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domingo, setembro 29, 2013

Os Tratados de Portugal




Um Tratado é um acordo resultante da convergência das vontades de dois ou mais sujeitos (Reis ou normalmente, representantes deles), formalizada num texto escrito, com o objetivo de produzir efeitos jurídicos. Em outras palavras, o Tratado é um meio pelo qual, estipulam direitos e obrigações entre as partes envolventes. Com o desenvolvimento das relações entre as nações, os tratados, os costumes e os princípios norteadores de Direito, tornaram-se as principais fontes do Direito Internacional existente, que celebram um determinado tratado, são chamados ‘Partes Contratantes’ (ou simplesmente ‘Partes’) a este tratado. 

Embora a notícia de outros tratados do início da civilização tenha chegado até os dias de hoje, o seu mais antigo registro seguro é o acordo de paz celebrado entre Hatusil III, Rei dos Hititas, e Ramsés II, Faraó Egípcio. Este acordo, que ficou conhecido como Tratado de Kadesh’, foi celebrado por volta de 1280 a 1272 a.C. e pôs fim à guerra nas terras sírias.

Até o século XIX a maioria dos tratados era bilateral, embora ocasionalmente alguns acordos pudessem envolver mais de um país, e todos davam-se entre Estados. A prática internacional registra, o uso livre dos diversos sinónimos da palavra ‘Tratado’ (convenção, acordo, protocolo etc.) A rigor, do ponto de vista jurídico, tais nomes importam pouco e não são aplicados de maneira coerente. Existe, porém, em alguns casos, o hábito, nem sempre seguido, de se atribuir a certos tratados nomes específicos, como por exemplo:

•         Convenção: costuma ser multilateral (dela participa um número considerável de países) e dispor acerca das grandes províncias ou dos grandes temas do direito internacional, como a ‘Convenção de Viena’.

•         Acordo: usualmente bilateral ou plurilateral, pode ser também multilateral, é um termo genérico para tratado.

•         Protocolo: costuma ser um ‘Tratado Acessório’ a, ou resultante de, um ‘Tratado Principal’.

•      Concordata: é o tratado, celebrado entre um Estado, e a Santa Sé, como a Concordata de Bolonha.

•            Tratado: costuma dar nome a actos especialmente solenes.

•    Carta ou Constituição: costuma, designar Tratados constitutivos, de organizações internacionais.

A proliferação de sinónimos pode causar uma certa confusão quanto à natureza jurídica do texto. Por exemplo, diante de um texto denominado ‘Memorando de Entendimento’ celebrado entre dois Estados, o analista pode indagar se se trata de um tratado ou apenas de uma declaração de boa vontade. Será um tratado se estipular direitos e obrigações e se estiver claro que as Partes o celebraram com o intuito de vincular-se (obrigatoriamente) às suas disposições.

São Condições de Validade dos Tratados Internacionais:

•        Capacidade das Partes Contratantes.

•        Habilitação dos agentes signatários.

•        Consentimento mútuo.

•        Formalidade.

•        Objecto lícito e possível.

Somente aos territórios nacionais e independentes se reconhece o chamado direito convencional. Em outras palavras, como regra geral, apenas os Estados nacionais e a Santa Sé podem celebrar tratados. As nações podem celebrar tratados desde que o seu ato constitutivo o autorize. A Santa Sé, embora não seja um Estado nacional na definição clássica, exerce, tradicionalmente, o direito convencional. Alguns juristas entendem que os beligerantes e os insurgentes só podem concluir tratados sobre o conflito em que estejam envolvidos. O Poder Régio concede uma autorização formal para que seus agentes negociem e concluam um tratado, chamada ‘plenos poderes’.



