-duque de Olivares, tanto que restituiu à casa de Bragança o ducado de Guimarães e outras prerrogativas. Ela seria regente do reino de 1656 a 1662. Seu irmão, o general Gaspar Alonso Pérez de Guzmán (morto em 1664), foi 9º duque de Medina Sidonia, governador da Andaluzia, e conspirou com o Marquês de Ayamonte para uma Andaluzia independente, na imitação do cunhado. Descoberta a conspiração, perdeu parte dos bens.
9. Dom Teodósio III de Bragança, 9.º Duque de Bragança
Príncipe herdeiro de Portugal. D. Teodósio de Bragança (Vila Viçosa, 8 de fevereiro de 1634-Belém, 6 de dezembro de 1653), primogénito do Rei de Portugal, D. João IV e da Rainha D. Luísa de Gusmão. Herdeiro da coroa portuguesa, 9.º Duque de Bragança (como D. Teodósio III) e 1.º Príncipe do Brasil, título especialmente criado em sua honra, enquanto herdeiro do trono, por carta do pai de 27 de Outubro de 1645.
Desde cedo vocacionado para o exercício do poder, revelou grandes dotes para as letras e para a música, à semelhança de seu pai; contudo, a sua morte prematura, aos 19 anos, apartou-o do trono, levando ao poder, em seu lugar, seu irmão D. Afonso, mentalmente débil. Com apenas seis anos, impusera-se como a grande esperança da Restauração da Independência de Portugal. «História de Portugal»: «recebera uma boa educação literária, científica e militar, contribuindo para a sua formação o padre António Vieira, que lhe moldou o espírito religioso na consciência do grande papel que o destino lhe reservava. O impulso da juventude o fez visitar em 1651 os castelos do Alentejo, onde animou os soldados e as populações; e, no regresso a Lisboa, viu-se nomeado capitão-general das armas do Reino. Para ele houve várias tentativas de consórcio, mas a diplomacia portuguesa não conseguiu impor o projecto na corte de França. Referem os cronistas que era muito devoto e, ao mesmo tempo, impregnado de ideal guerreiro. Mas tinha uma saúde frágil, pelo que aos 19 anos não resistiu aos efeitos de uma tuberculose pulmonar de que há muito padecia.» A ascendência do Príncipe Teodósio do Brasil.
Rei Afonso VI de Portugal
Rei Afonso VI de Portugal (Lisboa, 21 de agosto de 1643-Sintra, 12 de setembro de 1683) foi o vigésimo segundo rei de Portugal e o 2.º Rei de Portugal da Dinastia de Bragança. Nascido apenas como infante de Portugal, Afonso não estava destinado a reinar nem foi preparado para tal, em virtude do herdeiro da coroa ser o seu irmão mais velho, o brilhante príncipe Teodósio de Bragança. A sua formação foi pouco cuidada, à semelhança dos restantes irmãos, o que se confirma quando Catarina parte para a Inglaterra, em virtude do seu casamento com o rei Carlos II, quase sem saber falar inglês. Ao contrário dos seus irmãos, Afonso passou a sua infância e juventude em Lisboa, num ambiente tenso e mergulhado em preocupações políticas, governativas, militares, entre outras. Com 3 ou 4 anos de idade, atinge-o uma «febre maligna» que lhe afecta o lado direito do corpo e que se repercutirá na sua vida em variados aspectos, desde políticos a familiares e sexuais. Uma doença do sistema nervoso central, pensa-se hoje, talvez uma meningoencefalite, uma doença de foro nervoso, como propõe Montalvão Machado. A morte do irmão, Teodósio, sucede-se a 13 de maio de 1653 e, a 17 de novembro do mesmo ano, falece Joana. Passa Afonso para a ribalta como novo herdeiro do trono de Portugal. Criação da Casa do Infantado. Poucos anos antes de falecer, João IV dispensa em benefício do infante Pedro, que mais tarde se tornaria rei de Portugal, um vasto património de senhorios, grande parte deles usurpados aos nobres contrários à Restauração que haviam partido para Espanha. Estes senhorios estendiam-se ao longo do território português, do Norte ao sul do Alentejo, e estão na origem da Casa. Garantia-se assim, não só «o mantimento dos filhos segundos da coroa», nas palavras de Veríssimo Serrão, mas também o suporte da descendência de forma a perpetuar o Sangue Real Português o mais que se pudesse. Porém, alguns historiadores interpretam esta medida de forma diferente: com a debilidade da Monarquia Portuguesa, que nem sequer era reconhecida internacionalmente, e a insegurança que representava da incapacidade do Herdeiro, inclusive a gerar descendentes, esta medida conseguia colocar nas mãos da Família Real um vasto património, que garantiria a sua importância senhorial.
A Casa do Infantado e a Casa do Cadaval, com quem a Monarquia mais tarde contraiu alianças, formavam a trindade da Nobiliarquia Portuguesa e, embora tivessem todas elas ligações à Coroa, as suas possessões estavam segregadas do património do Estado. Subida ao trono e regência de D. Luísa. Volvidos três anos, falece João IV, deixando como sucessor Afonso, cuja idade ainda não lhe permitia governar e com capacidade mental duvidosa para assumir a função. Foi aclamado e jurado rei a 15 de novembro de 1656. O boato de que sofria de alguma doença mental levou a que se levantasse a questão do adiamento da cerimónia. No entanto, a data manteve-se por entendimento da rainha. O discurso de praxe coube ao doutor António de Sousa Macedo, jurisconsulto e diplomata, o qual destacou não a figura de Afonso mas a de seu pai, a quem definiu como «hum sugeito quasi divino». Não deixou de invocar os feitos dos reis anteriores, provavelmente com o propósito de despertar o brio do jovem monarca, cuja nação se preparava para o recomeço da ofensiva espanhola, que já se fazia anunciar, e ao qual incumbia o dever de juntar todas as forças para, ao fim de vinte e oito anos de guerra, não comprometer a independência face ao país vizinho e todo o processo de restauração.
Este era o dia em que se iniciava também a regência da sua mãe, Luísa de Gusmão. A regência de Luísa centrou-se, inicialmente, na organização do governo de modo a impor-se às facções palacianas em jogo. Nomeia então, Francisco de Faro, Conde de Odemira, para aio de Afonso e mantém os oficiais da Casa Real que exerciam tais funções no tempo do seu marido. Francisco, filho do segundo Conde de Faro, Estevão de Faro, e de Guiomar de Castro, filha do quarto Barão do Alvito, João Lobo da Silveira, e neta, por parte da mãe, do segundo Senhor de Lavre e Estepa, João Mascarenhas. Através dos matrimónios das suas filhas, Maria e Guiomar, traçou relações com o sétimo Conde da Feira e com o primeiro Duque de Cadaval, o célebre Nuno Álvares Pereira de Melo, e com o terceiro conde de Vila Nova de Portimão, respectivamente. Francisco, como se constata, pertencia a uma das famílias mais poderosas e de maior tradição em Portugal, e com ligações de parentesco directas com outras casas de suma importância, como é o caso da Casa de Cadaval. O Pedro Vieira da Silva e Gaspar Faria Severim, comendador de Moura, couberam o Conselho de Estado. Porém a rivalidade entre Francisco e o Conde de Cantanhede dificulta a regência da mãe de Afonso. Esta vê-se obrigada a nomear a «Junta Nocturna», assim conhecida por ter reuniões à noite. Para além dos dois nobres em disputa, constavam nela outros oficiais de confiança, como o marquês de Nisa, Pedro Fernandes Monteiro, o conde de São Lourenço e frei Domingos do Rosário, diplomata experiente. Esta Junta teve bastante utilidade e agilidade aos comandos dos negócios públicos. Amizade com António Conti. Com 13 anos, narra Veríssimo Serrão, divertia-se observando de uma janela do paço real rapazes de baixa condição nas suas brincadeiras, que incluíam lutas e outras arruaças.
O rei não se coibia de aplaudir tais lutas, incitando o grupo seu favorito. Nas arcadas do pátio para onde dava a dita janela, reuniam-se mercadores e outros negociantes. Entre eles estava António Conti, "que tinha tenda de fitas, meias e mais adornos femininos". Este astuto genovês soube insinuar-se nas boas graças do monarca, aplaudindo os seus protegidos e ofertando-lhe bugigangas condizentes com o seu pouco apurado gosto, sempre que o rei descia ao pátio para conversar com ele. Conti tratou de lhe apresentar o seu irmão e também outros rapazes, incluindo negros, lacaios, mouros e outros de ínfima estirpe. Tomando posse da sua Casa, a 7 de Abril de 1660, Afonso introduz António Conti no paço, concedendo-lhe alojamento, um quarto com porta para a câmara do próprio rei, causando, claramente, um escândalo na corte. Divertiam-se todos em combates de lebreus, primeiro no paço, depois no próprio terreiro, em público. Aquele bando ignóbil não abandonava nunca o rei percorriam todos a cidade, de noite, apedrejando janelas, arremetendo contra os transeuntes. A incapacidade física de D. Afonso tornava ainda estes espectáculos mais repugnantes. Atirando-se por bazófia a empresas atrevidas, sempre se saia mal, obrigando-se a fazer-se reconhecer, para não ser maltratado pelas pessoas que provocava. Por vezes enchia o paço de mulheres perdidas, também por bazófia, porque não era menos incapaz para as lutas amorosas que para as lutas guerreiras. Carlos Leite Ribeiro. Atribui a António Conti igualmente o foro de moço do guarda-roupa do rei. Assim, tinha o privilégio de assistir aos vestir e despir da real pessoa, que o designou também moço das chaves. António consegue ainda do rei que este o tornasse fidalgo, lhe concedesse uma comenda e ainda o hábito da Ordem de Cristo. O monarca dispensa-lhe ainda uma capela cujo rendimento se acercava dos 1.000 Cruzados. Nestas saídas nocturnas, de acordo com as descrições do Conde da Ericeira, que documentou grande parte da Restauração, o rei não se poupava a esforços para conquistar «a afeição tanto das mulheres mais expostas, quanto das mais recatadas, crescendo de sorte, que, passando do rebuço da noite à manifesta claridade do dia, não perdoava nem ao sagrado das igrejas». De facto, duas freiras do convento de Odivelas, já frequentado pelos monarcas desde Dinis e onde floresciam casos amorosos, disputavam do favor régio, Ana de Moura e Feliciana de Milão. Provavelmente para impressionar alguma das duas senhoras, Afonso quis tourear no pátio daquele convento, acabando por cair e magoar-se. Segundo a tradição, foi sangrado e Ana de Moura sangrou-se também, não tanto pela necessidade, mas para «fazer finaeza a Sua Majestade.» A regente, de início, tentou apaziguar estas atitudes e impedir que o rei mantivesse contacto com estes rapazes, aconselhando-o. Porém, Afonso não a escutava, nem tão pouco aos conselheiros, entre os quais o conde de Odemira, Francisco. As brincadeiras de mau gosto continuavam, eram motivo de preocupação na corte e no reino e Luísa teve que tomar uma medida drástica. É implementada a pena de açoites e degredo a quem, com mais de quinze anos, «jogasse pedradas». António Conti é afastado da corte. Francisco de Faro aproveita o mote e expulsa o grupo do paço, que ali entrava a seu belo-prazer.
Quem não gostou foi, obviamente, Afonso, que, ao ver-se impedido de contactar com os seus amigos, volta a sua ira contra a mãe e contra os membros do conselho de estado, incluindo Francisco. Surgem então na vida do jovem rei dois jovens cortesãos que lhe restituem as amizades perdidas. São eles Jerónimo de Ataíde (um dos filhos da célebre Filipa de Vilhena), e Luís de Vasconcelos e Sousa, que ficou para a História como o célebre conde de Castelo Melhor, título que lhe pertencia. Como diz Veríssimo Serrão, «não [se aproximaram de D. Afonso] porque lhes conviesse a vida escandalosa deste mas porque sentiam que o favor régio estava a seu alcance logo que ele tomasse o poder». A Batalha da Linha de Elvas. Mereceu Afonso o epíteto de O Vitorioso, por no seu reinado Portugal ter vencido a Espanha em várias batalhas da Guerra da Restauração. Em dez anos, mais ou menos o tempo em que combateu o país vizinho, diz António Pereira de Figueiredo, que foram cinco as vezes em que os portugueses combateram os castelhanos durante o seu reinado, por ocasião da Guerra da Restauração, sempre em menor número que os adversários. Logo no início do ano de 1657, a regente é informada pelo Conde de Soure que os espanhóis reuniam tropas para invadir Portugal na Primavera. Pouco tempo depois André de Albuquerque, general português, precisa o local de ajuntamento das tropas. Badajoz. Constava ainda que o próprio monarca vizinho viria dirigir um poderoso exército a Mérida. Substituído o conde de Soure no comando das operações militares nacionais no Alentejo, é o conde de São Lourenço que se encarrega de tal tarefa. Providencia a nomeação de capitães nas praças de Castelo de Vide, Marvão e Vila Viçosa e chama reforços de Trás-os-Montes, das Beiras e do Algarve. A zona do Guadiana é, em princípios do mês de Abril, dominada pelos espanhóis. Não resistiram as praças de Olivença e Mourão. Já em 1658, sabe-se então da pretensão das tropas de Filipe em ocupar Vila Viçosa. Eis que surge um dos grandes generais da Restauração, Sancho Manoel, governador da Praça de Elvas. Luis de Haro e as suas tropas, de cerca de 20 mil homens e muita artilharia, cercam Elvas, cerco este que se mantém durante três meses. Dentro das muralhas, resistiram os portugueses sob diário fogo de artilharia. Trezentos mortos por dia foi o resultado da peste que também se abateu sobre os militares. Esperavam-se os reforços vindos de todo o país, comandados pelo conde de Cantanhede, António Luís de Menezes, que não tardaram a chegar. A batalha era decisiva, pois estava em causa o controlo de Lisboa. É a 14 de janeiro de 1659 que se dá a batalha nos campos de Elvas, ganha pelos portugueses. Sancho recebe em troca da sua valentia em Elvas, o título de Conde de Vila Flor. Porém, a batalha (viriam os portugueses a perceber mais tarde) não foi definitiva, pois o Tratado dos Pirenéus deixa a Espanha sem outros encargos militares (...) em breve, o Rei voltaria a sentir os efeitos de uma ameaça, porventura mais grave. Antes, todavia, deflagra uma crise política no sei da corte, que opõe Luísa a Afonso, mãe e filho, pelas rédeas do Poder. A rainha chegou a encarar a hipótese de o infante Pedro, seu 3.º filho, vir a ser jurado herdeiro do trono, para o que recebeu a Casa do Infantado, ainda no tempo de D. João. Mas tendo falhado o golpe palaciano de 1662, que visava o desterro de António Conti no Brasil ou, talvez mesmo, a prisão do monarca, abriu-se o processo que levou ao termo da regência em 23 de Junho de 1662, à entrega do poder efectivo ao rei. Ascensão ao Poder. Foi a regente, Luísa de Gusmão, quem nomeou os condes de Castelo Melhor e Atouguia como aios do jovem monarca, mas essa nomeação iria voltar-se contra as suas pretensões e afastá-la definitivamente do poder do reino.
Não oferece dúvida que foi o conde de Castelo Melhor o cérebro da manobra que afastou a rainha da vida pública, tendo nela participado o conde de Atouguia e Sebastião César de Meneses. Ambos levaram o rei para Alcântara, para onde convocaram a nobreza, retirando-se ao Paço da Ribeira o centro de decisão política. Para alcançar o poder, foram dois os argumentos de Afonso: a busca de meios para defrontar a ameaça que representava Castela e poupar a sua mãe do «contínuo trabalho» que lhe cabia como regente. Por Ordem Régia de 22 de Junho de 1662, invoca-se um princípio jurídico inabalável, a que todos deveriam obedecer. A rainha, tratada com o maior respeito pelo grupo de Castelo Melhor, manteve-se no paço até março de 1663, recolhendo-se então ao convento dos Agostinhos Descalços (ou dos Grilos). Em carta à ausente filha Catarina, rainha de Inglaterra, define o ocorrido como uma conspiração. Na mesma carta, não chega sequer a referir o nome de Pedro, o seu segundo filho, irmão de Afonso, devido à sua tenra idade, que não lhe permitia a participação nesta disputa de poder. O país ficar-lhe-ia em dívida pela coerência e pulso firme com que garantiu a nova dinastia e as condições de independência de Portugal face ao país vizinho. A inclinação que teve pelo filho segundo terá provavelmente sido fruto da incapacidade que Luísa via no legítimo herdeiro e que poderia comprometer os vinte anos de luta que se travaram até ali.
Morreu ela a 27 de novembro do ano seguinte, no convento do vale de Xabregas. Em testamento, lavrado a 26 de fevereiro de 1666, declara Afonso como seu herdeiro e testamenteiro. Ao outro filho deixou as dívidas, a protecção dos criados que a serviam e pede-lhe ainda que proteja as obras de caridade às quais o seu nome se encontrava ligado. O golpe palaciano que a depôs é assim descrito: O conde de Castelo Melhor, auxiliado por alguns fidalgos, conseguiu que o monarca saísse para Alcântara, e daí fizesse saber a sua mãe que resolvera assumir o poder. A rainha tentou resistir por boas razões e conselhos, porém nada conseguiu, porque o conde de Castelo Melhor, disposto a subir ao poder, não desistia por caso algum.
A 29 de Junho de 1662, el-rei assumiu definitivamente o governo do reino, ou antes, em seu nome o conde de Castelo Melhor, que se fez nomear escrivão da puridade. O conde empregou sua astúcia em afastar de junto do rei as pessoas que podiam ofuscar-lhe o seu valimento, até conseguiu que a própria rainha se afastasse, acolhendo-se ao convento do Grilo. É certo porém, que se o conde se serviu de meios nem sempre dignos para subir ao poder, mostrou-se digníssimo em exercê-lo. O reinado de D. Afonso VI deveu-lhe a glória que o iluminou, e o inepto soberano pôde alcançar na história o epíteto de o vitorioso. O conde de Castelo Melhor.
Luís de Vasconcelos e Sousa, terceiro conde de Castelo Melhor, com apenas 26 anos, vivera exilado em França durante dois anos, devido a suspeitas do seu envolvimento na morte do conde de Vimioso. Quando regressa a Portugal, combate em defesa do Minho, ficando ferido com gravidade. Retornado à corte, recebe em 1659 o ofício de reposteiro-mor do Paço, em já em 1662 exercia funções de camareiro de serviço, estando constantemente em contacto com as figuras régias e a família real, o que o tornava uma das personalidades mais distintas na corte portuguesa. Hoje equivaleria às funções de um Primeiro-Ministro. Terá encabeçado o golpe que destituiu a regente, e colocou o soberano à cabeça do poder do reino, juntamente com o Conde de Atouguia e outros fidalgos de nobreza média. Todos veriam no rei um espaço para a sua ascensão social e política. Após a crise de 1662 que lhe concede o poder efectivo, Afonso VI logo reconheceu os préstimos do conde Luís ao nomeá-lo criado de escrivão da puridade, fiando-lhe «os maiores negócios do reino». Este cargo, ao longo da segunda disnatia, tinha sido quase sempre destinado ao funcionário régio de maior confiança. Hoje equivaleria às funções de um primeiro-ministro. Portanto, com este ofício, à mercê da centralização do poder que a Restauração impunha, era-lhe confiada a máquina de administração pública. Hoje equivaleria às funções de um Primeiro-Ministro. Se o reino usufruiu da eficiente regência de Luísa de Gusmão, também nada perdeu com a troca, pois Luís, aos comandos da administração pública demonstrou a garra de um verdadeiro estadista, como refere Veríssimo Serrão. Essa firmeza política demonstrou-a na condução das grandes batalhas que se seguiriam à tomada de posse de Afonso. Este curto espaço de tempo entre a queda da regente e a chegada de Castelo Melhor ao poder, foi predominante para a diplomacia portuguesa e para o comércio internacional. Catarina de Bragança, que anteriormente já havia sido proposta por Frei Domingos do Rosário, diplomata português, como esposa de Luís XIV, viu tal proposta ser recusada por influência de Mazarino. Se o casamento vingasse, seria um triunfo para a diplomacia portuguesa. Surge então o tratado anglo-luso de 1661, que visava o apoio mútuo entre o Portugal e a Inglaterra e, em virtude do tratado, a princesa portuguesa é proposta em casamento a Carlos II de Inglaterra, que aceita.
Em causa estava também um vasto dote que Portugal teria que pagar pelo matrimónio, razão pela qual D. Luísa, ainda como regente, teve que recorrer à ordem da Junta dos Três Estados para conseguir o dinheiro necessário, visto que o pagamento, por exigência do rei inglês, deveria ser feito o mais brevemente possível. A 25 de abril de 1662, a irmã de Afonso parte rumo ao seu novo reino. A França, por sua vez, não faz nenhuma objecção a este tratado, apesar da sua rivalidade com a Inglaterra, graças ao apoio do marechal Turenne, que permitu a vinda do general alemão Schomberg mais 600 oficiais, e soldados para servir na fase mais crítica das guerras da Restauração.
Ver Espanha enfraquecida face à hegemonia da França, decerto correspondia aos objectivos de Luís XIV. Assim, além de não hostilizar o tratado, a França firmou o tratado de liga formal com D. Afonso VI, que contribuiu posteriormente para a paz com Espanha.
Com a Holanda as relações externas não eram assim tão pacíficas, visto ser este país, um dos grandes inimigos de Portugal, por se ter apoderado de várias capitanias do Brasil e outros portos de pertença portuguesa, aquando do domínio filipino. Após um tratado ratificado por D. João IV, as hostilidades cessaram durante 10 anos. Porém, os territórios continuavam a ser ainda holandeses. Após várias propostas de devolução das capitanias do Brasil em troca de regalias no comércio do sal de Setúbal e pagamento de três milhões e meio de cruzados, arrastam-se as negociações até que em agosto de 1661 o tratado de paz é assinado. Ratificado por Afonso VI a 24 de maio de 1662, mesmo ficando por regular alguns pontos decorrentas da aplicação do tratado, Portugal teve que contribuir com quatro milhões de cruzados e a restituição da artilharia dos holandeses, a pagar no prazo de 16 anos. Assim se fez a paz entre Portugal e a Holanda. As relações com a Escandinávia pareciam intermitentes, sendo que de Cristiano IV da Dinamarca pouco apoio se conseguiu face à posição política do país quanto à Espanha. A Suécia, por sua vez, em 1654 renuncia a independência de Portugal e reconhece Filipe IV como rei deste país. As alianças diplomáticas que tanto custaram a João IV construir e a Luísa a manter pareciam agora desmoronar-se. A relação entre as duas coroas foi interrompida, de 1659 a 1662, já com o governo português nas mãos de Castelo Melhor.
Contudo, as relações comerciais falaram mais alto e a Suécia vê-se obrigada a voltar atrás, de modo a evitar as desvantagens do monopólio do sal de Setúbal para os ingleses e holandeses e também devido a interesses mercantis no Brasil e Guiné. Todavia, a aproximação diplomática entre Afonso VI e Cristina da Suécia, não teve grande utilidade na Restauração da independência. A independência portuguesa representava uma faca de dois gumes para a Santa Sé, visto que a Igreja nada tinha contra a emancipação portuguesa, mas também não podia reconhecê-la devido à influência política da Espanha. Este foi sem dúvida o campo de actuação mais difícil para os diplomatas portugueses. Só com a paz com Espanha, o papa Clemente IX alterou a atitude romana face às pretensões espirituais de Afonso VI e reconhecido Portugal como país independente.
As grandes batalhas. «Depois de Afonso VI tomar posse da governação de Estado, João de Áustria, filho bastardo do rei de Castela, invadiu o Alentejo, tomou Évora, e chegou quase às portas de Lisboa. O conde de Castelo Melhor tratou de organizar importantes forças para repelirem esta invasão, colocando à frente dessas forças Sancho Manuel, conde de Vila Flor, e o conde de Schomberg. Seguiu-se uma série de combates a de vitórias; a reconquista de Évora, a tomada de Assumar, Ouguela, Veiros, Monforte, Crato e Borba; Figueira de Castelo Rodrigo, Ameixial, batalha que se deu em 1663, em que muito se distinguiram os generais marquês de Marialva, e conde de Schomberg. A decadência de Portugal era inevitável, com um rei tão fraco que tudo sacrificava à quietação do espírito e às suas comodidades. Nas colónias ainda essa decadência mais se pronunciava. As complicações da Índia, a aliança da Inglaterra, com o casamento da infanta Catarina de Bragança, filha de João IV, com o rei de Inglaterra, Carlos II, que levou em dote duas praças, Bombaim e Tânger, a tomada, pelos holandeses, de Ceilão, Cranganor, Negapatam, Cochim, Coulam, e Cananor, as negociações a que foi indispensável entrar com eles e a traição do duque de Aveiro e de Fernando Teles de Faro. A campanha contra os espanhóis, terminou por assim dizer, com a batalha de Montes Claros, ganha pelo marquês de Marialva e o conde de Schomberg. Depois desta batalha, só houve escaramuças a guerras de fronteira. Os espanhóis, já cansados de tanto lutar, começaram a tratar da paz, que o conde de Castelo Melhor só queria aceitar com as condições a que nos dava direito a nossa constante supremacia militar. Assim o conde exigia que a Espanha nos cedesse uma porção do seu próprio território, queria a Galiza, e com certeza o conseguiria, se as intrigas da corte o não houvessem precipitado do poder.»
çNo ano de 1663 ocorreu em Lisboa um perigoso motim perante a perda de Évora e de outras terras alentejanas, que desassossegou a corte. Sucede-se então, no mesmo ano, a terceira batalha deste reinado, no Ameixial, junto a Estremoz, comandada por D. Sancho Manoel. (...) D.Sancho Manoel depois Conde de Villa Flor ganhou huma grande ventagem [...], e na batalha do Ameixial em que D. João de Austria ficou inteiramente derrotado, e restaurando Évora, e outras Pracas se sossegou Lisboa, e assegurou a Monarquia. Francisco Soares Toscano. A quarta batalha travada foi a de Castelo Rodrigo, também em 1663, comandada por Pedro Jacques de Magalhães, e a, quinta a de Montes Claros, cujo comando coube ao terceiro conde de Cantanhede, António Luís de Meneses, depois Marquês de Marialva. Porém, as vitórias levadas a cabo desde 1660 foram amparadas por um estratega alemão, o Conde de Schomberg, contratado naquele ano pelo conde de Soure. Grupos palacianos se aproveitaram da situação. Um grupo de nobres que incluía também o marquês de Marialva, o conde de Sarzedas, o conde de Vila Flor, conseguiu derrubar o conde de Castelo Melhor. A 27 de Outubro a Câmara de Lisboa pediu a convocação imediata das Cortes, enquanto Castelo Melhor se exilava num mosteiro de arrábidos perto de Torres Vedras, exilando-se depois nas cortes de Saboia, França e da Inglaterra (sua situação só se desanuviou depois da morte da Rainha em 1683). A Rainha deixou o Paço em 21 de Novembro, recolhendo-se ao convento da Esperança em clausura com suas damas e oficiais, no que se considerou grande escândalo. Após seu afastamento em 1667 Afonso foi compelido por sua mulher, Maria Francisca, e o irmão Pedro, a abdicar do trono no dia 22 de Novembro. O infante Pedro justificou a tomada do governo pela exigência do «Senado lisboeta». Guardou apenas o título de «curador» e governador do Reino. Desde 26 de novembro de 1667 os documentos vêm assinados pelo «Infante» e só depois de Cortes em 1668 passaram a sê-lo pelo «Príncipe». Fez membros do Conselho de Estado o duque de Cadaval, Nuno Álvares Pereira de Melo, D. Vasco Luís da Gama, marquês de Nisa, escolheu como Presidente da Mesa do Desembargo do Paço o marquês de Gouveia, João da Silva, e como vedor da Fazenda o velho general António Luís de Meneses, marquês de Marialva. Eram todos elementos ligados ao «partido francês», vitoriosos sobre a facção «inglesa» comandada por Castelo Melhor. Afonso foi banido para a ilha Terceira, nos Açores. Tais actos foram sancionados pelas Cortes de Lisboa de 1668.
O Rei morreu em Sintra, em 1683 depois de preso durante 9 anos no quarto com seu nome no Palácio Real de Sintra. Sua morte, se diz ter sido por envenenamento, após deposto pelo irmão Pedro II, que veio a casar com a sua mulher. Apenas saía do quarto para se dirigir à Capela do Palácio. Em 1652 falhou o casamento com a filha do príncipe de Parma, o mesmo sucedendo pouco depois com Mademoiselle de Montpensier, e tampouco resultou o plano de o casar com a filha do duque de Orléans, origem de uma missão de Francisco Manuel de Melo. Afinal o marquês de Sande, D. Francisco de Melo e Torres, assinou em Paris a 24 de fevereiro de 1666 o contrato matrimonial com Maria Francisca Isabel de Saboia, Mademoiselle d'Aumale. O casamento se celebrou por procuração em La Rochelle em 27 de junho e a nova Rainha chegou a Lisboa a 2 de agosto.
Maria Francisca alimentou esperanças de gravidez, em que pese a corrente favorável ao infante Pedro (o duque de Cadaval, o embaixador francês e outros) dizer depois que o casamento não se consumara. Pelos autos sabe-se que de facto, apenas dois dias após ter conhecido o noivo, a rainha já havia desabafado ao seu confessor, o jesuíta Francisco de Vila: "Meu padre, parece-me que não terá Portugal sucessores deste Rei." Nos meses que se seguiram, ainda em confissão, continuou a queixar-se ao religioso que o Rei era "inábil e impotente", a rainha acabou por recolher-se ao Convento de Nossa Senhora da Esperança em Lisboa, e a entrar, no dia seguinte, com um pedido de anulação do matrimónio no Cabido de Lisboa, designando como seu procurador no processo, o duque de Cadaval. Deixou ao Rei uma carta onde se justificava: "Apartei-me da companhia de Sua Majestade, que Deus guarde, por não haver tido efeito o matrimónio em que nos concertámos (...)". Desse modo, de 9 de janeiro a 23 de fevereiro de 1668, nas tardes de segundas, quartas e sábados, 55 testemunhas foram chamadas ao paço do Arcebispo de Lisboa para depor, em audiências públicas, sobre a incapacidade sexual do monarca. O processo foi julgado por três autoridades eclesiásticas e um júri com quatro desembargadores e quatro cónegos. Entre as primeiras testemunhas, encontravam-se 14 mulheres com quem o rei havia tentado envolver-se. Não compareceram quaisquer testemunhas a favor do rei. De acordo com o historiador português Joaquim Veríssimo Serrão "o processo constitui uma página lamentável de nossa história", mas mesmo que a tese da não consumação possa suscitar reservas, o processo contém matéria abundante para provar a incapacidade do monarca em assegurar a sucessão do Reino.
Não resiste à menor crítica, segundo o mesmo historiador, a versão posta a correr de os dois cunhados terem amores incestuosos. Antes da anulação ser declarada, já as cortes de 1668 tinham sentido o grave problema e sugerido ao infante o casamento com a Rainha, "para quietação do Reino e segurança de sua real sucessão". Efetuaram-se diligência em Roma para a necessária dispensa, no impedimento “publicae honestatis” que pudesse haver entre os nubentes, tendo a bula de autorização chegado a Lisboa a 27 de março. Seguidamente foi deposto por decisão do Conselho de Estado. Toda essa história e circunstância podem ser apreciadas num filme cujo nome é precisamente "O Processo do Rei", realizado em 1989, por João Mário Grilo. Fim da vida. Instalado na ilha Terceira, ali permaneceu ao longo de cinco anos. Viveu caprichoso, em turbulência constante e com grande violência física, nem mesmo poupava os criados. Em fins de 1673 descobriu-se em Lisboa uma conspiração para favorecer seu regresso. Diversos conspiradores foram mesmo enforcados no Rossio. O Rei, mandado vir, chegou a Lisboa em 14 de setembro de 1674, sendo conduzido ao Palácio de Sintra. Durante nove anos viveu ali, fechado em seus aposentos, com servidores da inteira confiança do duque de Cadaval. No início de 1683 foi sangrado, tomou purgas, em 30 de maio teve «agastamentos, com dores», na manhã de 12 de setembro teve um acidente apoplético e ficou sem fala, morrendo logo. Montalvão Machado, em «Causas de Morte dos Reis Portugueses», diz que o rei morreu de tuberculose pulmonar, como outros filhos de João IV e Luísa. Jaz juntamente com seu irmão Pedro II e Maria Francisca no Panteão dos Braganças em Lisboa. Títulos e estilos. 21 de Agosto de 1643-6 de Dezembro de 1653: Sua Alteza, O Sereníssimo Infante Afonso de Portugal. 6 de Dezembro de 1653-6 de Novembro de 1656: Sua Alteza Real, O Príncipe do Brasil, Duque de Bragança, etc. 6 de Novembro de 1656-12 de, Setembro de 1683: Sua Majestade, O Rei de Portugal e dos Algarves. O estilo oficial de D. Afonso VI enquanto Rei de Portugal: Pela Graça de Deus, Afonso VI, Rei de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Honrarias. Enquanto monarca de Portugal, D. Afonso VI foi Grão-Mestre das seguintes Ordens: Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ordem de São Bento de Avis. Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem de Sant'Iago da Espada. Antiga e Muito Nobre Ordem da Torre e Espada. A destronação de el-Rei D. Afonso VI e a anulação de seu matrimónio.
Rei D. Pedro II de Portugal
D. Pedro II de Portugal (Lisboa, 26 de abril de 1648-Alcântara, 9 de dezembro de 1706). Foi Rei de Portugal, de 1683 até sua morte, sucedendo ao irmão Afonso VI, vindo já exercendo as funções de regente do reino desde 1667, devido à instabilidade mental do irmão, Afonso VI. Está sepultado no Panteão dos Braganças em São Vicente de Fora. Morreu no Palácio de Sintra, de apoplexia. Tinha 58 anos e estava doente apenas há quatro dias. Terceiro filho do rei D. João IV de Portugal e de Luísa de Gusmão, foi Senhor da Casa do Infantado. Cognominado de O Pacífico, porque em sua regência que se fez a paz com a Espanha (em 1668). Regente de 1667 a 1683, chegou ao poder por golpe de Estado no qual em 27 de janeiro de 1668 depôs o irmão rei Afonso VI de Portugal. Foi rei por morte deste em 12 de setembro de 1683. Governou portanto de facto de 1667 a 1706. Implacável com o irmão, além de o encarcerar em Sintra, deflagrou processo de anulação do casamento com Maria Francisca Isabel de Saboia, alegando a não-consumação, por inaptidão do rei em sua relação com mulheres, obtendo de Roma e dissolução e casando-se com a cunhada.
Diz Veríssimo Serrão em «História de Portugal», «Um historiador coevo exaltou as suas qualidades físicas, tanto na destreza das armas como no toureio a cavalo, por ter uma agilidade e fortaleza que o predispunham para exercícios de violência. Foi no seu tempo que o palácio de Salvaterra de Magos voltou a ser o local preferido da corte, ali se instalando Pedro II nos meses de Janeiro e Fevereiro, para se dedicar aos desportos da montaria. (…) Senhor de grande memória, o monarca nunca recusava audiência a quem lha pedisse, tanto de dia como de noite, deleitando-se em ouvir os outros e em discutir os assuntos nos mais ínfimos pormenores. Essa qualidade era (…) um dos seus maiores defeitos, porque queria sempre ouvir a opinião dos conselheiros, o que o levava a dilatar a resolução dos problemas. O seu reinado tinha como grande desígnio reconstruir o País abalado pelas lutas da Restauração. Desde 1693 que podia dispor da riqueza aurífera do Brasil, que teria dado a essa obra o arranque decisivo de que Portugal carecia. Mas a participação na guerra sucessória da Espanha foi contrária aos interesses nacionais (…).» Firmou a aliança inglesa. Consolidou a independência de Portugal, com a assinatura do Tratado de Lisboa em 1668, pondo fim às guerras da Restauração iniciadas em 1640. Teve o decisivo apoio da Inglaterra, com base em cláusulas matrimoniais que uniram Carlos II Stuart com a irmã, princesa Catarina de Bragança, em 1661. Portugal cedeu Tânger e Bombaim, comprometeu-se a transferir para os ingleses a maioria das praças recuperadas dos holandeses, repartir ao meio o comércio da canela, instalar famílias inglesas com os mesmos privilégios dos portugueses em Goa, Cochim, Diu, Bahia, Pernambuco, Rio de Janeiro. Em troca a Inglaterra daria suporte militar a Lisboa, protegendo embarcações portuguesas no Mediterrâneo e nas costas de Lisboa e do Porto. A aliança com os ingleses foi decisiva na consolidação do poder de Pedro, que centralizou o poder da monarquia e dissolveu a excessiva força da nobreza depois da morte de D João IV em 1656.
Sua longa gestão foi de importantes realizações. Em 1671 concedeu liberdade de comércio para os ingleses residentes em Portugal e deu início ao estabelecimento de manufacturas têxteis. Dona Isabel Luísa foi proclamada herdeira do trono nas Cortes de 1674, tendo Pedro promulgado uma carta «sobre as regências e tutorias dos Reys» para melhor fundar o direito de sua filha. Em 1674 sua maior preocupação foi melhorar as defesas do Reino, pedindo contribuição da Junta dos Três Estados para o sustento das guarnições de fronteira, seu apetrecho e obras indispensáveis em castelos e fortes marítimos. As Cortes não atenderam a totalidade do pedido, mas o grande receio estava na defesa do litoral. «Os navios da Índia e do Brasil eram o principal objectivo da cobiça», de modo que «a Coroa viu-se na obrigação de armar uma frota de 11 barcos. (…) A esquadra saiu do Tejo em 21 de julho de 1675, sob o comando de Pedro Jacques de Magalhães.» «Mas não se viram os resultados de tão custosa empresa». Obteve autorização papal para a elevação do bispado da Bahia à categoria de arcebispado, e a criação dos bispados em Olinda e no Rio de Janeiro em 1676. Em 1677 foi criado o bispado do Maranhão, subordinado diretamente ao arcebispado de Lisboa. Em 1686, por decreto do Regimento de Missões, foram restringidos os privilégios dos jesuítas nos sertões do Norte. Houve porém resistências ao processo de reordenamento da administração colonial: em 1684 a revolta de Beckman, que sublevou os colonos do Maranhão contra o monopólio da Companhia Geral para o Estado do Maranhão, sufocada; da década de 1680 o levante dos tapuias em diversas regiões do Nordeste. Havia um óbice legal ao casamento de sua filha com o primo, o duque de Sabóia: a chamada «lei das Cortes de Lamego» impedia o casamento de uma herdeira com um príncipe estrangeiro, pretenso documento que em 1640 se tornara lei fundamental do Reino. As Cortes convocadas em 1 de novembro de 1679 não tiveram dúvidas em proceder à derrogação. Já então viera a Lisboa o embaixador saboiano, o marquês de Ornano, celebrar o casamento por procuração. Mas tudo ficaria sem efeito na medida em que a embaixada do duque de Cadaval, enviada a Turim, em maio de 1682, não alcançou ou não quis concretizar o projeto, por pressões talvez de Luís XIV sobre a dinastia de Sabóia. Em 1683, aliás, morreriam Afonso VI de Portugal e a rainha Maria Francisca Isabel. Na corte havia um forte partido «francês», chefiado pelo 1º duque de Cadaval, por Manuel Teles da Silva, 2º conde de Vilar Maior, futuro marquês de Alegrete, e pelo visconde de Ponte de Lima, mas outros pugnavam por aliança mais próxima com a Espanha. Ao casar-se novamente, Pedro II escolheu a irmã da rainha espanhola, como filha de Filipe Guilherme, eleitor palatino do Reno. A nova rainha Maria Sofia de Neuburgo jamais influiu na vida política, mantendo uma atuação discreta e dando ao marido larga descendência.
