quarta-feira, agosto 06, 2014

Batalhas e Combates-1740

Costa do Canará
(Janeiro de 1740)


A 5 de Março de 1739 o Bounsuló invadiu subitamente o distrito de Bardês que ocupou em poucos dias, ficando os portugueses encurralados nas fortalezas da Aguada e dos Reis Magos. Com a fortaleza de Rachaol também cercada e o distrito de Salcete ocupado pelos Maratas, à exepção do planalto de Mormugão, e sem tropas suficientes para guarnecer devidamente todas as obras defensivas, parecia que os dias de Goa estavam irremediavelmente contados. A 8 de Março o Vice-Rei, Conde de Sandomil, deu ordem para que as mulheres e as crianças de origem europeia e os religiosos fossem evacuados para a fortaleza de Mormugão. A 10, depois de ouvido o Conselho de Estado, propôs aos Maratas o início de negociações com vista a pôr termo à guerra. Embora com reluntância, estes aceitaram. O argumento utilizado pelos nossos delegados nessas negociações foi o de que, uma vez reduzidos às fortalezas, nos poderiamos aguentar nelas indefinidamente com os reforços que fossem sendo recebidos do Reino, que a guerra se arrastaria por muito tempo, com o que as populações sofreriam grandes privações sem proveito para ninguém, que por isso se impunha negociar uma paz justa! Na situação em que se encontrava Goa tal argumentação era pouco convincente, mas o que é facto é que os generais maratas concordaram em suspender por uns dias as hostilidades e discutir o assunto. Para a sua decisão é possível que tenham contribuido a apoximação da «monção», que tornava muito dificil o abastecimento de grandes exércitos, a eventual necessidade de deslocar o exército estacionado nas proximidades de Goa para outro teatro de operações mais importante, a vantagem de conservar aberta uma porta por onde os Maratas sempre iam recebendo algumas armas e munições de origem europeia de que tanto careciam para a guerra contra os Ingleses. A principal exigência dos delegados maratas às negociações de paz era a entrega de Baçaim e de toda a «Província do Norte». De inicio os delegados portugueses recusaram. Mas, perante a intransigência dos Maratas acabaram por ceder. No entanto, estes não insistiram mais no assunto por terem recebido informações de que a referida praça estava prestes a render-se. Em seu lugar passaram a exigir uma avultada indemnização em dinheiro. Caindo as negociações num impasse, recomeçou a guerra. Mas foi por pouco tempo. Sem forças suficientes para defender o vasto perimetro da ilha de Goa os portugueses acabaram por ceder, submetendo-se a todas as exigências do inimigo num último esforço para salvar a capital do Estado da Índia. E a 2 de Maio de 1739, na povoação de Raya perto de Rachol, foi assinado um tratado de paz, segundo o qual, a troco do pagamento de uma elevada indeminação, os Maratas se comprometiam a pôr termo à guerra e a devolver-nos o distrito de Salcete. No mesmo tratado ficou consignado que o Bounsuló também sairia do distrito de Bardês. Ao fim e ao cabo era a reposição do "statu quo" anterior a troco de dinheiro. Nas circustâncias aflitivas em que se encontrava Goa era o melhor que se podia conseguir.