Os agentes signatários também são chamados de "plenipotenciários". Os actos relativos ao tratado, tomados por pessoa sem plenos poderes, não têm efeito legal, a não ser que o respectivo Estado os confirme. A "carta de plenos poderes" é o instrumento que contém esta autorização e deve ser trocada pelos agentes signatários, no caso de um tratado bilateral, ou depositada junto a um Estado ou organização internacional (‘depositário’), no caso de tratado multilateral. Os Chefes de Estado e de Governo e os Ministros do Exterior estão dispensados da apresentação dos plenos poderes. A convergência das vontades das Partes é essencial à existência do tratado (da mesma forma que para um contrato em direito civil ou comercial). A vontade das Partes deve ser expressa de maneira formal, motivo pelo qual é obrigatória a forma escrita. Também essenciais à conformação do tratado são os efeitos jurídicos que as Partes desejam produzir com a sua celebração. O tratado só é tratado se gerar direitos e obrigações para as Partes Contratantes, no que os juristas chamam de ‘animus contrahendi’, a vontade de obrigar-se ou de vincular-se.

Evidentemente, a vontade das Partes deve estar livre de qualquer vício, como o erro, o dolo e a coacção. Qualquer destes vícios pode ser invocado como causa de nulidade de um tratado. Como qualquer outro acto jurídico, o objecto do tratado deve ser lícito e possível, sem o que o tratado é considerado nulo. Com relação à licitude do objecto, considera-se nulo o tratado cujo objecto conflite com uma regra imperativa de direito internacional geral, isto é, “uma norma aceita e reconhecida pela comunidade internacional dos Estados como um todo, como norma da qual nenhuma derrogação é permitida e que só pode ser modificada por norma ulterior de Direito Internacional geral da mesma natureza”.



Os tratados podem ser bilaterais (duas Partes) ou multilaterais (mais de duas Partes). Alguns juristas distinguem, ainda, os tratados plurilaterais (mais de duas Partes), reservando o termo ‘multilateral’ ao tratado com grande número de Partes. Alguns juristas classificam os tratados em normativos e contratuais, segundo produzam norma de conduta para as Partes (‘tratado-lei’) ou apenas resultem num negócio jurídico (“tratados-contrato”). Outros negam validade a este tipo de distinção. Os juristas distinguem os tratados em sentido estrito dos acordos em forma simplificados. Aqueles apresentam mais de uma fase entre a assinatura e a ratificação; estes têm apenas uma fase (a assinatura já torna o tratado obrigatório). Se devidamente celebrado e ratificado, o tratado gera direitos e obrigações para as Partes Contratantes. Ou seja, a partir da ratificação, o tratado é obrigatório para as Partes. Em alguns países, o seu direito constitucional exige ainda um passo adicional para que os termos do tratado sejam aplicáveis pelos órgãos internos do Estado: a promulgação.



Como regra geral, o tratado não pode aplicar-se a Estados que dele não fazem parte: ‘pacta tertiis nec nocent nec prosunt’. Os juristas usualmente identificam as seguintes fases para a conclusão de um tratado internacional:

•        Negociação.

•        Assinatura.

•        Procedimento interno, se cabível.

•        Ratificação.

•        Promulgação.

•        Publicação.

•        Registro.



Negociação

É a primeira fase do processo de conclusão de um tratado, da competência exclusiva do Poder Executivo. Ao término desta fase, existe um texto escrito que é consensual e que pode ser rubricado pelos negociadores. A rubrica não é assinatura, mas apenas autentica o texto negociado. Nesta fase inicial, as Partes procuram elaborar o texto convencional, por meio de propostas de redacção.

Assinatura

A assinatura é um acto que autentica o texto do tratado mas não o torna imediatamente obrigatório para as Partes. A assinatura faz-se, via de regra, sob reserva de ratificação, é necessário um acto adicional e posterior (usualmente chamado ‘ratificação’) que comunique a vinculação do Estado aos termos do tratado. O critério da Parte Contratante, a sua assinatura pode desde já vinculá-la juridicamente. A assinatura marca o início do prazo (se houver) para depósito dos instrumentos de ratificação. Assina o tratado, em nome do Estado que representa, o agente que estiver munido de plenos poderes. A competência para conceder os plenos poderes costuma ser do Poder Executivo. Há uma obrigação particular que decorre da assinatura do tratado, mesmo que ainda não tenha ocorrido a ratificação e a entrada em vigor. Trata-se da obrigação de não frustrar o objecto e finalidade de um tratado antes de sua entrada em vigor.