A descoberta de ouro no sertão de Caeté, nas Minas Gerais, no final do século XVII, deu início a uma fase de prosperidade económica e a remodelações administrativas, com a criação em 1693 da Capitania de São Paulo e Minas Gerais, e a criação da Intendência das Minas em 1702. Data do período também a destruição do Quilombo dos Palmares (Alagoas) em 1695. No final do reinado, havia dois grandes problemas no Brasil: a disputa pela colónia do Sacramento que, embora desde 1680 reconhecido território português, foi ocupada pelos espanhóis em 1705, e os primeiros conflitos, desde 1703, entre paulistas e emboabas, concorrentes forasteiros, inclusive reinóis, que chegaram à região das minas em busca de ouro. Numa avaliação geral, seu reinado consolidou a independência de Portugal diante da Espanha, mas foi alto o custo das concessões à Inglaterra (pelo controvertido Tratado de Methuen, de 1703), os panos de lã ingleses passaram a ser livremente comercializados em Portugal, o que levou à estagnação da indústria têxtil do Reino. Sua política de não-alinhamento tinha como trunfo a presença de embaixadores e agentes nas cortes europeias, e os nomes que se destacaram foram, até 1700, Francisco de Melo, marquês de Sande; Henrique de Sousa Tavares, 1º marquês de Arronches; o doutor José de Faria, na Inglaterra, Duarte Ribeiro de Macedo e Salvador Taborda Portugal, em Paris, Diogo de Mendonça Corte-Real, na Holanda. Diz Veríssimo Serrão: «Foi nessa boa escolha que se formou o mais destacado de nossos diplomatas da primeira metade de Setecentos, Luís da Cunha». A Guerra da Sucessão Espanhola veio alterar o equilíbrio, pois a sucessão de Carlos II da Espanha, morto em 1700, se revelou enorme problema, na medida em que não teve descendência. O rei deixara por testamento como herdeiro o neto de Luís XIV, Filipe, duque de Anjou. Recusando o facto consumado, Guilherme III da Inglaterra, por meio da Grande Aliança da Haia, formou coligação com Holanda e com o Império, propondo Carlos, arquiduque da Áustria, como candidato ao trono espanhol. Seria difícil a Portugal fugir às pressões externas, e o rei se viu impossibilitado de guardar uma posição neutral, pois as implicações do conflito podiam estender-se à América. Portugal, que começara por reconhecer Filipe de Anjou como Filipe V de Espanha pelo tratado de Paris de 18 de junho de 1701, repensou sua posição, facto para o qual «contribuíram as primeiras derrotas dos franceses em Itália e no Reno», e a ameaça da frota inglesa. Em setembro de 1702 anulou-se o tratado com Luís XIV e graças à intervenção de John Methuen, embaixador da Inglaterra, estabeleceram-se «formas de cooperação que ainda não eram de aberta beligerância por parte de Portugal.» Mas era normal, «Desde 1661 Portugal voltara, na política europeia, a fazer parte da órbita inglesa que garantira o triunfo da Restauração». Tratado de aliança com a Rainha Ana de Inglaterra, Leopoldo I da Áustria e os Estados da Holanda a favor de Carlos II como Rei de Espanha. Tratado de aliança com Filipe de Anjou como Filipe V de Espanha. Portugal assinou em Lisboa em 16 de maio de 1703 um tratado defensivo com a Inglaterra e Províncias Unidas. Havia dois artigos secretos, logo que subisse ao trono da Espanha, o arquiduque Carlos entregaria a Portugal a título perpétuo as praças fronteiras de Badajoz, Albuquerque, Valença de Alcântara, Tui, Baiona de Galiza e Vigo; e na América do Sul, as terras da margem setentrional do rio da Prata, o qual ficaria a constituir o limite das duas coroas. Aclamado rei da Espanha como Carlos III em Viena em 12 de setembro de 1703, o arquiduque Carlos entendeu fazer de Portugal a base das operações contra seu adversário e desembarcou em Lisboa a 9 de março de 1704. Deixou a cidade no ano seguinte numa esquadra inglesa para se fixar na Catalunha, pois a morte do imperador Leopoldo I, em 5 de maio, o forçava a se aproximar da Áustria e do norte da Itália. A ofensiva aliada começou com António Luís de Sousa, 4º marquês das Minas e Dinis de Melo e Castro, 1º conde das Galveias, que comandavam respectivamente a Beira e o Alentejo. Valência de Alcântara se rendeu ao segundo em 8 de maio de 1705. Fernando de Mascarenhas, futuro marquês de Fronteira, foi outro nome a destacar na guerra. A 28 de junho o exército português chegou a entrar triunfante em Madrid, onde Carlos III foi aclamado. Mas seu nome não tinha qualquer ressonância nas populações, e Filipe V recebia constantes socorros dos Pirenéus e beneficiava da realeza em exercício.
Fixou as bases de sua política no Brasil em dois pontos principais: o da pesquisa de metais e pedras preciosas e da extensão da fronteira da colónia às margens do rio da Prata. Enviou o visconde de Barbacena ao Brasil com instruções especiais para incentivas as explorações mineiras, e era tal a reputação dos paulistas que o Príncipe Regente, instado por Barbacena, escreveu a doze dos principais sertanistas piratininganos, a quem proporcionou a «incomparável honra» de uma interpelação direta, convocando-os ao emprego do seu real serviço. Alguns eram do maior prol, como Fernão Dias Paes Leme, Francisco Dias Velho, Lourenço Castanho Taques. Sob seu reinado foi criada a Casa da Moeda da Bahia, inaugurada em 8 de março de 1694. Pedro II cedeu seus direitos de senhoriagem, tributo a ele devido, para o melhor funcionamento desta instituição, que cunhou as primeiras moedas brasileiras para uso da própria colónia em 1695. Estas moedas de 4.000 e 2.000 réis, em ouro e as moedas de 640, 320, 160, 80, 40 e 20 réis, em prata, ampliaram e diversificaram o meio circulante no Brasil. Desde 1703 o rei passava épocas de profunda sonolência que os médicos atribuíam a um «defluxo de estilicido», ou seja, grave infecção da laringe. A 5 de dezembro de 1706 foi acometido de um «pleuriz legítimo» que derivou num ataque apoplético, com o qual perdeu os sentidos. Não resultou a sangria nos pés e, no dia 9, o ataque se tornou fatal. Acredita-se hoje em doença hepática, pois a autópsia achou «hua parte do fígado torcida e se lhe acharão 25 pedras no fel». Está sepultado em Lisboa no Panteão dos Braganças.
26 de Abril de 1648-27 de Janeiro de 1668: Sua Alteza, O Sereníssimo Infante Pedro de Portugal
27 de Janeiro de 1668-12, de Setembro de 1683: Sua Alteza Real, O Príncipe Regente
12 de Setembro de 1683, 9 de Dezembro de 1706: Sua Majestade, O Rei de Portugal e dos Algarves
O estilo oficial de D. Pedro II enquanto Rei de Portugal: Pela Graça de Deus, Pedro II, Rei de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc.
Enquanto monarca de Portugal, D. Pedro II foi Grão-Mestre das seguintes Ordens:
Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo.
Ordem de São Bento de Avis.
Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem de Sant'Iago da Espada.
Antiga e Muito Nobre Ordem da Torre e Espada.
Filhos do Rei D. Pedro II de Portugal
Filhos havidos de Maria Francisca de Sabóia (21 de Junho de 1646-27 de Dezembro de 1683 casados a 2 de Abril de 1668).
Herdeira presuntiva ao trono, até ao nascimento do irmão, o Príncipe D. João. O pai procurou casá-la com numerosas cabeças coroadas, esforço que não logrou nunca concretizar, o que lhe valeu o epíteto de "a Sempre-Noiva".
Filhos havidos de Maria Sofia, Condessa Palatina de Neuburgo. (6 de Agosto de 1666-4 de Agosto de 1699)-(casados a 11 de Agosto de 1687).
João de Bragança, Príncipe do Brasil (30 de Agosto de 1688-17 de Setembro de 1688). Feito Príncipe do Brasil e declarado novo herdeiro da coroa, mas viria a falecer decorridas pouco mais de duas semanas.
João V de Portugal (22 de Outubro de 1689-31 de Julho de 1750). Rei de Portugal de 1706 a 1750. Casou-se com Maria Ana de Áustria. O casamento produziu seis filhos.
Francisco, Duque de Beja (25 de Maio de 1691-21 de Julho de 1742). 7.º Duque de Beja, Condestável de Portugal, Prior do Crato e 2º Senhor da Casa do Infantado. Celibatário, deixou dois filhos de Mariana da Silveira, freira.
Infante D. António Francisco (15 de Março de 1695-20 de Outubro de 1757). Irmão directo do rei João V de Portugal, mas viveu sempre retirado da Corte. Aquando da morte do seu irmão D. Francisco de Bragança, em 1742, D. António reclamou para si a sucessão na chefia da Casa do Infantado, que viria contudo a ser entregue ao seu sobrinho D. Pedro, filho de D. João V, o que muito agravou a relação entre os dois irmãos. Nunca casou, nem deixou filhos.
Infanta D. Teresa (24 de Fevereiro de 1696-16 de Outubro de 1704). Faleceu com oito anos, de "bexigas malignas".
Infante D. Manuel Bartolomeu (3 de Agosto de 1697-3 de Agosto de 1766). Levou uma vida aventureira, durante mais de 20 anos percorreu as grandes capitais europeias. Bem conhecido nas Cortes da Áustria e da Rússia, chegou a ser pretendente à Coroa da Polónia em 1733, quando rebentou a Guerra da Sucessão Polaca.
Infanta Francisca Josefa (30 de Janeiro de 1699-15 de Julho de 1736). Nunca casou, nem deixou filhos.
Infanta Luísa de Bragança (9 de Outubro de 1679-23 de Dezembro de 1732). Legitimada por carta de 25 de Maio de 1691. Casou, em primeiras núpcias, com D. Luís Ambrósio Pereira de Melo, 2.º Duque de Cadaval, e, em segundas núpcias, com o cunhado D. Jaime Álvares Pereira de Melo, 3.º Duque do Cadaval. Não houve descendência de nenhum dos casamentos.
Miguel de Bragança, Duque de Lafões. 15 de Outubro de 1699-13 de Janeiro de 1724. Legitimado em 1704. Fundador da Casa de Lafões. Casou-se com D. Luísa Casimira de Sousa Nassau e Ligne em 1715. Do casamento, nasceram três filhos.
Infante José Carlos, Arcebispo de Braga (6 de Maio de 1703-3 de Junho de 1756). Legitimado. Licenciou-se na Universidade de Évora em Teologia, tendo sido eleito Arcebispo de Braga em 1739 (embora sagrado somente em 1741).
A Crónica de Faria e Sousa, de 1730, refere o seguinte: "Passatempos ordinários seus eram os exercícios corporais: caça, touros em Salvaterra, no Alentejo, a 12 léguas de Lx. Um dos melhores ginetes do Reino, quando todos os nobres toureavam como o rei. Em seu reinado, houve duas batalhas, Villaviciosa e Albuquerque, que perderam os Espanhóis por ser inferiores em gente mas não falta de valor, e quedaram os portugueses mui ufanos porque não estavam acostumados a ganhar.” Paz com a Espanha em 23 de fevereiro de 1668. Houve depois a Guerra da Sucessão da Espanha. Morto Carlos II aos 39 anos em 1 de novembro de 1700, por seu testamento de 21 de outubro o sucessor era Filipe de França, duque de Anjou, neto de Luis XIV, filho segundo do Delfim. Em 1701 Pedro assinou tratado de aliança ofensiva e defensiva com Espanha e França. Dois anos depois, «le obligaron sus inimigos a unirse con la Casa de Austria» e a fazer tratado semelhante com os Aliados inimigos de duas Coroas. Em 26 de maio de 1703, com partido do Imperador Leopoldo I, entrou com Vítor Amadeu II, Duque de Saboia, na grande aliança concluída na Haia em 7 de setembro de 1701 com Guilherme III da Grã-Bretanha e mais o Estados Gerais das Províncias Unidas dos Países Baixos. Morreu de apoplexia em 9 de dezembro de 1706. A primeira rainha (casamento com seu irmão anulado em 24 de março de 1668, casados a 2 de abril seguinte) morrera em Palhavã a 27 de dezembro de 1683 aos 38 anos. A segunda mulher morreu a 4 de agosto de 1699 aos 33 anos. Em março de 1704 chegou a Lisboa o segundo filho do imperador Leopoldo I (morto em 5 de maio de 1705 aos 65 anos), Carlos (futuro Carlos III de Espanha), recebido com muitos agasalhos. «Sitiada Barcelona, foi obrigado a se retirar em 12 de maio de 1706 perdendo na ocasião toda a artilharia.»
Rei João V de Portugal
João V de Portugal (João Francisco António José Bento Bernardo de Bragança; 22 de Outubro de 1689-31 de Julho de 1750), dito o Magnânimo, foi o vigésimo-quarto Rei de Portugal desde 1 de Janeiro de 1707 até à sua morte. O seu longo reinado de 43 anos foi o mais rico da História de Portugal, profundamente marcado pela descoberta de ouro no Brasil no final do século XVII, cuja produção atingiu o auge precisamente na última década do seu reinado. A primeira e última década do reinado foram marcadas por guerras, a Guerra da Sucessão Espanhola, que levara à tomada de Madrid em 1706, e levou à Batalha de Almansa no primeiro ano do seu reinado, e ainda a combates em África, na América, e na Ásia contra os franceses, mais tarde as campanhas navais contra os turcos no Mediterrâneo, que levaram à vitória na Batalha de Matapão em 1717; e ainda as guerras que Portugal ao mesmo tempo travava no Oriente, na Arábia e na Índia, contra estados asiáticos, nomeadamente contra o Império Marata e os árabes de Omã. O longo reinado de D. João V pode de certo modo dividir-se em dois períodos: uma primeira metade em que Portugal teve um papel activo e de algum relevo na política europeia e mundial, e uma segunda metade, a partir da década de 1730, em que a aliança estratégica com a Grã-Bretanha gradualmente assumiu maior importância, e o reino começou a sofrer uma certa estagnação. Como rei, D. João V sempre tentou projectar Portugal como uma potência de primeira grandeza, principalmente nas primeiras décadas do reinado. Exemplos disso são as faustosas embaixadas que por motivos vários enviou ao imperador Leopoldo I em 1708, a Luís XIV da França em 1715, ao papa Clemente XI em 1716, ou ainda ao Imperador da China em 1725.
Outro exemplo foi o litígio que manteve com a Santa Sé na década de 1720, sobre a questão do cardinalato a atribuir ao núncio apostólico na capital portuguesa. D. João V foi um grande edificador, e dotou principalmente a capital portuguesa de numerosas construções. Fomentou o estudo da história e da língua portuguesa, mas falhou em melhorar de forma significativa as condições da manufactura em Portugal, e gastou a maior parte da sua riqueza nos edifícios que construiu. Por ironia do destino, a maior parte deles desapareceria pouco depois da sua morte, no grande Terramoto de 1755. Os principais testemunhos materiais do seu tempo são hoje, o Palácio Nacional de Mafra, a Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra, o Aqueduto das Águas Livres em Lisboa, e a principal parte da colecção do Museu Nacional dos Coches, talvez a mais importante a nível mundial, também na capital portuguesa. No campo imaterial, merece destaque a extinta Academia Real da História Portuguesa, precursora da actual Academia Portuguesa da História, e ainda a criação do Patriarcado de Lisboa, um dos três patriarcados do Ocidente da Igreja Católica. O último feito diplomático do reinado de D. João V, o Tratado de Madrid de 1750, estabeleceu as fronteiras modernas do Brasil. Vestígios do seu tempo no Brasil são cidades como Ouro Preto, então a capital do distrito do ouro das Minas Gerais, São João del-Rei, assim nomeada em sua honra, Mariana, que recebeu o nome da rainha, São José, a que foi dada o nome do príncipe herdeiro, e numerosas, outras cidades, igrejas e conventos da era colonial. Resumo biográfico. D. João V nasceu em 22 de Outubro de 1689 em Lisboa, à beira do rio Tejo no Paço da Ribeira, e morreu no mesmo lugar em 31 de Julho de 1750. Encontra-se sepultado no Panteão dos Braganças, na Igreja de São Vicente de Fora, na mesma cidade. O rei era filho de D. Pedro II e de D. Maria Sofia, condessa palatina de Neuburgo. Tinha apenas um ano de idade quando por morte de seu irmão mais velho foi proclamado príncipe herdeiro de Portugal a 30 de Agosto, em acto solene na presença da Corte.
Foi jurado Príncipe do Brasil a 1 de Dezembro de 1697, e por morte de seu pai tornou-se o 24.º rei de Portugal a 9 de Dezembro de 1706. Subiu ao trono, solenemente aclamado, no dia 1 de Janeiro de 1707. De notar que segundo a tradição iniciada por seu avô D. João IV aquando da, Restauração, não foi coroado, coroando-se em vez com a coroa real uma estátua de N. Sr.a da Conceição como Padroeira do Reino. Em 1696 o Príncipe do Brasil foi armado cavaleiro da Ordem de Cristo por seu pai. Na sua infância teve como tutora a tia-avó, a rainha D. Catarina de Bragança, esposa de Carlos II de Inglaterra, que depois de enviuvar regressara a Portugal, e assumiu a responsabilidade pela educação do jovem príncipe herdeiro.
Depois de subir ao trono, D. João V casou em 1708 com Maria Ana de Áustria, filha do imperador Leopoldo I da Áustria e irmã do seu aliado na Guerra da Sucessão Espanhola. O casal teve seis filhos, foi sucedido por um deles, D. José I. Como qualquer monarca à época, D. João V estava interessado em fortalecer o prestígio internacional do seu reino. Ao longo de todo o seu reinado, mas principalmente nas duas primeiras décadas, D. João V sempre tentou afirmar Portugal como uma potência de primeiro plano, usando para isso as duas linguagens da época em que vivia. A das armas, e principalmente, no seu caso, a magnificiência típica da era do absolutismo. Ganhou por isso o cognome de Magnânimo é também por vezes conhecido como o Rei-Sol português.
Coche da Rainha Maria Ana de Portugal |
Nos últimos anos de vida sofreu vários ataques de paralisia, que o debilitaram no governo. Não obstante a sua vida pessoal incluir conhecidas relações com várias freiras ao longo da vida, das quais teve vários filhos ilegítimos, receberia ainda do Papa o título honorífico de Fidelissimus em 1748. Uma avaliação moderna resume sobre D. João V: “[...] era senhor de uma vasta cultura, bebida na infância com os Padres Francisco da Cruz, João Seco e Luís Gonzaga, todos da Companhia de Jesus. Falava línguas, conhecia os autores clássicos e modernos, tinha boa cultura literária e científica e amava a música. Para a sua educação teria contribuído a própria mãe, que o educou e aos irmãos nas práticas religiosas e no pendor literário [...] Logo na cerimónia da aclamação se viu o Pendor Régio para a Magnificência. Era novo o cerimonial e de molde a envolver a figura de Dom João V no halo de veneração com que o absolutismo cobria as Realezas.”
Início do reinado. O ouro do Brasil. Nenhum acontecimento marcaria tanto o reinado de D. João V como o achado de ouro numa remota região do interior do Brasil em meados da década de 1690, quando ele era ainda Príncipe do Brasil. O ouro mineiro começou a chegar a Portugal ainda no final dessa década. Em 1697, o embaixador francês Rouillé mencionou a chegada de ouro "peruano", citando 115,2 kg. Dois anos volvidos, em 1699, teriam chegado 725 kg de ouro a Lisboa; e em 1701 a quantidade terá já aumentado para 1785 kg. A economia da colónia entrava no chamado ciclo do ouro, e a exploração do ouro do motivaria, logo no início do seu reinado, os conflictos de 1707-1709 na região das minas conhecidos como a Guerra dos Emboabas. Desde então, a quantidade de ouro minado no Brasil continuou a aumentar durante a primeira metade do reinado, para se estabilizar na última década do mesmo. Apenas no reinado seguinte começou a produção aurífera a declinar, o que, juntamente com o Terramoto de 1755, seria desastroso para Portugal. Mas enquanto D. João V vivia não se adivinhavam problemas futuros: certos anos chegaram mais de vinte toneladas de ouro a Lisboa, e em valores médios, todos os anos durante o seu longo reinado entravam em Portugal mais de oito toneladas de ouro do Brasil. E na década de 1720 foram ainda encontrados diamantes em grandes quantidades, na região da vila colonial hoje chamada Diamantina.
Guerra da Sucessão Espanhola
Quando se iniciou o Reinado em 1707, estava-se em plena Guerra da Sucessão Espanhola (1701-1714), uma guerra que D. João V herdou de seu pai. Nesta, depois do Tratado de Methuen de 1703, Portugal alinhara com a aliança a favor do Arquiduque da Áustria Carlos, como Rei Carlos III da Espanha.
Arquiduque Carlos da Áustria |
Rainha Ana da Grã-Bretanha |
Imperador Leopoldo I |
Republica das Províncias dos Países Baixos
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Reino de Portugal |
Contra a Espanha e a grande potência continental, a França. Uma grande armada anglo-holandesa tinha chegado a Lisboa em 1704, com o filho do imperador, o arquiduque Carlos a bordo e um exército para, juntamente com tropas portuguesas, invadir Espanha via Portugal. No contexto da invasão que se preparava na península, tinha-se evacuado a praça da Colónia do Sacramento, no Rio da Prata em frente a Buenos Aires, em 1705. Em 1706, o ano antes de subir ao trono, Portugal viu o seu exército, comandado pelo Marquês das Minas e auxiliado por batalhões ingleses e holandeses às ordens do Conde de Galway, invadir a Espanha, pela fronteira de Ciudad Rodrigo. O exército confederado tomou depois Salamanca na sua marcha a caminho da capital de Espanha. Em Junho Portugal tinha conquistado Madrid para o arquiduque Carlos - a primeira e única vez na história - que um exército português tomou a capital espanhola. O arquiduque chegou a ser coroado Rei de Espanha, mas o exército confederado viu-se forçado a retirar para sul pouco depois. Batalha de Almansa e reformas, militares. Quando o rei subiu ao trono o exército português estava na Catalunha, ainda comandado pelo Marquês das Minas e apoiado por tropas inglesas e holandesas ao comando de Galway. Mas ao fim de longas manobras que o levaram muito para sul, travou-se uma importante batalha a 25 de Abril de 1707 em Almansa, na fronteira entre La Mancha, Valencia e Murcia, contra o exército franco-espanhol do Duque de Berwick.
Na Batalha de Almansa, a sorte não esteve do lado das armas portuguesas, e o exército anglo-luso sofreu uma pesada derrota contra as forças franco-espanholas. No seguimento, a vila fronteiriça espanhola de Valência de Alcântara foi reconquistada pelo inimigo, que ainda, às ordens do Duque de Ossuna, atacou a fronteira do Alentejo e conquistou Serpa e Moura um mês depois. D. João V aproveitou esta derrota para realizar importantes reformas na administração e no exército. No dia da sua aclamação, a 1 de Janeiro, tinha já nomeado D. Tomás de Almeida, bispo de Lamego e futuro Patriarca de Lisboa, para o importante cargo de escrivão da puridade. Três dias depois da derrota, despediu os vários, velhos conselheiros do Rei D. Pedro II, e nomeou Diogo de Mendonça Corte-Real Secretário de Estado. Simultaneamente, deu-se início a uma reforma do exército, que teria como resultado as Ordenações Militares de 1707, em que os velhos terços foram transformados em modernos regimentos e o velho posto de mestre de campo passou a ser designado coronel. De forma semelhante, o velho Terço da Armada da Coroa de Portugal, a mais antiga unidade militar permanente de Portugal (1618), foi transformado em dois Regimentos da Armada. Ainda no mesmo ano, e também como resultado da guerra em que o reino se encontrava, a Aula de Fortificação e Arquitetura Militar foi transformada na Academia Militar da Corte. Esta era apenas uma de várias “aulas” em Portugal e no Ultramar; poucos anos antes, tinham sido criadas várias aulas semelhantes, em Viana do Castelo (1701), e, no Brasil, em Salvador (Bahia) (1698), no Rio de Janeiro (1698), no Recife (Pernambuco) (1701) e em São Luís (Maranhão) (1705). D. João V quis assim promover os estudos militares, assistindo pessoalmente a actos solenes dos exames, e mandando ainda traduzir e imprimir algumas obras de fortificação e artilharia - como por exemplo a Fortificação Moderna, do contemporâneo Johann Friederich Pfeffinger (1667-1730). Mais tarde, em 1732, estabeleceria ainda academias militares nas duas principais praças fronteiriças de Portugal: Elvas, no Alentejo, e Almeida, nas Beiras. O final do ano foi no entanto marcado por mais um revés para as aspirações militares portuguesas, quando uma grande frota inglesa de perto de cento e cinquenta embarcações, que trazia reforços para Portugal depois da derrota de Almansa e vinha escoltada por seis naus de guerra inglesas, foi desbaratada perto do Cabo Lizard pelas esquadras francesas de Duguay-Trouin e do contra-almirante conde de Forbin.
A Guerra da Sucessão Espanhola disputou-se entre 1702 e 1714, pelo direito de sucessão da coroa espanhola, depois da morte do último monarca da Casa de Habsburgo, Carlos II de Espanha, sem deixar herdeiros da rainha Maria Luísa d'Orleães, a qual pertencia à família real francesa. A morte precoce de José Fernando da Baviera, Príncipe das Astúrias, levou ao trono espanhol Filipe V de Espanha, neto de Luís XIV de França, que ganhara o trono por testamento de Carlos II (1700); tal fato deu início à dinastia de Bourbon na Espanha. Uma vez que os Bourbon teriam, além da França, o poder na Espanha, as demais potências europeias recearam da união de dois Estados tão poderosos, tanto quanto a França temia uma reunião da Espanha e da Áustria de novo sob as mãos de um Habsburgo. Daí ter-se gerado um conflito, motivado pela sucessão de Carlos II de Espanha. O imperador Leopoldo I da Áustria, parente próximo do rei falecido, julgando-se com direitos ao trono de Espanha, iniciou as hostilidades, e assim teve início a guerra. Não houve vencedores propriamente ditos nesta guerra: através de um sistema de compensações chegou-se a um acordo. Filipe d'Anjou permaneceu como rei de Espanha (imposição de Luís XIV, seu avô). Para ser aceito pelos outros países beligerantes, Filipe V teve que ceder à Grã-Bretanha a ilha de Menorca, nas Baleares, assim como o rochedo de Gibraltar, e aos Habsburgos da Áustria os Países Baixos espanhóis. Também permitiu à Inglaterra um comércio limitado com suas colónias na América, por meio dos "navios de permissão", além de dar aos ingleses o direito de vender escravos por 30 anos no referido território, por meio do assento. A perda dos territórios mencionados marcou o início do declínio espanhol na Europa, por oposição ao da França, agora senhora praticamente inconteste na Europa continental, e da Grã-Bretanha, que dominava as rotas do comércio mundial. Além disso, a presença inglesa no comércio com as colónias espanholas ultrapassou os limites previamente definidos, reduzindo o controle castelhano sobre suas próprias colónias, sendo este um dos fatores que, posteriormente, favoreceriam as colónias em sua busca pela independência.
Desenvolver da guerra. Uma aliança anglo-luso-alemã, entretanto, insurgiu-se para evitar a união dinástica de França e Espanha. Mesmo depois de reconhecer, em Paris, Filipe V, "tendo José da Cunha Brochado aceite o tratado de 18 de Junho de 1701, pelo qual Portugal se comprometia a guardar os direitos da França, com a promessa de um auxílio militar em caso de ameaça", Portugal viu-se impelido a repensar a sua posição. Pedro II de Portugal anulou, em Setembro de 1702, o tratado com Luís XIV e, graças à intervenção do embaixador da Inglaterra John Methuen, "estabeleceram-se formas de cooperação que não eram ainda de aberta beligerância por parte de Portugal", e depois o país viu-se incluído em dois tratados: um de aliança defensiva com a Inglaterra e as Províncias Unidas, outro de aliança ofensiva e defensiva com a rainha Ana da Inglaterra, Leopoldo I de Áustria e os Estados da Holanda. O documento foi assinado em Lisboa a 16 de maio de 1703. Aclamado rei da Espanha em Viena a 12 de Setembro de 1703, o arquiduque Carlos resolveu fazer do país a base de operações contra o seu adversário. Carlos III, como se intitulava, desembarcou em Lisboa em 9 de Março de 1704, recebido com fausto invulgar. Os generais ingleses e portugueses escolheram a fronteira da Província da Beira como o melhor caminho para o arquiduque penetrar na Espanha. Antecedeu-o D. Pedro II, que, por Santarém e Coimbra, foi até à Guarda, onde no início de setembro o recebeu. Decidiu-se atacar Ciudad Rodrigo. A campanha ficou porém sem efeito, regressando os monarcas separadamente a Lisboa. O projecto comum saldara-se num fracasso, como narra Veríssimo Serrão. No ano seguinte Carlos III deixaria Lisboa numa esquadra inglesa, para se fixar na Catalunha. A morte de Leopoldo I, em 5 de maio, obrigava-o a aproximar-se da zona geopolítica da Alemanha, em especial do norte da Itália. Acompanhou-o o conde de Assumar na qualidade de embaixador. A sua partida aliviou o Tesouro das grandes despesas com a manutenção de sua vistosa corte. Comandavam a Beira e o Alentejo D. António Luís de Sousa, 2º marquês das Minas, e D. Dinis de Melo e Castro, 1º conde das Galveias, que atacou Valência de Alcântara, rendida em 8 de maio de 1705, e logo depois Albuquerque. O conde de São Miguel libertou o castelo de Marvão. O marquês das Minas retomou as praças ao norte do rio Tejo, como Salvaterra do Extremo, Segura, Zebreira, Castelo Branco e Monsanto. Viu ocupado o seu lugar no comando por D. Fernando de Mascarenhas, marquês de Fronteira. Na campanha de 1706, Alcântara se rendeu a 14 de abril, foram caindo as terras da Estremadura, e em Castela a zona da Ciudad Rodrigo a Salamanca. Evitando a marcha por Talavera, o marquês das Minas seguiu por Penharanda que lhe abriu as portas da serra de Guadarrama e de Madrid, onde o exército português penetrou triunfante em 28 de Junho. O trono espanhol ficou à mercê do pretendente austríaco cujo nome, entretanto, não tinha qualquer ressonância nas populações, enquanto Filipe V recebia constantes socorros de além Pirenéus e beneficiava, além disso, da realeza em exercício. As cidades de Castela voltaram a apoiar o partido francês. Com o inverno de 1706 ficou mais uma vez adiada a solução. Na guerra, a França enfrentou ao mesmo tempo a Áustria, a Inglaterra, Portugal e as Províncias Unidas. A luta caracterizou-se inicialmente por vitórias parciais francesas na Itália (1702) e na Alemanha (1703). Houve pressão sobre o território francês, especialmente Flandres e Artois onde tropas inglesas e holandesas, comandadas pelo duque de Marlborough, capturaram praças fortificadas francesas, além de obterem vitórias em campo aberto, como em Ramilles. Porém, uma das batalhas mais decisivas foi travada longe dali, em Blenheim (1704), na Baviera. Logo se seguiram reveses sérios: a invasão da Espanha pelo arquiduque Carlos (1707) e a derrota de Audenarde (Oudenarde), que abriu caminho para a invasão do norte da França, contida por Villars na batalha de Malplaquet (1709) e na vitória de Denain (1712). Embora a França tenha sofrido sucessivos reveses, a retirada prematura do exército britânico, devido a questões políticas internas, permitiu à França se levantar, batendo os austro-holandeses, comandados por Eugénio de Savóia, em Denain. O partido dos Bourbons acabou por sair vencedor. Os tratados de Utrecht (1713), de Rastatt e de Baden (1714) puseram fim ao conflito. O primeiro desses tratados contribuiu fundamentalmente para o crescimento do poderio marítimo e colonial da Inglaterra.
Os desdobramentos do conflito param Portugal. A 30 de Abril de 1704, Filipe V de Espanha declarou guerra a Portugal, iniciando-se uma etapa do conflito na península Ibérica. Muito importante foi a vinda a Lisboa do embaixador extraordinário John Methuen, a fim de negociar a entrada do país na liga contra a França, que veio a se traduzir num tratado comercial com a Inglaterra assinado em 27 de Dezembro de 1703: o tratado de Methuen, como ficou chamado, cujo texto e valor histórico tem suscitado as mais variadas opiniões. O Estado de Guerra de Portugal conta a França foi o que levou às incursões corsárias francesas ao Rio de Janeiro, sendo a primeira comandada por Jean-François Duclerc e a segunda por René Duguay-Trouin.
Dom António Luís de Sousa Marquês das Minas
Dom António Luís de Sousa ou António de Sousa (6 de abril de 1644 - 25 de dezembro de 1721), foi um nobre 4º conde do Prado em vida do pai, 2º Marquês das Minas.
Filho primogénito do 2º casamento de seu pai, Dom Francisco de Sousa, 1º Marquês de Minas. Senhor das vilas de Beringel e Prado, com todas as jurisdições, incluindo o privilégio de não serem entradas por corregedores das justiças reais, e padroados, e das vilas de Guvari e de Nossa Senhora da Escada, no Brasil. Mestre-de-campo general, estribeiro-mor, Governador e capitão general do Brasil. Foi ainda alcaide-mor de Beja, senhor de cinco comendas na Ordem de Cristo e de duas da ordem de Sant´Iago. Segundo o livro «Nobreza de Portugal», iniciou-se no exército aos 13 anos, sob as ordens do pai, na campanha de defesa de Elvas em 1658 e 1659. Acompanhou-o ao Minho, assistiu a várias ações. Em 1661 foi despachado capitão das guardas do exército, comandado por seu pai, e em 1663 mestre-de-campo de um terço de Infantaria. Nesta qualidade fez parte das forças com que o pai tanto se distinguiu na fronteira do Minho. Entrou na tomada do forte de Gayão, e continuando a servir na província, estava nomeado em 26 de novembro de 1665 general de batalha. Em 1665, entrou na expugnação da vila da Guardia. Em 1666 actuou brilhantemente junto a Valença, derrotando os espanhóis. Firmada a paz, ficou governando as armas de Entre Douro e Minho ou província do Minho em 1669, enquanto o pai foi como embaixador a Roma. Em 1671, segundo comenta o livro "Monstruosidades do tempo e da fortuna", enfrentou o marquês de Fontes, no jogo de pela. "Estranharam os chapéus, porque os desconheceu a cabeça, e para que se se visse quais eram as cabeças, andaram às punhaladas sobre se trocarem os chapéus. Ambos ficaram feridos, confirmando em seu próprio sangue a fidalguia como se fora derramada em os campos de África; feneceu a batalha com Sua Alteza os mandar prender a ambos em suas proprias casas". A 6 de dezembro de 1674 foi promovido a mestre-de-campo general. O Marquês das Minas não voltou a ocupar esse posto, pois foi nomeado presidente do Conselho Ultramarino. De 1684 a 1687 foi promovido a governador e capitão-general do Brasil, onde se distinguiu notavelmente, apesar das graves contrariedades.
Em 1674 sucedeu no título a seu pai. Alcançou no curto prazo serenar as inquietações nascidas no tempo dos governadores antecedentes, e tornou-se diversas vezes notável pelos serviços que prestou. Teve necessidade de recorrer a meios violentos para coibir os impetuosos arrebatamentos do governador de Pernambuco, João da Cunha Sotomaior. Depois, na terrível epidemia tropical, a bicha que grassou na no Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco (febre amarela?), pela primeira vez descrita por um médico, o Dr. João Ferreira da Rosa. Mostrou dedicação, pagando do seu bolso remédios e hospitalizações. Outro caso grave em 1684 foi a revolta do Maranhão, provocada pela proibição do tráfico de escravos, liderada por Manuel Beckman e Manuel Serrão de Castro, que depuseram as autoridades e proclamaram a autonomia regional. O tenente-general Gomes Freire de Andrada foi enviado de Portugal com uma expedição que sufocou a insurreição, enforcando os líderes - para muitos autores, trata-se da primeira manifestação nativista. Regressando a Portugal em 1687, foi escolhido conselheiro de guerra, e depois sucedeu ao Duque de Cadaval no cargo de presidente da junta do Tabaco (1698-1704). Desde 9 de julho de 1688 fora nomeado conselheiro de Guerra. Encarregado em 1701 da praça de São Julião da Barra e depois do Tratado de 16 de maio de 1703 partiu para a Beira, dispondo coisas do exército. Juntou-se ao Príncipe de Tilly que entrara pelo Alentejo, tomou Portalegre; mas o Marquês de Villadanas tomou o Algarve e Castelo d Vide! Desastroso o início das hostilidades para Portugal. Mostrou grande talento, mas quase sem recursos e viveres. O D. Berwick falava nele com enorme consideração, mas o Barão de Fagel e lord Galloway eram os generais que tudo decidiam no exército. Debalde quis o Marquês das Minas entrar em Espanha. Quando em 1701 se ajustou entre Portugal, a França e a Espanha o tratado de aliança para reconhecimento de Filipe V e garantia do testamento de Carlos II, e se tratou de guarnecer a capital e de pôr em defesa a margem do Tejo, foi encarregado do governo da praça de S. Julião da Barra, com o comando de todos os fortes desde Paço de Arcos até Cascais tendo, porém, depois D. Pedro II ajustado com a Holanda, o Império e a Inglaterra, o tratado de 16.5.1703 em que Port se col,igava com esses estados contra Filipe V, e tratando-se de adoptar as prevenções para a guerra em que nos íamos empenhar para defender o AD Carlos, foi enviado para a provincia da Beira, a fim de dispor as coisas pertencentes ao exército que devia entrar em campanha. 24 de junho de 1703 nomeado governador das Armas da Beira. Vida militar. Iniciou-se no exército aos 13 anos, sob as ordens do pai, na campanha de defesa de Elvas em 1658 e 1659, na guerra da Restauração. Acompanhou-o ao Minho, assistiu a várias ações. Em 1661 foi despachado capitão das guardas do exército, comandado por seu pai, e em 1663 mestre-de-campo de um terço de Infantaria. Nesta qualidade fez parte das forças com que o pai tanto se distinguiu na fronteira do Minho. Entrou na tomada do forte de Gayão, e continuando a servir na província, estava nomeado em 26 de novembro de 1665 general de batalha. Em 1665, entrou na expugnação da vila da Guardia.
