D. Sancho II
(Coimbra, 8 de setembro de 1209 – Toledo, 4 de janeiro de 1248), apelidado de "o Capelo" e "o Piedoso", foi o Rei de
Portugal de 1223 até ser deposto em 1247 por seu irmão mais novo D. Afonso III.
Era o filho mais velho do Rei D. Afonso II de Portugal e sua esposa a Rainha D.
Urraca de Castela.
Vida antes do Reinado.
D. Sancho II viria
a chefiar um Reino que atravessava uma profunda crise económica que já se tinha
feito sentir nos tempos do seu avô o Rei D. Sancho I, devido a uma série de
factores conjunturais e locais, como as más colheitas e consequente subida de
preços e fome, ou a escassez dos frutos de pilhagens e saques a potências inimigas
nos últimos anos do seu Reinado. Daí que em 1210 tenhamos registo do Rei D.
Sancho I, juntamente com o Conde Vasco Mendes, terem recorrido à pilhagem da
quintã de um dos seus próprios paisanos, Lourenço Fernandes da Cunha, para
enriquecer os Cofres Reais. Esta acção não parece ter sido isolada, e virá a
repetir-se, seguindo o exemplo Real. Neste ano conturbado crê-se ter nascido D.
Sancho II, provavelmente entre os dois últimos meses. O jovem D. Sancho esteve,
pelo menos durante esses primeiros anos do Reinado de Afonso II, debaixo da
tutelagem dos seus vassalos o Conde Martim Fernandes de Riba de Vizela e a Condessa
Estevainha Soares da Silva, casal nobre ligado por parentesco aos Condes de Sousa
e aos Condes de Lanhoso. D. Martim tinha sido Alferes do Rei em 1203, posição
que manterá até à morte deste, para subir, com D. Afonso II, ao Mordomado, no
mesmo ano em que este assume a Coroa. Parece contudo morrer em 1212, deixando Sancho,
que não podia ter mais de 2 anos, a cargo de sua mulher D. Estevainha. Em 1213,
através de uma doação feita por Donna Estevainha a um Mosteiro, sabemos que o
jovem Sancho se encontrava doente. Embora não se saiba ao certo, é provável que
Sancho tenha sido criado em Coimbra e na região do Entre Douro e Minho, e que
sua ama tenha sido Donna Teresa Martins, filha de Donna Estevainha. No verão de
1222, D. Afonso II já não confirma os diplomas por sua mão, uma manifestação
inequívoca de incapacidade, e D. Sancho, o Infante Herdeiro, estava ainda a um
ou dois anos da idade da robora. Numa perspectiva destas, o futuro do Reino Português
era, a um ano da Coroação de D. Sancho II, incerto, pelo menos o da linha de D.
Afonso II. Façamos referência ainda a D. Martim e a D. Pedro Sanches. D. Martim
era filho bastardo de Sancho I e meio-irmão do D. Pedro e do Rei Afonso II. D.
Pedro era o irmão mais novo do Rei Afonso II. O primeiro tinha feito uma Investida
Militar contra as Cidades de Braga e Guimarães, desbaratando a hoste Real, em
1220 e assim dando o exemplo para que, em Junho de 1222, o Rei Afonso IX de
Leão tomasse o Castelo de Santo Estêvão de Chaves, o segundo foi promovido
ilimitadamente na Corte Leonesa aquando da morte do seu irmão o Rei D. Afonso
II. Ambos foram revestidos de tenências de terras muito perto das fronteiras
portuguesas, e ambos representaram uma ameaça permanente nesta conjuntura para
a sobrevivência independente do então ainda jovem Reino Português.
Coroação.
D. Sancho II é Coroado
na Primavera de 1223, seu pai D. Afonso II tendo morrido excomungado pelo Papa
Honório III. Começava já com o pé esquerdo, visto que era filho de um casamento
que ia contra a «Lei Canónica, D. Afonso II e D. Urraca de Castela», e que era
menor, não tendo ainda atingido os catorze anos e possivelmente os treze. H.