Procedimento interno

A assinatura sob reserva de ratificação (a mais comum) permite o início do procedimento interno de aprovação do tratado. É a fase na qual os órgãos internos do Estado apreciam o teor do tratado e o aprovam ou o rejeitam. O Poder Executivo é livre para ratificar o tratado quando lhe convier, em outros Estados, ainda, á a necessidade de aprovação legislativa existe para alguns tipos de tratado, e não para outros. Em geral, o Poder Executivo detém a prerrogativa de decidir quando enviar o tratado para apreciação legislativa.

Ratificação

A ratificação é o ato pelo qual uma Parte Contratante informa à (s) outra (s) que se considera doravante obrigada aos termos do tratado no plano internacional. Pode ocorrer que o tratado não entre em vigor neste momento, caso o seu texto estipule uma condição adicional para tanto. A ratificação é um ato discricionário, isto é, a Parte Contratante decide livremente sobre a sua conveniência e oportunidade. No plano interno dos Estados, costuma ser ato (também discricionário) do Poder Executivo. Uma vez concluídos os procedimentos internos, o Executivo costuma ter a prerrogativa de decidir quando ratificar o tratado e o fará se assim o desejar. No caso dos tratados bilaterais, as Partes Contratantes trocam os respectivos instrumentos de ratificação; no caso dos tratados multilaterais, os instrumentos de ratificação são depositados junto a uma das Partes ou a uma organização internacional para tanto designada.

Promulgação e Publicação

O direito de alguns Estados exige, ainda, para que o tratado seja obrigatório para os seus órgãos internos, a promulgação. Esta é o ato jurídico, de natureza interna, pelo qual o governo de um Estado atesta a existência de um tratado devidamente ratificado e ordena a sua execução no seu território. A partir de então, o tratado é obrigatório também no plano interno. Cabe ressaltar a diferença, em termos práticos, entre os efeitos da ratificação e os da promulgação. Se um Estado ratifica um tratado mas não o promulga (e o seu direito constitucional exige a promulgação), o texto convencional lhe é obrigatório no plano internacional mas não no plano interno. Neste caso, o Estado em questão pode ver-se na posição de ser cobrado nas suas obrigações convencionais pelas demais Partes Contratantes, mas acontecer de um de seus órgãos internos recusar-se a aplicá-las por falta de promulgação. Nasce, então, uma situação de responsabilidade internacional da parte do Estado faltoso. Já a publicação é pré-requisito para a aplicação do tratado pelos órgãos internos do Estado e é adoptada por todos os países, com ligeiras diferenças de procedimento entre si.

Registro

O registro advém do princípio que condena a diplomacia secreta. Outras organizações internacionais também podem exigir o registro de tratados sobre certos assuntos.

A reserva é uma declaração unilateral da Parte Contratante, expressa no momento do consentimento, com o objetivo de excluir ou modificar o efeito jurídico de uma ou mais disposições do tratado em relação àquela Parte Contratante. Em outras palavras, a Parte, ao assinar ou ao ratificar o tratado, pode informar às demais Partes que:

•         Não se considera vinculada a uma ou mais disposições.

•        Considera que certas disposições lhe são aplicáveis de uma maneira específica, explicada no momento da reserva.

A reserva é a consequência de pequenos desacordos sobre o texto do tratado que não ameaçam o espírito deste; neste caso, por vezes, para a Parte é mais vantajoso acatar o texto como está e fazer uma reserva a uma disposição que lhe desagrade do que rejeitar o tratado inteiro. Em geral, a reserva é cabível em tratados plurilaterais ou multilaterais, não bilaterais. Nos acordos bilaterais, a falta do consenso completo inviabiliza o texto. Caso uma Parte discorde das reservas apresentadas por outra Parte, a primeira pode oferecer uma objecção. Neste caso, compete à primeira indicar se considera o tratado, em vigor entre si mesma e a segunda Parte. É lícito que o tratado proíba, limite ou condicione o oferecimento de reservas ao seu texto.

Os Tratados Extinguem-se Por:

•        Vontade das Partes ou ab-rogação: exige, em princípio, a vontade comum de todas as Partes Contratantes naquele momento vinculadas aos termos do tratado (a não ser que o tratado contenha previsão de ab-rogação por maioria).