Em 1666 actuou brilhantemente junto a Valença, derrotando os espanhóis. Firmada a paz, ficou governando as armas de Entre Douro e Minho ou província do Minho 1669, enquanto o pai foi como embaixador a Roma. Em 1671, segundo a obra «Monstruosidades do tempo e da fortuna", enfrentava o Marquês de Fontes, no jogo de pela. "Estranharam os chapéus, porque os desconheceu a cabeça, e para que se visse quais eram as cabeças, andaram às punhaladas sôbre se trocarem os chapéus. Ambos ficaram feridos, confirmando em seu proprio sangue a fidalguia como se fora derramada em os campos de África; feneceu a batalha com Sua Alteza os mandar prender a ambos em suas proprias casas". A 6 de dezembro de 1674 foi promovido a mestre-de-campo general. O pai não voltou a ocupar esse posto, sendo nomeado presidente do Conselho Ultramarino. Em 1674 sucedeu no título a seu pai.
De 1684 a 1687 foi promovido a governador e capitão-general do Brasil, onde se distinguiu notavelmente, apesar de graves contrariedades. «Alcançou no curto prazo serenar as inquietações nascidas no tempo dos governadores antecedentes, e tornou-se diversas vezes notável pelos serviços. Teve necessidade de recorrer a meios violentos para coibir os impetuosos arrebatamentos do governador de Pernambuco, João da Cunha Sotomaior. Depois, na terrível epidemia tropical, a bicha que grassou na no Rio de Janeiro, Bahia e Pernambuco» (talvez um surto de febre amarela?), «pela primeira vez descrita por um médico, o Dr. João Ferreira da Rosa, mostrou dedicação, pagando do seu bolso remédios e hospitalizações. Outro caso grave sucedeu em 1684 (a revolta do Maranhão), provocada pela proibição do tráfico de escravos, liderada por Manuel Beckman e Manuel Serrão de Castro, que depuseram as autoridades e proclamaram a autonomia regional.»
O tenente-general Gomes Freire de Andrada foi enviado de Portugal com expedição que sufocou a insurreição, enforcando os líderes. Para muitos autores, seria a primeira manifestação nativista. No Reino. Regressando a Portugal em 1687, foi escolhido conselheiro de guerra, e depois sucedeu ao Duque de Cadaval no cargo de presidente da junta do Tabaco (1698-1704). Desde 9 de julho de 1688 estava nomeado conselheiro de Guerra. Guerra de Sucessão da Espanha. Foi em 1701 encarregado da praça de São Julião da Barra e, depois do tratado de 16 de maio de 1703, partiu para a Beira, dispondo coisas do exército. Juntou-se ao Príncipe de Tilly que entrara pelo Alentejo, tomou Portalegre; mas o Marquês de Villadanas tomou o Algarve e Castelo de Vide! Desastroso o início das hostilidades para Portugal. Havia grande talento no marquês das Minas, mas estava quase sem recursos e viveres. O Duque de Berwick falava nele com enorme consideração, mas o Barão de Fagel e lord Galloway eram os generais que tudo decidiam no exército. Debalde quis o Marquês entrar em Espanha. Quando em 1701 se ajustou entre Portugal, a França e a Espanha o tratado de aliança para reconhecimento de Filipe V e garantia do testamento de Carlos II, e se tratou de guarnecer a capital e de pôr em defesa a margem do Tejo, foi encarregado do governo da praça de S. Julião da Barra, com o mando de todos os fortes desde Paço de Arcos até Cascais; tendo, porém, depois D. Pedro II de Portugal ajustado com os Países Baixos o Império e a Inglaterra, o tratado de 16 de maio de 1703 em que Portugal se coligava com esses estados contra Filipe V, e tratando-se de adoptar as prevenções para a guerra em que nos íamos empenhar para defender o Arquiduque Carlos, foi enviado para a província da Beira, a fim de dispor as coisas pertencentes ao exército que devia entrar em campanha.Em 24 de junho de 1703 foi nomeado governador das Armas da Beira, conselheiro de Estado em abril de 1704. «Em 12 de junho de 1704, governando a Beira, atacou e destroçou o inimigo comandado por D. Francisco Ronqullo, junto a Monsanto, ferindo-se em combate. Em 1705, recuperou Salvaterra do Extremo e incendiou Zarza. Passou no mesmo ano a tomar o governo das Armas do Alentejo.» Diz a Nobreza de Portugal, «(…) intentou apoderar-se de Badajoz, o que não conseguiu por esta praça ter sido eficazmente socorrida pelos espanhóis. A 7 de março de 1706, fez nova investida, queimando a vila de Brocas e junto desta tiveram as suas tropas um choque com as que o Duque de Berwick comandava, do qual resultou a derrota das forças deste último, colhendo o nosso general 80 prisioneiros e 240 cavalos. A 9 de Abril do mesmo ano sitiou Alcântara, governada pelo general-de-batalha D. Miguel Gasco, conseguindo tomá-la e aprisionar juntamente com o dito governador toda a sua guarnição e 47 peças de artilharia. Prosseguiu o Marquês das Minas vitoriosamente a campanha, tomando consecutivamente Ciudad Rodrigo, Salamanca, Coria e Plasencia, e em 25 de junho fez a sua vitoriosa entrada em Madrid, onde esteve instalado como senhor durante 40 dias, no Paço Real, recebendo a sujeição dos poderes constituídos e tribunas, não só da mesma cidade como de Segóvia e Toledo, e fazendo ali proclamar Rei o Arquiduque Carlos, por cuja pretensão os aliados combatiam.» Diz outro autor: «Sua intenção era cortar da linha de operações ao exército de Berwick, mas este general, vendo que não recebia reforços de Madrid que o habilitassem a prosseguir na sua marcha vitoriosa, retirara para a fronteira, o que não impediu um dos seus generais de ser rudemente batido pelas tropas do marquês das Minas, que tinham sido reforçadas pelas dos Conde da Atalaia e conde de Alvor com os contingentes do Minho e de Trás-os-Montes. O Marquês estreara-se tomando Fuente Guinaldo, e reconquistara depois finalmente as povoações portuguesas ocupadas pelas tropas de Berwick. Tantos serviços prestados pelo Marquês das Minas confessados pelos próprios inimigos, pois que o Duque de Berwick sempre falava dele com muita consideração ao passo que votava um profundo desprezo aos outros generais que tinha na sua frente, tantos serviços pois pareciam que o indigitavam para o comando em chefe do exército aliado, mas o holandês de Fagel, quando D. Pedro II entrou em campanha, foi o verdadeiro general como se el-rei o quisesse recompensar pela derrota que sofrera, e que estivera quase abrindo ao inimigo as portas de Lisboa. Fagel e lorde Galloway eram os dois generais que tudo decidiam no exército, e debalde quis o Marquês das Minas entrar em Espanha impelindo adiante de si o general francês, que de bem poucas forças dispunham. Prevaleceram as opiniões de Galloway e Fagel, e a pretexto de estar próximo o Inverno, os soberanos recolheram-se a Lisboa sem terem vingado o insulto das armas franco-espanholas, nem terem aproveitado os brilhantes sucessos do Marquês das Minas. A este respeito dizem Paquis e Dochez na sua «Historia de Hespanha»: «O Marquês das Minas com a sua tática, continuava a ser empreendedoras, mas todos os seus planos eram paralisados pela inépcia de lorde Galloway». No ano seguinte, o Marquês das Minas continuou a ser posto de parte dando-se-lhe apenas o comando do exército da Beira, ao passo que o Conde das Galveas, general distintíssimo mas muito idoso, recebia o comando do exército de Alentejo a que se tinham juntado as tropas estrangeiras, e que era destinado para as operações militares. À frente de um pequeno corpo de tropas viu-se o Marquês obrigado a empregá-lo em acções de pouca importância, e limitou-se a reconquistar a praça de Salvaterra e a ocupar a povoação de Sarça, mas por fim, apesar da má vontade que pareciam ter na corte ao Marquês das Minas, não houve remédio senão confiar-lhe o comando principal do exército de operações. Tratou logo o general de fazer uma campanha de Outono, a fim de favorecer com uma diversão poderosa as operações realizadas na Catalunha pelo conde de Peterborough. Sem se demorar com o ataque e tomada de pequenas praças, determinou imediatamente pôr cerco a Badajoz, que lhe devia servir de base de operações. Nos princípios de Outubro entrou em campanha, traçou em redor de Badajoz a linha de circunvalação, o com tanta energia bateu a praça, que estava já a brecha a ponto de ser praticável quando o marechal de Pessé conseguiu passar o rio Xévora, por descuido ou por maldade de Galloway, e formar-se em batalha debaixo dos muros de Badajoz cobrindo-a dessa forma e tornando-a inexpugnável. Ficaram desse modo inúteis, todas, as precauções que Minas tomara para que a praça não fosse socorrida. Não faltou quem atribuísse à inveja e à má vontade dos generais estrangeiros a singularidade de passar um exército inteiro quase à vista do nosso sem ser sentido, mas o Marquês das Minas, tendo perdido ocasião de dar golpe no poder do Rei de Espanha, tratou de levantar o cerco sem deixar nem uma peça nas mãos do inimigo, levando até dos arredores da praça tudo quanto entendeu que era útil ao exército. Daí a pouco Filipe V, obrigado pela notícia que lhe chegara da rendição de Barcelona, chamou da fronteira portuguesa o marechal de Pessé com grande parte das forças que aí militavam, e o Marquês das Minas, ficando por isso com um pequeno exército na sua frente, abriu a campanha de 1706 resolvido a marchar sobre Madrid. «Concentrando num só corpo todas as suas tropas, dirigiu se rapidamente para o Norte deixando Badajoz à sua direita, ocupou de surpresa os lugares de S. Vicente e de Membrio, e travou renhido combate com o inimigo em Brozas. Alcançando vitória deixou o adversário retirar para Cáceres, prosseguiu para Alcântara, que no fim de cinco dias de resistência teve de se render, enviando o marquês para Portugal em resultado dessa capitulação 4.200 prisioneiros, entre os quais se contavam 6 generais e 128 oficiais, e assenhoreando-se por essa ocasião de 47 peças de artilharia, 2.961 espingardas fora as desarmadas, 3.900 arrobas de pólvora, 1.800 balas de artilharia, 360 caixas de balas de chumbo, 6 morteiros, 400 moios de farinha, 100 de cevada, 200 tonéis de vinho, 1.100 fardamentos novos, 105 cavalos, etc. Sem se demorar em Alcântara mais do que o tempo necessário para reunir abastecimentos e munições, Minas seguiu em direcção a Madrid pela estrada de Placencia. Preparava-se Berwick para passar o Tejo, a fim de socorrer Alcântara, quando teve notícia de que a praça se rendera. Retirando então para Placencia com o intento de cobrir a capital do reino sem se aventurar a uma batalha, começou entre os dois hábeis generais, que se achavam frente a frente, uma série de marchas e contramarchas estratégicas em que Berwick e Minas se mostraram igualmente dignos. 0 Marquês não querendo empreender uma marcha tão audaciosa sem ter bem segura a comunicação com Portugal, e sem sujeitar ao mesmo tempo ao poder de Carlos III uma larga extensão de território, enquanto marchava sabre Placencia, ocupando no caminho Coria e Galisteo, mandou destacamentos do seu exército para ocuparem na sua direita Cáceres e Truxillo. No dia 28 apareceu diante de Placencia onde, depois do Duque retirar para a margem esquerda do rio entrou logo fazendo aí aclamar Carlos III. Desse ponto continuou o exercito português rumo a Madrid pela estrada que, sendo cortada pelo Tretor atravessa Naval-Moral, Talavera de Ia Reyna e Toledo e pela qual se retirava Berwick fazendo um simulacro de resistência, na ideia de atrair o Marquês das Minas às estéreis planícies da Castela Nova. Chegando a Almaraz o nosso general, compreendendo o fim do adversário, deixou de o perseguir, retirou subitamente para Coria e fazendo um grande rodeio, seguiu para o Norte a estrada de Ciudad Rodrigo e de Salamanca, colhendo assim a vantagem de marchar ao longo da fronteira da nossa província da Beira e de ser reforçado por tropas frescas, ao passo que o Duque de Berwick se pretendesse ir-lhe no alcance se via obrigado a enfraquecer ainda o seu pequeno exército.»
A 22 de maio de 1706, quando o Duque de Berwick mal podia suspeitar as intenções do Marquês das Minas, dirigia-se o nosso exército a marchas forçadas para Ciudad Rodrigo, e abdicando as condições da capitulação para não demorar a marcha, tomou posse dessa praça e encaminhou-se para Salamanca, onde ditou a lei prosseguindo logo depois para Madrid sem encontrar resistência porque o duque ou não teve forças ou não teve tempo para lhe disputar a passagem dos desfiladeiros do Guadarrama. A 24 de junho chegou perto de Madrid, ao sítio de Nossa Senhora do Retamal, e esperando aí notícias da capital para saber a atitude que ela tomaria contra o exército vencedor, não tardou a receber informações seguras. «A orgulhosa cidade mandava humildemente os seus deputados ao general português para pedir que nomeasse o corregedor que devia governar a cidade, e muitas cidades das províncias próximas tais como Segóvia, Toledo, Talavera de la Reina, Ávila e outras, enviaram também os seus emissários implorarem a protecção do nosso general. No dia 28 finalmente fez o exercito port entrada triunfal em Madrid e ao cabo de 126 anos o Marquês das Minas vingava a afronta que Portugal sofrera com a entrada do Duque de Alba em Lisboa. Entradas em Madrid as forças do comando do Marquês das Minas, este ordenou que se efetuasse com solenidade a aclamação de Carlos III a 2 de julho, e ao mesmo tempo enviou recados sobre recados ao arquiduque, para que apressasse a sua vinda para a capital, mas esse príncipe fez muito devagar a viagem de Barcelona a Madrid, demorou-se em Saragoça, e paralisou todos os movimentos do marquês com os avisos que lhe mandava de que não tardaria a unir-se-lhe. Com todas essas delongas a junção só veio a efectuar-se quando já toda a Espanha estava em fogo, quando Berwick cortava as comunicações do exército com o Aragão, como já estavam cortadas com Portugal, e em ocasião por fim em que o Marquês das Minas, para não ser envolvido pelas tropas regulares e pelos insurgentes, se viu obrigado a retirar para a fronteira do reino de Valência, onde entrou intacto mantendo sempre a distância o inimigo que lhe era superior em número. Refazendo então como pôde o seu exército, tomou a ofensiva, expugnou o castelo de Vilena, e procurou atacar o inimigo em Montalegre e em Esla, até que os dois exércitos opostos se encontraram nos campos de Almanza a 25 de abril de 1707, onde as tropas portuguesas sofreram um terrível revés. A derrota em nada macula a reputação militar do Marquês das Minas, porque a previu e recuou, e se se aventurou a dar a batalha, foi obrigado pelo voto contrário de Galloway, que tinha grande peso como representante da nação que entre os aliados tinha mais importância, mas como sempre sucede Minas, que tão vistoriado fora quando entrara triunfantemente em Madrid, viu agora todo o seu prestígio perdido.» «Recolhendo a Lisboa e pretendendo voltar ao governo das armas da província do Alentejo, nem isso lhe concederam. Quis demitir-se de todos os cargos e honras, mas a pedido do rei desistiu desse intento, e passou o resto da vida exercendo o lugar de estribeiro-mor da rainha.» Diz a «Nobreza de Portugal», após a entrada em Madrid: «Durou pouco este notável triunfo das armas portuguesas, porque a extraordinária lentidão do pretendente a ir a Madrid fazer-se aclamar, em pessoa, deu tempo a que a hábil política dos partidários do Duque de Anjou, Filipe V, ganhasse numerosas adesões para este Príncipe, fazendo ver aos Espanhóis a sua causa como causa nacional. Após vicissitudes diversas da guerra, feriu-se a 25 de abril de 1707 a batalha de Almanza, na qual a causa do Arquiduque se perdeu, tendo os franco-espanhóis comandados por Berwick infligido severa derrota ao exército aliado, que ali perdeu elevadíssimo número de mortos, feridos e prisioneiros. No meio deste desastre houve-se o Marquês das Minas, cujas forças estavam incorporadas no exército vencido, não só com a maior bravura, mas também com grande perícia estratégica, conseguindo retirar para Barcelona com o que restava de suas forças e dali embarcá-las para Lisboa, sob a proteção da esquadra anglo-holandesa. Depois desta campanha foi nomeado estribeiro da Rainha D. Maria Ana de Áustria.»
Casou em 1664 com sua prima D. Maria Madalena de Noronha (morta em 1707), filha de D. Álvaro Manoel, 6º senhor da Atalaia, e D. Inês de Lima e Távora.
1
- D. Francisco de Sousa (1665-1687) 5º conde do Prado, morto solteiro e sem
geração.
2
- D. D. João de Sousa (Viana do Castelo 29 de dezembro de 1666-assassinado ao
sair da Congregação do Oratório de S. Filipe de Néri em 17 de setembro de 1722)
3o Marquês das Minas em 1721 e 6º conde do Prado.
3
- D. José Domingos de Sousa (1668-1708), cónego da Colegiada de Guimarães.
4
- D. António Luís de Sousa, morto, cedo.
5
- D. Catarina de Sousa, abadessa do mosteiro de Santa Clara, Coimbra
De
Teresa Colen, senhora irlandesa, teve um filho:
6 - D. Luís António de Sousa, (1671-1749),
casado com Bárbara Mascarenhas de Queiroz, senhora de Moroleiros. Provem deste
bastardo o Sousa usado pelos morgados de Mateus, depois Condes de Vila Real.A 7 de Novembro de 1712, Portugal assinou armistícios com a Espanha e com a França. Posteriormente, assinou o Tratado de Paz com a França (1° Tratado de Utrecht, 11 de Abril de 1713), obtendo a completa renúncia gaulesa às possessões portuguesas na margem esquerda do rio Amazonas, no Estado do Maranhão. O processo seria concluído com a assinatura do Tratado de Paz com a Espanha (2° Tratado de Utrecht, 6 de Fevereiro de 1715).
O casamento realizou-se a 9 de Julho, na Catedral de Santo Estêvão, com o imperador a representar D. João V. A nova rainha de Portugal foi então trazida a Lisboa a bordo da armada de catorze naus do Conde de Vilar Maior, que no caminho tocou em Portsmouth na Inglaterra, onde houve festejos em honra do casamento do rei aliado. Chegada a rainha a Lisboa, houve fogos-de-artifício no Terreiro do Paço, e armou-se um anfiteatro, onde em três tardes sucessivas se realizaram corridas de touros. Houve ainda preparações extraordinárias para a bênção nupcial, a 28 de Outubro, com arcos de triunfo e enorme magnificência, e toda a Corte sofreu uma profunda alteração: “Capela sob D. João IV, cavalariça sob D. Afonso VI, mosteiro sob D. Pedro II, a corte de D. João V surgiu, nova, e se formaram dois partidos; o da moda nova, chefiado pelo Conde da Ericeira, homem elegante e jovial que queria que as senhoras se deixassem ver e conversassem nas antecâmaras, que jogassem e bailassem; e o da moda velha, pelo Conde de Vimioso, azedo e formalista, devoto e taciturno, o lar igual a um mosteiro, a virtude igual a clausura, a mulher igual ao diabo; pregando retiro, silêncio e recato e detestando o comércio entre senhoras e cavalheiros. No dia de São Carlos [4 de Novembro], as salas dos Tudescos, dos Embaixadores e dos Leões se abriram e inundaram de luz, enchendo-se de panos de rás, as damas entraram aos bandos, tímidas, acanhadas, pois pela primeira vez desde D. Manuel homens e mulheres se cortejaram nas salas do Paço. A rainha tocou cravo; dançou a infanta D. Francisca, gorda, corada e empoada. Desde esse dia, houve profunda modificação na moral da Corte, sedução, graça, elegância, intriga.” O resultado deste casamento, e destas festas, logo se fez sentir: a 10 de Novembro do mesmo ano o Conde da Ribeira Grande escreveu em carta a D. Luís da Cunha: “Houve um baile no dia de São Carlos em que dançaram e cantaram as Damas do Paço na presença de Damas e Fidalgos; El-Rei está teimando em estrangeirar o nosso país e não sei até onde, acabará.”
O casal real teve seis filhos, entre os quais a rainha de Espanha D. Bárbara, esposa de Fernando VI de Espanha, o sucessor D. José, e D. Pedro III, marido de D. Maria I. Entretanto continuava a Guerra da Sucessão Espanhola. Depois de Almansa a participação portuguesa resumira-se a acções fronteiriças de menor envergadura. Vital para a coroa neste período era garantir a segurança das armadas do Brasil, grandes frotas de cinquenta a cento e cinquenta naus, que anualmente traziam açúcar, tabaco, e o cada vez mais importante ouro da província ultramarina, escoltadas por esquadras de meia dúzia de naus de guerra. Em 1710 o corsário francês Jean-François Duclerc tentou, com seis navios, atacar o Rio de Janeiro, porto de embarque do ouro. Foi no entanto repelido pelas fortalezas da barra ao tentar entrar na Baía de Guanabara, e ao tentar depois um desembarque numa praia mais afastada e logo uma marcha sobre a cidade sofreu uma pesada derrota, sendo aprisionado. Mas logo René Duguay-Trouin, que já antes em 1706 com três naves tentara sem sucesso capturar algumas naus da frota do Brasil, mas fora posto em fuga pela escolta de seis naus da Armada Real portuguesa, que em 1707 desbaratara a frota inglesa do comboio de Portugal, deu provas do seu talento militar. No ano seguinte, em 1711 - ano em que a vila de São Paulo recebeu o estatuto de cidade - fazendo uso de relatos vários sobre os ventos, as correntes, e as fortificações do Rio de Janeiro, Duguay-Trouin esperou ao largo da cidade, com uma esquadra financiada quer pelo rei, quer por privados, pelas condições ideais para atacar a cidade.
Na madrugada de 12 de Setembro de 1711, com o vento e a corrente a favor, e o Rio coberto de neblina matinal, avançou sobre a cidade com uma esquadra de sete naus de guerra e seis fragatas. Graças às condições apenas teve que suportar poucas salvas das fortalezas da barra, que no ano anterior tinham afugentado Leclerc. Os franceses penetraram então na baía de Guanabara, e após um bombardeamento e desembarque lograram conquistar a cidade. Após dois meses de ocupação, o governador do Rio de Janeiro aceitou, sob ameaça de destruição da cidade, pagar um resgate de 610.000 cruzados. A expedição de Duguay-Trouin teve assim um êxito comparável ao saque de Cartagena das Índias em 1697 pelo barão de Pointis (e nefastas consequências para as finanças de D. João V). Na península, os portugueses no mesmo ano reconquistaram a praça de Miranda do Douro, em Março, e viram cercadas as praças de Campo Maior e Elvas, na fronteira do Alentejo, por exércitos espanhóis. No final do ano, nasceu a infanta D. Maria Bárbara de Bragança, a futura rainha de Espanha, que anos mais tarde fez parte da chamada Troca das Princesas em 1729.
Tratado de Utrecht. Com a morte do imperador José I a 17 de Abril de 1711, o seu irmão, o arquiduque Carlos, cunhado de D. João V, subiu ao trono imperial como Carlos VI. Isto desequilibrou-se o sistema de alianças europeu e significou o fim da Guerra da Sucessão Espanhola, visto ser impensável o imperador da Áustria ser também rei de Espanha. Na cidade flamenga de Utrecht juntaram-se os ministros dos dois blocos. Portugal, representado pelo Conde de Tarouca e por D. Luís da Cunha, assinou uma paz separada com a França a 11 de Abril, no mesmo dia em que a maioria dos outros Estados assinou a paz geral. A paz com Espanha, no entanto, apenas viria a ser assinada a 6 de Fevereiro de 1715. Nos artigos do tratado de paz, ſolida e perpetua com verdadeira e ſincera amizade, podemos ler: Art.o III: ”Amniſtia para todas as peſſoas, aſſim Officiaes como ſoldados, e quaesquer outras...” / Art.o IV: ”Todos os Priſioneiros, e Refens, de huma e outra, parte, ſerão reſtituidos...” / Art.o V: ”As Praças, Caſtello (. . .) Territorios e Campos pertencentes ás duas Coroas (. . .) ſeráô reſtituïdas inteiramente ſem reſerva, de ſorte que as Rayas, e Limites das duas Monarquias fiquem no meſmo eſtado que antes da preſente Guerra.” / Art.o IX: ”As Praças de Albuquerque e Puebla ſe entregaráô no meſmo eſtado em que ſe achaô (. . .) igualmente a respeito do Castello de Noudar, e Colonia do Sacramento.” / Art.o X: ”Os Moradores deſtas Praças, ou de quaesquer outros Lugares occupados na preſente guerra, que naô quiserem ali ficar, podéraô retirarſe das ſobreditas partes, vendendo e diſpondo dos ſeus bens de Raïz e moveis (...) ” / Art.o XI: ”Os bens confiſcados reciprocamente por cauſa e razaô da preſente Guerra, seráô reſtituïdos aos antigos Poſſuïdores, ou a ſeus herdeiros (...) ”. Outros artigos determinaram por exemplo "que o rei espanhol reconhecia uma dívida de seiscentas mil patacas a D. João V, a ser paga (...) em tres pagamentos iguaes e conſecutivos (…) O Primeiro ſe fará com a chegada a Heſpanha da primeira frota, flotilha, ou galioens que vierem (...)” que as duas coroas respeitariam reciprocamente os respectivos e importantes monopólios do tabaco, em todos os seus domínios ultramarinos, “que as duas nações voltariam a abrir o comércio, para o estado em que este se achava antes da guerra; que voltariam a abrir os seus portos a naus mercantes e de guerra vizinhas, no máximo de seis naus de guerra em portos maiores, e três em portos menores,”...e ſe conſtragidos de tormentas, ou alguma urgente neceſſidade entrarem ſem pedir licença, seraó obrigados a dar logo parte da sua chegada (…) pondo grande cuidado em naô fazer dano, ou prejuizo algum ao dito Porto”, etc. Isto é, tudo voltou ao “status quo” ante. No entanto, os diplomatas de D. João V falharam em negociar com precisão o Artigo VI e várias outras passagens relevantes a este, sobre a Colónia do Sacramento. Isto forçaria D. João V, vinte anos mais tarde, a reagir com força militar para resolver este problema. Quanto aos franceses, a paz pôs fim a certos litígios com a França na Amazónia, que a França ambicionava a partir da Guiana francesa, e onde os portugueses tinham fundado a futura Manaus. No entanto, devido às distâncias e ao consequente atraso de comunicações, o último combate entre portugueses e franceses travou-se já depois do tratado de paz em 1713, no Oriente: a fragata Nossa Senhora da Nazareth, de 40 peças, tendo largado de Macau rumo a Goa em Dezembro de 1713, encontrou uma nau de 54 peças e uma fragata de 36 peças francesas, ao comando de Henri Bouynot, no estreito de Malaca em Janeiro de 1714. Após um combate que durou três dias e duas noites, os franceses afastaram-se, a nau francesa ficou tão danificada no encontro com a fragata portuguesa que teve posteriormente que ser abandonada por Bouynot. Vários combates semelhantes indicam que os oficiais e marinheiros da Armada Real de D. João V nada ficavam a dever aos franceses. Sem quaisquer ganhos após o esforço bélico, aprendeu D. João V com a guerra a não dar um apreço muito grande às questões europeias e à sinceridade dos acordos; daí em diante permaneceu fiel a seus interesses atlânticos, comerciais e políticos, reafirmando a aliança com a Grã-Bretanha.
Em relação ao Brasil, que foi sem dúvida a sua principal preocupação, e cuja população crescia exponencialmente nesta época, o rei ampliou os quadros administrativos, militares e técnicos, tudo com vistas a evitar o descaminho dos quintos do ouro, o imposto que era parte fundamental da economia de Portugal. Reformou ainda os impostos, e ampliou a cultura do tabaco e do açúcar em terras brasílicas, sobre as quais o Duque de Cadaval lhe pôde escrever, com todo o acerto: “(...) pois do Brazil depende hoje absolutamente muita parte da conservação de Portugal.” Apesar de tudo isto, Portugal teve por vezes dificuldades económicas, devidas em parte ao contrabando do ouro, em parte às prioridades económicas de D. João V, e em parte às dificuldades do Estado da Índia. Poder global: guerras no Oriente. No início do reinado de D. João V, enquanto se lutava na Europa e no Novo Mundo, os portugueses, como potência mundial que então eram, também estavam envolvidos em guerras no Oriente. Na Índia, o ano em que D. João V subiu ao trono marcou o início do colapso do Império Mogol, que tradicionalmente mantivera boas relações com Portugal; este entrou em rápida decadência após a morte de Aurangzeb em 1707.
Em vez deste, aumentou o poder do Império Marata, forte inimigo dos portugueses desde o final do século XVII. Como resultado, durante practicamente todo o reinado de D. João V os portugueses encontraram-se em guerra contra os maratas. O almirante da armada marata, pelos portugueses chamado Angriá, e seus filhos e sucessores, foram, principalmente durante as duas primeiras décadas do século, uma frequente ameaça à navegação portuguesa (e inglesa) na costa indiana. Outro inimigo era, os árabes de Mascate, velha possessão portuguesa para eles, perdida em 1650. No início do século XVIII estes estavam no auge do seu poder, tendo conquistado praças na costa da África Oriental até Zanzibar, incluindo a portuguesa Mombaça, fugazmente reconquistada pelos portugueses em 1729. Practicamente todos os anos os portugueses enviavam uma esquadra - a chamada Armada do Estreito - de Goa ao golfo de Omã e estreito de Ormuz, para proteger o seu comércio com a Pérsia e tentar evitar que as esquadras de Omã saíssem e alcançássem o mar Arábico. Batalha de Surate. O auge da, guerra que moviam os árabes de Omã aos Portugueses na Índia atingiu-se entre 1714 e 1719. Em 1714 uma forte esquadra árabe de sete naus alcançou o porto neutral de Surate, no golfo de Cambaia, principal porto do Império Mogol. Em vez de seguir viagem para sul, para atacar a navegação portuguesa no mar Arábico como era seu costume, tiveram que se manter no porto para reparar duas das naus, que tinham ficado fortemente danificadas durante a travessia. No porto de Surate encontravam-se embarcações de várias nacionalidades, incluindo holandesas, e também duas portuguesas de Macau, a maior das quais os árabes tomaram. Isto era uma clara violação da neutralidade do porto. O Vice-rei da Índia, Vasco Fernandes César de Meneses, futuro Conde de Sabugosa e Vice-rei do Brasil, obteve assim autorização do Grão-Mogol para atacar os árabes no próprio porto, e uma esquadra foi para lá enviada. Esta era composta pela nau Nossa Senhora da Estrella, de 64 peças, três fragatas de 122 peças, e cinco corvetas de 73 peças. Após uma dura batalha contra a esquadra inimiga de agora seis naves e 218 peças, contando com a de Macau que tinham tomado, os árabes foram desbaratados. Sintomático do estado de guerra no Estado da Índia, a fragata São Francisco de Assis, de 34 peças, não se chegou a juntar à esquadra portuguesa contra a esquadra àrabe, por a caminho ter travado um combate contra uma esquadra do Império Marata, que a fez regressar a Goa para reparos. A batalha de Surate marcou o apogeu da expansão omanita no mar Arábico.
Sobre a esquadra portuguesa, e sobre toda a navegação no império ultramarino de então, temos hoje o relato do missionário italiano Ippolito Desideri, que navegou primeiro de Lisboa a Moçambique a bordo de naus portuguesas da Carreira da Índia, depois de Moçambique a Goa, e finalmente nesta esquadra de Goa a Surate, com destino ao Tibete. O relato de toda a sua viagem no Oriente, Notizie Istoriche del Thibet, escrito de volta a Itália em 1727, foi recentemente traduzido e publicado em inglês. Em 1719, nova batalha travou-se no golfo Pérsico, em que a Armada do Estreito portuguesa, de três naus de 66, 64, e 60 peças e uma fragata de 40 peças derrotou uma esquadra árabe de igual força de quatro naves e 246 peças. Esta foi a última vez que os árabes tentaram saír para o Mar Arábico em força contra os portugueses; a próxima principal batalha entre uns e outros não seria antes da campanha por Mombaça, na costa da África Oriental, em 1727-1729, que os portugueses venceram no mar mas perderam em terra. Quanto à Africa Oriental, é digno de menção que apenas em 1752 foi Moçambique retirado da esfera governativa do Estado da Índia. Durante todo o reinado de D. João V os governadores na Ilha de Moçambique estavam assim ainda subordinados aos vice-reis da Índia. Política de ostentação: as embaixadas a Paris e Roma. Quando D. Manuel I em 1514 enviou a sua magnífica embaixada ao Papa, esta incluia um rinoceronte africano, um elefante branco da Índia - o famoso Hanno, animal de estimação de Leão X -, e onças do Brasil. D. João V quis igualmente garantir que as suas embaixadas imortalizassem o nome de Portugal. É necessário ter em mente que o ritual protocolar nesta época era visto como de máxima importância. O primeiro enviado de D. João V a Roma, em 1709, não ia por exemplo munido de estatuto de Embaixador, mas apenas de Enviado Especial. Assim, foram-lhe dadas as seguintes prerrogativas pelo Vaticano: Poderia ter um baldaquino na antecâmara, e outro na sala de audiências, os seus cavalos poderiam ter plumas de seda negra atadas à brida, ao sair no seu coche, seria precedido por um criado de libré a pé levando um parasol vermelho, como cardeais e príncipes, ser-lhe-ia permitida uma almofada de veludo para se ajoelhar na rua na igreja e na rua ao passar o sacramento, o seu lacaio principal poderia usar veludo negro à espanhola, seria entitulado na terceira pessoa em italiano, lei, mais respeitoso que Illustrissima para diplomatas residentes, e menos formal que Eccellenza para embaixadores, podia pedir uma audiência com Sua Santidade com um dia de antecedência, ou mesmo no próprio dia de manhã para a tarde, finalmente, seria sempre recebido por cardeais nas vestes cardinalícias regulares, e não de sobrepeliz ou roquete. Já em 1707, quando o Conde de Vilar Maior foi pedir a mão da filha do imperador, foram encomendados sete magníficos coches nos Países Baixos, de onde o embaixador se deslocou a Viena. Mas de todas as missões diplomáticas de D. João V, seriam as embaixadas a Paris em 1715, depois da Guerra da Sucessão Espanhola, e a Roma no ano seguinte, aquando da guerra contra os turcos, as mais famosas. Paris, 1715: Finda a guerra, D. João V estava agora interessado em melhorar as relações com Luís XIV de França. Para atingir este objectivo, enviou o Conde da Ribeira Grande, filho de uma princesa francesa e afilhado do rei de França, a Paris à frente de uma faustosa embaixada, que fez uma entrada pública em Paris a 18 de Agosto de 1715, pouco antes da morte de Luís XIV.
Com o maior aparato, num cortejo de cinco magníficos coches, cada um puxado por seis cavalos de diferentes cores, enquanto lacaios atiravam 10.000 moedas de prata e 200 moedas de ouro cunhadas para a ocasião aos parisienses nas ruas. O coche do embaixador, denominado Coche da Coroa, é um dos muitos da época que hoje pode ser visto no Museu Nacional dos Coches, na capital portuguesa. Roma, 1716: No mesmo ano de 1715 veio um núncio apostólico a Lisboa para o baptismo do príncipe herdeiro, D. José; o coche que trazia era um presente para o rei de Portugal, e pode hoje também ser visto no Museu dos Coches. Para retribuir a visita, e por causa de acontecimentos recentes no Mediterrâneo envolvendo a República de Veneza e o Império Otomano, D. João V organizou em 1716 uma das mais faustosas embaixadas de todos os tempos a Roma, onde na altura era embaixador o futuro Marquês de Abrantes, então Marquês de Fontes. O cortejo pelas ruas da Cidade Eterna de cinco extraordinários coches temáticos - três dos quais se encontram hoje no Museu dos Coches - e dez coches de acompanhamento marcaram o ponto alto da ostentação da magnificência do Poder Real de um monarca que dominava um vasto império. Triunfo de política externa: Batalha de Matapão.
No Mediterrâneo, o sultão otomano Ahmed III (1703-1736) queria vingar-se das derrotas do irmão Mustafa II a que sucedera, vistas no Tratado de Karlowitz. Em 1715 iniciou uma guerra contra a República de Veneza para conquistar a Moreia. Veneza logo pediu auxílio ao Papa e ao imperador. E estes, por sua vez, pediram o auxílio dos principais reinos católicos europeus - Espanha, França, e Portugal. A França, que acabara de estar em guerra contra a Áustria, não a quis ajudar. Mas a Espanha enviou uma esquadra ao Mediterrâneo em 1716. D. João V, ao contrário do irmão, o Infante D. Francisco, não era apaixonado pelo mar. No entanto, talvez para não ficar atrás do monarca espanhol, o rei fez armar uma esquadra para defender Corfu, que se encontrava cercada pelos turcos. Esta esquadra, de cinco naus de 334 peças, e ainda uma fragata e várias embarcações auxiliares, foi comandada pelo Conde do Rio Grande.