Fernandes argumenta que o facto de nenhum Tutor ter sido seleccionado para
participar, Assinando, os Documentos saídos da Chancelaria do Rei D. Sancho II
durante a sua menoridade, e de se observar a ausência de um ritual de passagem
como a investidura na cavalaria que marca a entrada do Rei D. Afonso VIII na
posse Real do Reino de Leão, viriam a ajudar o argumento a favor da sua
deposição. Outra linha de argumento, utilizada por exemplo pelo Papa Honório
III em correspondência com o Monarca, leva em consideração a idade tenra e
primeira adolescência de D. Sancho II e realça o papel corruptor dos seus Conselheiros
Régios. Tornar-se-á um dispositivo recorrente nos discursos sobre Sancho
produzidos, muito para além dos primeiros anos do seu Reinado. Tanto um artifício
como o outro visam desculpabilizá-lo, ou simplesmente fazê-lo sobressair como
fraco e incapaz de Reinar.
Conflitos. Infantas
e Tias de D. Sancho II
Filhas e Herdeiras
de considerável feudo territorial de D. Sancho I, seu pai, estas tinham em
Donna Teresa, antiga Rainha de Leão, um líder incontestado, visto que parecia
querer assumir, tal como a sua rival Donna Berenguela, papel nuclear na política
do Ocidente Peninsular. As raízes do conflito remontam ao primeiro testamento
do Rei D. Sancho I, redigido em 1188, que disponibilizava os Castelos de
Alenquer, Montemor, Viseu, Guimarães e Santa Maria para a sua mulher a Rainha
D. Dulce e para as suas filhas e deixava à sua filha maior D. Teresa o Castelos
de Montemor e Cabanões, e à mais nova, D. Sancha, os Castelos de Bouças, Vila
do Conde e Fão. Há um detalhe que se revela logo de início capaz de semear a
discórdia, a concessão Hereditária feita a D. Teresa, de 12 anos, e a D.
Sancha, de 8 anos. Parece residir aqui um dos pomos fomentadores da discórdia
entre o Herdeiro D. Afonso e suas irmãs, na medida em que colocava nas mãos de
D. Teresa e de D. Sancha um Feudo Territorial de consideráveis dimensões,
correspondendo aos territórios dos Castelos. No seu segundo e último Testamento,
D. Sancho I reforça estas dotações prévias, D. Teresa ficando na posse dos
Castelos de Montemor e Esgueira, e D. Sancha com o Castelo de Alenquer, D.
Mafalda dos Mosteiros de Bouças e de Arouca e da Herdade de Seia que havia sido
de sua mãe. Logo nos primeiros meses do seu precoce Reinado, em 1223, o jovem
Rei D. Sancho assina um acordo com as tias para resolver esta querela,
dando-lhes tudo aquilo que o Rei D. Afonso II não lhes quisera reconhecer,
sobretudo os Castelos, conseguindo também a inclusão de D. Branca, não
contemplada no testamento de Sancho I, com bens imóveis, e agora transformada
em Herdeira de Teresa na parcela de Montemor e Esgueira. Vão somar ainda à
posse dos Castelos às Infantas Teresa e Sancha a muito elevada quantia de 4.000
morabitinos de ouro, anuais, a pagar sobre os direitos de Torres Vedras que
entre si devem dividir. Ficam assim com a totalidade das rendas de outro dos
centros urbanos mais significativos da Estremadura, contribuindo para cimentar
a sua influência numa área onde a Penetração Senhorial era reduzida e que
tradicionalmente fazia parte do domínio directo do Rei. Crê-se que tanto este
acordo como o celebrado pouco tempo depois com o Arcebispo de Braga Estêvão
Soares já tivessem sido planeados nos tempos finais do Rei D. Afonso II, mas
que, talvez devido à doença destruidora deste, se tinham posto de parte,
aguardando sua morte. O Rei D. Sancho II terá possivelmente planeado, uma ofensiva
com o objectivo de retomar estes castelos em 1231.
Conflitos. Com a
Igreja.
D. Martinho
Rodrigues, Bispo do Porto
O Rei D. Sancho I
teve dissensões com o Bispo do Porto por ter intervindo nas graves fracturas
que afectavam a relação do Bispo com os seus Cónegos e com a Elite da Cidade.