Em Boçaim o desfecho não foi tão feliz. A 16 de Maio de 1739, após um cerco de três meses que custou a vida a oitocentos dos nossos soldados e a doze mil maratas a praça capitulou. Magnânimo o general marata concedeu que o restava da sua guarnição saisse de bandeiras desfraldadas, armas ao ombro e tocando tambores e que fosse transportada por mar para Bombaim. Na sequência da tomada de Boçaim os Maratas apoderaram-se da ilha de salcete. Da orgulhosa «Província do Norte» só nos deixaram Damão, de que aliás, ocuparam sete das suas praganas (espécie de freguesias rurais). A noticia da perda de Bonçaim só chegou a Goa em fins de Julho. Entretanto Chaul conseguira aguentar-se. Desde Março de 1739 que esta cidade e a fortaleza do Morro estavam a ser flangeladas por tropas maratas destacadas do exército que tinha invadido a «Província do Norte». Mas até então todos os seus ataques haviam sido repelidos. A chegada da «monção» obrigou os Maratas a retirar. Por essa altura Chaul não tinha para nós qualquer interesse económico ou militar. Pelo contrário era um peso morto que só conseguia sobreviver à custa do dinheiro que lhe era enviado de Baçaim. Perdida esta a estando o Estado da Índia em sérias dificuldades de ordem financeira por causa do pagamento da indeminazação aos Maratas não havia possibilidade de conservar Chaul. A nosso ver sensatamente, o Conde de Sandomil ordenou ao general do Norte que em vez de levar para Chaul o que restava da guarnição de Boçaim a fizesse regressar a Goa. Ao mesmo tempo tentou vender Chaul aos Ingleses ou aos Sidis, mas nem uns nem outros, com medo dos Maratas se mostraram interessados. Quem a desejava era o Angriá. No entanto com este não quis o Vice-Rei negociar por ser um dos piores inimigos do Estado. Ao contrário do que ficara estipulado no Tratado de Raya, o Bounsuló não saiu das terras de Bardês. Com base nisso os Portugueses suspenderam o pagamento da indemnização a que se tinham obrigado e, em represália, os Maratas suspenderam a evacuação do distrito de Salcete, recusando-se a entregar-nos as povoações de Cuncolim e Assolná. Em Setembro de 1739 chegaram a Goa duas Naus de guerra do Reino. Com os reforços por elas levados pôde o Vice-Rei lançar uma ofenciva de certa envergadura contra os Bounsulós que os levou a retirar de Bardês. Mas nem por isso o problema ficou resolvido, uma vez que aqueles retaliaram com frequentes incursões de cavalaria ao nosso território, que ficou transformado numa espécie de terra de ninguém. Foi neste complexo contexto politico-militar que em finais de 1739 foi enviada para a costa do Canará sob o comando de Luis Vieira Matoso, uma esquadra constituida por duas Palas e duas Gálias escoltando Treze Parangues encarregados de trazer arroz para Goa. (As Gálias eram pequenos navios de vela e remo semelhantes às Galvetas, armados com seis ou oito peças de pequeno calibre.) Segundo parece, terá sido posteriormente mandada seguir para Mangalor uma Fragata não sabemos qual, a fim de reforçar a esquadra de Vieira Matoso no seu regresso a Goa. Mas, possivelmente, as relações de Comando entre estes e o comandante da Fragata não terão sido claranente definidas. Em Janeiro de 1740, em dia que os cronistas não indicam, Vieira Matoso provavelmente ao fim da tarde deixou Mangalor com a sua esquadra e os treze parengues que levava à sua guarda, convencido de que a fragata o seguiria. Mas não foi isso que aconteceu. Talvez porque não estivesse pronto para se fazer ao mar ou porque tivesse ficado melindrado por não ter sido devidamente avisado, o que é certo é que o comandante da fragata continuou em Mangalor. No dia seguinte ao amanhecer verificou Vieira Matoso com supresa que a Fragata não o acompanhava. A nosso ver deveria ter voltado desde logo para trás a fim de esclarecer a situação. Mas não o fez. Possivelmente por uma questão de orgulho decidiu continuar em frente, dando a sí próprio a desculpa estúpida de que se viesse a acontecer alguma coisa de mau a responsabilidade não era sua. Pela tarde começaram a avistar-se muitas velas pela proa. Era a esquadra do Sambagi Angriá constituida por seis Palas e nove Galvetas. Mais uma vez pensamos que Vieira Matoso deveria ter invertido imediatamente o rumo e tentar alcançar Mangalor, tanto mais que a Fragata que lá tinha deixado já poderia vir a caminho. Em vez disso, o que fez foi afastar-se para o mar na presunção de que a coberto da escuridão da noite seria capaz de despistar os maratas. Mas estes eram hábeis marinheiros e dispunham de muitos navios, pelo que não é de admirar que cerca da meia-noite tenham conseguido localizar o nosso comboio que foram seguindo até ao romper do dia. Quando principiou a clarear, vendo atrás de si toda a esquadra marata Vieira Matoso deu ordem aos Parangues, acompanhados por duas Gálias para continuarem a viagem para Goa, ao mesmo tempo que com as duas Palas se atravessava no caminho dos navios inimigos na esperança de os conseguir entreter durante o tempo suficiente para que aqueles pudessem escapar. Mas o seu sacrificio cedo se revelou inútil. Ao fim de pouco tempo de combate a sua própria Pala, açoitada por um vendaval de pelouros maratas, estava com o aparelho feito em pedaços e com o convés juncado de mortos e feridos. A outra Pala só não teve a mesma sorte porque se pôs vergonhosamente em fuga logo no inicio do combate. Mas o expediente de nada valeu porque foi rapidamente alcançado pelos navios maratas, aos quais se rendeu, o mesmo acontecendo com as Gálias e os Parengues. Em face deste descalabro Vieira Matoso rendeu-se também. Neste infeliz combate tiveram os portugueses apenas quatro mortos e cerca de duzentos prisioneiros o que mostra bem a frouxidão com que se bateram. O mesmo por certo não teria acontecido se tivessem tido em sua companhia a Fragata que ficara em Mangalor. De resto, a perda das duas Palas e das duas Gálias, por muito dolorosa que tenha sído para o nosso orgulho, pouco efectou o potencial da nossa esquadra da Índia, que era composta por meia dúzia de Naus e Fragatas e possivelmente, por uma dezena de navios ligeiros. Mais falta deve ter feito o arroz transportado pelos Parangues.


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