Para infelicidade das armas portuguesas, ao chegar a Corfu já os turcos tinham levantado o cerco. Mas a recompensa pela faustosa embaixada de D. João V a Roma e pela esquadra contra os turcos no Mediterrâneo nesse Verão de 1716 foi imediata: em Novembro do mesmo ano, o Papa Clemente XI elevou o estatuto de arquidiocese da capital portuguesa, criando o Patriarcado de Lisboa. Os únicos, outros patriarcados no Ocidente eram então - e são ainda - justamente Roma e Veneza. No ano seguinte, em 1717, Clemente XI voltou a pedir o auxílio de D. João V, que novamente enviou uma esquadra ao Mediterrâneo. Esta esquadra - agora sete naus de 472 peças no total - deveria juntar-se à Armata grossa de Veneza e uma pequena esquadra da Ordem de Malta. Novamente capitaneada pelo Conde do Rio Grande, e tendo agora como vice-almirante o Conde de São Vicente, a esquadra foi uma autêntica embaixada flutuante de D. João V, tendo realizado grande fausto em Palermo e Messina, na Sicilia, antes de fazer o mesmo em Corfu. Em Corfu a esquadra portuguesa, fortalecida por duas pequenas naves da Ordem de Malta de ao todo 112 peças, e uma nau veneziana de 70 peças - por curiosa coincidência chamada Fortuna Guerriera – formaram, a arrière, ou terço traseiro da linha de batalha da armada cristã. No entanto, os condes portugueses recusaram ficar subordinados ao almirante da Ordem de Malta como chefe desta esquadra dos aliados de Veneza. Encontrada a armada turca, travou-se a Batalha de Matapão.
A certa altura caiu o vento, e a arrière cristã viu-se sozinha a lutar contra a vanguarda de quinze naus da armada turca, estando as restantes naus cristãs mais afastadas e fora de alcance. E quando ao voltar o vento o almirante da Ordem deu ordem para a esquadra se afastar do inimigo para se juntar às demais cristãs, o Conde de São Vicente, a bordo de uma poderosa nau de 80 peças, recusou seguir a manobra. Nisto foi seguido pelo Conde de Rio Grande, a bordo de outra nau de 80 peças, duas outras das naus portuguesas, e ainda a veneziana Fortuna Guerriera. Graças à insubordinação dos condes portugueses, esta pequena força de cinco naus viu-se assim sozinha em luta contra as quinze naus da vanguarda da linha turca. No entanto, muito possivelmente por esta vanguarda ter já muito pouca pólvora para as peças, ao fim de várias horas de combate toda a vanguarda, e a própria armada turca, fez contravolta e retirou-se do campo de batalha. Assim, aos olhos da Armata grossa veneziana e das naves da Ordem de Malta, parecia que as naus portuguesas - ajudadas pella Fortuna Guerriera - tinham posto o inimigo turco em fuga (…). Como resultado, a esquadra do Conde do Rio Grande foi um verdadeiro triunfo de política externa de D. João V. Na viagem de regresso novas festas, com banquetes, bailes e fogos-de-artifício, foram dadas em Palermo na Sicília, onde a esquadra passou algum tempo em reparos, enquanto se correspondia com Portugal, Roma e Veneza - tendo o próprio Papa escrito a agradecer o almirante português.
Mais tarde, D. João V recebeu igualmente agradecimentos de Clemente XI, e Veneza enviou um embaixador extraordinário a Lisboa com agradecimentos. O prestígio internacional de D. João V estava no seu auge. Relacões internacionais, 1720-1750. Relações com a Santa Sé e a China. D. João V sempre foi, numa época em que a França era o modelo europeu em practicamente todos os aspectos, mais virado para Roma que Paris. Ainda durante a Guerra da Sucessão Espanhola, em 1712, tinha fundado a Academia de Portugal em Roma, uma academia de arte destinada à formação de artistas portugueses na cidade pontífica.
Do mesmo modo, o seu artista favorito, João Frederico Ludovice, o arquitecto do Palácio Nacional de Mafra assim como por exemplo ourives da Custódia de Bemposta, fora também formado em Roma. Com as embaixadas de 1715-1716 e as duas esquadras portuguesas contra os turcos no Mediterrâneo em 1716-1717, as relações entre D. João V e a Santa Sé alcançaram o seu zénite; e isto numa fase em que a importância internacional da Santa Sé era grande, devido à ameaça do Império Otomano. No entanto, e apesar de ser de um modo geral fiel a Roma, D. João V nem sempre viu com bons olhos os decretos pontíficos, tentando simultâneamente, dentro da hierarquia católica, promover Portugal como uma potência de primeiro plano. Após o Tratado de Passarowitz em 1719 que se seguiu à derrota dos turcos perante a Áustria, a importância relativa da Santa Sé na política internacional diminuiu. Entrava-se no século das Luzes, um termo usado pela primeira vez na França em 1733. Isto no entanto não afectou a colaboração de D. João V com o Papa, mesmo em casos em que os interesses dos dois eram diferentes. Um exemplo foi a forma como a Armada Real portuguesa se prestou a transportar um legado papal à China para implementar uma política que era contrária aos interesses de Portugal no Oriente. A questão dos Ritos Chineses. Clemente XI (1700-1721) era um papa ortodoxo, condenou, famosamente, o jansenismo com a bula Unigenitus (1713). Dois anos mais tarde, com a bula Ex ille die (1715), devido à "Controvérsia dos ritos na China", condenou igualmente o uso pelos missionários na China de costumes locais - os chamados Ritos Chineses - para facilitar a evangelização. Esta condenação dificultaria o trabalho dos missionários - na sua maioria jesuítas, e muito deles portugueses - e colocaria por isso o Padroado português numa muito pior situação na China.
Mas D. João V queria, dentro do razoável, acomodar a Santa Sé. Assim, a nau Rainha dos Anjos, de 56 peças, a mais pequena das portuguesas presentes na Batalha de Matapão em 1717, largou de Lisboa rumo a Macau a 20 de Março de 1720. A bordo viajava Monsenhor Mezzabarba, Patriarca de Alexandria, legado papal à corte do Imperador da China. Este imperador era o grande Kangxi, um dos mais importantes da história da China, que reinara já por mais de meio século, e que tinha tido ampla convivência com missionários católicos. O imperador tinha sido educado por missionários, tinha tido o jesuíta português Tomás Pereira como principal músico da Corte durante décadas, e encarregara mesmo um missionário, Teodorico Pedrini, da educação música de três filhos seus, um deles o seu succesor, o futuro imperador Yongzheng (1722-1735). A nau portuguesa chegou a Macau a 23 de Setembro, e pouco mais de um ano mais tarde, depois de conversas totalmente infrutíferas, largou de Macau com o legado de regresso a Roma a 13 de Dezembro de 1721. Um excelente exemplo de como D. João V se dispunha a colaborar com a Santa Sé. Como nota deve ser dito que a Rainha dos Anjos nunca chegaria a Lisboa. Depois de ter chegado ao Rio de Janeiro a 5 de Maio de 1722, perdeu-se no porto um mês depois, devido a uma explosão da pólvora a bordo. A sua valiosa carga, que incluía mais de uma centena de peças de porcelana chinesa, e ainda vários outros presentes do imperador da China para D. João V e o papa, nunca foi encontrada, e encontra-se ainda no fundo da Baía da Guanabara.
O imperador Kangxi não apreciou a missiva papal, e decidiu fechar a China aos missionários estrangeiros. No entanto, sabia que Mons. Mezzabarba representava o papa e não o rei de Portugal. Como resposta, pouco depois da Rainha dos Anjos ter largado de Macau, enviou uma embaixada em separado a D. João V logo em Março em 1721. Esta embaixada chegaria a Lisboa, tendo uma audiência em Dezembro, onde ofereceu ao monarca português mais ricos presentes, incluindo sete enormes pérolas avaliadas em 14.000 cruzados cada. A embaixada motivaria uma resposta diplomática de D. João V. No entanto, como o imperador Kangxi faleceu no ano seguinte, após o mais longo reinado da história da China, a embaixada ao seu sucessor apenas largaria três anos mais tarde. Em 1725, largou então a pequena nau de guerra Nossa Senhora da Oliveira, de 50 peças, em nova embaixada ao novo imperador da China. O embaixador era Alexandre Metelo de Sousa e Meneses, antigo secretário da embaixada em Madrid. O embaixador esteve quatro meses no Brasil na ida, para tratar de interesses vários da Coroa na colónia, e fez ainda uma "missão a Batávia", com a duração de um mês, onde entregou duas cartas da Coroa ao governador-geral da Companhia Holandesa das Índias Orientais antes de seguir viagem para a China. Esta embaixada de D. João V, mais um exemplo da sua política internacional de ostentação e magnificiência para promover Portugal no plano internacional, encontra-se descrita numa monografia recente.
A questão do cardinalato de Bichi. Houve, no entanto, um aspecto que marcou profundamente as relações entre Lisboa e Roma neste período: a nunciatura de Vincenzo Bichi, núncio apostólico em Lisboa nomeado em Setembro de 1709, que chegou a Lisboa em Outubro do ano seguinte. Durante mais de dez anos este seria o protagonista de uma feroz luta de interesses entre Lisboa e Roma. Bichi, anteriormente núncio na Suíça desde 1703, foi fortemente criticado pelo clero português pelo seu escandaloso comportamento em Lisboa, que passava por abusos vários a avultada venda de indultos. Essas queixas com o tempo levaram D. João V a queixar-se à Santa Sé. Bichi foi chamado ao Vaticano para se justificar, e depois ser severamente avisado pôde regressar a Lisboa. Mas o seu comportamente não melhorou, passando mesmo a ignorar ordens pontíficas. Entretanto deu-se a embaixada a Roma do Marquês de Fontes e as jornadas ao Mediterrâneo das esquadras do Conde do Rio Grande. A arquidiocese de Lisboa tinha sido elevada a patriarcado depois da primeira. Depois da Batalha de Matapão, pareceu-lhe agora justo a D. João V que quando o indesejado Bichi fosse substituído, lhe fosse dada a dignidade de um cardinalato, como era costume em Roma dar a núncios regressados de Madrid, Paris, e Viena. Isto mesmo tinha sucedido com o anterior núncio em Lisboa - o futuro Inocêncio XIII -. D. João V queria agora que esta práctica se tornasse fixa. Infelizmente, devido à má conduta de Bichi em Lisboa, parecia pouco provável que a dignidade lhe fosse concedida. D. João V no entanto insistiu, e comunicou à Santa Sé em 1719 que não permitiria Bichi deixar Lisboa sem antes receber garantias de que lhe seria oferecido o cardinalato.
Mais uma vez vemos assim D. João V afirmar Portugal como uma potência principal, querendo equiparar Portugal com a Áustria, a Espanha, e a França. Em Setembro de 1720, Clemente XI chamou Bichi a Roma e nomeou o napolitano Giuseppe Firrao novo núncio em Lisboa. D. João V, no entanto, manteve-se firme: não autorizou nem Bichi a deixar Lisboa, nem Firrao a entrar. E no início de 1721 morreu Clemente XI. Depois da morte de Clemente XI, D. João V viu com bons olhos a eleição de Inocêncio XIII em 1721. Era um homem que o monarca conhecia bem pessoalmente, visto o novo Papa ter vivido doze anos em Portugal, como núncio apostólico em Lisboa de 1697 a 1710. No entanto, em Maio de 1721 Inocêncio XIII confirmou Firrao como núncio, sem no entanto ceder quanto à questão do cardinalato. O monarca português recusou reconhecer a nomeação de Firrao, e continuou a exigir o cardinalato para Bichi, ameaçando mesmo cortar as relações diplomáticas. Isto numa altura em que por exemplo, como se viu, uma nau de guerra portuguesa funcionava como transporte diplomático à China ao serviço da Santa Sé. Inocêncio XIII morreria pouco depois, em 1724.
O novo Papa, Bento XIII - o único papa com ascendência real portuguesa, visto ser descendente de D. Dinis - via-se pressionado por um lado pelo cardeal português José Pereira de Lacerda, que tentava usar a sua influência na Cúria em favor do seu rei, e pelo lado contrário por um grupo de cardeais do Sacro Colégio liderados pelo embaixador francês, o cardeal de Polignac, que argumentavam que não seria correcto premiar o mau comportamento e desobediência de Bichi com a púrpura. Finalmente D. João V, que despendia fabulosas somas com a cúria romana, e com igrejas, monumentos e cerimónias religiosas, realizou em 1728 as ameaças que tinha feito alguns anos antes: encerrou a nunciatura em Lisboa, ordenou a todos os seus súbditos em Roma que deixassem a cidade, e proibiu todos os portugueses, eclesiáticos e leigos, de manter relações directas com a Santa Sé. Isto motivou Bento XIII a pedir a mediação de Filipe V de Espanha na questão, mas esta mediação foi categoricamente recusada por D. João V. Por fim, no outono de 1730 o novo papa Clemente XII, eleito poucos meses antes, cedeu totalmente aos desejos do D. João V, comprometendo-se a promover Bichi ao cardinalato. Bichi seria feito cardeal de S. Pietro in Montorio a 24 de Setembro de 1731, e pôde tomar possessão da dignidade com magnífica ostentação graças a uma dádiva de 25.000 cruzados de D. João V - que assim conseguira, numa época em que prestígio era tudo, ver a nunciatura em Lisboa ser promovida a uma das mais prestigiosas do mundo católico, a par de Madrid, Paris, e Viena -. Relações com a Espanha e a Grã-Bretanha. Durante todo o reinado de D. João V Portugal manteve uma relação pouco estável com a Espanha por um lado, e para o contrabalançar uma firme aliança com a Grã-Bretanha por outro.
Isto tinha fundamentalmente que ver com as diferentes naturezas dos três impérios. Um incidente em África. Durante todo o reinado de D. João V, o mais fiel aliado de Portugal foi a Grã-Bretanha. Em 1723 passou-se um incidente que, por ser exceptional, revela muito o motivo desta aliança. A 4 de novembro de 1722, o vice-rei do Brasil escreveu ao rei, informando Lisboa sobre uma fragata holandesa que incomodava a navegação portuguesa na Costa do Ouro. Ao mesmo tempo, o governador de Luanda, em Angola, escreveu ao rei a informar que os ingleses estariam a construir um forte em Cabinda, na foz do Rio Congo, região que os portugueses tinham descoberto com a expedição de Diogo Cão na década de 1480, e cujos reis locais, depois de evangelizados, sempre tinham sido amigos dos portugueses. Cabinda sempre tinha sido considerada pelos portugueses parte de Angola; um forte inglês na região era assim intolerável para Lisboa. O rei discutiu a situação, considerada grave, com o Conselho Ultramarino, e foi, decido enviar uma das próximas naus da Armada do Brasil para investigar, e tomar acção se necessário. Essa nau poderia depois examinar o caso da fragata holandesa na Costa do Ouro. No dia 26 de Maio de 1723 largaram então para o Brasil as naus Nossa Senhora Madre de Deus (60 peças) e Nossa Senhora da Atalaia (52 peças), como escolta de dezasseis naus mercantes. Depois de chegar a salvamento a Salvador (Bahia), a mais pequena das naus cruzou novamente o Atlântico, dirigindo-se então a Angola, como estipulado pelas ordens régias. Chegou a Luanda no dia 12 de Setembro, e largou novamente com rumo norte a 6 de Outubro.
Duas semanas depois chegou a Cabinda, e verificou que efectivamente aí se achavam ingleses: duas corvetas (Sloops of war, com menos de 18 peças cada), uma nau de mercadorias, e um forte de 30 peças acabado de ser construído. Nos termos das ordens que levava de D. João V, a Nossa Senhora da Atalaia exigiu que os ingleses entregassem o forte ao governo de Sua Majestade portuguesa. Estes recusaram, e a nau portuguesa abriu fogo. Com apenas 52 peças, era uma nau das mais pequenas, no entanto, era mais que suficiente para lidar com duas pequenas corvetas, cujas tripulações logo as abandonaram e se refugiaram no forte. Por dois dias a nau portuguesa e o forte inglês cruzaram fogo, até que os ingleses aceitaram render o forte e a nau de transporte em troca de poderem regressar à Europa nas corvetas. Este incidente marca o único confronto entre forças portuguesas e inglesas durante todo o longo reinado de D. João V; não há notícia do monarca português ter recebido protestos de Londres. O incidente é importante porque sendo a excepção, prova a regra, os interesses ultramarinos das duas potências nesta época eram distintos, os ingleses concentravam-se essencialmente nas Caraíbas e na América do Norte, os portugueses na América do Sul, África, e na Índia, onde os interesses dos ingleses estavam ainda inteiramente nas mãos da Companhia das Índias Orientais. Os interesses das duas coroas não entravam assim em conflicto, o que explica a longevidade da aliança entre Portugal e a Grã-Bretanha neste período. Quanto à Nossa Senhora da Atalaia, esta regressou a Luanda com as novas, e voltou depois a largar para a Costa do Ouro em Dezembro, no cumprimento das ordens régias. Depois de uma curta paragem nas possessões portuguesas da Ilha do Príncipe, no Golfo da Guiné, e no forte de Ajudá, na Costa dos Escravos, chegou ao então há muito holandês Castelo da Mina, na Costa do Ouro, em Janeiro de 1724. Aqui descobriu que a fragata holandesa que tinha incomodado a navegação portuguesa era afinal um barco de piratas de 30 peças, que a nau portuguesa logo afundou a tiro de canhão. A Nossa Senhora da Atalaia regressou depois ao Brasil, onde chegou no início de Abril de 1724, para depois voltar a Portugal, depois de ano e meio e mais de catorze mil milhas náuticas de cruzeiro. Desde que o governador de Luanda e o Vice-Rei do Brasil tinham escrito a D. João V, até os problemas não mais existirem, apenas um ano passara, um bom exemplo da dimensão global de Portugal nesta época, e de como ela dependia da Armada. A Troca das Princesas. Ao contrário das muito estáveis relações com a Grã-Bretanha, as relações com a Espanha sempre sofreram altos e baixos ao longo do reinado de D. João V. Quando subiu ao trono estava-se em plena guerra; mas mesmo depois da paz, a situação nunca foi estável. Alguns anos após a paz de Utrecht, as relações entre os dois reinos ibéricos melhoraram sensivelmente quando D. Luís da Cunha, grande diplomata que estivera presente nas negociações do tratado de paz, foi nomeado embaixador em Madrid em 1719. Estava-se também no período áureo do prestígio de D. João V, graças à Batalha de Matapão. A cidade de Colónia do Sacramento fronteira a Buenos Aires, evacuada pelos portugueses em 1705, tinha sido devolvida dez anos depois, e nada fazia prever novos conflictos. Mas pouco depois fundaram os portugueses na mesma região a cidade de Montevidéu, actual capital do Uruguai, em 1723. As reacções dos espanhóis de Buenos Aires foram imediatas, fazendo adivinhar futuras polémicas. Desde 1723, a jovem infanta portuguesa D. Maria Bárbara, filha de D. João V, estava prometida ao ainda mais jovem Príncipe das Astúrias, o infante Fernando.
Em 1725 a diplomacia espanhola viu então no Príncipe do Brasil, o infante D. José, o noivo ideal para a infanta Maria Ana Vitória, filha de Filipe V. A aliança entre as duas casas reais foi assim transformada em consórcio duplo, e criaram-se portanto condições excepcionais para a unidade peninsular. O duplo matrimónio dos príncipes herdeiros com princesas do reino vizinho veio a verificar-se após a chamada Troca das Princesas, também conhecida como Jornada do Caia, que ocorreu no rio Caia na fronteira do Alentejo, a 19 de Janeiro de 1729. A jornada em si foi caracterizada por todo o aparato típico das grandes cortes absolutistas da época. Das dezenas de coches e berlindas usados nesta ocasião - apenas para a Jornada do Caia foram encomendadas em Paris 24 berlindas -, sobreviveu até os nossos dias no Museu Nacional dos Coches um coche fabricado em Portugal, o Coche da Mesa, assim chamado por conter no interior uma mesa amovível.
A campanha do Rio da Prata. Desde o início do reinado de D. João V, o principal ponto de discórdia entre Portugal e a Espanha não estava situado na fronteira ibérica, mas sim no distante Rio da Prata: era a Colónia do Sacramento. Sempre desde que os portugueses tinham fundado esta cidade em frente a Buenos Aires em 1680, os espanhóis desta cidade tinham querido remover os portugueses da região. A 22 de Novembro de 1723, os portugueses fundaram ainda Montevidéu, que possui o melhor porto profundo no Rio da Prata. A fundação desta nova cidade logo causou novos problemas. Uma das questões era a própria legalidade da fundação: o Tratado de Utrecht estipulara sobre ”o Territorio e Colonia do Sacramento, ſita na margem ſeptentrional do Rio da Prata” que o monarca espanhol faria uma “desistência nos termos mais fortes”, ”para que o dito Territorio e Colonia fiquem comprehendidos nos Dominios da Coroa de Portugal”, mas nada dizia sobre novas fundações na região. Na interpretação dos espanhóis de Buenos Aires, isto significava que os portugueses apenas tinham direito à Colónia do Sacramento, e que a fundação de Montevidéu era ilegal. A reacção foi imediata, a 22 de Janeiro de 1724, os espanhóis de Buenos Aires ocuparam a recém-fundada localidade.
Os verdadeiros problemas viriam na década seguinte, quando os portugueses intensificaram a colonização do Rio Grande do Sul em 1733. Forças de Buenos Aires vieram então em 1734 pôr cerco à Colónia do Sacramento, que apenas se salvou graças a reforços enviados do Rio de Janeiro. Montevidéu continuava ocupada pelos espanhóis, que para lá fariam passar um exército considerável. As relações entre Portugal e a Espanha deterioraram rapidamente, e logo em Fevereiro de 1735 deu-se o "incidente das embaixadas", a guarda espanhola entrou na embaixada portuguesa em Madrid e aprisionou dezanove empregados da embaixada, a que D. João V logo ripostou com a prisão de dezanove funcionários da embaixada espanhola em Lisboa. Cortaram-se as relações diplomáticas, e em Lisboa preparou-se a guerra. D. João V decidiu então enviar uma forte esquadra ao Rio da Prata para fazer valer os interesses de Portugal na região. Em 1736, largaram assim ao todo seis naus de guerra, com 390 peças no total, para a América do Sul. Encontrariam no Mar da Prata uma esquadra espanhola de cinco pequenas naus e três fragatas, com 332 peças no total, uma força manifestamente inferior. Alguns combates foram travados, em que nenhum dos lados perdeu naves, mas os espanhóis não conseguiram impedir que a esquadra portuguesa, ao comando de Luís de Abreu Prego, iniciasse um bloqueio a Montevidéu, bloqueando assim o exército espanhol em terra. Durante um ano, de Agosto de 1736 a Agosto de 1737, a esquadra portuguesa bloqueou o exército espanhol em Montevidéu, sem que a esquadra espanhola no Mar da Prata tentasse fazer alguma tentativa de desafiar os portugueses, até que chegou uma nau de guerra do Rio de Janeiro com notícias de que em Paris se tinha assinado um armistício em Maio de 1737. Assim foi devolvida Montevidéu a Portugal, sem que durante um ano a esquadra espanhola na zona tivesse ousado desafiar a portuguesa. Por ironia, a única nave perdida durante toda esta campanha foi uma fragata espanhola de 36 peças, por encalhe. Enquanto tudo isto se passava, D. João V tinha invocado a aliança com a Grã-Bretanha logo em 1735, quando depois do incidente das embaixadas se adivinhava uma possível guerra com Espanha. Como resultado da aliança anglo-lusa, chegou a Lisboa no verão de 1736 uma poderosíssima armada de vinte e seis naus de guerra - equivalente practicamente a toda a Armada Real espanhola - às ordens do próprio Admiral of the Fleet Sir John Norris. A maior parte desta armada permaneceu em Lisboa até o verão seguinte, após o armistício de Paris. Assim se explica porque pôde D. João V enviar a esquadra ao Rio da Prata sem ter que se preocupar com a defesa das àguas da metrópole, e assim se explica porque Espanha rapidamente assinou um armistício com Portugal. E assim se explica, talvez, porque Portugal a partir da segunda metade do reinado de D. João V começou a sofrer uma certa dependência da Grã-Bretanha, que apenas se tornaria mais manifesta com o passar das décadas. O Tratado de Madrid. Mapa da América do Sul em 1750. Durante o reinado de D. João V a população do Brasil multiplicou várias vezes. Ao mesmo tempo, as fronteiras terrestres do território, após as primeiras experiências pioneiras dos bandeirantes no século XVII, foram alargadas para Ocidente, para além dos limites do Tratado de Tordesilhas de 1494. Os conflitos com a Espanha eram vários; para além da questão do Rio da Prata, existiam também litígios na Amazónia, onde os portugueses em 1669 tinham erguido o Forte de São José da Barra do Rio Negro, na actual Manaus. À medida que Portugal e a Espanha cada vez mais populavam o interior dos seus domínios na América, tornava-se imperioso firmar novo tratado sobre as fronteiras entre as duas coroas no Novo Mundo, e em 1746 as negociações foram iniciadas. Nesta época já D. João V sofria de saúde, e os principais responsáveis pelas negociações foram o Visconde de Vila Nova de Cerveira, embaixador extraordinário a Madrid, e principalmente Alexandre de Gusmão, este último um hábil diplomata que tinha nascido no próprio Brasil; era ainda seu, irmão o célebre inventor Bartolomeu de Gusmão. Assinado a 13 de Janeiro de 1750, o “Tratado de Madrid” obteve para Portugal o reconhecimento europeu da realidade das fronteiras do Brasil, seguindo o princípio de uti possidetis. As linhas rectas do século XV de Tordesilhas deram assim lugar aos contornos da ocupação efectiva, e Portugal manteve assim o domínio da bacia fluvial do Amazonas, aumentando muito o tamanho do Brasil. O tratado definiu, grosso modo, as fronteiras do Brasil moderno. Segundo o tratado, Portugal entregaria ainda a Colónia do Sacramento a Espanha, recebendo em troca o território dos Sete Povos das Missões. No entanto, esta troca foi contestada no local, os portugueses não entregaram Sacramento, e a mesma contestação nas missões levou à Guerra Guaranítica de 1754-1756, já no reinado de D. José I.
Relacões internacionais na Índia. Na Índia, a última década do reinado de D. João V viu primeiro a perda da Provícia do Norte em 1739-1741, e depois as Novas Conquistas em Goa em 1744-1746. A perda da Provincia do Norte. Algumas décadas após a morte de Aurangzeb em 1707, para infelicidade dos portugueses na Índia, o Império Mogol, que desde Akbar se mostrara tolerante à presença dos portugueses ao longo da costa, encontrava-se em avançado processo de colapso. O Império Marata não tinha conseguido ser uma séria ameaça no mar Arábico, onde a Armada Real portuguesa ao tempo de D. João V voltara, ser, como fora no século XVI, a principal força. O almirante dos maratas - Kanhoji Angrey, ou Angriá, como lhe chamavam os portugueses -, na Índia hoje visto como o primeiro grande almirante indiano, era essencialmente um corsário semi-independente do peshwa ou “grande ministro” marata; e a armada dos maratas era essencialmente composta por pequenas embarcações de um ou dois mastros apenas, que graças ao seu menor calado podiam fugir das maiores naves portuguesas nos baixos da costa indiana. Em 1738, dezasseis destas pequenas embarcações lograram tomar a pequena fragata portuguesa São Miguel, de 24 peças; esta foi a maior presa alguma vez tomada pela armada marata aos portugueses. Grão-Mogol Aurangzeb (1658-1707). Depois do seu reinado, o Império Mogol desintegrou-se, com seis grão-mogóis em doze anos. Peshwa Bajirao I (1720-1740), grande general e maior peshwa do Império Marata. No entanto, o Império Marata era tal como o Império Mogol um império terrestre. O que lhe faltava no mar, tinha-o em terra, onde as imensas forças terrestres dos maratas eram temíveis. De 1720 a 1740 o peshwa marata era Bajirao I, o maior chefe militar da história dos maratas. Este ameaçou agora as possessões portuguesas conhecidas desde Quinhentos como a Província do Norte: a faixa da costa desde Bombaim - esta oferecida aos ingleses aquando do casamento de D. Catarina de Bragança com Carlos II de Inglaterra em 1662 - a Damão. Toda esta faixa costeira, com praças como Baçaim e Chaul, estivera inteiramente nas mãos dos portugueses desde Quinhentos. Assim, nos últimos dias de 1738 Bajirao I, que no ano anterior tinha saqueado Deli, a própria capital dos Grão-Mogores, invadiu a Província do Norte. Em Janeiro conquistou facilmente três vilas menos importante, e a 17 de Fevereiro de 1739, pôs cerco a Baçaim. Ao mesmo tempo que invadia a Província do Norte, um segundo exército marata desceu dos Gates Orientais e invadiu o território de Goa, a própria capital dos portugueses na Ásia. Tal como contra os mogores, Bajirao I queria desferir um golpe o mais violento possível contra os seus inimigos. Simultâneamente, pedia aos Bounsolós ou régulos vizinhos que o auxiliassem. Era então Vice-Rei da Índia o Conde de Sandomil. Este tinha já recentemente enviado tropas a Baçaim, para reforçar a guarnição, e Goa encontrava-se assim à espera de reforços do Reino. Bardez perdeu-se, à excepção da fortaleza da Aguada e da fortaleza dos Reis Magos. O distrito de Salcete também se perdeu, ficando os portugueses cercados no forte de Rachol. A 8 de Março, o Vice-Rei mandou recolher todas as mulheres e crianças europeias à fortaleza de Mormugão, e dois dias depois propôs abrir negociações aos maratas. Os termos destes eram simples, abandonariam as conquistas em Goa, se os portugueses abandonassem a Província do Norte. O tratado de paz foi firmado a 2 de Maio, e a 12 de Maio Baçaim rendeu-se. Da guarnição de mil e duzentos homens tinham morrido oitocentos; aos sobreviventes foi permitido sairem da fortaleza com as bandeiras desfraldadas, de armas ao ombro e a toque de tambor. No entanto, o tratado não foi integralmente cumprido pelas duas partes. Os portugueses conservaram Damão e Chaul, e os maratas várias terras em Goa. Quando em Portugal se soube da invasão decidiu D. João V enviar na Armada da Índia desse ano uma esquadra de quatro naus e duas fragats, às ordens de Luís de Abreu Prego, com uma força de desembarque de dois mil homens, para reforçar as praças da Índia.
Esta Armada da Índia largou a 12 de Maio de 1740, a bordo ia também o Conde da Ericeira, justamente feito Marquês de Louriçal e nomeado novo Vice-rei. Mas quando este chegou a Goa em Fevereiro de 1741 já o Conde de Sandomil, ao abrigo de novo tratado entretanto firmado em Setembro de 1740, tinha acabado de entregar Chaul, evacuada em Janeiro de 1741. Assim se perdeu toda a Província do Norte, que durante cerca de duzentos anos fora portuguesa, excepto Damão, que permaneceria portuguesa até 1961. Com os reforços do Marquês de Louriçal conquistaram-se algumas terras em redor de Goa aos Bounsolós. Busto de D. João V de 1747 no Palácio Nacional de Mafra. Foi nesta época que se deram as Novas Conquistas na Índia. Como nota, a praça portuguesa de Mazagão, última praça portuguesa em Marrocos, foi nesta época também atacada pelo sultão de Marrocos, mas os portugueses sempre tiveram êxito em defender a praça de Mazagão. Ao todo rechaçaram os portugueses sete ataques dos invasores nestes anos, em Janeiro de 1738, Outubro de 1738, Janeiro de 1739, Setembro de 1741, Janeiro de 1743, Novembro de 1743, e por fim Maio de 1745, o último ataque marroquino a Mazagão durante o reinado de D. João V. As novas conquistas. Em Setembro de 1744 chegou a Goa novo Vice-Rei, o Marquês de Castelo Novo, que um quarto de século antes tinha sido governador da Capitania de São Paulo e Minas de Ouro no Brasil. Este decidiu em 1746 iniciar uma invasão de grande envergadura contra os Bounsolós a norte de Goa, para lhes conquistar definitivamente as terras entre os Gates e as terras portuguesas de Goa. Ainda antes da monção, em abril, conquistou Alorna, Bicholim, e Sanquelim, a primeira por assalto, as outras practicamente sem luta. Com o crescer da monção interrompeu-se a campanha militar, apenas para ser renovada depois das chuvas. Em novembro, tomou-se o forte de Tiracol, hoje no extremo norte de Goa, e em Dezembro algumas localidades menores ainda mais a norte. Mais tarde, em 1748, o Marquês de Castelo Novo garantiu com novas vitórias estas terras para Portugal. Desde então estas terras são chamadas, em Goa e na historiografia, as Novas Conquistas, em oposição às Velhas Conquistas do século XVI. Como recompensa, o Marquês de Castelo Novo foi agraciado com o título de Marquês de Alorna em 1748 por D. João V. Sociedade. Panorama cultural. Projectos arquitectónicos. Igreja do Menino Deus. Interior da Igreja do Menino Deus, de 1711, em Lisboa, um dos poucos projectos de construção de D. João V que sobreviveram o Terramoto de 1755. No panorama cultural, vivia-se em toda a Europa o final do Barroco. D. João V, fiel à sua política de opulência, gastou somas consideráveis em projectos de construção, principalmente em Lisboa, que pretendia, por assim dizer, transformar numa nova Roma. Um dos primeiros e mais belos projectos, e um dos poucos que sobreviveram o Terramoto de 1755, é a Igreja do Menino Deus, de rara planta octogonal, construída em 1711. Em cumprimento de um voto esse mesmo ano a 26 de Setembro, dois meses antes do nascimento do seu primeiro filho a 4 de Dezembro - a infanta D. Bárbara, a futura rainha de Espanha - D. João V inicou o projecto de construção de um vasto edifício, digno de homenagem ao herdeiro de um igualmente vasto império. Esse edifício seria o Palácio Nacional de Mafra, o maior monumento barroco português, da autoria de João Frederico Ludovice.
O conjunto é conhecido principalmente pela sua biblioteca, terminada no reinado seguinte, e pelo seu carrilhão, o maior do mundo em quantidade de sinos, encomendado em Antuérpia e Liège por D. João V. A construção do palácio-convento faz parte importante do romance Memorial do Convento, de José Saramago. As obras tiveram início a 17 de Novembro de 1717, uma semana depois da esquadra do Conde do Rio Grande ter regressado da Batalha de Matapão contra os turcos. D. João V tinha uma grande paixão por livros. Por esse motivo, na década de 1720 o principal projecto do rei foi a construção da Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra, iniciada também em 1717 e concluída em 1728.
Este projecto é assim ligeiramente anterior à semelhante, ainda que ainda mais grandiosa Hofbibliothek, ou Biblioteca da Corte em Viena, iniciada em 1722 pelo cunhado de D. João V, o imperador Carlos VI. Depois de concluída a biblioteca, ordenou D. João V a construção da Torre da Universidade, terminada em 1733. Ao mesmo tempo que ordenou a construção da biblioteca universitária, D. João V elevou também a verba de que a Universidade dispunha para a compra de livros, de 40$000 réis a 100$000 réis anuais.
Capela de São João Baptista (1742-1744). Note-se a esfera armilar no mosaico do chão, símbolo de Portugal como potência marítima. Nas décadas de 1730 e 1740 construiu-se então, para abastecer de água a capital portuguesa, o grandioso Aqueduto das Águas Livres, que trouxe água de Belas à capital. Um dos arquitectos responsáveis, Manuel da Maia, escreveu no projecto que o resultado que se queria era um aqueduto "forte, mas não magnífico, e ostentoso", o que sem dúvida foi alcançado, visto a estrutura, poucos anos depois de estar acabada, ter aguentado o Terramoto de 1755. Entre muitos outros, o derradeiro projecto do rei seria a extravagante Capela de São João Baptista, uma das mais ricas do mundo cristão. Projectada por Nicola Salvi - arquitecto da Fonte de Trevi - e Luigi Vanvitelli - arquitecto do Reggia di Caserta - e construído em Sant'Antonio dei Portoghesi (Santo António dos Portugueses), em Roma, de 1742 a 1744, foi sagrada e abençoada pelo papa a 15 de Dezembro de 1744, que nela ainda celebrou Missa a 6 de Maio de 1747, para depois ser desmontada, levada para Lisboa, e ser montada na Igreja de São Roque.
Tudo nesta capela é preciosíssimo, a frente do altar é revestida de ametista, as colunas são revestidas de lápis-lazúli, as paredes são revestidas de ágata e pórfiro, as molduras das portas etc. são de jaspe verde, etc. Enquanto os imagens não são pinturas, mas finos mosaicos. Merece, destaque o mosaico de uma esfera armilar no chão em frente ao altar. D. João V seguiu de perto o projecto, interferindo várias vezes nos desenhos, que incluíram não apenas a capela, mas ainda uma grande colecção de objectos de culto em ouro e prata, que representam o auge da ourivesaria barroca. Estes objectos, assim como vestes de culto, pinturas, etc., encontram-se hoje expostos no Museu de Arte Sacra de São Roque. Enquanto se construía esta capela intensificava-se o povoamento do Brasil, cuja população aumentava de forma exponencial.
Já em 1719 tinha por esse motivo sido criada a Diocese de Belém do Pará, e D. João V insistiu agora que fossem criadas duas noves dioceses no Brasil, o que veio a suceder com a criação da Diocese de São Paulo, até então uma prelatura da Diocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, e da Diocese de Mariana, ambas a 6 de Dezembro de 1745. Portugal afirmava-se cada vez mais como um dos principais estados católicos, e a edificação da Capela de São João Baptista, com toda a sua magnificiência, depois das várias outras construções de D. João V, terá certamente contribuído para a concessão pelo mesmo papa Clemente XII do título honorífico de Fidelissimus ou Sua Majestade Fidelíssima, extensível aos seus sucessores, em 1748. Portugal recebia assim as mesmas honras que Espanha e França, cujos monarcas usavam os títulos de Sua Majestade Católica e Sua Majestade Cristianíssima. D. João V conseguira, também neste aspecto, ver equiparado Portugal com as principais potências católicas do seu tempo, o objectivo que em todos os aspectos sempre guiou a sua política. Entre os projectos hoje menos conhecidos do monarca conta-se ainda o Miradouro de São Pedro de Alcântara, que oferece uma das vistas mais belas da capital portuguesa. Hoje de aspecto romântico Oitocentista, este miradouro, conhecido de todos os lisboetas, foi construído na década de 1740 por iniciativa de D. João V.