Assim é então que na Primavera de 1210 o Papa Inocêncio III troca
correspondência com o Bispo D. Martinho Rodrigues, tratando as graves opressões
e enormes injúrias, perpetradas sobre ele e os seus homens bem como alguns
cónegos que lhe tinham permanecido fiéis. A razão destes desacordos aparenta
ter sido o facto de D. Rodrigues não ter aceitado a proposta de D. Sancho de promover
a entrada solene e processional na cidade em benefício de seu filho D. Afonso,
porque o casamento deste com Urraca era ilícito face à Lei Canónica, que nesta
altura ainda restringia os casamentos até ao sétimo grau de parentesco. A
reacção do Rei D. Sancho I fora uma de violência formal ritualizada, nas
palavras de H. Fernandes, visto que foram destruídas as casas dos Cónegos fiéis
ao Bispo, forçadas as fechaduras das portas da Igreja, invadido o espaço
sagrado por indivíduos excomungados, sepultos os corpos mortos em interdito.
Como se isso não bastasse, D. Martinho Rodrigues foi ainda enclausurado com o
seu deão no Paço Episcopal durante cinco meses, de onde sairá, numa fuga
nocturna com destino a Roma, evitando assim a composição que o Rei D. Sancho II
o queria compelir a subscrever, mas pondo em risco os seus bens, confiscados
pelo Porteiro Régio para seu uso pessoal e do Rei. Aqui encontramos a génese
dos problemas que o Rei D. Sancho II virá a ter com o Bispo D. Rodrigues. Nos
anos de 1226, 1227 e 1228 a hostilidade entre Rei e Bispo agudiza-se, visto que
falhara a hipótese de expansão para o interior «Elvas» e o Rei voltava-se para
os centros urbanos e portuários do litoral. Para além de Braga, o Porto, por
concessão de D. Teresa, trisavó de D. Sancho II, era o único centro urbano com
alguma relevância no Reino que não tinha o Rei por Senhor. Enquanto se manteve,
esta situação provocou um prolongado conflito entre os cidadãos e o seu Bispo. O
que estava em causa era a jurisdição do Porto e algumas das rendas e direitos
do Bispo na sua diocese. Ao ignorar a doação feita pela sua trisavó, o Rei D.
Sancho II procurava apropriar-se de um senhorio e aumentar o Domínio Real, ampliando
a massa colectável. Em jogo estava também o controle dos benefícios
eclesiásticos e o incumprimento da doação das dízimas pelo Rei D. Afonso II às
Igrejas do Reino. Acusações parecidas podem ser verificadas no caso de Lisboa,
quando paróquias vagavam por morte do prior o Rei entregava-as a laicos
inúteis, estranhos e desconhecidos que não querem receber ordens do presbítero
e que nesse sentido ficam aquém das imposições canónicas. Segundo H. Fernandes
o sistema clientelar estava em causa, estando o direito de apresentar os
clérigos no centro das práticas de distribuição de benesses em que este se apoiava,
neste caso vendo-se a pressão do Rei não como incidindo directamente sobre os
rendimentos das igrejas mas sobre o direito de dispor deles a favor dos seus
homens em detrimento do Bispo. Em 1233 há novas queixas.
D. Estêvão Soares
da Silva, Arcebispo de Braga.
O D. Estêvão Soares
da Silva era um dos mais poderosos Metropolitas da Hispânia Ocidental, o mais
importante dos Bispos Portugueses. Os conflitos da Coroa com este clérigo
remontam ao ano de 1219, ainda durante o Reinado de Afonso II. Em Agosto de
1220 D. Afonso promove no Território do Arcebispado a primeira de numerosas
inquirições que o século de 1200 verá, atingindo o Arcebispo assim no coração
da sua área de influência. Este processo visava robustecer os Direitos Reais,
principalmente no Norte Arquiepiscopal, segmento do Reino que D. Afonso pior
controla e que há quase dois séculos era palco de um processo Senhorializador,
usufruindo de benefícios como isenções fiscais. Assiste-se então a uma violenta
disputa, que envolve a destruição dos bens do Arcebispo perpetrada pelos Cavaleiros
de Coimbra e de Guimarães, Vassalos do Rei e que forçará D. Estêvão Soares ao
exílio, lançando o Rei na Excomunhão e o Reino em Interdito. O Papa Honório III
pede ajuda ao Rei de Leão, Afonso IX, tendo já enviado uma série de missivas a
prelados desse Reino e do de Castela, para conseguir apoio em favor de D.