•      Tratado superveniente sobre o mesmo assunto e que reúna todas as Partes do tratado anterior.

•      Superveniência de "norma imperativa de direito internacional geral (jus cogens)".

•      Vontade unilateral ou denúncia.

A denúncia é o acto unilateral pelo qual uma Parte Contratante manifesta a sua vontade de deixar de ser Parte no tratado. A rigor, a denúncia pode não extinguir o tratado, pois a saída de apenas uma Parte não afecta um tratado que tenha, originalmente, mais de duas Partes. Já a denúncia a um tratado bilateral necessariamente o extingue. Caso um tratado contenha disposições processuais acerca da denúncia, basta à Parte Contratante segui-las para desobrigar-se do texto convencional. Mesmo que o tratado nada diga a respeito, é lícito à Parte denunciá-lo, cabendo discutir apenas se existiria um prazo entre a denúncia e os seus efeitos. Não é lícito denunciar um tratado que contenha cláusula temporal (que proíbe a denúncia por certo período de tempo) nem o que fixa fronteiras e limites entre Estados (o que alguns juristas chamam de ‘situações jurídicas estáticas’).

Tratado de Alcanizes
(12 de Setembro de 1297)



O tratado de Alcanizes (em língua castelhana, Alcañices) foi assinado entre os soberanos de Leão e Castela, Dom Fernando IV, Rei desde 1295 a 1312, e de Portugal, Dom Dinis, Rei de 1279 a 1325, a 12 de Setembro de 1297, na povoação leonesa-castelhana de Alcanizes.



Por ele se restabelecia a paz, fixando-se os limites fronteiriços entre os dois Reinos. Em troca de direitos portugueses nos termos raianos de Aroche e de Aracena, passavam para a posse definitiva de Portugal:

•        Campo Maior

•        Olivença

•        Ouguela

•        São Félix dos Galegos

E em troca de direitos portugueses nos domínios de Aiamonte, Esparregal, Ferreira de Alcântara e Valença de Alcântara, e outros lugares nos Reinos de Leão e de Galiza, era reconhecida a posse portuguesa das chamadas terras de Ribacôa, que compreendiam as seguintes povoações e respectivos castelos:

•        Almeida

•        Alfaiates

•        Castelo Bom

•        Castelo Melhor

•        Castelo Rodrigo

•        Monforte

•        Sabugal

•        Vilar Maior


Uma versão do tratado, cujo exemplar em Castelhano hoje se encontra depositado no Arquivo Nacional da Torre do Tombo, encontra-se transcrita por Rui de Pina na Crónica de El-Rei Dom Dinis. Embora na fórmula de encerramento seja informada a datação como Era de mil trezentos trinta e cinco annos, recorde-se que a referida é a da Era de César, vigente à época daqueles soberanos, equivalente a 1297 no atual calendário gregoriano. Três territórios foram perdidos por Portugal ou encontram-se pendentes de delimitação: São Félix dos Galegos (atual San Felices de los Gallegos), Ermesende (atual Hermisende), Salvaterra do Minho (atual Salvaterra de Miño). Olivença (incluindo o atual município de Táliga), embora fazendo parte do território português é administrada pelo Estado espanhol.

Sentença Arbitral de Torrellas
(8 de agosto de 1304)