Cúpola da basílica de Mafra. Cúpula da basílica do Convento de Mafra (1717-1730). Produção literária. Como interessado que estava em afirmar Portugal como grande nação, D. João V usou também a produção literária para o atingir. Assim, o seu reinado foi marcado por uma grande produção literária sobre temas relacionados com a história, a geografia, e a língua portuguesa. Aqui, o exemplo máximo será talvez o Vocabulario Portuguez e Latino, o primeiro dicionário da língua portuguesa, cujos dez volumes, da autoria de Raphael Bluteau (1638-1734), foram publicados entre 1712 e 1721. Outras obras menores no género, de outros autores, são por exemplo as Regras da Lingua Portugueza (1725), a Orthographia, ou arte de escrever, e pronunciar com acerto a Lingua Portugueza (1734), e outra Orthographia da Lingua Portuguesa (1735), esta última de D. Luís Caetano de Lima (1671-1757). D. João V procurou justamente incentivar tais obras literárias sobre Portugal e assuntos portugueses; e em 1720, fundou a Academia Real da História Portuguesa para o efeito, com imprensa própria e numerosos gravadores franceses e flamengos. Durante os próximos vinte anos, a Academia publicaria vasto número de obras, incluindo por exemplo algumas das crónicas manuscritas de reis medievais portugueses, de cronistas como Fernão Lopes, Rui de Pina ou Duarte Galvão, como por exemplo as crónicas de D. Afonso Henriques (1726), D. Dinis (1729), ou D. Pedro I (1735). A academia acrescentaria ainda outras histórias ainda não escritas anteriormente, colmatando assim lacunas na historiografia portuguesa, como uma história de D. Sebastião composta por Diogo Barbosa Machado (1682-1772) em três tomos (1736-1747). Este autor compilou ainda uma rica biblioteca pessoal de alguns milhares de volumes, que mais tarde ofereceria ao rei D. José I, depois do Terramoto de 1755 ter destruído a Biblioteca Real no Paço da Ribeira, esta biblioteca seria mais tarde levada para o Brasil aquando da transferência da corte portuguesa para o Brasil em 1808, e constitui hoje a maior parte do fundo primitivo da Biblioteca Parque Estadual. Os académicos da academia enriqueceram ainda a cultura portuguesa de então com obras sobre outros estados e nações, como uma história da Ordem dos Templários, uma outra da Ordem de Malta, ou ainda a Geografia Historica de Todos os Estados Soberanos de Europa, composta por D. Luís Caetano de Lima em dois tomos (1734 e 1736). No entanto, como o próprio nome da academia reflectia, a prioridade era naturalmente Portugal.
A Biblioteca Joanina da Universidade de Coimbra (1717-1728). Enquanto se construía a belíssima biblioteca, a Academia Real da História Portuguesa publicava valiosas obras sobre temas portugueses. A obra magna da academia foi a Historia Genealogica da Casa Real Portugueza, de D. António Caetano de Sousa (1674-1759). Esta, uma das mais importantes obras do reinado de D. João V, é a culminação Setecentista de uma riquíssima tradição portuguesa de histórias genealógicas, anterior mesmo, por exemplo, ao Conde de Barcelos em meados do século XIV, e aos seus Livro de Linhagens do Conde D. Pedro e Crónica Geral de Espanha de 1344. Os 13 volumes de texto desta grande história de Portugal, com 14.203 páginas, e 6 volumes de provas documentais, com 4.580 páginas, foram publicados entre 1735 e 1749. Muitas outras obras marcadamente portuguesas foram ainda publicadas durante o reinado de D. João V, em parte impulsionadas pela academia. Um bom exemplo é a História Trágico-Marítima, de Bernardo Gomes de Brito (1688-1759), uma obra que dificilmente poderia ter sido escrita noutro país que não Portugal. Os seus dois tomos foram publicados em 1735 e 1736. Outra foi a Descripçam Corografica do Reyno de Portugal (1739), que contém uma exacta relação de todas as províncias e concelhos do reino. No final do reinado, Luís António Verney (1713-1792) escreveu a obra O Verdadeiro Método de Estudar, um seminal estudo crítico e ensaio filosófico sobre o ensino em Portugal, igualmente em dois tomos, publicado em 1746, em tudo muito superior à Nova Escola para Aprender a Ler, e Escrever (1722) de Manuel de Andrade de Figueiredo (1670-1735). Como bibliófilo que era, D. João V para além de custear por exemplo a publicação das obras da Academia, como os dez tomos do Vocabulario Portuguez e Latino e os dezanove tomos da História Genealogica da Casa Real Portugueza, favorecia ainda autores de poucos meios, possibilitando a publicação de obras que sem a intervenção do monarca possivelmente ficariam por imprimir. E quando alguma obra lhe era indicada como excelente e já rara, não hesitava em a mandar reimprimir, como por exemplo o Tratado dos Descobrimentos Antigos e Modernos (1735), de António Galvão (1490-1557), uma obra que não tinha sido impressa desde 1563. Um outro exemplo da bibliofilia do rei viu-se quando D. João V no início da década de 1740 ordenou ao embaixador em Roma que formasse uma colecção de todas as obras que pudesse descobrir nas bibliotecas da cúria romana que dissessem respeito à história de Portugal, ao mesmo tempo que ordenava a Sebastião José de Carvalho e Melo, então ministro plenipotenciário em Londres, que reunisse uma colecção de tudo quanto pertencesse aos ritos, leis, e costumes dos judeus, incluindo bíblias hebraicas, em qualquer das línguas vivas, o que o futuro Marquês de Pombal fez, compilando uma valiosa colecção que chegaria a Lisboa em 1743. Sobre D. João V e a sua rica livraria escreveu D. António Caetano de Sousa; “Assim tem uma numerosa e admiravel livraria, que se veem as edições mais raras, grande número de manuscriptos, instrumentos mathematicos, admiraveis relogios, e muitas outras cousas raras que ocupam muitas casas e gabinetes.” Outros estudiosos e escritores portugueses notáveis do reinado foram Jacob de Castro Sarmento (1691-1762), António Ribeiro Sanches (1699-1783), e Francisco Xavier de Oliveira, o Cavaleiro de Oliveira, (1702-1783), estes no exílio. Produção artística e científica. Custódia da Bemposta, no Museu Nacional de Arte Antiga. Domenico Scarlatti, Mestre de Capela na corte portuguesa 1719-1729. Portugal viveu uma grande riqueza artística durante o reinado de D. João V. Parte desta riqueza artística era no entanto, por assim dizer, totalmente importada, e paga em ouro do Brasil. Um exemplo é a magnífica Custódia da Bemposta, outrora na capela do Palácio da Bemposta, hoje no Museu Nacional de Arte Antiga, ambos em Lisboa.
A custódia foi desenhada por um ourives alemão formado em Roma (João Frederico Ludovice, o arquitecto de Mafra) contratado por D. João V e pago em ouro do Brasil, foi executada em prata dourada com esse mesmo ouro, e foi ainda decorada com pedras preciosas provenientes também do Brasil ou compradas com o ouro das Minas. Isto é, é uma obra de arte de certa forma inteiramente estrangeira, e um exemplo entre muitos. No entanto, graças às numerosíssimas comissões de D. João V, da casa real, e da alta nobreza portuguesa, as artes conheceram um desenvolvimento notável, e o barroco joanino obteve grande riqueza, para além da arquitectura, também por exemplo na pintura, na ourivesaria, ou no mobiliário. E certos estilos marcadamente nacionais foram também desenvolvidos, nomeadamente a arte do azulejo, e particularmente a da talha dourada. Ao mesmo tempo, a convivência com culturas estrangeiras, principalmente na Índia, permitiu influências estrangeiras, e o desenvolvimento do estilo indo-português. Alguns artistas notáveis foram Vieira Lusitano (1699-1783), pintor; José de Almeida (1700-1769), escultor, e o seu irmão Félix Vicente de Almeida, entalhador. No Brasil, um conhecido mestre-de-obras foi Manuel Francisco Lisboa em Ouro Preto, pai de António Francisco Lisboa, o famoso Aleijadinho, activo no reinado seguinte. Ainda no Brasil, uma colectânea de arte do reinado de D. João V (e não só) pode ser observada por exemplo no Museu de Arte Sacra de São Paulo e museus congéneres. D. João V tomava grande agrado pela música, tendo o rei ainda em 1713 fundado um seminário de música, que funcionou primeiramente no paço dos arcebispos, e posteriormente no convento de São Francisco. A partir de 1730 D. João V introduziu a ópera italiana na Corte; a data mais antiga conhecida é de 1733, ao cargo do violinista italiano Alessandro Paghetti. Em 1739 inaugurou-se então um teatro de ópera no Palácio de Belém, que o rei comprara ao Conde de Aveiras em 1726. Existia ainda um teatro de ópera na Rua dos Condes, mais perto do palácio real.
A importância que D. João V dava à música pode ser vista por exemplo no Mestre de Capela que contratou, que era também, mestre de música, da infanta D. Bárbara: o napolitano Domenico Scarlatti, o melhor cravista da sua geração; Scarlatti permaneceria em Lisboa de 1719 a 1729 como mestre de música, para depois da Troca das Princesas em 1729 seguir a infanta portuguesa para a corte de Madrid. No panorama nacional, os mais importantes compositores portugueses do reinado foram Francisco António de Almeida (1702-1755), Carlos Seixas (1704-1742), e António Teixeira (1707-1774). O Engenheiro Portuguez, de Manuel de Azevedo Fortes (1728). Quanto às ciências, para além da historiografia nacional, a que mais privilegiada foi pelo monarca foi a medicina, quer com traduções de obras estrangeiras - como a Cirurgia Anatomica, & completa por Perguntas e Respostas (1715), de um original francês, quer com novas fundações, como quando fundou uma escola de cirurgia no Hospital Real de Todos os Santos em Lisboa em 1731, e quando aprovou os estatutos de uma academia cirúrgica no Porto em 1746. Outras ciências naturais, tais como a física e química, foram no entanto mais neglicenciadas. De um modo geral, as ciências em Portugal não atingiram um desenvolvimento assinalável durante o reinado de D. João V. Para isto terá também sem dúvida contribuído o clima de censura da Inquisição. E mesmo a medicina sofreu com as actividades da Inquisição, visto muitos médicos serem judeus. Neste panorama de estagnação científica encontramos contudo uma clara excepção: a engenharia. De todas as ciências, a que melhores resultados apresentou durante o reinado de D. João V foi sem dúvida a engenharia, uma arte então essencialmente militar, tal como era ensinada nas academias militares, mas também com ampla aplicação civil em tempo de paz. O reinado de D. João V produziu assim notáveis engenheiros, tais como Manuel de Azevedo Fortes (1660-1749), Engenheiro-mor do reino em 1719 e autor de por exemplo O Engenheiro Portuguez, em dois tomos (1728), Manuel da Maia (1677-1768).
Arquitecto do Aqueduto das Águas Livres, um dos mais notáveis feitos de engenharia do século XVIII na Europa, ou ainda Eugénio dos Santos (1711-1760), responsável pela reconstrução do Terreiro do Paço depois do Terramoto em 1755. Para além destes engenheiros, e num campo totalmente diverso, é ainda justo mencionar a figura do cientista e inventor Bartolomeu de Gusmão (1685-1724), inventor da passarola. A nobreza. Armas de Sá chefe, in Livro do Armeiro-Mor (fl 65r) (1509). Armas, do 3º Marquês de Fontes, feito Marquês de Abrantes por D. João V em 1718, como recompensa pelo sucesso como embaixador em Roma, e em troca pelo antigo marquesado de Fontes. Armas de Noronha chefe, in Livro do Armeiro-Mor (fl 47v) (1509). Armas do 2.o Conde de Vila Verde, feito Marquês de Angeja por D. João V em 1714, quando foi nomeado Vice-rei do Brasil. O reinado de D. João V foi relativamente estável quanto à nobreza. Ao todo existiam cerca de cinquenta casas nobres tituladas, todas ainda pertencentes à mesma élite que podemos observar por exemplo no Livro do Armeiro-Mor de 1509, e que todas ainda conservavam os seus velhos poderes e prerrogativas. Graças ao ouro do Brasil foi ainda possível ao rei recompensar a mais alta nobreza, de modo que esta sempre se mostrou fiel ao monarca. A sociedade portuguesa sob D. João V era em todos os aspectos uma sociedade típica do Antigo Regime. Contenção nobiliárquica. Um aspecto extraordinário do governo de D. João V, em que Portugal se destaca de todos os principais reinos europeus, foi no entanto a contenção quanto à distribuição de títulos nobiliárquico pelo monarca, contrariamente à distribuição de simples foros de fidalgo da Casa Real. Em todos os reinos europeus nesta era assistiu-se a uma enorme inflação nobiliárquica, os monarcas aumentaram significativamente os números da nobreza titulada, conferindo imensas vezes títulos como recompensa. Na vizinha Espanha, por exemplo, passara-se de 144 casas tituladas em 1621 a 528 em 1700, e a tendência continuou durante a época de D. João V, em 1787 existiam 654 casas tituladas - cinco vezes mais títulos que cento e cinquenta anos antes. Na Grã-Bretanha passara-se o mesmo: de 55 títulos em 1603, passara-se a 173 casas tituladas em 1700; e em 1800 existiam 267 casas tituladas - cinco vezes mais títulos que duzentos anos antes. Em Portugal, no entanto, nada disto se observou. Em 1640, aquando da Restauração, tinham existido 56 casas tituladas. Como resultado da aclamação de D. João IV, alguns títulos de apoiantes do domínio espanhol foram revogados, e novos foram dados a apoiantes da indepêndencia portuguesa. No entanto, finda a Guerra da Restauração em 1668, em 1670 existiam apenas ainda 50 títulos em Portugal. Em 1700, o número passara a 51. Em 1730, a meio do longo reinado de D. João V, esse número era ainda de 51, e em 1760, no início do reinado de D. José I, tinha caído para 48. Ainda em 1790 o número de casas tituladas em Portugal era apenas 54, o mesmo que cento e cinquenta anos antes. D. João V, tal como o pai, D. Pedro II, e o filho, D. José I, apenas raramente conferia títulos de nobreza e ao mesmo ritmo que conferia alguns poucos, outros títulos antigos existentes extinguiam-se, normalmente por falta de sucessão. Esta contenção por parte dos monarcas é ainda mais marcante se se contemplar as comendas das Ordens Militares. Antes da Restauração existiam mais de quatrocentos comendadores das várias Ordens. À morte de D. João V esse número tinha sido reduzido a pouco mais de metade. A contenção de D. João V torna-se ainda mais óbvia se analisarmos os poucos títulos que conferiu; Conde de Povolide (1709). Marquês de Angeja (1714) quando foi nomeado Vice-rei do Brasil. Marquês de Abrantes (1718) recompensa pela embaixada a Roma.
Duque de Lafões (1718) um primo ilegítimo de D. João V. Conde do Lavradio (1725). Conde de Sabugosa (1729) enquanto era Vice-rei do Brasil. Conde de Alva (1729). Conde de Sandomil (1732) quando foi nomeado Vice-rei da Índia. Marquês de Louriçal (1740) quando foi nomeado Vice-rei da Índia. Marquês de Castelo Novo (1744) quando foi nomeado Vice-rei da Índia. Marquês de Alorna (1748) recompensa pelas Novas Conquistas na Índia. Marquês de Penalva (1750). Isto é, em 43 anos de reinado, e excluindo o primo, D. João V apenas conferiu títulos a dez homens. No entanto, todos os agraciados com um marquesado eram já condes. E em apenas quatro casos não existiam motivos extraordinários para conferir o título: uma nomeação como vice-rei, ou uma missão diplomática (Abrantes) ou militar (Alorna) vitoriosa. Excepto estes casos extraordinários, vemos assim como D. João V apenas conferia um título de nobreza uma vez por década. Esta extraordinária contenção nobiliárquica, completamente oposta ao que se verificava no resto da Europa, significava que existiam poucos meios de se distinguir na sociedade. Assim, as dignidades existentes, e possíveis de atingir, eram fortemente concorridas, com importantes consequências sociais: os foros de fidalgo da Casa Real; os hábitos das Ordens Militares; e o estatuto de familiar do Santo Ofício da Inquisição. A Igreja e a Inquisição. Assim como Roma para D. João V sempre foi, em matérias de política internacional, o verdadeiro fiel da balança europeia, assim continuava Portugal durante o seu reinado a ser um país em que a Coroa e a Igreja Católica, não obstante as disputas referidas supra, formavam um bloco homogéneo. Um exemplo disto é o facto de o rei, depois da morte do antigo diplomata e Secretário de Estado Diogo de Mendonça Corte-Real em 1736, ter escolhido para o cargo um cardeal da Igreja, D. João da Mota e Silva, que exerceu o cargo por mais de uma década. Merece, ainda destaque o longo período do cardeal D. Tomás de Almeida como Patriarca de Lisboa de 1716 a 1754. Limpeza de sangue. Diogo de Mendonça Corte-Real, Secretário de Estado (1707-1736). Cardeal D. João da Mota e Silva, Secretário de Estado (1736-1747). Cardeal D. José Pereira de Lacerda, bispo do Algarve (1716-1738). Cardeal D. Tomás de Almeida, Patriarca de Lisboa (1716-1754). O reino de Portugal era oficialmente apenas católico, não existindo lugar para outras crenças. No entanto, se bem que o número de protestantes (considerados hereges) em Portugal fosse ínfimo, o número de cristãos-novos era considerável, ainda que variável de região para região. E alguns destes cristãos-novos eram criptojudeus, isto é, practicavam ainda em segredo o judaísmo. Por esse motivo, os velhos estatutos do século XVI de "limpeza de sangue", que exigiam ausência de antepassados judeus (ou muçulmanos) para se poder ocupar uma grande variedade de cargos no reino, existiam também ainda durante o reinado de D. João V. Para se poder obter uma longa lista de promoções, ou por exemplo ser feito cavaleiro de uma das três Ordens Militares, seria necessário provar essa “limpeza de sangue”. Esta era documentada através de uma Habilitação de Genere et Moribus. No entanto, a Inquisição neste período, se bem que ainda perseguisse judeus, era também um mecanismo de prestígio na sociedade. Numa sociedade em que títulos nobiliárquicos eram impossíveis de obter para quem não pertencesse a uma extraordinariamente restricta élite de uma vintena de famílias, o prestígio passava pelos simples foros da Casa Real e pelas Ordens Militares e pela “limpeza de sangue”.
A Inquisição em Portugal nesta época funcionava assim também como uma simples emissora de certidões de “limpeza de sangue”. Realizava habilitações de genere, e passava aos cidadãos que as requeressem (e pagassem) certidões de, por assim dizer, “melhor raça”. E esta era uma parte não pouco importante das suas funções. Existia ainda a categoria de familiar do Santo Ofício, que também exigia “limpeza de sangue”. Os familiares eram agentes locais da Inquisição, de família respeitável de comprovada ancestralidade, que auxiliavam o tribunal, fazendo denúncias a nível local. No entanto, nesta época a dignidade era muitas vezes uma simples questão de prestígio a nível local, se bem que em cidades e vilas com maior número de cristãos-novos existissem normalmente mais familiares. Mas estudos recentes para os concelhos das terras da Casa de Bragança no Alentejo, vilas de Alter do Chão, Arraiolos, Borba, Évoramonte, Monforte, Monsaraz, Portel, Sousel, e Vila Viçosa, sugerem que o número de familiares não seria elevado, e curiosamente, mostram que ao longo do reinado de D. João V o seu número parece ter aumentado com o tempo precisamente à medida que a importância da Inquisição diminuía, de 10 familiares ao todo nas nove vilas na década de 1710, o número aumentou para 15 na de 1720, 24 na de 1730, e 28 na última década do reinado de D. João V. Esta têndencia sugere fortemente que (como foi recentemente também visto em Minas Gerais no Brasil) era de facto o prestígio o que mais levava os homens a procurar a dignidade de familiar, e não as actividades do tribunal.
Não obstante tudo isto, a verdade é que a Inquisição perseguiu os judeus portugueses durante o reinado de D. João V, incluindo alguns notáveis, executando alguns e motivando a emigração de outros, tais como; Jacob de Castro Sarmento (1691-1762), médico e filósofo natural, emigrado para Londres como resultado de denúncias justamente no Alentejo. António Ribeiro Sanches, médico e filósofo, emigrado por denúncia de um primo. Viveu em São Petersburgo e Paris. António José da Silva (1705-1739), o Judeu, dramaturgo, condenado e executado pela Inquisição. Censura literária. Frontispício de um Index Librorum Prohibitorum de Veneza de 1559. Licenças do Santo Ofício, na Chronica de D. Sancho I de Rui de Pina, na edição de 1727. Para além da perseguição aos criptojudeus e da emissão de certidões de "limpeza de sangue", o tribunal do Santo Ofício tinha também uma importante actividade censória. Existia um índice oficial “o Index Librorum Prohibitorum” de obras que eram vistas como opostas à doutrina da Igreja Católica, e qualquer obra, antes de ser impressa, teria obrigatoriamente que passar pela censura da Inquisição, e receber as necessárias licenças do Santo Ofício. Apenas umas poucas instituições eram julgadas possuir tão elevada estatura moral que estavam isentas da censura do Santo Ofício, e dependiam apenas dos seus próprios censores. Uma destas instituições era a Academia Real da História Portuguesa, que possuía uma mesa própria de quatro censores; um deles era por exemplo D. Diogo Fernandes de Almeida (1698-1752), escolhido pela Academia para escrever principalmente história eclesiástica, nomeado censor em 1737. Assim vemos um fenómeno de certo modo paradoxal: D. João V por um lado dotou a Universidade de Coimbra com uma bela biblioteca universitária, aumentou a sua verba para aquisição de livros, ordenou aos embaixadores em Roma e Londres que lhe enviassem livros, e fundou mesmo a Academia Real da História, tudo para fomentar o eruditismo no reino, mas por outro lado via com bons olhos a existência de uma instituição que de certo modo impedia esse mesmo eruditismo, quando as áreas estudadas eram consideradas incompatíveis com a doutrina cristã.
No entanto, isto não nos deve surpreender demasiado, nem se deve exagerar o efeito da censura da Inquisição. Todos os estados europeus à época de D. João V tinham alguma forma de censura nos seus reinos. A principal diferença estava nas áreas que eram censuradas: enquanto no norte protestante existia maior liberdade científica, em todo o sul católico essa liberdade era menor. Ficou recentemente demonstrado, graças a pesquisa histórica em arquivos do Vaticano recentemente abertos, que contrariamente ao imaginário popular, a Inquisição católica sul-europeia era relativamente suave na maioria dos casos que iam a tribunal, e mais suave que as igrejas protestantes norte-europeias quanto à perseguição de membros menos ortodoxos da sociedade, nomeadamente as bruxas no século XVII. Mas em verdade o Tribunal do Santo Ofício em Portugal continuou as suas actividades para além dessa centúria, e perseguiu também outras formas de pensamento pouco ortodoxo, levando a que figuras como o Cavaleiro de Oliveira acima mencionado tenham escolhido o exílio. Isto prejudicou sem dúvida alguma a livre transmissão de ideias na sociedade, e terá atrasado o desenvolvimento científico e social do país. Um sintoma é o facto de Luís António Verney acima mencionado ainda em 1746 ter sentido necessidade de publicar a sua obra, talvez considerada demasiado progressiva, sob pseudónimo.
Manufacturas e pragmáticas contra o luxo. Para além da sua política de ostentação, e da ter mantido relações com várias freiras, D. João V é hoje principalmente lembrado pelas suas construções. No entanto, o rei tentou também fomentar a industrialização do reino, ou melhor dito, as manufacturas; “Durante o reinado de D. João V, além de se dar sequência aos planos económicos que vinham de longe, ampliaram-se e robusteceram-se com novas disposições que a experiência foi aconselhando”. Assim se refere Fortunato de Almeida à política de desenvolvimento interno do Rei Magnânimo, a quem, como afirma, “alguns só conhecem dissipações de ostentação e vícios pessoais” [referência no original]. Contrariando essa visão, o autor refere que D. João V ”facilmente compreendeu quanto convinha apoiar o desenvolvimento económico”, e terá sido nessa perspectiva que dinamizou as manufacturas. Entre estas, salienta-se a fundação de uma fábrica de papel na Lousã. Esta iniciativa enquadra-se na política de industrialização que remonta a D. Pedro II, política a que D. João V deu continuidade. O rei sempre mostrou interesse pela fundação de manufacturas e outras empresas que pudessem fortalecer a economia do reino. Logo no início do reinado fundou por exemplo a Companhia de Comércio de Macau (1710); exemplos de manufacturas relevantes são a fábrica de papel da Lousã (1716), a fábrica de vidros da Coina (1722, transferida para a Marinha Grande em 1748), as fábricas de pólvora de Alcântara e Barcarena (1729), ou a fábrica de sedas de Lisboa (1734).
Com a fundação de manufacturas como estas procurava D. João V substituir importações estrangeiras com produção nacional em sectores vitais da economia. A fundação da fábrica de sedas prende-se ainda com as Leis Pragmáticas; toda uma legislação contra o luxo no reino, em que se tentava limitar o uso exagerado de materiais de luxo importados, e assim evitar a saída de ouro para o estrangeiro. Nesta era, este tipo de leis tivera início com D. Pedro II, o pai de D. João V, e leis de 1677, 1686, e 1698. Do mesmo modo, várias vezes durante o seu longo reinado (a primeira das quais já em 1708, e a última em 1749) legislou D. João V sobre a matéria. Toda uma legislação extremamente detalhada foi desenvolvida, definindo que grupos sociais (de fidalgos a escravos) podiam usar que materiais, tais como sedas e rendas nos trajes, ouros e pratas, vidros e cristais, etc. nos coches e liteiras, no mobiliário, etc. Toda esta legislação tinha essencialmente dois objectivos 1ª diferenciar socialmente os súbditos do rei, de maneira a facilitar a identificação social das pessoas (e evitar por exemplo que burgueses exibissem o se julgava ser prerrogativas da fidalguia) e a 2ª limitar afinal as importações, ao mesmo tempo que a fundação de manufacturas procurava satisfazer as necessidades do reino. Pragmáticas contra o luxo foram no século XVIII vistas em practicamente toda a Europa; um caso extremo da Dinamarca de 1783 tentou mesmo legislar que vinhos poderiam ser bebidos em que ocasiões. No entanto, não havia naturalmente maneira de fiscalizar todo um reino para controlar tais leis, e na maior parte dos casos pouco ou nenhum efeito tiveram. No caso português, o uso por exemplo da cor vermelha na libré, prerrogativa da casa real, era facilmente detectável e severamente punido; mas no caso de detalhes como cintos e lenços as transgressões eram practicamente impossíveis de detectar, e os consumidores continuaram, independentemente da igualdade de qualidade que muitas das manufacturas portuguesas apresentavam, a dar preferência aos artigos importados. Assim, a política de fomento de manufacturas e substituição de importações de D. João V, de uma forma geral, não surtiu efeito.
Emigração para o Brasil. Um outro factor digno de menção sobre a sociedade joanina, pois marcou todo o reinado de D. João V, foi a fortíssima emigração para o Brasil que se fez sentir, devido à atração do ouro. Foi nesta época que Portugal efectivamente iniciou a povoação do Brasil, cuja população possivelmente terá quadruplicado durante o reinado de D. João V, a partir de uma população de talvez trezentas mil pessoas. Todos os anos quatro, cinco, seis mil ou mais portugueses, principalmente do Minho, emigravam para o Brasil. Numa tentativa de controlar este êxodo a coroa chegou a legislar; três leis, em 1709, 1711, e novamente em 1720, tentaram regular a migração minhota para o Brasil, sem grande efeito. Em relação à lei editada em 1720, as autoridades afirmavam: "Tendo sido o mais povoado, o Minho hoje é um estado no qual não há pessoas suficientes para cultivar a terra ou prover para os habitantes." De modo inverso, em 1721 o Conde de Assumar, futuro Marquês de Alorna na Índia, escreveu da sua capitania no Brasil que muitas jovens portuguesas eram enviadas para conventos em Portugal, e que melhor seria se ficassem e casassem no Brasil. Finalmente, em 1732, D. João V proibiu a saída de mulheres portuguesas para o reino sem a sua autorização expressa, um alvará que, contribuindo para o povoamento do Brasil, não aleviou no entanto a emigração portuguesa. Como se escrevia dois anos mais tarde, a propósito da festividade do Triunfo Eucarístico em Villa Rica em 1733, "Viu-se em breve tempo transplantado meio Portugal a este empório.
" Saúde e morte do rei. D. João V sempre teve saúde delicada. Ainda em 1709 foi sangrado devido a caroços no pescoço. Em 1711 convalesceu de uma queixa de flatos. Em 1716 foi restabelecer-se em Vila Viçosa de doença de cariz melancólico. Foi essa a primeira de duas ocasiões em que a rainha sua esposa foi regente do reino em sua ausência. No dia 10 de Maio de 1742, com apenas 52 anos de idade, teve um forte ataque, que uma testemunha descreveu da seguinte maneira; "um estupor o privou dos sentidos e ficou teso de toda a parte esquerda, com a boca à banda." Este foi o primeiro ataque de paralisia que teve. O monarca melhorou com o passar dos dias, indo aos banhos nas Caldas da Rainha e ao Santuário da Nazaré. Foi essa a segunda vez que a rainha foi regente do reino. D. João V voltou passado pouco tempo ao governo, mas já como um homem diminuído e menos energético. O rei faria nos últimos anos de vida ao todo mais doze jornadas às Caldas, para convalescer e descansar: Julho-Agosto de 1742, Maio de 1743, Setembro de 1743, Abril-Maio de 1744, Julho de 1744, Outubro de 1744, Maio de 1745, Outubro de 1745, Setembro-Outubro de 1746, Abril de 1747, Setembro de 1747, e Setembro de 1748. Mas gradualmente adoeceu cada vez mais. Em Julho de 1750 piorou então tanto que foi sacramentado. Chamaram-se frades, recitaram-se salmos e jaculatórias, e o Cardeal-Patriarca veio administrar-lhe o sacramento da extrema-unção. O rei faleceu a 31 de Julho de 1750, após mais de quarenta anos de governo. Ao morrer, o rei tinha a seu lado a rainha, o príncipe D. José, os infantes D. Pedro e D. António, o futuro Cardeal da Cunha, e os médicos da corte.
Jaz no Panteão dos Braganças, ao lado da esposa, no mosteiro de São Vicente de Fora em Lisboa. Legado. D. Luís da Cunha (1662-1749), autor do chamado Testamento Político, uma longa carta ao príncipe herdeiro D. José, escrita no fim da sua vida, assim como da de D. João V, em 1747. Na última década do reinado de D. João V a produção de ouro no Brasil alcançou o ápice. Várias toneladas de ouro chegavam todos os anos a Lisboa. Mas apesar do aparente estado de prosperidade dos cidadãos portugueses durante o reinado de D. João V, o ouro que foi obtido na colónia não foi aproveitado de forma a fomentar um estado de facto próspero. As tentativas de fomentar o comércio e a manufactura do reino foram ainda assim poucas e insuficientes. Como resultado, a capacidade de produção de Portugal, já de si inferior aos grandes centros de artesanato, manufactura, e comércio norte-europeus, não foi capaz de acompanhar o crescimento destes. Assim, à morte de D. João V Portugal estava ainda mais atrasado em relação aos estados norte-europeus que quando D. João V subiu ao trono. Isto, no entanto, era um fenómeno compartilhado por toda a Europa do sul, e dificilmente atribuível a D. João V; o tema foi magistralmente estudado por Max Weber na obra fundamental que é A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo. D. João V tentou, ao longo de todo o seu reinado, afirmar Portugal como uma potência de primeira grandeza, e usou os métodos típicos de alguém nascido no sul da Europa no último quartel do século XVII. Tudo o que fez no campo político tem que ver com esta vontade de ver Portugal equiparado com as grandes potências, aproveitando a estável aliança com a Grã-Bretanha. No entanto, fez também tentativas (que se mostraram totalmente insuficientes) para melhorar as manufacturas. Mas se bem que o rei poderia sem dúvida ter feito mais nesse sentido, os problemas existentes eram, tal como em todo o sul da Europa, estruturais e muito profundos. Veja-se que nem mesmo as imensas reformas do Marquês de Pombal no reinado seguinte, assim com as de Carlos III de Espanha na mesma época, conseguiram aproximar os países ibéricos dos norte-europeus.
A longa paz, salvo casos pontuais, a partir do segundo quartel do século, fez D. João V neglicenciar a Armada Real, que à data da sua morte apenas tinha dois terços dos efectivos que tivera durante a Guerra da Sucessão Espanhola. Assim, Portugal colocou-se numa posição cada vez mais dependente da Grã-Bretanha, como já se vira em 1736. No final do reinado, D. Luís da Cunha, o veterano diplomata, escreveu de Paris o seu "Testamento Político", uma carta ao príncipe herdeiro, em que, entre muitas outras reformas (sobre por exemplo policiamento e iluminação nas ruas de Lisboa, ou mudar a Corte para o Brasil), aconselhava justamente o futuro rei a fortalecer o exército e a Armada, de modo a diminuir a depêndencia da Grã-Bretanha. O Terramoto de 1755 logo traria outras prioridades. Hoje, o legado de D. João V é, para os historiadores, a extensa obra literária que fomentou, e para o público geral os edifícios e obras de arte que mandou criar, muitas de grande beleza. Curiosamente, o bronze dos sinos do carrilhão de Mafra e demais sinos da basílica, ao todo 110 sinos, chegaria para armar uma nau de guerra de peças de bronze.
Poucas dúvidas existem de que se o seu irmão, o infante D. Francisco, tivesse reinado em lugar de D. João V, isto seria o que teríamos visto: o conselho de D. Luís da Cunha de fortalecer as, armas, o exército e a Armada levado a cabo. O irmão do rei teria preferido usar o ouro do Brasil (ou neste caso o bronze) para fabricar canhões, e comprar mosquetes. D. João V preferiu encomendar sinos, e estátuas. Assim, o longo reinado de D. João V serve também para ilustrar quão fundamental era a personalidade do rei absoluto para a política do Estado durante o Antigo Regime. Títulos, estilos, e honrarias. Títulos e estilos. 22 de Outubro de 1689-1 de Dezembro de 1696; Sua Alteza, O Sereníssimo Infante João de Portugal. 1 de Dezembro de 1696-9 de Dezembro de 1706; Sua Alteza Real, O Príncipe do Brasil, Duque de Bragança, etc. 9 de Dezembro de 1706-23 de Dezembro de 1748. Sua Majestade, O Rei de Portugal e dos Algarves. 23 de Dezembro de 1748-31 de Julho de 1750: Sua Majestade Fidelíssima, O Rei de Portugal e dos Algarves. O estilo oficial de D. João V enquanto Rei de Portugal; Pela Graça de Deus, Sua Majestade Fidelíssima D. João V, Rei de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Honrarias. Enquanto monarca de Portugal, D. João V foi Grão-Mestre das seguintes Ordens: Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ordem de São Bento de Avis. Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem de Sant'Iago da Espada. Antiga e Muito Nobre Ordem da Torre e Espada. Genealogia. Ascendência Ancestrais de João V de Portugal. Descendência; Havidos de Maria Ana de Áustria (7 de Setembro de 1683-14 de Agosto de 1754; casados por procuração a 27 de Junho de 1708) Maria Bárbara, Rainha de Espanha.
Retrato a três quartos de uma jovem envergando um vestido e seda laranja e cor-de-rosa, com uma peruca empoada. 4 de Dezembro de 1711. 27 de Agosto de 1758 casou-se com Fernando VI, Rei de Espanha. Não houve descendência. Pedro, Príncipe do Brasil Retrato de uma criança pequena sentada (Princípe Pedro) com uma menina mais velha ao seu lado (Infanta Maria Bárbara) 19 de Outubro de 1712. 29 de Outubro de 1714. Príncipe do Brasil do nascimento à morte.
José I de Portugal. Retrato a meio corpo de um homem vestido com uma couraça prateada com um fato de veludo, púrpura e uma peruca empoada. 6 de Junho de 1714-1724 de Fevereiro de 1777. Rei de Portugal de 1750 a 1777. Casou-se com Mariana Vitória de Bourbon, filha de Filipe V, Rei de Espanha.
O casamento produziu quatro filhos. Carlos, Infante de Portugal 2 de Maio de 1716. 1 de Abril de 1736. Faleceu aos 19 anos, com uma febre. Pedro III de Portugal. Retrato mostrando um jovem de colete prateado e fato de veludo azul, com uma peruca empoada. 5 de Julho de 1717- 25 de Maio de 1786. Rei de Portugal, jure uxoris, de 1777 a 1786. Casou-se com D. Maria I, Rainha de Portugal. O casamento produziu sete filhos. Alexandre, Infante de Portugal. 24 de Setembro de 1723-2 de Agosto de 1728. Faleceu aos 4 anos de idade, de varíola. Havidos de Luísa Inês Antónia Machado Monteiro. António de Bragança-1 de Outubro de 1704-14 de Agosto de 1800. Um dos três Meninos da Palhavã. D. João V reconheceu o filho em documento secreto em 1742, escrito após o seu primeiro ataque de paralisia, mas apenas feito público depois da sua morte, deixando-lhe herança. Havidos de Madalena Máxima de Miranda (c. 1690-?). Gaspar de Bragança, 8 de Outubro de 1716-18 de Janeiro de 1789. Arcebispo-Primaz de Braga de 1758 a 1789. Um dos três Meninos da Palhavã. D. João V reconheceu o filho em documento secreto em 1742, escrito após o seu primeiro ataque de paralisia, mas apenas feito público depois da sua morte, deixando-lhe herança.
Havidos de D. Filipa de Noronha, filha do Marquês de Cascais. Nado-morto. Maio de 1710. Morreu à nascença, no Convento de Santa Clara. Havidos de Madre Paula de Odivelas (17 de Junho de 1701-1768) José de Bragança. Retrato que mostra um jovem a meio corpo, vestido de prelado com cruz peitoral e com uma peruca preta. (8 de Setembro de 1720). (31 de Julho de 1801) Inquisidor-mor da Inquisição Portuguesa de 1758 a 1777. Um dos três Meninos da Palhavã. D. João V reconheceu o filho em documento secreto em 1742, escrito após o seu primeiro ataque de paralisia, mas apenas feito público depois da sua morte, deixando-lhe herança. Havidos de Luísa Clara de Portugal, a Flor da Murta (21 de Agosto de 1702-31 de Agosto de 1779). Maria Rita de Bragança (1731-1808). Freira no Convento de Santos, em Lisboa. D. João V não a reconheceu oficialmente, mas custeava-lhe as despesas. Havidos de uma senhora francesa incógnita. Joana Rita de Bragança
Rei José I de Portugal, (nome completo; José Francisco António Inácio Norberto Agostinho de Bragança, (6 de junho de 1714-24 de fevereiro de 1777), cognominado O Reformador devido às reformas que empreendeu durante o seu reinado, foi Rei de Portugal da Dinastia de Bragança desde 1750 até à sua morte. Casou, em 1729, com Mariana Vitória de Bourbon, infanta de Espanha. Reinado.