Estêvão Soares. Nota-se, nas palavras de H. Fernandes, que a lisonja utilizada
em referência ao Monarca Leonês serve evidentes desígnios políticos Papais,
deixando a pairar a legitimidade ou pelo menos a promessa de um silêncio
cúmplice por parte do pontífice, no caso de uma intervenção Leonesa em Território
Português. Ameaça ainda o Rei D. Afonso II de invalidar o seu Reino, tornando-o
assim vulnerável a conquistas por outros Reis Católicos. De facto, com o acordo
assinado em mês incerto de 1223, D. Sancho fizera a paz com D. Estêvão Soares,
tanto mais que este não defende o Bispo do Porto na sua contenda com o mesmo, e
deixa ainda, em testemunho em 1228, 1.000 Morabitinos ao Rei, que este ainda
lhe devia dos 6.000 que se obrigara a pagar no acordo de cinco anos anteriores.
D. Soeiro Viegas,
Bispo de Lisboa.
Um dos principais
responsáveis pelo Cerco do Castelo de Alcácer do Sal, D. Soeiro já tinha
contenda com o Rei Afonso II. As razões, segundo os Diplomas Papais, são a
apropriação do direito de padroado, o que lhe permitira colocar nos benefícios
eclesiásticos indivíduos da sua clientela, proibição do Bispo construir Mosteiros,
Igrejas e Capelas, provavelmente para impedir a proliferação de instituições
que escapassem a esse mesmo direito Padroado Régio, desprezo pela autoridade da
Igreja para ministrar sacramentos, ignorando as excomunhões já lançadas e
intervindo junto dos Habitantes de Santarém, a outra grande Cidade do Bispado,
para que não se fizessem absolver, violação das imunidades eclesiásticas,
obrigando os clérigos a pagar direitos de «vacas, porcos, carneiros» ignorando
o Foro Judicial e Eclesiástico, coagindo-os ao serviço militar, de hoste, aos
encargos de manutenção das torres, muralhas e guarda delas, assaltando-lhes
enfim as casas, sob o pretexto de procurar aí mulheres, barregãs, costume
interdito pela Ordenação Régia, por último acusando o Rei de ignorar
ostensivamente as determinações do «IV Concílio de Latrão» que segregava social
e fisicamente os Judeus, minoria que o Monarca, D. Afonso II e, na sua esteira,
o Rei D. Sancho II, continuava a privilegiar, protegendo-os da prática do uso
dos sinais distintivos e do interdito de os cristãos comerciarem com eles, perseguindo
por isso o Bispo a quem negava a dízima e preferindo os Judeus aos Cristãos nos
Ofícios Régios. Infamante entre todas, a utilização dos serviços de Judeus e Mouros
como autores materiais dos ataques contra a Igreja. Segundo H. Fernandes estas
queixas são quase padronizadas, como o próprio Papa reconhece, a situação sendo
similar à que opusera poucos anos antes o Arcebispo de Braga D. Estêvão Soares
ao Rei D. Afonso II. Dois anos antes, em Março de 1222, o Papa Honório II
entendera por bem escrever aos priores dos dominicanos, franciscanos e da Ordem
de Santiago na diocese de Lisboa, dando-lhes plenos poderes para que usassem da
sua discrição e entendimento para pôr cobro aos abusos do Bispo Olisiponense D.
Soeiro Viegas. As acusações às quais o Papa dera inteiro crédito eram
referentes ao Bispo e os prelados das igrejas incorrerem em práticas de
extorsão, recusando ministrar os sacramentos a quem não lhes deixasse em Testamento
a terça ou uma determinada parte dos seus bens. Talvez houvesse portanto um
conflito aberto entre a Oligarquia Urbana e o Bispo que tenha permitido ou pelo
menos potenciado os ataques que este tinha vindo a sofrer por parte do Rei. O
prolongamento deste conflito resultará no lançar do Interdito sobre o Reino Português
no ano de 1231 por um grupo de Juízes da Sé Apostólica.