O reinado de José I é sobretudo marcado pelas políticas do seu secretário de Estado, o Marquês de Pombal, que reorganizou as leis, a economia e a sociedade portuguesa, transformando Portugal num país moderno. Quando subiu ao trono, José I tinha à sua disposição os mesmos meios de acção governativa que os seus antecessores do século XVII, apesar do progresso económico realizado no país, na primeira metade do século XVIII. Esta inadaptação das estruturas administrativas, jurídicas e políticas do país, juntamente com as condições económicas deficientes herdadas dos últimos anos do reinado de João V, vai obrigar o monarca a escolher os seus colaboradores entre aqueles que eram conhecidos pela sua oposição à política seguida no reinado anterior. Diogo de Mendonça Corte-Real, Pedro da Mota e Silva e Sebastião José de Carvalho e Melo passaram a ser as personalidades em evidência, assistindo-se de 1750 a 1755 à consolidação política do poder central e ao reforço da posição do marquês de Pombal, com a consequente perda de importância dos outros ministros.
A 1 de novembro de 1755, José I e a sua família sobrevivem à destruição do Paço Real no Terremoto de Lisboa por se encontrarem na altura a passear em Santa Maria de Belém. Depois desta data, José I ganhou uma fobia a recintos fechados e viveu o resto da sua vida num complexo luxuoso de tendas no Alto da Ajuda em Lisboa. D. José na sua adolescência, enquanto Príncipe do Brasil, em retrato de Pierre-Antoine Quillard. Outro acontecimento notável do seu reinado foi a tentativa de regicídio que sofreu a 3 de setembro de 1758 e o subsequente processo dos Távoras. Os Marqueses de Távora, o Duque de Aveiro e familiares próximos, acusados da sua organização, foram executados ou colocados na prisão, enquanto que a Companhia de Jesus foi declarada ilegal e os jesuítas expulsos de Portugal e das colónias.
Uma segunda fase, de 1756 a 1764, caracteriza-se pela guerra com a Espanha e a França, pelo esmagamento da oposição interna (expulsão dos Jesuítas), reforma da Inquisição e execução de alguns nobres acusados de atentarem contra a vida do rei, entre os quais o duque de Aveiro e o marquês de Távora, e pela criação de grandes companhias monopolistas, como a do Grão-Pará.
Guerra dos Sete Anos
A Guerra dos Sete Anos foi uma série de conflitos internacionais que ocorreram entre 1756 e 1763, durante o reinado de Luís XV, entre a França, a Áustria e seus aliados (Saxónia, Rússia, Suécia e Espanha), de um lado, e a Inglaterra, Portugal, a Prússia e Hanôver, de outro. Vários fatores desencadearam a guerra: a preocupação das potências europeias com o crescente prestígio e poderio de Frederico II, o Grande, Rei da Prússia; as disputas entre a Áustria e a Prússia pela posse da Silésia, província oriental alemã, que passara ao domínio prussiano em 1742 durante a guerra de sucessão austríaca; e a disputa entre a Grã-Bretanha e a França pelo controle comercial e marítimo das colónias das Índias e da América do Norte. Também foi motivada pela disputa por territórios situados na África, Ásia e América do Norte. A fase norte-americana foi denominada Guerra Franco-Indígena (ou Guerra Francesa e Indígena), e participaram a Inglaterra e suas colónias norte-americanas contra a França e seus aliados algonquinos. A fase asiática iniciou o domínio britânico nas Índias. Foi o primeiro conflito a ter carácter mundial, e o seu resultado é muitas vezes apontado como o ponto fulcral que deu origem à inauguração da era moderna. A Guerra foi precedida por uma reformulação do sistema de alianças entre as principais potências europeias, a chamada Revolução Diplomática de 1756, e caracterizou-se pelas sucessivas derrotas francesas na Alemanha (Rossbach), no Canadá (queda de Québec e Montreal) e na Índia. O conflito terminou com a vitória da Inglaterra e seus aliados.
As principais batalhas em território europeu foram:
1ª Batalha de Minorca (20 de maio de 1756).
2ª Batalha de Lobositz (1 de outubro de 1756).
3ª Batalha de Reichenberg (21 de abril de 1757).
4ª Batalha de Praga deu-se no dia 6 de maio de 1757, durante a Guerra dos Sete Anos e envolveu 65 mil prussianos e 62 mil austríacos. A Guerra dos Sete Anos iniciara-se em 1756, com a invasão da Saxónia pelos prussianos de Frederico o Grande. Durante o inverno seguinte, uma grande coalizão formou-se contra a Prússia, encabeçada pela Áustria, França e Rússia. Ciente de que a França e a Rússia tardariam a colocar seus exércitos em marcha na primavera seguinte, decidiu Frederico lançar um golpe de mão contra a Boémia, região então pertencente a Áustria, para perturbar a concentração do exército adversário e capturar alguns de seus armazéns. Com um exército de 108 mil homens, divididos em quatro colunas convergentes, o prussiano forçou o recuo do exército austríaco de Browne e logrou efetuar a concentração de suas forças à frente de Praga. Ali também, no limite oriental da cidade, as forças austríacas decidiram interromper o recuo e oferecer batalha. Carlos de Lorena posicionou-se voltado para o norte, com a frente protegida por um riacho e o flanco esquerdo apoiado na cidade. À direita, confiou sua segurança em um terreno pontilhado por lagos artificiais. Pois foi justamente pela direita que Frederico veio, em uma difícil marcha de flanqueamento, que obrigou os austríacos, pouco a pouco, a mudar de posição. Ainda assim, a batalha foi dificílima para as tropas prussianas. Salvaram-se pela descoberta de uma brecha no centro da nova linha austríaca, que acabou por obrigar os defensores a se refugiarem na cidade fortificada. As perdas humanas foram equilibradas, tendo os prussianos a lamentar a morte do inestimável marechal Schwerin.
5ª Batalha de Kolin, travada a 18 de Junho de 1757, em plena Guerra dos Sete Anos, o rei prussiano Frederico II, usando a estrada, tentou lançar todo seu esforço contra o flanco direito austríaco. Porém, viu seu plano frustrado por Daun, que conseguiu mudar o posicionamento de suas tropas, transformando a manobra prussiana em puro ataque frontal. O terreno elevado, além de favorável aos austríacos, não permitiu ao rei prussiano uma visão adequada do campo de batalha. As colunas prussianas, lançadas ao ataque, uma após a outra, de forma descoordenada, logo se viram diante de forças numericamente superiores. Ao final da tarde, após horas de intenso combate, elas estavam desorganizadas, permitindo a Daun empurrá-las montanha abaixo. Os couraceiros prussianos, sob o comando de Oberst von Seydlitz finalmente lançaram-se na refrega, atacando o flanco direito austríaco. Deram-se, então, muitas cargas de cavalaria na região do monte Krzeczor, diminuindo a pressão imposta por Daun. E então, sob a cobertura das forças comandadas pelo General von Tauentzien, parte da força prussiana engajada na batalha pode recuar em segurança, evitando-se o pior.
6ª Batalha de Hastenbeck (26 de julho de 1757).
7ª Batalha de Gross-Jägersdorf (30 de agosto de 1757).
8ª Batalha de Moys (7 de setembro de 1757).
9ª Batalha de Rossbach (5 de novembro de 1757).
10ª Batalha de Breslau (22 de novembro de 1757).
11ª Batalha de Leuthen (5 de dezembro de 1757).
12ª Batalha de Krefeld (23 de junho de 1758).
13ª Batalha de Zorndorf, (25 de agosto de 1758) o rei Frederico II da Prússia, usando mais uma vez sua ordem de ataque oblíqua, carregou contra o flanco direito adversário. Mas os Russos conseguiram repulsar o ataque e realinhar sua frente. Frederico então repetiu a investida sobre o novo flanco direito de conde Fermor, sendo novamente repelido. Então, von Seydlitz, à frente da cavalaria prussiana, atacou novamente a infantaria russa, colocando-a em fuga.
14ª Batalha de Hochkirch (14 de outubro de 1758).
15ª Batalha de Bergen (13 de abril de 1759).
16ª Batalha de Kay (23 de julho de 1759).
17ª Batalha de Minden (1 de agosto de 1759).
18ª Batalha de Kunersdorf, (12 de agosto de 1759), lutada na Guerra dos Sete Anos, foi a derrota mais devastadora de Frederico II da Prússia. No dia 12 de agosto de 1759, nas proximidades de Kunersdorf (Kunowice), a leste de Frankfurt (Oder), 50.900 prussianos foram derrotados por um exército combinado de 41.000 russos e 18.500 austríacos sob o comando de Pyotr Saltykov. Somente 3.000 soldados dos 50.900 prussianos retornaram para Berlim depois da batalha, apesar de que muitos outros fugiram. A batalha começou com um ataque prussiano ao flanco russo. Esse ataque foi tão bem sucedido que se Frederico tivesse parado por aí (como seu irmão havia ordenado), Kunersdorf teria sido uma vitória prussiana. Entretanto o líder prussiano quis testar seu sucesso inicial e decidiu continuar a luta. Enquanto o ataque prussiano perdia força, a cavalaria austríaca (até então mantida na reserva) entrou na batalha. No entanto, Frederico foi capaz de reagrupar e manter a pressão nos aliados. O ponto máximo da batalha nas horas iniciais da noite com um ataque maciço da cavalaria prussiana sob o comando de Friedrich Wilhelm von Seydlitz sobre o centro e a artilharia russos. A cavalaria prussiana sofreu grandes perdas e retirou-se em completa desordem. O próprio Seydlitz ficou gravemente ferido. A cavalaria aliada, que incluía a cavalaria pesada russa, os Croats e os Kalmyks, contra-atacaram e dispersaram o que sobrou do exército prussiano. O rei Frederico II quase foi capturado e ficou ferido ao atirar em si mesmo. Ele ficou sozinho numa pequena colina com seu florete fincado no chão atrás dele - determinando que ele sustentaria a linha contra todos os inimigos sozinhos ou morreria. O capitão da cavalaria, Ernst Sylvius von Prittwitz, foi ao resgate do rei com seu esquadrão e convenceu Frederico a sair. Os russos e os austríacos perderam menos do que 15.000 homens (aproximadamente 5.000 mortos). Os prussianos sofreram uma derrota severa ao perder 172 canhões, 6.000 mortos, 13.000 feridos e 26.000 soldados que fugiram. Quatro dias depois da batalha a maioria dos 26.000 homens que haviam fugido reapareceram e o exército de Frederico passou a contar com 32.000 homens e 50 canhões. A Batalha de Kunersdorf foi a primeira batalha onde unidades regulares de artilharia a cavalo foram usadas. Eram, essencialmente, um híbrido de cavalaria e artilharia, onde todo o destacamento utilizou os cavalos durante a batalha. A unidade tinha sido formada recentemente e lutou no lado prussiano. Apesar de terem sido destruídas durante a batalha, as baterias foram reorganizadas no mesmo ano e participaram na Batalha de Maxen.
19ª Batalha de Hoyerswerda.
20ª Batalha de Maxen (21 de novembro de 1759).
21ª Batalha de Meissen (4 de dezembro de 1759).
22ª Batalha de Landshut (23 de junho de 1759).
23ª Batalha de Warburg (1 de agosto de 1759).
24ª Batalha de Liegnitz (15 de agosto de 1760).
25ª Batalha de Torgau (3 de novembro de 1760).
26ª Batalha de Villinghausen (1761).
27ª Batalha de Burkersdorf (21 de julho de 1761).
28ª Batalha de Lutterberg.
Batalha de Freiberg.
Motivos da guerra. A guerra deu continuidade a disputas não apaziguadas pelo Tratado de Aquisgrão (1748) e tinha relação com a rivalidade colonial e económica anglo-francesa, e com a luta pela supremacia nos Estados Alemães entre a Áustria e a Prússia. A guerra prosseguiu na América do Norte, com a expedição de Braddock, que entre 1695 e 1755 comandou as forças britânicas contra os franceses indígenas. Cada facção estava insatisfeita com seus antigos aliados. A Inglaterra tomou a iniciativa quando capturou trezentos navios franceses sem declarar guerra, e em seguida, com o Acordo de Westminster (1756), pelo qual estabelece uma aliança militar com Frederico II da Prússia para defender Hanôver de um possível ataque francês. A França, por sua vez, com os dois Tratados de Versalhes (1756 e 1757) obtém a promessa de aliança de Maria Teresa da Áustria e de seu ministro Kaunitz. Maria Teresa também se aliou com Isabel da Rússia. Desenrolar da guerra. Ao longo dos sete anos, 1756-1763, as grandes potências europeias levam a guerra às suas possessões em todo o mundo. Enquanto nas colónias americanas e da Índia os sucessos pertencem aos Ingleses, e apesar da tentativa do "Pacto de Família" com os Bourbons da Espanha, na Europa, numa fase inicial, a aliança franco-austríaca é bem-sucedida, contando com a ajuda dos príncipes alsacianos, da Suécia e da Rússia. A guerra na Europa teve início no verão de 1756, quando Frederico II da Prússia resolveu, preventivamente, atacar a Saxónia, estado do Sacro Império Germânico aliado da Áustria de Maria Teresa, e ocupar a capital, Dresda. Em poucas semanas ele logrou capturar a totalidade do exército saxónico (18 mil homens) em Pirna. Adiantava-se, assim, ao iminente ataque preparado contra a Prússia pela coalizão formada pela Áustria, Rússia, Suécia, Saxónia e França. Embora tivesse o melhor exército da Europa, a situação estratégica da Prússia era preocupante. A Prússia, como um todo, estava ameaçada ao norte pela Suécia (que dispunha de um exército pequeno) e pela Áustria ao sul. A oeste, um punhado de príncipes alemães, fiéis a Maria Teresa, formara um exército contrário a Frederico e que viria a operar na Saxónia. A noroeste, o Hanôver, apoiado por tropas britânicas, oferecia uma ilusória proteção aos prussianos. A leste, a neutra Polónia era uma nação permeável às tropas russas que, em um primeiro momento, estavam interessadas em ocupar a Prússia Oriental. Durante o ano de 1756, as tropas prussianas conquistaram uma série de vitórias. Frederico II invadiu a Boémia e, em 6 de maio de 1757, bateu os austríacos na disputada batalha de Praga. Mas no dia 18 de junho Frederico acabou sendo derrotado pelo marechal austríaco Daun em Kolin, o que o obrigou a abandonar a Boémia. A Prússia, a partir de então, foi obrigada a enfrentar uma guerra defensiva em três frentes: a Suécia atacou a Pomerânia; as tropas russas invadiram a região oriental do território prussiano, obtendo uma importante vitória; a França penetrou na Prússia ocidental e os austríacos marcharam sobre a Silésia. Apesar da inferioridade do exército de Frederico ante as tropas inimigas, o rei obteve duas grandes vitórias em 1757: em 5 de novembro infligiu uma esmagadora derrota a um exército franco-germânico em Rossbach e, em 5 de dezembro, esmagou os austríacos em Leuthen, na Silésia, salvando a Prússia de uma invasão. Frederico foi muito pressionado em 1758, mas derrotou, em Zorndorf, as tropas russas, que ameaçavam Berlim, e fez com que recuassem para Landsberg e Konigsberg. Ferdinando de Brunsvique protegeu seu flanco ocidental com um exército anglo-hanoveriano. Na batalha de Hochkirch, no entanto, o inesperado ataque dos austríacos obrigou o rei prussiano a recuar até Dresda. Em agosto de1759, Frederico sofreria a sua mais terrível derrota, em Kunersdorf, ao atacar uma força austro-russa reunida a leste do rio Oder. Apenas o desentendimento entre as tropas austríacas e russas e a logística podem explicar a salvação de Berlim naquele ano. Em situação precária, o rei recuperou sua capacidade ofensiva graças a um novo tratado com a Inglaterra, que lhe forneceu a ajuda financeira necessária ao prosseguimento da guerra. Em 1760 as tropas prussianas iniciaram seu avanço em direção à Silésia, onde venceram os russos e os austríacos. As forças militares do monarca prussiano, embora prodigiosas, começavam a mostrar sinais de esgotamento. Nesse mesmo ano seria travado o último grande combate de Frederico II: a batalha de Torgau, em que prussianos e austríacos sofreram pesadas baixas. Ocorreu então o que é chamado pelos historiadores austríacos de o "milagre da Casa de Brandemburgo": com a morte da czarina Isabel, em 1762, subiu ao trono russo seu sobrinho, Pedro III, que nutria grande admiração por Frederico e pela Prússia. Rompeu-se assim a coalizão anti prussiana. O novo czar não apenas reverteu sua política e assinou um armistício com Frederico II (deixando o rei livre da frente oriental), como também atuou como mediador entre prussianos e suecos. Pôs seu exército à disposição do rei e se juntou aos prussianos para expulsar os austríacos da Silésia. Pedro III foi assassinado meses depois de subir ao trono, mas sua viúva e sucessora, Catarina II, a Grande, manteve a paz com a Prússia. Sem o apoio do Exército russo, os austríacos foram derrotados em Burkersdorf e Freiberg. Operações nas colónias. Paralelamente aos conflitos nos campos de batalha da região central da Europa, os combates travados entre a Inglaterra e a França pela posse das colónias da América do Norte e das Índias estenderam-se às Índias Ocidentais, oeste da África, Mediterrâneo, Canadá e Caribe. A ocupação da ilha de Minorca, então possessão inglesa, pelos franceses, em 1756, provocou o bloqueio inglês às costas da França em Toulon e Brest, o que deixou indefeso o Canadá francês diante dos ataques lançados pelos ingleses às colónias ao sul do rio São Lourenço. Em julho de 1757, o primeiro-ministro Pitt, o Velho, subiu ao poder na Inglaterra e conduziu a guerra com habilidade e vigor. Enquanto a França via-se limitada pelos seus compromissos continentais, a Grã-Bretanha tomava o controlo do Atlântico e isolava as forças francesas na América do Norte. Precisando de reforços, Louisbourg caiu em 1758. O ano de 1759 foi de vitórias britânicas - Wolfe capturou Québec, Ferdinando derrotou o exército francês em Minden e Hawke destruiu a frota francesa na baía de Quiberon. Com a tomada de Montreal, em 1760, depois das vitórias navais britânicas da Baía de Quiberon e Lagos, todas as possessões francesas no Canadá passaram às mãos dos ingleses, que conquistaram ainda alguns portos do Mediterrâneo. Na Índia, Clive havia conseguido o controlo de Bengala em Plassey. Os franceses se renderam nas Índias em 1761. O almirante Boscawen atacou com sucesso as Índias Ocidentais francesas. Em 1761, a Espanha entrou na guerra e Pitt renunciou. A França assinara com a Espanha o chamado "pacto de família", o que provocou a invasão de Cuba pela Inglaterra e a ocupação de Manila, nas Índias Ocidentais. Até o ano de 1763, os britânicos controlavam a Havana espanhola e todas as ilhas francesas, com exceção de Santo Domingo. Em meados do século XVIII o relacionamento saudável entre a Inglaterra e as 13 colónias foram modificadas devido a dois fatores paralelos: A ocorrência da revolução industrial. A vitória das 13 colónias na guerra dos 7 anos. A paz. Todos estavam dispostos a um acordo de paz. No cômputo global do conflito, a Inglaterra e a Prússia foram as grandes vitoriosas. Em 1762, o Tratado de São Petersburgo devolveu a Pomerânia à Prússia, antigo território Germânico, tomado pelos Suecos na Guerra dos Trinta Anos. Pelo Tratado de Paris, firmado em 1763, franceses, austríacos e ingleses assinarem a paz. No acordo firmado, os ingleses ganham o Canadá e parte da Louisiana, Flórida (que foi cedida pela Espanha), algumas ilhas das Antilhas (São Vicente e Granadinas, Tobago, Granada, São Luís, e feitorias costeiras do Senegal, na África, além de ter de reconhecer todas as conquistas inglesas nas Índias Ocidentais. A favor de Espanha, para compensá-la dos prejuízos advindos da guerra, a França cedeu o resto da Louisiana e Nova Orleans. Os franceses perdiam também toda a influência na Índia. Finalmente, em 15 de fevereiro de 1763, foi firmada a paz definitiva em Hubertsburgo. Pelo Tratado de Hubertsburgo, a Áustria renunciou definitivamente à Silésia e a cedeu à Prússia, enquanto a Polónia era dividida pela primeira vez, ocupada pela Prússia, Rússia e Áustria. A Prússia se afirma como concorrente da Áustria na liderança dos estados alemães, lançando as bases do futuro Império Alemão. As importantes vitórias inglesas sobre a França, solidificadas no Tratado de Paris, lançam as bases do futuro Império Colonial Britânico. No Brasil houve repercussão dessa luta. Portugal não aderiu ao "pacto de família", o que motivou o ataque dos espanhóis do rio da Prata ao sul do Brasil. O Tratado de Santo Ildefonso, assinado em 1777, encerrou o conflito: a Espanha tomou posse da Colônia do Sacramento e de grande parte do atual território do Rio Grande do Sul, enquanto Portugal recuperava a ilha de Santa Catarina. Guerra Fantástica. A Guerra Fantástica, Guerra do Mirandum ou Guerra do Pacto de Família, foi o nome pelo qual ficou conhecida a participação de Portugal na Guerra dos Sete Anos (1756-1763), fruto de um terceiro Pacto de Família Bourbon. O conflito desenrolou-se no período de 9 de maio a 24 de novembro de 1762, iniciando-se quando um exército franco-espanhol, com um efectivo de cerca de 42.000 homens sob o comando do general Nicolás de Carvajal y Lancaster, o marquês de Sarriá, invadiu Portugal pela fronteira de Trás-os-Montes, conquistando Miranda, Bragança e Chaves, sendo derrotado pelas guerrilhas (sobretudo quando tentaram cruzar o Douro para ocupar a cidade do Porto e atravessar as montanhas de Montalegre, com o mesmo fim). e forçado a retirar para Espanha. Os espanhóis abandonaram todas as praças anteriormente ocupadas, com excepção de Chaves, e o comandante espanhol foi substituído pelo Conde de Aranda. Perante esta derrota, seguiu-se uma segunda invasão pelas Beiras, conquistando Almeida e Castelo Branco, entre outras praças. Em resposta, formou-se um exército anglo-português, com cerca 14.000 a 15.000 homens, sob o comando do Conde de Lippe, que se posicionou para defender Lisboa nas colinas a nordeste de Abrantes, onde foram construídas várias obras de defesa. O exército aliado e camponeses da Beira Baixa puseram em prática uma muito eficaz tática de Terra Queimada e foram levadas a cabo ações de guerrilha na retaguarda dos invasores, que viram a sua linha de comunicações com Espanha praticamente cortada. Enquanto os anglo-portugueses, protegidos e entrincheirados nas colinas a Norte da "Península de Lisboa" (definida a Oeste pelo Oceano Atlântico e a Sul e Este pela formidável barreira do Rio Tejo), podiam ser abastecidos por mar, os Franco-Espanhóis viam as suas fileiras serem dizimadas pela fome, deserção e guerrilhas. Assim, o exército invasor viu-se forçado a escolher entre ficar em frente a Abrantes e morrer de fome ou retirar. O Conde de Lippe, apercebendo-se da situação desesperada do inimigo, completou-a com um movimento audacioso que decidiu a guerra: enviou uma força de soldados portugueses comandados por George Townshend deslocar-se num movimento de cerco em direção à retaguarda do diminuto e desmoralizado exército Espanhol. Este retirou logo para mais perto da fronteira (Castelo Branco). Mas um segundo movimento de cerco levado a cabo pela mesma força de Townshend, que pretendia aprisionar o exército espanhol em Castelo Branco, levou à retirada definitiva do exército Franco-Espanhol para Espanha (mais uma vez, um movimento militar, -e não uma batalha formal- decidiam a guerra). Os invasores foram assim derrotados e perseguidos até Espanha, sofrendo perdas terríveis (cerca de 25 000 homens) provocadas quer pelas tropas regulares quer pelos camponeses, fome, deserção e doenças. O Quartel-general Franco-Espanhol em Castelo Branco (cheio de feridos e doentes abandonados durante a fuga do exército espanhol) foi conquistado, bem como todas as praças anteriormente ocupadas pelos Borbónicos, com as únicas excepções de Chaves e Almeida, em Novembro daquele ano de 1762 foi assinado um acordo de cessar-fogo depois de pequenas batalhas travadas no Douro, Montalegre, Valencia de Alcântara e Vila Velha do Ródão e do fracasso de forças espanholas diante de Marvão e Ouguela. O episódio ficou conhecido por Guerra Fantástica porque, apesar da humilhante derrota infligida aos invasores, os recontros mais importantes não foram batalhas convencionais mas acções de guerrilha conduzidas pelas milícias locais, tendo o resultado da guerra ficado decidido por uma série de sucessivas e brilhantes movimentações de tropas sob o comando do Conde de Lippe, um dos melhores soldados da sua era. A vitória de Lippe foi um exemplo clássico da vitória da estratégia sobre o números, assim como da vitória da guerrilha e movimentos militares sobre a guerra convencional. O plano e estratégia de Lippe seriam novamente postos em ação, de uma forma mais sistematizada, por Wellington durante a terceira invasão francesa em 1810-1811. A Guerra Fantástica, Guerra do Mirandum ou Guerra do Pacto de Família, foi o nome pelo qual ficou conhecida a participação de Portugal na Guerra dos Sete Anos (1756-1763), fruto de um terceiro Pacto de Família Bourbon. O conflito desenrolou-se no período de 9 de maio a 24 de novembro de 1762, iniciando-se quando um exército franco-espanhol, com um efectivo de cerca de 42.000 homens sob o comando do general Nicolás de Carvajal y Lancaster, o marquês de Sarriá, invadiu Portugal pela fronteira de Trás-os-Montes, conquistando Miranda, Bragança e Chaves, sendo derrotado pelas guerrilhas (sobretudo quando tentaram cruzar o Douro para ocupar a cidade do Porto e atravessar as montanhas de Montalegre, com o mesmo fim), e forçado a retirar para Espanha. Os espanhóis abandonaram todas as praças anteriormente ocupadas, com excepção de Chaves, e o comandante espanhol foi substituído pelo Conde de Aranda. Perante esta derrota, seguiu-se uma segunda invasão pelas Beiras, conquistando Almeida e Castelo Branco, entre outras praças. Contexto. Tanto Portugal como a Espanha haviam se mantido neutrais na Guerra dos Sete Anos, que havia sido declarada oficialmente em 1756. Sob o reinado de Fernando VI de Espanha aquele país mantinha boas relações com os britânicos, e desse modo não se juntou ao seu tradicional aliado, a França, contra os ingleses no conflito. Esse cenário mudou com a sucessão de um novo monarca, Carlos III de Espanha cujo governo pendeu para uma política mais pró-francesa e, em fins de 1761 os dois estados entraram em conflito. O plano espanhol original era o de tomar a praça-forte de Almeida e, em seguida, avançar pelo Alentejo sobre Lisboa. Entretanto, com a nomeação do marquês de Sarriá como comandante-em-chefe, este decidiu começar por um ataque pela região norte, tendo o Porto como objetivo. Este seria um duro golpe para os britânicos, que tinham grandes interesses comerciais naquela cidade, e também seria agradável para Isabel de Parma, a Rainha-mãe, que ainda tinha muito poder por trás do trono espanhol e que desejava poupar a posição de sua filha Mariana Victoria, rainha consorte de Portugal. Em qualquer caso, não havia nenhuma vantagem em hostilizar Portugal indevidamente e, caso o país não fosse atacado sem sua capital a reação não seria tão forte. Cronologia. Cronologia da Guerra Fantástica. A 16 de Março de 1762. Os embaixadores de França e Espanha entregam ao Governo português uma "pró-memória" exigindo que Portugal aderisse ao Pacto de Família dos Bourbons, assinado em 1761, e excluísse dos seus portos os navios dos britânicos e seus aliados em troca de protecção dos seus domínios ultramarinos. A 20 de Março de 1762. O Governo português, pela voz de D. Luís da Cunha Manuel, então Secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros e da Guerra, recusa a oferta de cooperação dos dois países na defesa dos domínios ultramarinos portugueses, efectivamente rejeitando a adesão ao Pacto de Família.
A 1 de Abril de 1762, em novo "pró-memória" os embaixadores de França e Espanha exigem ao Governo português a participação de Portugal na guerra contra a Grã-Bretanha, informando que as tropas espanholas invadirão o território português caso Portugal não impeça a utilização dos portos portugueses pelos navios britânicos.
A 5 de Abril de 1762. O Governo português recusa colaborar com a França e a Espanha na guerra contra a Grã-Bretanha. A 16 de Abril de 1762. Tendo em conta que desde 1754 o Exército Português estava reduzido a metade dos seus efectivos regulamentares, o marquês de Pombal manda aumentar os efectivos dos regimentos de infantaria, cavalaria e artilharia. A 23 de Abril de 1762. Os embaixadores de França e Espanha entregam ao Governo português um terceiro e último "pró-memória", em estilo de ultimato, exigindo o fecho dos portos aos britânicos e seus aliados.
A 25 de Abril de 1762. Portugal responde negativamente ao ultimato, na prática tornando inevitável a guerra.
A 27 de Abril de 1762. Os embaixadores de França e Espanha abandonam Lisboa.
A 30 de Abril de 1762. O comandante das forças espanholas concentradas em redor de Zamora, o general Nicolás de Carvajal y Lancaster, marquês de Sarriá, divulga uma proclamação aos portugueses, afirmando que a invasão de Portugal tinha por objectivo o benefício dos portugueses.
A 5 de Maio de 1762. As forças espanholas entram em Portugal pela fronteira de Trás-os-Montes e dirigem-se para Miranda do Douro, que é cercada.
A 6 de Maio de 1762. Desembarcam em Lisboa forças auxiliares britânicas, sob o comando do general George Townshend, depois visconde e marquês Townshend.
A 8 de Maio de 1762. A explosão de um paiol durante um bombardeamento provoca 400 mortos em Miranda do Douro, levando à rendição da praça, que nesse dia é ocupada pelo exército espanhol.
A 16 de Maio de 1762. A cidade de Bragança rende-se e é ocupada pelo exército espanhol.
A 18 de Maio de 1762. Perante a consumação da invasão, Portugal declara a guerra à França e à Espanha.
A 21 de Maio de 1762. A cidade de Chaves é ocupada pelo exército espanhol.
A 15 de Junho de 1762. Espanha declara guerra a Portugal e é suspensa a publicação da Gazeta de Lisboa.
A 3 de Julho de 1762. Por indicação britânica, chega a Lisboa Guilherme de Schaumburg-Lippe, o conde de Lippe, com o objectivo de comandar o exército luso-britânico.
A 10 de Julho de 1762. Guilherme de Schaumburg-Lippe, o conde de Lippe, é nomeado marechal-general do exército luso-britânico.
A 20 de Julho de 1762. Aumentando a internacionalização do conflito, a França declara guerra a Portugal.
A 25 de Agosto de 1762. Abre-se uma nova frente com a entrada de forças espanholas pela fronteira das Beiras, que tomam a praça de Almeida, na Beira Alta, que é ocupada pelo exército espanhol comandado pelo marquês de Sarriá.
O 5 de Outubro de 1762. Tropas espanholas comandadas por D. Pedro de Cevallos, comandante das forças espanholas em Buenos Aires, invadem a Colónia do Sacramento, povoação portuguesa na margem esquerda do estuário do rio da Prata.
A 29 de Outubro de 1762. Colónia do Sacramento rende-se e é ocupada por forças espanholas.
A 3 de Novembro de 1762. É assinado em Fontainebleau um tratado de paz provisório entre os reinos de Portugal, Grã-Bretanha, França e Espanha.
A 1 de Dezembro de 1762. Assinado um armistício entre os exércitos luso-britânico e franco-espanhóis comandados, respectivamente, pelo Conde de Lippe e pelo general Pedro Pablo Abarca de Bolea, Conde de Aranda.
A 25 de Janeiro de 1763. O rei D. José I de Portugal concede ao Conde de Lippe o direito ao uso do tratamento de Alteza em recompensa pelos serviços prestados durante a guerra.
A 10 de Fevereiro de 1763. Assinado em Paris um tratado de paz (Tratado de Paz de Paris), pelo qual a Espanha restituiu a Portugal as praças de Chaves e Almeida e a Colónia do Sacramento no estuário do Rio da Prata.
A 25 de Fevereiro de 1763. O tratado de paz é ratificado pelo rei D. José I de Portugal.
A 25 de Março de 1763. Proclamada em Lisboa a paz entre os Reinos de Portugal, Espanha e França.
Conde soberano de Schaumbourg, marechal general do exército português. Nasceu em Londres a 24 de janeiro de 1724. Depois de ter estudado em Leyde na Holanda, e em Montpellier na França, entrou no serviço das guardas inglesas, sendo em breve despachado alferes, e tendo apenas dezanove anos assistiu à batalha de Dettiragen, com seu pai, então general ao serviço da Holanda. Alistando-se na marinha inglesa em 1744, deixou pouco depois essa carreira por falta de saúde, e mais tarde entrou em nova campanha ás ordens do general austríaco conde de Schulemburgo, largando em seguida a vida militar. Viajou durante dois anos, e tendo vinte e um anos de idade foi chamado ao governo dos seus estados. Em 1757 uniu-se com a sua tropa ao exército hanoveriano de cuja artilharia foi nomeado grão-mestre pelo rei de Inglaterra, e nesta qualidade tomou parte em algumas batalhas. Em 1762 o marquês de Pombal, vendo iminente a guerra entre a nossa corte, e as de Espanha e França, ao mesmo tempo que pedia socorro à Inglaterra, cuidou de contratar um general estrangeiro para comandante em chefe do nosso exército, e por indicação do rei de Inglaterra foi escolhido para essa elevada comissão o conde Schaumbourg-Lippe. A 3 de julho do referido ano se expediu o decreto nomeando-o marechal general dos exércitos, e encarregando-o do governo das armas de todas as tropas de infantaria, cavalaria, dragões e artilharia, e director geral de todas elas. Chegando a Lisboa, o conde de Lippe tratou logo de ver quais as tropas sólidas com que podia dispor, e reconheceu que apurando-as bem não tinha para compor o exército de operações mais de sete ou oito mil ingleses e outros tantos portugueses, porque o resto das tropas nacionais era preciso para que guarnecerem as praças ou formado de recrutas mais prejudiciais do que úteis nas marchas que deviam constituir as manobras principais da defensiva. Tendo apenas essa diminuta força para se opor ao exercito franco espanhol, que constava de 42.000 homens e 93 canhões, o marechal decidiu-se a limitar as suas manobras a conservar-se na defensiva, procurando apenas inquietar a marcha dos invasores, e tendo as suas tropas concentradas lança-las num momento imprevisto sobro algum ponto fraco do inimigo, imitando assim o sistema de guerra do grande Frederico. Entretanto o marquês de Sarria atravessava o rio Côa, tomava Castelo Rodrigo, e marchava sobre Almeida, e o conde de Lippe logo que teve conhecimento dessas operações concentrou as suas tropas em Abrantes, esperando ensejo para uma empresa qualquer. Em breve se apresentou esse ensejo, e o marechal, notando que os espanhóis, parecendo prepararem se para invadir o Alentejo, depois da tomada de Almeida, começaram para isso a dispor armazéns de víveres pela fronteira de Badajoz e mantinham aí em observação uns três ou quatro mil homens, concebeu o audacioso projecto de lançar no Alentejo um corpo de tropas que fosse surpreender esses armazéns a esses destacamentos inimigos e cortar ao mesmo tempo da sua base de operações o exercito que sitiava Almeida. Para levar a cabo este plano dividiu o marechal o seu exército em cinco fracções ou corpos, estabelecendo-se o 1.º sob o comando do conde de Loudon em Viseu, tendo por missão especial defender as províncias do norte. O 2°, às ordens do conde de Santiago foi enviado para Castelo Branco e depois para a Guarda a fim de cobrir a Beira Baixa e a Estremadura; o 3.º ficou em Abrantes para acudir onde fosse preciso; o 4.º comandado pelo coronel Burgoyne devia marchar secretamente pelo Alentejo, lançar o terror pela Extrema dura espanhola, tomar ou incendiar os depósitos de víveres e cortar quanto pudesse as comunicações de Badajoz com o exército que sitiava Almeida, o 5.º finalmente, que constituía o grosso do exército, devia, protegido pelas operações de Burgoyne, penetrar em Espanha e cortar o exército do marquês de Sarria da sua base de operações. Uma condição essencial para o êxito deste plano era que Almeida se não rendesse tão depressa, e para prevenir esse desastre ordenou o conde de Lippe ao governador que defendesse a praça até à última extremidade. Dispostas assim as coisas, no dia 21 de agosto pela manhã Burgoyne passou o Tejo em Abrantes, e dirigindo-se secretamente a Castelo de Vide, entrou em Espanha, tomou de surpresa Valência de Alcântara, aprisionou ou dispersou cinco ou seis companhias do regimento de Sevilha e quarenta dragões que vinham servindo de escolta ao marechal de campo Balanza, que também ficou prisioneiro. No mesmo dia 24 pôs-se também a caminho, atravessando o Tejo o grosso do exército, mas a pasmosa imprevidência da administração dos víveres por tal forma demorou a marcha, que ainda as nossas tropas estavam a duas jornadas de Espanha, quando veio de súbito a noticia da capitulação de Almeida. Deste modo estavam perdidas todas as combinações do conde de Lippe, e o nosso exército corria risco muito sério de ser cortado pelos espanhóis, que avançando rapidamente podiam separar as forças que estavam no Alentejo das que ocupavam a Beira Alta e a Beira Baixa. Felizmente o conde andava com prudência, e valendo-se dos regimentos que conservara em Abrantes para proteger a junção das tropas de Loudon com o grosso do exército, deu ordem ao conde de Santiago para incomodar as comunicações do inimigo enquanto pudesse, e para se internar nos desfiladeiros entre o Tejo e o Zêzere logo que isso se tornasse necessário, reforçou as tropas de Burgoyne deixando –as em observação entre Portalegre e Vila Velha e ao mesmo tempo trouxe rapidamente para Abrantes os regimentos que estavam em Nisa prontos a invadir a Espanha. Apesar de tudo, se os generais espanhóis manobrassem com rapidez, podiam nessa ocasião ter alcançado grandes resultados; mas, felizmente para nós, as operações dos invasores foram dirigidas com tal demora que o conde de Lippe pode concentrar as suas tropas e tomar as disposições convenientes para se opor ao exército franco espanhol que de Castelo Branco, onde se reunira, parecia querer passar o Tejo em Vila Velha. O marechal chamou então Burgoyne a Vila Velha e encarregou-o de defender a margem do Tejo, construindo baterias em todos os escarpados das montanhas que por ali orlam o rio e aproveitando enfim o próprio castelo da Vila que apesar de ser um mau recinto, tinha a vantagem de ser de muito difícil acesso. Colocados sérios obstáculos que impediriam o inimigo de marchar para o Alentejo, tratou o conde de Lippe de defender também os desfiladeiros das montanhas que entre o Zêzere e o Tejo vão ter a Abrantes, mas ao mesmo tempo com certo desejo de que os inimigos desistindo de atravessarem o rio seguissem o caminho desses desfiladeiros, cuja defesa foi confiada às tropas do conde de Santiago, chamadas à pressa da Beira Baixa. Depois de ter perdido muito tempo o conde de Aranda que substituíra o marquês de Sarria no comando do exército espanhol, o que obrigou o conde de Lippe a retrogradar em pouco das posições que ocupava indo então postar-se em frente de Abrantes. Os inimigos, porém, quase nada aproveitaram com aquela vantagem, porque tendo na sua frente o marechal com as tropas em posição fortíssima, eram fatigados por combinadas excursões, e tinham de viver e marchar nesse país devastado e sem estradas, e onde todas as operações de guerra eram dificílimas. O conde de Santiago recebera ordem para fazer retirar da Beira tudo o que pudesse servir à subsistência e marchas do invasor, e o conde de Lippe para aumentar os embaraços do inimigo, mandou contramarchar o conde de Loudon e reforçando-se com mais algumas tropas deu-lhe ordem de marchar para Penamacor a fim de cortar as comunicações aos invasores. Entretanto o conde de Lippe não cessava de fortificar a sua magnífica posição, de a guarnecer e fornecer com artilharia e de estabelecer comunicações com a margem sul do Tejo, a fim de se ligar com o corpo de Burgoyne. Ao mesmo tempo o Outono auxiliava-o, as tempestades haviam começado, o exército espanhol exposto às intempéries da estação com falta de víveres e de comodidades, atacado incessantemente pelos destacamentos portugueses, começou a achar-se em posição muito crítica. Ao saber que o conde de Loudon aparecia no Fundão, o conde de Aranda, vendo que não podia tomar Abrantes, recuou e foi novamente ocupar Castelo Branco com a intenção de emendar o erro que cometera, e de passar ao Alentejo em vez de prosseguir à invasão pela Beira Baixa. O conde de Lippe pôs-se logo em movimento para estorvar o plano do adversário, mas o mau tempo dificultou a operação, e o conde de Aranda voltou para Espanha. A guerra, porém, estava a findar. A Espanha fora infeliz nas suas tentativas contra Portugal, infelicíssima no mar e nas colónias, a França também suportara graves perdas marítimas, no continente. Frederico II obtivera a neutralidade dos russos, e depois de muitas alternativas dessa guerra dos Sete Anos, conseguira ganhar sobre os austríacos nova vitória decisiva. Em Fontainebleau reuniram-se os plenipotenciários discutindo o tratado de paz, e em vista disto o conde de Aranda e o conde de Lippe concordaram entre si um armistício que foi assinado no dia 1 de Dezembro de 1762, e que terminou no dia 11 com a chegada do próprio conde de Oeiras, que vinha trazer a notícia que no dia 3 de outubro se assinara em Fontainebleau a paz entre a França, Inglaterra, Espanha e Portugal. A 7 de março seguinte foi proclamada a paz definitiva, e no dia 20 de abril o conde de Lippe partiu para Lisboa. Esta campanha de 1762 teve uma grande importância para Portugal, porque ela datou a reorganização do nosso exército, e porque o conde de Lippe desenvolveu nessa guerra um grande tacto militar. Terminada a luta, o marquês de Pombal ocupou-se de reorganizar o exército, e nesse empenho o ajudou poderosamente o conde de Lippe. A disciplina e a instrução das tropas mereceram a principal atenção do marechal, que publicou os conhecidos Regulamentos de infantaria, cavalaria, e os artigos de guerra que se conservaram em vigor por muitos anos, sendo depois substituídos por um novo código de justiça militar. Da defesa do país e do melhoramento das fortificações, também se não esqueceu o conde de Lippe, e a ele se deve a construção do forte junto a Elvas, chamado hoje forte da Graça, mas que por muito tempo conservou o nome de Forte de Lippe. O conde voltou então À sua pátria, elevado por D. José à dignidade de príncipe de sangue com tratamento de alteza, e recebendo nessa ocasião valiosos presentes, que consistiram em 6 canhões de ouro pesando cada um trinta e duas libras montados em reparos de ébano chapeados de prata, e um botão e uma presilha de brilhantes.
Uma terceira fase, até 1772 é marcada por uma grande crise económica e, até final do reinado, assiste-se à política de fomento industrial e ultramarino, e à queda económica das companhias monopolistas brasileiras.
O atentado sofrido por D. José em 1758. Este atentado foi o catalizador do Processo dos Távoras.
Todo o reinado é caracterizado pela criação de instituições, especialmente no campo económico e educativo, no sentido de adaptar o País às grandes transformações que se tinham operado. Funda-se a Real Junta do Comércio, o Erário Régio, a Real Mesa Censória; reforma-se o ensino superior, cria-se o ensino secundário (Colégio dos Nobres, Aula do Comércio) e o primário (mestres régios); reorganiza-se o exército. Em matéria de política externa, José conservou a política de neutralidade adoptada por seu pai. De notar ainda, o corte de relações com a Santa Sé, que durou 10 anos. Sucedeu-lhe a filha, a futura rainha Maria I de Portugal (Maria Francisca Isabel Josefa Antónia Gertrudes Rita Joana de Bragança); Lisboa, 17 de dezembro de 1734-Rio de Janeiro, 20 de Março de 1816) que, antes de assumir o trono, foi Princesa do Brasil, Princesa da Beira e duquesa de Bragança.
A continuidade dinástica da Casa de Bragança ficou assegurada com o seu casamento com o irmão do Rei e tio da princesa, o futuro rei Pedro III de Portugal. O casamento foi realizado no Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, em Lisboa, a 6 de julho de 1760. Dado o casal já ter filhos quando Maria ascendeu ao trono, passou a ser o rei Pedro III, sendo ainda o 19.º duque de Bragança, 16º duque de Guimarães e 14.º duque de Barcelos, 12.º marquês de Vila Viçosa, 20º conde de Barcelos, 16.º conde de Guimarães, de Ourém, de Faria, e de Neiva, 22.º conde de Arraiolos. Tiveram quatro filhos e três filhas. Jaz no Panteão dos Braganças, no mosteiro de São Vicente de Fora em Lisboa. Títulos, estilos, e honrarias. Estilo real de tratamento de José I de Portugal. Brasão de armas do Reino de Portugal (1640-1910). Estilo real. Sua Majestade Fidelíssima. Tratamento directo. Vossa Majestade Fidelíssima. Estilo alternativo. Senhor. Títulos e estilos. (6 de Junho 1714-29 de outubro de 1714). Sua Alteza, O Sereníssimo Infante José de Portugal. (29 de Outubro de 1714-31 de julho de 1750). Sua Alteza Real, O Príncipe do Brasil, Duque de Bragança, etc. (31 de Julho de 1750-24 de fevereiro de 1777.
Sua Majestade Fidelíssima, O Rei de Portugal e dos Algarves. O estilo oficial de D. José I enquanto Rei de Portugal; Pela Graça de Deus, José I, Rei de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Honrarias. Enquanto monarca de Portugal, D. José I foi Grão-Mestre das seguintes Ordens. Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ordem de São Bento de Avis. Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem de Sant'Iago da Espada. Antiga e Muito Nobre Ordem da Torre e Espada. Genealogia. Ascendência. Ancestrais de José I de Portugal. Descendência. Havidos de Mariana Vitória de Bourbon. (31 de março de 1718-15 de janeiro de 1781); (casados a 19 de janeiro de 1729). Maria I de Portugal. Retrato de uma senhora de meia-idade, muito pálida, de vestido prateado com mangas de renda, um manto cor-de-rosa de pele de arminho, e uma faixa verde e vermelha com uma Cruz de Cristo pendente. Com uma peruca branca empoada e um véu fino com jóias e penas. Aponta para a Coroa Real, em cima de uma almofada de veludo numa mesa ao seu lado. (17 de dezembro de 1734-20 de março de 1816). Rainha de Portugal, a título próprio, de 1777 a 1816. Casou-se com o Infante D. Pedro, seu tio. Do casamento nasceram 4 filhos (um deles nado-morto) e 3 filhas. Maria Ana Francisca, Infanta de Portugal (Retrato a três quartos de uma senhora de cabelos castanhos, apanhados em duas tranças, de pé ao lado de um cravo, e envergando um vestido verde e azul e uma capa encarnada). (7 de outubro de 1736-16 de maio de 1813). Seguiu com a restante família real para o Brasil, onde veio a falecer. Maria Francisca Doroteia, Infanta de Portugal. (Retrato a três quartos de uma senhora de cabelos castanhos, apanhados numa trança comprida, envergando um vestido de seda púrpura e uma capa verde, e empunhando um leque). (21 de setembro de 1739-14 de janeiro de 1771). Foi-lhe proposto casar com Luís Filipe II, Duque de Orleães (mais tarde conhecido como Philippe Égalité), mas recusou-se. Maria Francisca Benedita, Infanta de Portugal. (Retrato de busto de uma senhora de meia-idade, com uma peruca empoada com um pequeno véu preso por um ramalhete de flores, com um vestido simples de cor branca.) (25 de julho de 1746-18 de agosto de 1829). Casou-se com o sobrinho, D. José, Príncipe da Beira, em 1777. Não houve descendência. Ficou conhecida como A Princesa-Viúva (por ter enviuvado precocemente e nunca ter tido voltado a casar).
Maria I de Portugal (Maria Francisca Isabel Josefa Antónia Gertrudes Rita Joana de Bragança). (Lisboa, 17 de dezembro de 1734-Rio de Janeiro, 20 de março de 1816) foi Rainha de Portugal de 24 de fevereiro de 1777 a 20 de março de 1816, sucedendo ao seu pai, El-Rei José I. Maria foi, antes de assumir o trono, Princesa do Brasil, Princesa da Beira e duquesa de Bragança. Jaz na Basílica da Estrela, em Lisboa, para onde foi transportada após a morte. Ficou conhecida pelos cognomes de A Piedosa ou a A Pia, devido à sua extrema devoção religiosa à Igreja Católica, demonstrada, por exemplo, quando mandou construir a Basílica da Estrela, em Lisboa. No Brasil, é conhecida pelo cognome de Dona Maria, a Louca ou Maria Louca, devido à doença mental manifestada com veemência nos últimos 24 anos de vida. Nascimento. Maria nasceu a 17 de dezembro de 1734 no Paço da Ribeira, em Lisboa, Portugal. Seu nome completo era Maria Francisca Isabel Josefa Antónia Gertrudes Rita Joana. Foi primogênita de D. José de Bragança, então Príncipe do Brasil, e sua esposa Mariana Vitória de Bourbon.
Infanta de Espanha. Quando o seu pai subiu ao trono em 1750 como D. José I, Maria tornou-se sua herdeira presuntiva e recebeu os títulos tradicionais de Princesa do Brasil e Duquesa de Bragança. Casamento. A continuidade dinástica da Casa de Bragança ficou assegurada com o seu casamento com o tio Pedro de Bragança. O casamento foi realizado no Palácio de Nossa Senhora da Ajuda, em Lisboa, a 6 de julho de 1760. Ele subiu ao trono como Pedro III, sendo feito 19.º duque de Bragança, 16º duque de Guimarães e 14.º duque de Barcelos, 12.º marquês de Vila Viçosa, 20º conde de Barcelos, 16.º conde de Guimarães, de Ourém, de Faria, e de Neiva, 22.º conde de Arraiolos.
Tiveram quatro filhos e três filhas. Reinado. Dona Maria I, Rainha de Portugal, por José Leandro de Carvalho, 1808. Embora Maria I seja tradicionalmente reconhecida como a primeira Rainha reinante em Portugal, isso é questionável, visto que à luz de uma nova perspectiva da história, Teresa de Leão já havia sido reconhecida como tal pelo papa, em 1112. Seu primeiro acto como rainha, iniciando um período que ficou conhecido como a Viradeira, foi a demissão e exílio da corte do marquês de Pombal, a quem nunca perdoara a forma brutal como tratou a família Távora durante o Processo dos Távoras. Rainha amante da paz, dedicada a obras sociais, concedeu asilo a numerosos aristocratas franceses fugidos ao Terror da Revolução Francesa (1789-1799). Era, no entanto, dada a melancolia e fervor religioso de natureza tão impressionável que quando ladrões entraram em uma igreja e espalharam hóstias pelo chão, decretou nove dias de luto, adiou os negócios públicos e acompanhou a pé, com uma vela, a procissão de penitência que percorreu Lisboa. O seu reinado foi de grande actividade legislativa, comercial e diplomática, na qual se pode destacar o tratado de comércio que assinou com a Rússia em 1789. Desenvolveu a cultura e as ciências, com o envio de missões científicas a Angola, Brasil, Cabo Verde e Moçambique, e a fundação de várias instituições, entre elas a Academia Real das Ciências de Lisboa e a Real Biblioteca Pública da Corte. No âmbito da assistência, fundou a Casa Pia de Lisboa. Fundou ainda a Academia Real de Marinha para formação de oficiais da Armada. A 5 de janeiro de 1785 promulgou um alvará impondo pesadas restrições à atividade industrial no Brasil.
Durante seu reinado ocorreu o processo, condenação e execução do alferes Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes.
Regência do filho. Mentalmente instável, desde 10 de fevereiro de 1792 foi obrigada a aceitar que o filho tomasse conta dos assuntos de Estado. Obcecada com as penas eternas que o pai estaria sofrendo no inferno, por ter permitido a Pombal perseguir os jesuítas, o via como "um monte de carvão calcinado". Para tratá-la veio de Londres o Dr. Willis, psiquiatra e médico real de Jorge III, enlouquecido em 1788, mas de nada adiantaram seus "remédios evacuantes". Em 1799, sua instabilidade mental se agravou com os lutos pelo seu marido Pedro III (1786) e seu filho, o príncipe herdeiro José, Duque de Bragança, Príncipe da Beira, Príncipe do Brasil, morto aos 27 anos (1788), a marcha da Revolução Francesa, e execução do Rei Luís XVI de França na guilhotina e o filho e herdeiro João assumiu a regência. João VI de Portugal. Mudança para o Brasil. A Família Real Portuguesa transfere-se para o Brasil, fruto do receio de ser deposta, à semelhança do que ocorrera nos países recentemente invadidos pelas tropas francesas. Napoleão acumula o título de rei de Itália, dando o título de rei de Nápoles ao seu irmão José Bonaparte, a quem posteriormente situou no trono da Espanha, nos Países Baixos a coroa é dada a seu irmão Luís Bonaparte (Luís I da Holanda).
Em 1801, o primeiro-ministro de Espanha, Manuel Godoy apoiado por Napoleão invadiu Portugal por breves meses e, no subsequente Tratado de Badajoz, Olivença passou para a coroa de Espanha, mais tarde também ocupada pelos franceses. Portugal continuou a fazer frente à França e, ao recusar-se a cumprir o bloqueio naval às Ilhas Britânicas, foi invadido pela coligação franco-espanhola liderada pelo Marechal Junot.
A família real foge para o Brasil a 13 de Novembro de 1807 deixando Portugal a mercê do invasor. Junot invade Lisboa sendo nomeado governador de Portugal. A 1 de Agosto de 1808, o Duque de Wellington desembarcou em Portugal e iniciou-se a Guerra Peninsular. Entre 1809 e 1810, o exército luso-britânico lutou contra as forças invasoras de Napoleão, nomeadamente na batalha do Buçaco. Quando Napoleão foi derrotado em 1815, Maria e a família real encontravam-se ainda no Brasil. Dos membros da realeza, porém, foi a que se manteve mais calma, chegando a declarar; Não corram tanto, vão pensar que estamos a fugir. Reino Unido.
Proclamada Rainha do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves em 16 de dezembro de 1815. Morte. Incapacitada, Maria viveu no Brasil por oito anos, sempre em estado infeliz. Ela morreu no Convento do Carmo, na cidade do Rio de Janeiro, em 20 de março de 1816, aos 81 anos de idade.
Com sua morte, o Príncipe Regente João foi aclamado Rei de Portugal, Brasil e Algarves. Após as cerimônias fúnebres, seu corpo foi sepultado no Convento da Ajuda, também no Rio. Em 1821, após o retorno da Família Real para Portugal, seus restos mortais foram transladados para Lisboa e sepultado em um mausoléu na Basílica da Estrela, igreja que ela mesma mandou erguer. Títulos, estilos, e honrarias. Títulos e estilos. (17 de Dezembro de 1734-31 de Julho de 1750: Sua Alteza Real, A Princesa da Beira, Duquesa de Barcelos. (31 de Julho de 1750-24 de Fevereiro de 1777); Sua Alteza Real, A Princesa do Brasil, Duquesa de Bragança, etc. (24 de Fevereiro de 1777-16 de Dezembro de 1815); Sua Majestade Fidelíssima, A Rainha de Portugal e dos Algarves. (16 de Dezembro de 1815-20 de Março de 1816); Sua Majestade Fidelíssima, a Rainha do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves. O estilo oficial de D. Maria I, desde a sua Aclamação até 1815 foi; Pela Graça de Deus, Maria I, Rainha de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhora da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Com a criação do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, em 1815, o seu estilo evoluiu, para.
Pela Graça de Deus, Maria I, Rainha do Reino Unido de Portugal, Brasil e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhora da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Honrarias. Enquanto monarca de Portugal, D. Maria I foi Grã-Mestre das seguintes Ordens; Ordem dos Cavaleiros de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ordem de São Bento de Avis. Antiga, Nobilíssima e Esclarecida Ordem de Sant'Iago da Espada. Antiga e Muito Nobre Ordem da Torre e Espada. Genealogia. Descendência. Havidos de D. Pedro III de Portugal (5 de Julho de 1717-25 de Maio de 1786; casados a 6 de Junho de 1760). José, Príncipe do Brasil. (21 de Agosto de 1761-11 de Setembro de 1788). Recebeu o título de Príncipe da Beira ao nascer, título criado pelo seu avô materno especialmente para si. Desposou a tia materna, a Infanta Maria Francisca Benedita, de quem tinha quinze anos de diferença de idade; do casamento não houve descendência. Tornando-se Príncipe do Brasil e herdeiro aparente ao trono com a aclamação da sua mãe, D. José faleceu prematuramente de varíola. D. João de Bragança (20 de Outubro de 1762) Nado-morto, no Paço de Nossa Senhora da Ajuda, Lisboa. D. João Francisco de Paula Domingos António Carlos Cipriano de Bragança. (16 de Setembro de 1763-10 de Outubro de 1763). Morreu menos de um mês depois de nascer. João VI de Portugal. (13 de Maio de 1767-10 de Março de 1826) Tornou-se Príncipe do Brasil e herdeiro aparente do trono, com a morte precoce dos irmãos mais velhos.
Governou como Príncipe Regente, desde a declaração de incapacidade de mental da Rainha D. Maria I em 1792, e tornou-se Rei de Portugal entre 1816 e 1826. Infanta D. Maria Ana Vitória (15 de Dezembro de 1768-2 de Novembro de 1788). Nascida no Palácio de Queluz a 15 de Dezembro de 1768, morta em San Lorenzo de El Escorial em 2 de Novembro de 1788, tendo tido dois filhos e uma filha que casou-se com Gabriel António Francisco Xavier João Nepomuceno José Serafim Pascoal Salvador de Bourbon e Saxe, Infante de Espanha, nascido em Portici a 12 de maio de 1752 e morreu no Escorial a 23 de Novembro de 1788, quarto filho de Carlos III, rei da Espanha e de sua esposa Maria Amália de Saxe. Infanta D. Maria Clementina Francisca Xavier de Paula Ana Josefa Antónia Domingas Feliciana Joana Michaela Julia de Bragança (9 de Junho de 1774-27 de Junho de 1776). D. Maria Isabel de Bragança (12 de Dezembro de 1776-14 de Janeiro de 1777). Na cultura popular. Uma versão altamente ficcionalizada da rainha Maria I é a protagonista da opéra-comique Les diamants de la couronne (1841), pelo compositor Daniel Auber, com libretto de Eugène Scribe e Jules-Henri Vernoy de Saint-Georges; figurando igualmente na adaptação a zarzuela de Francisco Asenjo Barbieri, Los diamantes de la corona (1854), esta com libretto de Francisco Camprodón. Na ópera, Maria é menor aquando da morte do seu pai, sendo o país governado por um Conselho de Regência liderado pelo Conde de Campo Mayor. Maria toma o nome de “Catalina" e, sem ninguém o saber, lidera um grupo de bandidos com o intuito de vender as jóias da coroa, substituindo-as por falsificações, para trazer solvência fiscal ao Estado. No final, durante a sua coroação, Maria usa a sua astúcia para evitar a determinação do Conselho de Regência que a obrigaria a casar com um filho de rei de Espanha e, ao invés, casa com o Marquês de Sandoval, que havia sido assaltado pelos bandidos e se havia enamorado pela beleza de "Catalina", chefe da quadrilha.
Maria-vai-com-as-outras. O termo "maria-vai-com-as-outras" é muito popular na lusofonia, onde é usado para designar uma pessoa fraca, sem opinião própria, que se deixa levar pelos outros. Segundo o pesquisador Brasil Gerson, autor do livro Histórias das Ruas do Rio, o termo foi cunhado a partir da figura da rainha Maria I, que viveu seus últimos anos no Rio de Janeiro. Declarada mentalmente incapaz desde 1792, Maria vivia reclusa e só saía na companhia de suas damas, que costumavam levá-la para passear às margens do rio Carioca, no antigo bairro de Águas Férreas (atual Cosme Velho). Ao ver a monarca sendo conduzida pelas mãos por suas damas, a população exclamava: Maria Vai-com-as-Outras.
José de Bragança, príncipe herdeiro de Portugal. Dom José Francisco Xavier de Paula Domingos António Agostinho Anastácio de Bragança (Lisboa, 21 de agosto de 1761) (Lisboa, 11 de setembro de 1788) foi o filho primogénito da Rainha D. Maria I e de seu consorte, D. Pedro III. Vida. Nascido no Palácio da Ajuda, em Lisboa, D. José foi titulado Príncipe da Beira por seu avô materno ao nascer, tornando-se o primeiro homem a receber tal título. Ele era o herdeiro aparente de sua mãe, então titulada Princesa do Brasil e proclamada herdeira da coroa portuguesa. Teve os títulos de 8.º Príncipe do Brasil, 2.º Príncipe da Beira, 14.º Duque de Bragança, 8.º Duque de Barcelos, 13.º Marquês de Vila Viçosa, 21.º Conde de Barcelos, 18.º Conde de Ourém, 15.º Conde de Arraiolos e 15.º Conde de Neiva. Foi educado por tutores. Tendo sido indicados pelo seu avô rei, D. José I, em 7 de Dezembro de 1768, como seu confessor Frei Manuel do Cenáculo e para instrutor de ler, e escrever António Domingues do Passo. No dia 21 de Fevereiro de 1777, em Lisboa, D. José desposou sua tia materna, a Infanta Maria Francisca Benedita (1746-1829). Na época, ele tinha quinze anos de idade e seu noivo, trinta. Eles não tiveram filhos. Três dias depois do casamento, o Rei D. José I, seu avô e pai de sua esposa, faleceu, e sua mãe ascendeu ao trono. D. José, como novo príncipe herdeiro da coroa, tornou-se Príncipe do Brasil e o 14.° Duque de Bragança. Era membro da Maçonaria. O Príncipe D. José faleceu prematuramente de varíola em Lisboa, aos vinte e sete anos. Seu corpo está sepultado no Panteão dos Braganças, em São Vicente de Fora, tendo a sua morte contribuído para a suposta "loucura" da sua mãe, a Rainha. O seu irmão menor D. João tornou-se o herdeiro da coroa e, mais tarde, rei de Portugal, com o nome de João VI de Portugal.
Rei João VI de Portugal (nome completo: João Maria José Francisco Xavier de Paula Luís António Domingos Rafael de Bragança). (Lisboa, 13 de maio de 1767-Lisboa, 10 de março de 1826), cognominado O Clemente, foi rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves de 1816 a 1822, de facto, e desde 1822 até 1825, de jure. Desde 1825 foi rei de Portugal até sua morte, em 1826. Pelo Tratado do Rio de Janeiro de 1825, que reconhecia a independência do Brasil do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves, também foi o imperador titular do Brasil, embora tenha sido seu filho Pedro o imperador do Brasil de facto. Um dos últimos representantes do absolutismo, D. João viveu num período tumultuado, e seu reinado nunca conheceu paz duradoura. Ora era a situação portuguesa ou europeia a degenerar, ora era a brasileira. Não esperara vir a ser rei; só ascendeu à posição de herdeiro da Coroa pela morte de seu irmão mais velho, D. José. Assumiu a regência quando sua mãe, Dona Maria I, foi declarada mentalmente incapaz. Teve de lidar com a constante ingerência nos assuntos do reino de nações mais poderosas, notadamente a Espanha, França e Inglaterra. Obrigado a fugir de Portugal quando as tropas napoleônicas invadiram o país, chegando à colónia enfrentou revoltas liberais que refletiam eventos similares na metrópole, e foi compelido a retornar à Europa em meio a novos conflitos.
Perdeu o Brasil quando seu filho D. Pedro I proclamou a independência e viu seu outro filho, D. Miguel I, rebelar-se procurando depô-lo. Finalmente, foi provado há pouco tempo que morreu envenenado. Seu casamento foi da mesma forma acidentado, e a esposa, Dona Carlota Joaquina, repetidas vezes conspirou contra o marido em favor de interesses pessoais ou da Espanha, seu país natal. Não obstante as atribulações, deixou uma marca duradoura especialmente no Brasil, criando inúmeras instituições e serviços que sedimentaram a autonomia nacional, sendo considerado por muitos pesquisadores o verdadeiro mentor do moderno Estado brasileiro. Apesar disso, é até hoje um dos personagens mais caricatos da história luso-brasileira, sendo acusado de indolência, falta de tino político e constante indecisão, sem falar em sua pessoa, retratada amiúde como grotesca, o que, segundo a historiografia mais recente, na maior parte dos casos é uma imagem injusta. D. João nasceu em 13 de maio de 1767, durante o reinado de seu avô, D. José I. Foi o segundo dos filhos de Dona Maria e D. Pedro, que era também seu tio. Tinha dez anos quando o avô morreu e sua mãe ascendeu ao trono como Maria I de Portugal. Sua infância e juventude foram vividas discretamente, já que era apenas um Infante, ficando à sombra de seu irmão, D. José, o primogênito e herdeiro do trono.
Formou-se um folclore a respeito de uma suposta falta de cultura no príncipe, entretanto, de acordo com Pedreira e Costa, há indícios de que tenha recebido uma educação tão rigorosa quanto a que seu irmão, na condição de herdeiro, recebeu. Por outro lado, um relato do embaixador francês não o pintou em cores favoráveis, descrevendo-o como hesitante e apagado. De qualquer forma, há pouca informação a respeito desta fase de sua vida. Segundo a tradição, teve como professores de letras e ciências o frei Manuel do Cenáculo, António Domingues do Paço e Miguel Franzini, como mestre de música, o organista João Cordeiro da Silva e o compositor João Sousa de Carvalho, e como instrutor de equitação, o sargento-mor Carlos António Ferreira Monte. De seu aproveitamento, pouco se sabe. Também seguramente teve instrução em religião, legislação, língua francesa e etiqueta, e a história deve ter sido aprendida através da leitura de obras de Duarte Nunes de Leão e João de Barros.
Casamento e crise sucessória. Em 1785 seu casamento foi arranjado com a infanta Dona Carlota Joaquina, filha do futuro rei Carlos IV de Espanha (na época, ainda era o herdeiro do trono) e de Dona Maria Luísa de Parma. Por razões políticas, temendo uma nova União Ibérica, parte da corte portuguesa não via o casamento com uma princesa espanhola com bons olhos. Apesar de sua pouca idade, Carlota era considerada uma menina muito vivaz e de educação refinada. Não obstante, teve de suportar quatro dias de testes diante dos embaixadores portugueses antes que o casamento se confirmasse. Também, sendo parentes, e pela pouca idade da infanta, os noivos precisaram de uma dispensa papal para poderem se unir. Após a confirmação, a outorga das capitulações matrimoniais foi assinada na sala do trono da corte espanhola, cercada de grande pompa e com a participação dos grandes de ambos os reinos, seguindo-se imediatamente o esponsal, realizado por procuração. D. João foi representando pelo próprio pai da noiva. À noite foi oferecido um banquete para mais de dois mil convidados.
A infanta foi recebida no Paço de Vila Viçosa no início de maio e em 9 de junho o casal recebeu as bênçãos nupciais na capela do Paço. Seu casamento ocorreu ao mesmo tempo que o de sua irmã, Dona Mariana Vitória, destinada ao infante D. Gabriel, também da casa real espanhola. A assídua correspondência de D. João com Dona Mariana na época revela que a falta da irmã lhe pesava, e, comparando-a com sua jovem esposa, dizia; "Ela é muito esperta e tem muito juízo, só o que tem é ser ainda muito pequena e eu gosto muito dela, mas por isso não te deixo de ter amor igual". Por outro lado, o temperamento da menina era pouco dado à docilidade, exigindo por vezes a intervenção da própria rainha Dona Maria. Além disso, ele com dezoito anos e ela com apenas dez, a diferença de idade entre ambos o incomodava e o punha em ansiedade. Pela excessiva juventude da esposa, o casamento ainda não se consumara, e dizia: "Cá há-de chegar o tempo em que eu hei-de brincar muito com a infanta. Se for por este andar julgo que nem daqui a seis anos. Bem pouco mais crescida está de que quando veio". De fato, a consumação teve de esperar até o dia 5 de abril de 1790.
Em 1793 nascia Dona Maria Teresa, a primeira dos nove filhos que teriam. Entrementes, sua vida relativamente pacata sofreu uma reviravolta em 11 de setembro de 1788, quando seu irmão mais velho, D. José, faleceu. Assim D. João passava a ser o herdeiro da Coroa. Em D. José o povo depositava grandes esperanças e era tido como um príncipe alinhado aos ideais progressistas do iluminismo, mas era criticado pelos religiosos, já que parecia inclinar-se para a orientação política anticlerical do marquês de Pombal. Em contrapartida, a imagem de D. João enquanto seu irmão viveu era oposta. Sua religiosidade era notória e teria-se mostrado favorável à prática do regime absolutista. A crise sucessória se agravou quando, no ano seguinte, D. João ficou gravemente enfermo, e temeu-se pela sua vida. Recuperado, em 1791 caiu doente outra vez, "deitando sangue pela boca e pelos intestinos", conforme anotações deixadas pelo capelão do marquês de Marialva, acrescentando que seu ânimo estava sempre abatido. Formara-se desta forma um clima de tensão e incertezas sobre o seu futuro reinado. Regência. Além disso, a rainha dava crescentes sinais de desequilíbrio mental. Em 10 de fevereiro de 1792, em documento assinado por dezessete médicos, ela foi declarada incapaz de gerir o reino, não havendo previsão de melhora em seu quadro. D. João se mostrou relutante em assumir decididamente as rédeas do poder, rejeitando a ideia de uma regência formalizada, abrindo assim caminho para elementos da nobreza formarem uma corrente que pretendia governar de facto o reino através de um Conselho. Circularam rumores de que D. João exibia sintomas da mesma insanidade, especulando-se se ele também se veria impedido de reinar. De acordo com antigas leis que norteavam a instituição regencial, caso o regente viesse a falecer ou ser impedido por qualquer motivo, e tendo filhos menores de quatorze anos - situação em que se encontraria D. João - o governo seria exercido pelos tutores dos infantes ou, se estes não houvessem sido nomeados formalmente, pela esposa do regente, uma espanhola. Complicava-se, entre temores, suspeitas e intrigas, todo o quadro institucional da nação.
Ao mesmo tempo, sentiam-se os reflexos da Revolução Francesa, que causaram perplexidade e horror entre as casas reinantes europeias. A execução do rei francês Luís XVI em 21 de janeiro de 1793 pelas forças revolucionárias precipitou uma resposta internacional.
Assim, em 15 de julho foi assinada uma convenção entre Espanha e Portugal, e em 26 de setembro Portugal aliou-se à Inglaterra, ambos os tratados visando auxílio mútuo para o combate aos franceses e levando os portugueses no ano seguinte às campanhas do Rossilhão e da Catalunha (1793-1795), em que o país participou com seis mil soldados, e que depois de um início bem-sucedido acabou em fracasso. Criou-se um delicado problema diplomático, em que Portugal não podia selar a paz com a França sem ferir a aliança com a Inglaterra, que envolvia múltiplos interesses, passando assim a buscar uma neutralidade que se revelou frágil e tensa. Depois da derrota, tendo a Espanha alienado Portugal da Paz de Basiléia concertada com a França, e sendo a Inglaterra poderosa demais para ser atacada diretamente, o alvo da vingança francesa passou a ser Portugal. Assumindo o poder francês em 1799, no mesmo ano em que D. João foi instalado oficialmente como regente do reino (em 14 de julho).
Napoleão Bonaparte coagiu a Espanha a impor um ultimato aos portugueses, que obrigava ao rompimento com a Inglaterra e a submissão do país aos interesses franceses. Diante da negativa de D. João, a neutralidade se tornou inviável. Em 1801 Espanha e França invadiram Portugal, episódio conhecido como a Guerra das Laranjas, onde perdeu-se a praça de Olivença. Todos os países envolvidos, com interesses conflitantes, faziam movimentos ambíguos e acordos secretos. A situação se tornara crítica para Portugal, que tentava se manter fora das convulsões. Mas, de todas, era a parte mais fraca, foi usado como um joguete pelas outras potências e acabaria por ser novamente invadido.
Enquanto isso, D. João teve de enfrentar o inimigo dentro de casa. Sua própria esposa, fiel aos interesses espanhóis, iniciou intrigas objetivando depor o marido e tomar o poder, tentativa que entretanto acabou abortada em 1805, com o resultado da conspiradora ser exilada da corte, passando a viver no Palácio de Queluz, enquanto o regente passou a residir no Palácio de Mafra.
Partida para o Brasil. Em 1807 foram assinados os tratados de Tilsit, entre a França e Rússia, e de Fontainebleau, entre a França e Espanha, onde definiu-se a conquista e partilha de Portugal. O destino do reino estava traçado. D. João tentou desesperadamente ganhar tempo e até o último momento simulou uma submissão voluntária à França, chegando a sugerir ao rei inglês a declaração de uma guerra fictícia à Inglaterra. O Bloqueio Continental decretado por Napoleão não foi seguido em todos os seus termos e secretamente estabeleceu-se com a Inglaterra novo acordo em que Portugal receberia ajuda para uma eventual partida da família real. O acordo era sumamente vantajoso para os ingleses, que, preservando de uma deposição certa o governo legítimo, que sempre lhe fora simpático, manteria sua influência sobre o país, continuando a tirar grandes lucros no comércio com o império transcontinental português. A Portugal cabia escolher entre a obediência à França ou à Inglaterra, mas o governo, dividido entre francófilos e anglófilos, hesitava, ameaçando Portugal de uma guerra não apenas contra uma potência, mas contra duas. Logo os eventos se precipitaram, em outubro de 1807 chegaram informações de que um exército composto de franceses e espanhóis se aproximava, em 1º de novembro foi conhecido na corte que Napoleão divulgara uma notícia dizendo que a Casa de Bragança em dois meses deixaria de reinar, e em 6 de novembro a esquadra inglesa entrou no porto de Lisboa com uma força de sete mil homens, com ordens de ou escoltar a família real para o Brasil ou, se o governo se rendesse aos franceses, atacar e conquistar a cidade. Depois de angustiada ponderação, pressionado por todos os lados, D. João decidiu aceitar a proteção inglesa e partir para o Brasil.