Reconquista.
Contrariamente ao
que durante muito tempo a historiografia tradicional portuguesa se esforçou por
indicar, o Rei D. Sancho II não era um capaz Chefe Militar, e tampouco
participou de forma activa das conquistas que se deram ao longo do Guadiana a
partir do ano de 1230. O Castelo de Elvas aparenta ter sido tomado "pela graça do salvador",
portanto sem a intervenção do Rei D. Sancho II, ocupado quase que por sorte,
sem confronto militar. Este padrão repetir-se-á, por exemplo, com Beja. De
certa forma, a Reconquista é impulsionada pelo Papa Gregório IX, que, em 1232,
concede ao Rei D. Sancho II que não pode ser excomungado sem mandado especial
da Santa Sé, desde que persista na guerra contra os Sarracenos, e que portanto
nenhum dos seus Bispos o possa excluir da comunidade cristã. Estas absolvições
continuaram, vendo-se em Junho de 1233 uma por violências cometidas por D. Sancho
II sobre clérigos "com a sua mão e
com um bastão". Embora várias Cidades no Algarve e no Alentejo tenham
sido conquistadas durante o Reinado de Sancho II, este trabalho é protagonizado
quase exclusivamente pelas Ordens Militares, como a Ordem de Santiago, que
recebeu como pagamento dos serviços prestados diversas povoações, tais como
Aljustrel, Sesimbra, Aljazar de Pena, Mértola, Aiamonte e Tavira, facto que
porá o Rei D. Sancho II cada vez mais dependente delas. Concentra-se em
utilizá-las também para povoar as regiões desertas, outra missão pontifícia,
doando-lhes Terras e Castelos à medida que vão conquistando. Foram emitidas, em
1234 e 1241, Bulas Papais de Cruzada para o Reino de Portugal. Em 1241, o Rei
D. Sancho II casa com a D. Mécia Lopes de Haro.
Excomunhão
A 16 de agosto de
1234, o Rei D. Sancho II é excomungado pelo mesmo Comité de Juízes Pontifícios
que lançara o Interdito em 1231, reunido em Ciudad Rodrigo. Era a consequência
natural da Bula Si quam horribile do
ano anterior. O eterno e cada vez mais omnipotente chanceler do Rei D. Sancho
II, o Mestre Vicente, é enviado em missão à Cúria Pontifícia, conseguindo assim
minorar os efeitos da excomunhão sobre a autoridade do Rei D. Sancho II,
prolongando assim o seu Reinado.
Guerra Civil,
Deposição e Morte.
O isolamento
político do Rei D. Sancho II começa provavelmente em 1232, estando o Reino com
conturbações internas. O Rei D. Afonso de Castela entra nesse ano pelo Norte do
Reino em defesa do Rei D. Sancho II. Resigna também em Roma o Bispo de Coimbra
D. Pedro, aliado do Rei D. Sancho II. D. Afonso, irmão mais novo do Rei D.
Sancho II, denuncia em 1245 o casamento do Rei D. Sancho II com D. Mécia. Nesse
mesmo ano a Bula Inter alia desiderabilia
prepara a deposição de facto do monarca. O Papado, através de duas Breves,
aconselha Don Afonso, Conde de Bolonha, a partir para a Terra Santa em Cruzada
e também que passe a estar na Hispânia, fazendo aí guerra ao Islão. A 24 de
julho, a Bula Grandi non immerito
depõe oficialmente o Rei D. Sancho II do Governo do Reino, e Don Afonso, Conde
de Bolonha torna-se Regente do Reino de Portugal. Os Fidalgos levantam-se
contra o Rei D. Sancho II, e D. Afonso cede a todas as pretensões do clero no
Juramento de Paris, uma assembleia de prelados e nobres portugueses, jurando
que guardaria todos os privilégios, foros e costumes dos municípios,
cavaleiros, peões, religiosos e clérigos seculares do Reino. Abdicou
imediatamente das suas Terras Francesas e marchou sobre Portugal, chegando a
Lisboa nos últimos dias do ano. Em 1246, D. Afonso segura as Cidades e Castelos
de Santarém, Alenquer, Torres Novas, Tomar, Alcobaça e Leiria. O Rei Don Sancho
II fortifica-se em Coimbra. As Cidades e Castelos da Covilhã e da Guarda ficam
nas mãos de D. Afonso. O Rei Don Sancho II procura a Intervenção Castelhana na
guerra civil, depois da conquista de Jaén. Assim, o Infante D. Afonso de
Castela entra em Portugal por Ribacôa a 20 de dezembro, tomando os Castelos e
Cidades da Covilhã e da Guarda e devastando o Termo de Leiria, derrotando a 13
de janeiro de 1247 o Exército do Conde de Bolonha. Apesar de não ter perdido
nenhuma das Batalhas contra o irmão do Rei de Portugal, Don Afonso de Castela
decide abandonar a empresa, levando consigo para Castela El-Rei D. Sancho II,
visto que a pressão da Santa Sé aumentava. Embora no Minho continuem
partidários do Rei D. Sancho II e fiquem no terreno as Guarnições Castelhanas
no Castelo de Arnóia (seu grande apoiante e anticlerical), o caso encontra-se
perdido. O Rei D. Sancho II redige o seu segundo e último Testamento enquanto
exilado em Toledo a 3 de Janeiro de 1248, e morre a 4 desse mesmo mês. Julga-se
que os seus restos mortais repousem na Catedral de Toledo. Afonso III
declara-se Rei de Portugal em 1248, já após a morte do seu irmão mais velho,
Sancho.
D. Martim de
Freitas, Alcaide de Coimbra, faz abrir o túmulo do Rei Don Sancho II para
verificar a sua morte.
Conclusões.
Na medida em que os
conflitos com o clero ocorriam a uma escala maior que a do Reino Português,
eles demonstram uma linha de oposição entre um modelo de sociedade teocrática,
tal como o Papado desde o Papa Gregório VII o vinha propondo e um outro, menos
definido, mas que tem o poder dos Príncipes como centro e que a recuperação do Legado
Romano virá contribuir para unificar em torno de bases ideológicas mais
sólidas. Conflito entre o Rei e os Bispos, destes com os seus cabidos,
intervenções Papais, tudo parece convergir num ponto onde os interesses
casuísticos dos grupos se encontram com processos de longa duração que afectam
a própria organização social urbana. Mencione-se ainda que as sequelas destas
conturbações prolongar-se-ão durante o tempo em que outros estão nos cargos de
Bispo acima mencionados. Os vestígios escritos da Chancelaria do Rei Don Sancho
II oferecem um grande número de lacunas por vezes extensas, por exemplo de 1229
a 1235, o que H. Fernandes julga ser fruto de uma provável destruição desta
documentação pelo irmão e futuro Rei Afonso III. Até ao ano de 1236, o Mestre
Vicente é Chanceler do Rei, Maestro da Política Régia, detendo assim um cargo
importante. De 1236 em diante, o Rei Don Sancho II traz frequentemente os seus Físicos
na Corte, sinal de que provavelmente já se encontrava doente. As pilhagens a
partir de 1236 são protagonizadas por Bandos de Fidalgos com os seus homens. José
Mattoso, no seu artigo sobre a "Crise
de 1245", fala numa crescente agitação social, dando para esta a
justificação de um crescimento demográfico desequilibrado em relação à expansão
territorial. Fala-se também num desequilíbrio conjuntural que impulsiona também
o banditismo generalizado, praticado por marginais e não só, havendo também
acesas lutas entre Nobres e o Clero. Longe de aparecer como um Rei fraco ou Rex Inutilis, em diversas alturas do seu
Reinado, Don Sancho II mostrou ter um braço de ferro para tomar posições
difíceis, como retaliações sobre os não-cooperantes, a ofensiva sobre os bens e
benefícios eclesiásticos, o teste constante da fidelidade que havia ao monarca,
entre outros exemplos, seguindo assim um pouco a veia do seu Pai Falcão.
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