O exército invasor, comandado por Jean-Andoche Junot, iniciara seu avanço, mas chegou às portas da capital somente em 30 de novembro de 1807. Tendo enfrentado várias dificuldades no caminho, esta milícia estava alquebrada e faminta, suas fardas estavam em farrapos e os soldados, em sua maioria novatos inexperientes, mal conseguiam carregar suas armas. Alan Manchester descreveu-os dizendo que "sem cavalaria, artilharia, cartuchos, sapatos ou comida, cambaleando de fadiga, a tropa mais parecia a evacuação de um hospital do que um exército marchando triunfalmente para a conquista de um reino", e por isso acredita-se que uma resistência poderia ter sido bem-sucedida, mas o governo não estava a par da situação do inimigo, e de qualquer modo já era tarde para eles. D. João, acompanhado de toda a família real e grande séquito de nobres, prelados, funcionários de Estado e criados, bem como volumosa bagagem onde se incluía valioso acervo de arte, os arquivos de Estado e o tesouro real, já partira, deixando o país sob uma regência, conhecida como Conselho de Regência de 1807. A ideia de uma mudança da sede da corte para a América como ato geopolítico já existia em Portugal há muito tempo, e de fato alguns meses antes já haviam sido feitos alguns preparativos para a eventualidade, mas neste momento a fuga teve de ser realizada às pressas, debaixo de chuvas que deixaram as ruas num lamaçal, e causou enorme tumulto em Lisboa, em meio a uma população entre atônita e revoltada que não podia acreditar que seu príncipe a abandonava. Na confusão foram esquecidas no cais inúmeras outras malas e pertences, os caixotes com toda a prataria das igrejas, que foi confiscada e fundida pelos franceses, e o precioso acervo de sessenta mil volumes da Biblioteca Real, que foi salvo e enviado ao Brasil mais tarde. No relato de José Acúrsio das Neves, a partida causou profunda comoção no príncipe regente; "Queria falar e não podia; queria mover-se e, convulso, não acertava a dar um passo; caminhava sobre um abismo, e apresentava-se-lhe à imaginação um futuro tenebroso e tão incerto como o oceano a que ia entregar-se. Pátria, capital, reino, vassalos, tudo ia abandonar repentinamente, com poucas esperanças de tornar a pôr-lhes os olhos, e tudo eram espinhos que lhe atravessavam o coração". Para explicar-se ao povo, D. João mandara afixar cartazes pelas ruas afirmando que a partida fora inevitável, a despeito de todos os esforços feitos para assegurar a integridade e a paz do reino; recomendando calma a todos, ordenou que não resistissem aos invasores para que não se derramasse sangue em vão. Em virtude da pressa, no mesmo navio que o príncipe, seguiram sua mãe a rainha e os seus herdeiros D. Pedro I e D. Miguel, uma decisão imprudente, dados os perigos de uma viagem transatlântica naquela época, pondo em risco a sucessão da Coroa caso naufragassem, enquanto Dona Carlota e as infantas iam em dois outros barcos. O número de pessoas embarcadas é muito controverso; no século XIX falava-se em até 30 mil emigrados, estimativas mais recentes oscilam de quinhentas a quinze mil, mas a esquadra, composta por quinze embarcações, de fato só podia levar de doze a quinze mil pessoas, estando neste número inclusos os tripulantes. Porém, há vários relatos a respeito da superlotação dos navios. Segundo Pedreira e Costa, levando em conta todas as variáveis, é mais provável que tenham sido de quatro a sete mil pessoas, excluindo tripulantes. Muitas famílias foram separadas, e mesmo altos dignitários não encontraram uma colocação nos navios, ficando para trás. A viagem não foi nada tranquila, logo de início enfrentaram uma tormenta que obrigou a um considerável desvio na rota, vários navios estavam em precária condição, a superlotação impunha situações humilhantes para a nobreza, a maioria teve de dormir amontoada, sob vento e chuva, nos tombadilhos, a higiene era péssima, surgindo até uma epidemia de piolhos, muitos não haviam conseguido trazer mudas de roupa, várias pessoas adoeceram, os mantimentos e a água eram escassos e foram racionados. O ânimo de todos azedou e iniciaram murmurações, e a frota, atravessando um denso nevoeiro em que se perdeu contato visual entre os navios e, em seguida, sendo fustigada por outra tempestade que danificou seriamente vários barcos, acabou por se dispersar na altura da Ilha da Madeira. Logo depois o príncipe mudou seus planos, e por sua ordem o grupo de navios que ainda o acompanhava se dirigiu para Salvador, provavelmente por uma razão política, agradar os habitantes da primeira capital da colónia, que já haviam dado vários sinais de descontentamento com a perda do antigo status, enquanto os navios restantes seguiam para o Rio de Janeiro, como era o plano original.
Mesmo grande, não foi suficiente para acomodar a todos, e foi necessário requisitar os edifícios vizinhos, como o Convento do Carmo, a Casa da Câmara e a cadeia. Para atender aos outros nobres e instalar novas repartições públicas, inúmeras residências menores foram desapropriadas às pressas, despejando-se arbitrariamente seus proprietários, às vezes usando de meios violentos diante de resistências. Como o regente, a despeito dos esforços do vice-rei Marcos de Noronha e Brito e de Joaquim José de Azevedo, ainda estava mal instalado, o comerciante Elias Antônio Lopes ofereceu sua casa de campo na Quinta da Boa Vista, um palacete suntuoso em excelente localização que imediatamente caiu no agrado do príncipe. Depois de várias reformas e ampliações, o palacete se transformaria no Paço de São Cristóvão. Dona Carlota Joaquina, por outro lado, preferiu ficar em uma chácara na praia de Botafogo, continuando seu hábito de viver apartada do marido. Registro da cerimônia do beija-mão na corte carioca de D. João, um costume típico da monarquia portuguesa. A cidade, na época com cerca de sessenta mil habitantes, se viu transformada do dia para a noite. A população adicional, cheia de novas exigências, impôs uma nova organização no abastecimento de alimentos e outros bens de consumo, incluindo itens de luxo. O processo de instalação dos portugueses ainda levaria anos para se completar e o cotidiano do Rio se tornou durante um bom tempo caótico, os aluguéis dobraram, subiram os impostos e os víveres sumiram, requisitados para a nobreza. Isso logo dissipou o entusiasmo popular pela chegada do príncipe. Com o tempo a fisionomia urbana também começou a mudar, com a construção de inúmeras novas residências, palacetes e outras edificações, e foram implementadas várias melhorias nos serviços e na infraestrutura. Igualmente, a presença da corte introduziu novos padrões de etiqueta, novas modas e novos costumes, incluindo uma nova estratificação social.
Entre os ditos costumes, D. João VI continuou no Brasil o antigo cerimonial português do beija-mão, pelo qual tinha grande apreço e que entrou para o folclore, exercendo grande fascínio sobre o povo. Recebia seus súditos todos os dias, excetuando domingos e feriados, que em longas filas, onde se misturavam nobres e plebeus, esperavam para mostrar seu respeito pelo monarca e pedir-lhe mercês. Disse o pintor Henry L’Evêque que "o Príncipe, acompanhado por um Secretário de Estado, um Camareiro e alguns oficiais de sua Casa, recebe todos os requerimentos que lhe são apresentados; escuta com atenção, todas as queixas, todos os pedidos dos requerentes; consola uns, anima outros (...) A vulgaridade das maneiras, a familiaridade da linguagem, a insistência de alguns, a prolixidade de outros, nada o enfada. Parece esquecer-se de que é senhor deles para se lembrar apenas de que é o seu pai". Oliveira Lima registrou que ele "nunca confundia as fisionomias nem as súplicas, e maravilhava os requerentes com o conhecimento que denotava das suas vidas, das suas famílias, até de pequenos incidentes ocorridos em tempos passados e que eles mal podiam acreditar terem subido à ciência d'el-rei". Ao longo de sua permanência no Brasil o rei formalizaria a criação de um enorme número de instituições e serviços públicos e fomentaria a economia, a cultura e outras áreas da vida nacional. Todas essas medidas foram tomadas a princípio pela necessidade prática de se administrar um grande império em um território antes desprovido desses recursos, pois a ideia predominante era a de que o Brasil permaneceria como uma colónia, visto que se esperava um retorno da corte para a antiga metrópole assim que a situação política europeia se normalizasse. Isso não quer dizer que tudo fossem amenidades e progresso. Houve sérias crises políticas, que iniciaram logo depois de sua chegada, com a invasão da Guiana Francesa em 1809, em represália à invasão de Portugal, e grandes problemas económicos, a começar com o penoso acordo comercial de 1810 imposto pela Inglaterra, que na prática inundou o pequeno mercado interno com quinquilharias inúteis e prejudicou as exportações e a criação de novas indústrias no país; o deficit público se multiplicou por vinte e a corrupção grassava à solta nas instituições, incluindo o primeiro Banco do Brasil, que acabou falindo. Além disso a corte era extravagante e perdulária, acumulava privilégios sobre privilégios e sustentava uma legião de sicofantas e aventureiros. O cônsul britânico James Henderson observou que poucas cortes europeias eram tão grandes como a portuguesa. E diz Laurentino Gomes que D. João distribuiu mais títulos hereditários durante os primeiros oito anos de sua estada no Brasil do que foram outorgados em todos os trezentos anos anteriores da história de Portugal, sem contar mais de cinco mil insígnias e comendas de ordens honoríficas. Quando Napoleão foi apeado do poder, em 1815, as potências europeias instalaram o Congresso de Viena para reorganizar o mapa político do velho continente. Portugal participou das negociações, mas diante das maquinações inglesas contrárias aos interesses da Casa de Bragança, o regente foi aconselhado a permanecer no Brasil pelo conde de Palmela, embaixador português junto ao Congresso, e pelo poderoso príncipe de Talleyrand, a fim de estreitar os laços entre metrópole e colónia, sugerindo-se inclusive a elevação da colónia à condição de reino unido a Portugal.
O representante inglês também acabou concordando com a ideia, que resultou na efetiva criação do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarves em 16 de dezembro de 1815, instituição jurídica rapidamente reconhecida por outras nações. Ascensão ao trono e outras questões políticas,´
Em 20 de março de 1816 faleceu a rainha Dona Maria, abrindo caminho para o regente assumir o trono. Mas embora passasse a governar como rei no dia 20, sua sagração não se realizou de imediato, sendo aclamado somente em 6 de fevereiro de 1818, com grandes festividades.
Entrementes, vários assuntos políticos ocupavam o primeiro plano. Dona Carlota Joaquina continuava a conspirar contra os interesses portugueses. Na verdade isso havia iniciado em Portugal, e, ambiciosa, logo após sua chegada ao Brasil estabelecera entendimentos tanto com espanhóis como com nacionalistas platinos, pretendendo conseguir um reino para si própria, fosse como regente da Espanha, fosse como rainha de um novo reino a ser criado nas colónias espanholas no sul da América, ou mesmo através da deposição de D. João.
Isso tornara sua convivência com D. João impossível, apesar da paciência que o marido lhe demonstrava, e só por força das conveniências se apresentavam juntos em público. Embora Dona Carlota tenha conseguido angariar muitas simpatias, todos esses seus planos malograram. Apesar disso, conseguiu influenciar o marido a se envolver mais diretamente na política colonial espanhola, o que acabou desembocando na tomada de Montevidéu em 1817 e na anexação da Província Cisplatina em 1821. Na mesma época se colocava o problema de casar o príncipe herdeiro D. Pedro I. O Brasil era visto na Europa como um país distante demais, atrasado e inseguro, e encontrar boas candidatas não foi tarefa simples. Depois de um ano de buscas o embaixador, marquês de Marialva, conseguiu enfim uma aliança com uma das mais poderosas casas reinantes da Europa, os Habsburgo, imperadores da Áustria, depois de seduzir a corte austríaca com algumas mentiras, uma faustosa exibição de pompa e a distribuição de barras de ouro e diamantes entre a nobreza.
Casou-se então D. Pedro I com Dona Leopoldina, filha do imperador Francisco I, em 1817. O imperador e seu ministro Metternich consideraram a aliança "um pacto vantajosíssimo entre a Europa e o Novo Mundo", podendo fortalecer o regime monárquico em ambos os hemisférios e criando para a Áustria uma nova zona de influência. Ao mesmo tempo, a situação em Portugal não estava nada tranquila; acéfalo e devastado pela Guerra Peninsular, que causou fome em massa e um enorme êxodo populacional, com o afastamento definitivo da ameaça francesa a metrópole se havia convertido na prática num protetorado britânico, comandado pelo marechal William Beresford, que governou com mão de ferro. Desde a ascensão de D. João ao trono os portugueses faziam pressão para o seu retorno, iniciavam rebeliões de orientação liberal e agiam sociedades secretas, objetivando uma convocação das Cortes, que não se reuniam desde 1698. No Brasil havia agitação semelhante. Em 1817 eclodira em Recife a Revolução Pernambucana, movimento republicano que instalou um governo provisório em Pernambuco e se infiltrou por outros estados, mas foi severamente reprimido. Em 24 de agosto de 1820 um levante militar no Porto instaurou uma Junta Governativa, com repercussões em Lisboa. Reuniram-se as Cortes Gerais Extraordinárias e Constituintes, formando um governo e convocando eleições para deputados sem a consulta a D. João. O movimento se espalhou para a Ilha da Madeira, os Açores e alcançou a capitania do Grão-Pará e a Bahia, no Brasil, chegando a causar a sublevação da guarnição militar no próprio Rio de Janeiro. A 30 de janeiro de 1821 as Cortes se reuniram em Lisboa e decretaram a formação de um Conselho de Regência para exercer o poder em nome de D. João, libertaram muitos presos políticos e exigiram o regresso imediato do rei. Em 20 de abril D. João convocou no Rio uma reunião para escolher deputados à Constituinte, mas no dia seguinte houve protestos em praça pública que acabaram reprimidos com violência. No Brasil a opinião geral era de que a volta do rei poderia significar a retirada do país da autonomia conquistada, voltando a ser uma colónia. Pressionado, D. João tentou encontrar uma saída contemporizadora enviando para Lisboa seu filho, o príncipe herdeiro D. Pedro I, para outorgar uma Constituição e estabelecer as bases de um novo governo. O príncipe, contudo, já envolvido com ideias libertadoras, recusou-se. A crise havia ido longe demais e não havia como voltar atrás. Só restou ao rei nomear D. Pedro I regente em seu nome e partiu para Lisboa em 25 de abril de 1821, após uma permanência de treze anos no Brasil, do qual levou saudades.
Regresso a Portugal. Os navios com o rei e sua comitiva entraram no porto de Lisboa em 3 de julho. Sua volta fora orquestrada de modo a não dar a entender que o rei se sentira coagido, mas de fato já se havia instaurado um novo ambiente político. Elaborada a Constituição, o rei foi obrigado a jurá-la em 1º de outubro de 1822, perdendo diversas prerrogativas. Dona Carlota negou-se a imitar o marido, e com isso seus direitos políticos foram cassados, sendo despojada do título de rainha. Nesta data, do outro lado do oceano o rei já havia perdido também o Brasil. Seu filho, optando por ficar no país, liderou uma revolta proclamando a Independência do Brasil em 7 de setembro, assumindo o título de imperador.
Diz a tradição que antes de seguir viagem para Portugal D. João VI teria antecipado os futuros acontecimentos dizendo para o herdeiro: "Pedro, o Brasil brevemente se separará de Portugal: se assim for, põe a coroa sobre tua cabeça, antes que algum aventureiro lance mão dela". Segundo as memórias do conde de Palmela, de fato a independência brasileira teria sido realizada em comum acordo entre o rei e o príncipe. De qualquer modo, a correspondência posterior entre os dois registra a preocupação do príncipe de que isso não perturbasse o pai. O reconhecimento oficial da independência, porém, demorou. A Constituição liberal jurada pelo rei vigoraria apenas durante alguns meses. O liberalismo não agradava a todos e ergueu-se um movimento absolutista. Em 23 de fevereiro de 1823, em Trás-os-Montes, o conde de Amarante proclamou a monarquia absoluta, o que entretanto não vingou de pronto, mas novas agitações se seguiram.
Em 27 de maio o infante D. Miguel, instigado por sua mãe Dona Carlota, liderou outra revolta, conhecida como a Vilafrancada, tentando restaurar o absolutismo. Mudando o jogo, o rei apoiou o filho a fim de evitar sua própria deposição, (desejada pelo partido da rainha, e apareceu em público no dia de seu aniversário ao lado do filho, que vestia um uniforme da Guarda Nacional, um corpo militar que embora desorganizado tendia para o liberalismo, recebendo os aplausos da milícia. A seguir o monarca se dirigiu pessoalmente a Vila Franca para melhor administrar a crise, e seu retorno para Lisboa foi um verdadeiro triunfo. O clima político se mostrava indeciso, e com isso mesmo os mais firmes defensores do liberalismo recearam se comprometer em demasia.
As Cortes, antes de serem dissolvidas, protestaram contra qualquer mudança que se operasse no texto constitucional recém aprovado, mas o regime absoluto foi restaurado, os direitos da rainha, restabelecidos, e o rei, aclamado pela segunda vez em 5 de junho de 1823. D. João, além disso, reprimiu manifestações em contrário, deportou alguns liberais, prendeu outros, ordenou a recomposição de magistraturas e instituições mais de acordo com a nova orientação política e criou uma comissão para elaborar estudos para uma nova Carta. A aliança do rei com D. Miguel não frutificou, já que, sempre influenciado pela mãe, o infante em 29 de abril de 1824 levantou a guarnição militar de Lisboa e colocou o pai sob custódia no Paço da Bemposta, na chamada Abrilada, a pretexto de esmagar os maçons e defender o rei das ameaças de morte que aqueles supostamente teriam-lhe feito, prendendo na ocasião diversos inimigos políticos. Tentava o infante, na verdade, forçar a abdicação do pai. Alertado da situação, o corpo diplomático penetrou no palácio e, diante de tantas autoridades, os custódios do rei não resistiram, moderando-se. Em 9 de maio, por conselho de embaixadores amigos, D. João simulou um passeio a Caxias, mas de fato foi buscar refúgio junto à armada britânica ancorada no porto. A bordo da nau Windsor Castle chamou o filho, repreendeu-o, destituiu-o do comando do exército e ordenou-lhe a libertação dos presos que fizera. D. Miguel foi exilado. Vencida a rebelião, o povo foi às ruas comemorando a permanência do governo legítimo, onde se uniram absolutistas e liberais.
No dia 14 o rei voltou à Bemposta, reconstituindo o ministério e mostrando generosidade para com os outros rebeldes. Porém, não cessava a rainha de conspirar. A polícia descobriu que outra rebelião deveria estourar em 26 de outubro, diante do que a D. João não restou senão mostrar-se enérgico, mandando a esposa para prisão domiciliar em Queluz. Anos finais. No fim de seu reinado D. João ordenou a criação de um porto-franco em Lisboa, mas a medida não foi implantada. Mandou prosseguir a devassa para averiguar a morte do marquês de Loulé, seu antigo amigo, mas a sentença final nunca foi proferida. Em 5 de junho de 1824 anistiou os envolvidos na revolução do Porto, excetuando nove oficiais que foram desterrados, e no mesmo dia mandou entrar em vigor a antiga Constituição do reino e convocar novamente as Cortes para a elaboração de um novo texto. A mudança constitucional enfrentou diversos obstáculos, principalmente da Espanha e de partidários da rainha. Contudo, os maiores problemas que enfrentou foram os ligados à independência do Brasil, até então a maior fonte de riqueza de Portugal, e cuja perda fora de grande impacto sobre a economia portuguesa. Foi imaginada inclusive uma expedição de reconquista da antiga colônia, mas logo a ideia foi abandonada. Negociações difíceis entabuladas na Europa e no Rio de Janeiro, com a mediação e pressão da Inglaterra, resultaram no definitivo reconhecimento da independência em 29 de agosto de 1825. Ao mesmo tempo, o rei libertou todos os brasileiros que estavam presos e autorizou o comércio entre ambas as nações. Quanto a D. Pedro, foi acertado que governaria soberano com o título de Imperador Regente, mantendo D. João para si o título de Imperador Titular do Brasil, passando a assinar os documentos oficiais como "Sua Majestade o Imperador e Rei D. João VI".
O Brasil ficava ainda obrigado ao pagamento do último empréstimo contraído com Portugal. Sobre a sucessão das duas coroas, nada ficou dito no tratado, mas D. Pedro, continuando na qualidade de Príncipe Real de Portugal e Algarves, permanecia implicitamente na linha de sucessão ao trono português. Em 4 de março de 1826, D. João, vindo do Mosteiro dos Jerônimos onde almoçara, recolheu-se ao Paço da Bemposta sentindo-se mal. Iniciaram vômitos, convulsões e desmaios, que duraram alguns dias. O enfermo pareceu melhorar, mas por prudência designou sua filha, a infanta Isabel Maria, como regente. Na noite do dia 9 a moléstia se agravou, e perto das 5 horas do dia 10, faleceu. Os médicos não puderam determinar exatamente a causa mortis, mas suspeitou-se de envenenamento. Seu corpo foi embalsamado e sepultado no mausoléu dos reis de Portugal, o Panteão Real da Dinastia de Bragança, no Mosteiro de São Vicente de Fora, em Lisboa.
A infanta assumiu imediatamente o governo interino e D. Pedro foi reconhecido legítimo herdeiro, como D. Pedro IV de Portugal. Recentemente uma equipe de pesquisadores exumou o pote de cerâmica chinesa que continha as suas vísceras. Fragmentos do seu coração foram reidratados e submetidos a análises, que detectaram uma quantidade de arsênico suficiente para matar duas pessoas, confirmando as suspeitas de que o rei foi em verdade assassinado. Vida privada. Manuel Dias de Oliveira: Retrato de D. João e Dona Carlota, uma imagem oficial que dissimula a perene discórdia entre o casal. Em sua juventude foi uma figura retraída, fortemente influenciado pelo clero, vivendo cercado de padres e frequentando diariamente as missas da Igreja. Entretanto, Oliveira Lima afirmou que antes do que uma expressão de carolice pessoal, isso era um mero reflexo da cultura portuguesa de então, e que o rei (...) "compreendia que a Igreja, com seu corpo de tradições e sua disciplina moral, só lhe podia ser útil para o bom governo a seu modo, paternal e exclusivo, de populações cujo domínio herdara com o cetro. Por isso foi repetidamente hóspede de frades e mecenas de compositores sacros, sem que nessas manifestações epicuristas ou artísticas se comprometesse seu livre pensar ou se desnaturasse sua tolerância cética.... Aprazia-lhe o refeitório mais do que o capítulo do mosteiro, porque neste se tratava de observância e naquele se cogitava de gastronomia, e para observância lhe bastava a da pragmática. Na Capela Real mais gozava com os sentidos do que rezava com o espírito: os andantes substituíam as meditações". Apreciava muito a música sacra e era um grande leitor de obras sobre arte, mas detestava atividades físicas. Acredita-se que sofria de periódicas crises de depressão. Seu casamento não foi feliz, mas circularam rumores de que uma vez, aos 25 anos, se apaixonara por Eugênia José de Menezes, dama de companhia de sua esposa. Quando ela engravidou as suspeitas recaíram sobre D. João. O caso foi abafado e a moça foi enviada à Espanha para dar à luz. Nasceu uma menina, cujo nome se desconhece. A mãe viveu encerrada em mosteiros e foi sustentada por toda a vida por D. João.
Os historiadores Tobias Monteiro e Patrick Wilcken apontam indícios de que D. João teria tido também um relacionamento homossexual, não por convicção, antes por necessidade, pois seu casamento logo se revelou um fracasso, vivendo apartado da esposa e reunindo-se a ela somente em ocasiões protocolares. Seu parceiro teria sido seu camareiro favorito, Francisco de Sousa Lobato, cuja tarefa teria sido masturbar o rei com alguma regularidade. Embora isso possa ser fruto de simples maledicência, um padre, chamado Miguel, teria uma vez surpreendido a cena e por isso deportado para Angola, não sem antes deixar um testemunho por escrito. De qualquer maneira o camareiro acabou recebendo diversas honrarias, acumulando entre outros os cargos de conselheiro do rei, secretário da Casa do Infantado, secretário da Mesa de Consciência e Ordens e governador da fortaleza de Santa Cruz, recebendo também o título de barão e depois visconde de Vila Nova da Rainha. No Rio os hábitos pessoais do rei, instalado num ambiente precário e despojado, eram simples. Ao contrário do relativo isolacionismo que observara em Portugal, passou a se mostrar mais dinâmico e interessado pela natureza. Deslocava-se com frequência entre o Paço de São Cristóvão e o Paço da cidade, passava temporadas na Ilha de Paquetá, na Ilha do Governador, na Praia Grande, a antiga Niterói, e na Real Fazenda de Santa Cruz. Praticava a caça e se demorava em lugares aprazíveis repousando em barracas, ou debaixo de alguma árvore. Gostava do país, apesar dos enxames de mosquitos e outras pragas e do calor abrasante dos trópicos, que de resto eram detestados pela maioria dos portugueses e outros estrangeiros. Tinha aversão a mudanças em sua rotina, o que se estendia ao vestuário, e usava a mesma casaca até que ela se rasgasse, obrigando seus camareiros a costurá-la no próprio corpo do monarca enquanto ele dormia. Sofria de ataques de pânico quando ouvia trovoadas, encerrando-se em seus aposentos com as janelas trancadas, não recebendo ninguém.
Legado. No decorrer dos poucos anos de sua permanência no Brasil, D. João ordenou a criação de uma série de instituições, projetos e serviços que beneficiaram imensamente o país no âmbito econômico, administrativo, jurídico, científico, cultural, artístico e outros mais, embora nem todos tenham tido o sucesso planejado e alguns fossem francamente disfuncionais ou desnecessários, como observou mordazmente Hipólito José da Costa. Entre eles, foi o responsável pela criação da Imprensa Régia, do Jardim Botânico do Arsenal de Marinha, da Fábrica de Pólvora, do Corpo de Bombeiros, da Marinha Mercante, da Casa dos Expostos. Também criou diversas aulas avulsas no Rio, Pernambuco, Bahia e outros lugares, tais como teologia, dogmática e moral; cálculo integral, mecânica, hidrodinâmica, química, aritmética, geometria; francês e inglês; botânica e agricultura, e várias mais. Fomentou a fundação de diversas sociedades e academias para estudos científicos, literários e artísticos, como a Junta Vacínica, a Real Sociedade Bahiense dos Homens de Letras, o Instituto Acadêmico das Ciências e das Belas-Artes, a Academia Fluminense das Ciências e Artes, a Escola Anatômica, Cirúrgica e Médica do Rio de Janeiro, a Real Academia de Artilharia, Fortificação e Desenho, a Academia dos Guardas-Marinhas, a Academia Militar, a Real Biblioteca, o Museu Real, o Teatro Real de São João, além de recrutar solistas de canto de fama internacional e patrocinar os músicos da Capela Real, onde se incluía o padre José Maurício, o maior compositor brasileiro de seu tempo, apoiando também a vinda da Missão Artística Francesa, que resultou na criação da Escola Real de Ciências, Artes e Ofícios, antecessora da Academia Imperial de Belas Artes, de fundamental importância para a renovação do ensino e produção de arte no Brasil. Na economia D. João determinou mudanças de largo alcance, iniciando a partir da abertura dos portos e da abolição do monopólio comercial dos portugueses, tendo a Inglaterra como a grande beneficiada. Se por um lado os comerciantes instalados no Brasil tiveram de enfrentar poderosa concorrência estrangeira, por outro se fomentou a criação de novas manufaturas e outras atividades econômicas que antes eram proibidas, precárias ou inexistentes no Brasil. Ao mesmo tempo, iam-se instalando diversos órgãos administrativos de alto escalão, como os ministérios da Guerra e Estrangeiros e o da Marinha e Ultramar; os Conselhos do Estado e o da Fazenda, o Conselho Supremo Militar, o Arquivo Militar, as Mesas de Desembargo do Paço e da Consciência e Ordens, a Casa de Suplicação, a Intendência Geral da Polícia, o Banco do Brasil a Real Junta do Comércio, Agricultura, Fábricas e Navegação, e a Administração Geral dos Correios, além de passar a absorver brasileiros nos quadros administrativos e funcionais, contribuindo para, diminuírem, as tensões entre os nativos e os portugueses. Também incentivou a produção agrícola, especialmente do algodão, arroz e cana-de-açúcar; abriu estradas e estimulou a navegação fluvial, dinamizando a circulação de pessoas, bens e produtos entre as regiões. Controvérsias. No entender de Pedreira & Costa, são poucos os monarcas portugueses que ocupam no imaginário popular um lugar tão destacado como D. João VI, um imaginário que o descreve de maneiras muito variadas, "ainda que raramente por boas razões (...). Não são estranhas as atribulações de sua vida conjugal e familiar e as referências à sua personalidade e aos seus costumes pessoais, convidando à caricatura fácil e à circulação de uma tradição pouco lisonjeira, quando não jocosa". Na crítica de Ronaldo Vainfas, "é uma história cheia de erros de todo tipo, deturpações, imprecisões, invenções". Para o historiador Luiz Carlos Villalta, "constitui um amplo ataque ao conhecimento histórico" e, ao contrário do anunciado pela cineasta Carla Camurati, que pretendeu "produzir uma narrativa cinematográfica que constituísse uma espécie de romance histórico com funções pedagógicas e que, assim, oferecesse ao espectador um conhecimento do passado e o ajudasse, como povo, a pensar sobre o presente (...), não oferece conhecimento histórico novo ao espectador, nem que se considere que a mesma concebe a História como um Romance: ele reforça, na verdade, as ideias que os espectadores trazem, sendo nulo em termos de ampliação do conhecimento (...). Dessa forma, conduz-se o espectador mais ao deboche do que à reflexão crítica sobre a história do Brasil".
D. João retratado por vários artistas, mostrando a diversidade em suas representações Até mesmo sua iconografia o representa com traços os mais diversos. Ora é um obeso, desproporcionado e com aparência desleixada, ora é um personagem dignificado e elegante. Diz a pesquisadora Ismênia de Lima Martins: "Se existe a concordância de todos os autores, que se basearam no depoimento daqueles que o conheceram de perto, quanto à sua bondade e afabilidade, todo o resto é controvérsia. Enquanto uns apontavam sua visão de estadista, outros consideravam-no inteiramente covarde e despreparado para governar. De qualquer maneira, D. João VI marcou de forma indelével a história luso-brasileira, fato que repercute até o presente, através de uma historiografia que insiste em julgar o rei, desprezando as transformações contínuas que a disciplina experimentou ao longo do século XX". Em seu governo sempre dependeu de auxiliares fortes, encontrando-os principalmente nas figuras do conde de Linhares, do conde da Barca e em Tomás de Vila Nova Portugal, que podem ser considerados os mentores de muitas das mais importantes medidas que o rei tomou, mas segundo John Luccock, um fidedigno observador do período joanino, "o príncipe regente tem sido várias vezes acusado de apatia; a mim, pareceu-me ele possuir maior sensibilidade e energia de caráter do que em geral tanto amigos como adversários costumam atribuir-lhe. Achava-se colocado dentro de circunstâncias novas e próprias para pô-lo à prova, curvando-se ante elas com paciência; se incitado, agia com vigor e presteza". Enalteceu também o caráter do rei, reafirmando sua bondade e atenção. Oliveira Lima, com seu clássico Dom João VI no Brasil (1908), foi um dos grandes responsáveis pelo, inicio, de sua reabilitação em maior escala. Pesquisou inúmeros documentos de época sem encontrar descrições brasileiras desfavoráveis ao rei, nem de embaixadores e outros diplomatas acreditados na corte, ao contrário, encontrando muitos relatos que o pintaram em cores positivas, como os testemunhos deixados pelo cônsul britânico Henderson e o ministro norteamericano Sumter, que "preferiam muito dirigir-se diretamente ao monarca, sempre disposto a fazer justiça, a entender-se com seus ministros (...) reputando-o em tal assunto muito mais adiantado do que os seus cortesãos". Documentos diplomáticos também comprovam a largueza de sua visão política, almejando para o Brasil uma importância nas Américas comparável à dos Estados Unidos, adotando um discurso que era semelhante ao do Destino Manifesto norteamericano. Fazia valer sua autoridade sem violência, mas de maneira persuasiva e afável, sua condução dos assuntos internacionais, embora não tenha tido sucesso em repetidas ocasiões e tenha cedido a alguma ambição imperialista, em muitas outras se revelou clarividente e harmonizadora, e não é preciso repetir as múltiplas ações, descritas antes, que levou a cabo para melhorar as condições de vida da colônia brasileira. No entanto, o general francês Junot descreveu-o como "um homem fraco, que suspeita de tudo e de todos, cioso de sua autoridade mas incapaz de fazer-se respeitar. É dominado pelos padres e só consegue agir sob a coação do medo", e vários historiadores brasileiros, como Pandiá Calógeras, Tobias Monteiro e Luiz Norton, carregaram nas cores sombrias. Entre os portugueses, como Oliveira Martins e Raul Brandão, foi invariavelmente retratado como uma figura burlesca até a ressurgência conservadora de 1926, quando então foram aparecendo alguns nomes para defendê-lo, como Fortunato de Almeida, Alfredo Pimenta e Valentim Alexandre. É certo também que fez muitos desafetos, que elevou impostos e agravou a dívida pública, que multiplicou títulos e privilégios hereditários, que não soube apaziguar todas as discórdias internas nem eliminar a corrupção arraigada nos escalões administrativos, e que deixou o Brasil à beira da falência quando esvaziou o tesouro para voltar a Portugal. Qualquer que tenha sido o caráter do rei, e entre erros e acertos, é inconteste a importância do seu reinado para um notável arranco de desenvolvimento e para a própria unidade da nação brasileira. Gilberto Freyre afirmou que "D. João VI foi uma das personalidades que mais influíram sobre a formação nacional (...) foi um mediador idea (...) entre a tradição (que encarnou) e a inovação (que acolheu e promoveu) naquele período decisivo para o futuro brasileiro". Como disse Laurentino Gomes, "nenhum outro período da história brasileira testemunhou mudanças tão profundas, decisivas e aceleradas quanto os treze anos em que a corte portuguesa morou no Rio de Janeiro". Estudiosos como Oliveira Lima, Maria Odila da Silva Dias, Roderick Barman e o mesmo Laurentino acreditam que se ele não tivesse-se deslocado para a América e instalado um forte governo centralizado provavelmente o grande território do Brasil, com importantes diferenças regionais, teria-se fragmentado em diversas nações distintas, como ocorreu com a vasta colónia espanhola sua vizinha, uma opinião que já havia sido emitida pelo almirante britânico sir Sidney Smith, comandante da esquadra que escoltara os navios portugueses em fuga para o Brasil. As biografias mais recentes tentam distinguir entre lenda e fato, e reverter o folclore do ridículo que se formou sobre ele e que de resto não tem muita documentação histórica autêntica que o corrobore. Lúcia Bastos adverte que mesmo atitudes que hoje poderíamos criticar devem ser analisadas com cuidado contra seu contexto histórico, como a questão da corrupção, lembrando que, embora houvesse gastos enormes e claros abusos, na época não havia separação nítida entre o público e o privado, e na lógica do Antigo Regime "o rei é o dono do Estado (...) aquela distribuição de benesses fazia parte: o rei é o dispensador de justiça e benesses". Nas palavras de Leandro Loyola, "das novas pesquisas surge um governante que tinha limitações, mas enfrentou uma conjuntura totalmente adversa e sobreviveu a ela, apesar de governar um país pequeno, empobrecido e decadente como o Portugal do começo do século XIX".
Significativamente, Napoleão, seu mais poderoso inimigo, antes de falecer na ilha de Santa Helena, disse sobre ele: "Foi o único que me enganou". O marquês de Caravelas, discursando no Senado por ocasião da morte do rei, louvou-o dizendo: "Nós todos que aqui estamos temos muitas razões para nos lembrarmos da memória de D. João VI, todos lhe devemos ser gratos, pelos benefícios que nos fez: elevou o Brasil a reino, procurou por todos o seu bem, tratou-nos sempre com muito carinho e todos os brasileiros lhe são obrigados". Descendência. Com sua esposa, Carlota Joaquina de Bourbon, Infanta de Espanha (1775-1830), teve os filhos: D. Maria Teresa de Bragança (1793-1874), casada em primeiras núpcias com D. Pedro Carlos de Bourbon e Bragança, Infante de Portugal e de Espanha, e pela segunda vez com Carlos de Bourbon, Conde de Molina, também Infante de Espanha e seu cunhado; com descendência. D. Francisco António Pio de Bragança (1795-1801), Príncipe da Beira; sem descendência. D. Maria Isabel de Bragança (1797-1818), casou-se com Fernando VII de Espanha; uma filha natimorta. D. Pedro I do Brasil e IV de Portugal, Imperador do Brasil e Rei de Portugal (1798-1834), casado em primeiras núpcias com Maria Leopoldina de Áustria e em segundas com Amélia de Leuchtenberg; com descendência. D. Maria Francisca de Assis de Bragança (1800-1834), casou com Carlos de Bourbon, Conde de Molina; com descendência. D. Isabel Maria de Bragança (1801-1876); sem descendência. D. Miguel I de Portugal (1802-1866), casado com Adelaide de Löwenstein-Wertheim-Rosenberg; com descendência do casamento e com duas filhas naturais legitimadas. D. Maria da Assunção de Bragança (1805-1834); sem descendência. D. Ana de Jesus Maria de Bragança (1806-1857), casou com Nuno José Severo de Mendoça Rolim de Moura Barreto, 1º duque de Loulé; com descendência. Títulos, estilos, e honrarias. Títulos e estilos. (13 de Maio de 1767-11 de Setembro de 1788): Sua Alteza, O Infante Dom João (11 de Setembro de 1788-10 de Fevereiro de 1792): Sua Alteza Real, O Príncipe do Brasil, Duque de Bragança, etc. (10 de Fevereiro de 1792-14 de Julho de 1799): Sua Alteza Real, O Príncipe Regente em nome da Rainha. (14 de Julho de 1799-20 de Março de 1816): Sua Alteza Real, O Príncipe Regente. (20 de Março de 1816-7 de Setembro de 1822):
Sua Majestade Fidelíssima, El-Rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e dos Algarves. (7 de Setembro de 1822-10 de Março de 1826): Sua Majestade Fidelíssima, El-Rei de Portugal e dos Algarves (29 de Agosto de 1825-10 de Março de 1826): Sua Majestade Imperial e Fidelíssima, O Imperador Titular do Brasil. O estilo oficial de D. João VI enquanto Rei de Portugal: Pela Graça de Deus, João VI, Rei do Reino Unido de Portugal, Brasil e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Ao reconhecer a independência do Império do Brasil pelo Tratado do Rio de Janeiro, D. João VI passa a usar, por carta de lei de 15 de Novembro de 1825, o título de imperador do Brasil, que lhe fora deferido pelo seu filho: Pela Graça de Deus, João, Imperador do Brasil, e Rei do Reino Unido de Portugal e dos Algarves, d'Aquém e d'Além-Mar em África, Senhor da Guiné e da Conquista, Navegação e Comércio da Etiópia, Arábia, Pérsia e Índia, etc. Outros títulos e honrarias. D. João VI foi também o 8º Príncipe da Beira e do Brasil, o 21º Duque de Bragança, 18º Duque de Guimarães, 16º Duque de Barcelos, 20º Marquês de Vila Viçosa, 24º Conde de Arraiolos; 22º Conde de Ourém, de Barcelos, de Faria e de Neiva; Grão‑prior do Crato e Senhor da Casa do Infantado; Grão-mestre das ordens de Cristo, de Avis, de São Tiago da Espada, da Torre e Espada, de São João de Jerusalém, e Grão‑prior em Portugal; Grã-cruz das ordens de Nossa Senhora da Conceição de Vila Viçosa, de Carlos III, de São Fernando, de Isabel a Católica, do Espírito Santo, de São Luís, de São Miguel, da Legião de Honra, de Leopoldo, de Santo Estêvão, da Coroa de Ferro, de Santo André, de Santo Alexandre Nevsky, de Sant'Ana, do Elefante, do Leão Neerlandês, da Águia Negra; Cavaleiro da Ordem do Tosão de Ouro e da Ordem da Jarreteira, e serviu de Condestável no ato da aclamação de sua mãe, a rainha Dona Maria I. Rei Pedro IV de Portugal.
Rei Pedro IV de Portugal
(1826-1826)
Rainha Maria II de Portugal
(1826-1853)
Rei Miguel I de Portugal
(1828-1834)
Rei Pedro V de Portugal
(1853-1861)
Rei Luis I de Portugal
(1861-1889)
Rei Carlos I de Portugal
(1889-1908)
Rei Manuel II de Portugal
(1908-1910)
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