A Sentença Arbitral de Torrellas foi um acordo estabelecido entre os representantes do Reino de Castela, do Reino de Aragão, e do Reino de Portugal em 8 de agosto de 1304, relativo às fronteiras do Reino de Múrcia e às reclamações do trono castelhano-leonês por Dom Afonso de la Cerda, neto de Afonso X 'o Sábio'. A assinatura do acordo aconteceu no município saragoçano de Torrellas. As cláusulas da sentença foram aprovadas pelos Reis Dom Fernando IV de Castela, Dom Jaime II de Aragão, Dom Dinis I de Portugal e pelo Rei Maomé III de Granada. Em 8 de agosto de 1304, na vila saragoçana de Torrellas, o Rei Dom Dinis I de Portugal, o Arcebispo de Saragoça, Dom Jimeno de Luna, em nome do Reino de Aragão, e o Infante Dom João de Castela "o de Tarifa", representando a Castela, publicaram as cláusulas da Sentença Arbitral de Torrellas. O propósito da negociação era pôr fim às disputas entre o Reino de Castela e o Reino de Aragão pela posse do Reino de Múrcia. O Rei Maomé III de Granada participou nas conversações a pedido do Rei Dom Fernando IV de Castela, que dispôs que no ‘Tratado de Paz e Aliança entre os Reinos Cristãos da Península’ interviesse o Rei de Granada, pois tinha interesse por manter a amizade, a submissão e as párias que cada ano se via obrigado a abonar ao Rei de Castela o monarca granadino, e que constituíam um apreciado recurso para o Reino de Castela. Portanto, o Rei Dom Jaime II de Aragão e o Rei Dom Dinis I de Portugal avieram-se a manter boas relações com o Reino de Granada. Segundo o disposto na Sentença, o Reino de Múrcia, que então se achava nas mãos do Rei Dom Jaime II de Aragão, seria repartido entre o Reino de Aragão e o Reino de Castela, e ao longo do rio Segura seria estabelecida a fronteira meridional do Reino de Aragão.



As cidades de Alicante, Elche, Orihuela, Novelda, e Elda, bem como as povoações de Abanilla, Petrel, Crevillent, e Sax, continuariam em poder do monarca aragonês. A Sentença Arbitral reconhecia a posse por parte do Reino de Castela e Leão das cidades de Múrcia, Monteagudo, Alhama, Lorca e Molina de Segura. Os cidadãos afectados pela troca de soberania teriam liberdade para permanecer nas suas cidades e vilas se o desejar, ou bem poderiam abandonar livremente o território. Ao mesmo tempo, os dois Reinos acordaram conceder a liberdade aos prisioneiros de guerra, assim como ser ambos inimigos dos inimigos de cada um deles, exceptuando a Santa Sé e o Reino da França. O senhorio de Villena continuou sendo propriedade de Dom João Manuel de Castela, filho do Infante Dom Manuel de Castela e neto do Rei Dom Fernando III ‘o Santo’, mas as terras nas quais se assentava permaneceriam sob soberania aragonesa. Em 8 de agosto de 1304, os Reis de Portugal e Aragão pronunciaram-se, em presença do Infante Dom Juan de Castela "o de Tarifa", sobre as reclamações dos Infantes de la Cerda. O Dom Afonso de la Cerda, apoiado pelo Rei Dom Jaime II de Aragão, fora concedido como compensação pela sua renúncia ao trono de Castela uma série de Senhorios e Posses, dispersos por todo o território castelhano-leonês a fim de evitar a formação de um microestado, entre os que figuravam os de ‘Alba de Tormes’, Valdecorneja, Gibraleón, Béjar e o Real de Mançanares, além do castelo de Monzón de Campos, Gatón de Campos, La Algava, e Lemos. Adicionalmente, concederam-se a Dom Afonso de la Cerda numerosas rendas e posses em Medina del Campo, Córdova, Toledo, Bonilla e Madrid. O Rei Dom Fernando IV de Castela, que desejava que o seu parente Dom Afonso de la Cerda desfrutasse de uma renda anual de 400.000 maravedis, dispôs que se as rendas das posses que lhe fossem doadas não atingiam essa quantidade lhe entregaria outros territórios até as rendas atingirem tal cifra. Ao mesmo tempo, foi acordado que, em prova de que o monarca castelhano entregaria estes senhorios a Dom Afonso de la Cerda, os castelos de Alfaro, Cervera, Curiel de los Ángeles e Gumiel seriam entregues a quatro ricos-homens por trinta anos. Pela sua vez, Dom Afonso de la Cerda renunciou aos seus direitos ao trono castelhano-leonês, a usar os ‘Títulos Régios’, e a usar o ‘Selo Real’. Ao mesmo tempo, comprometia-se a devolver ao Rei as praças de Almazón, Sória, Deza, Serón, Alcalá, e Almenara. Porém, pouco tempo depois voltou a usar os 'Símbolos da Realeza', contravindo o acordado em ‘Torrellas’. A questão dos direitos ao trono de Dom Afonso de la Cerda resolveu-se definitivamente em vida do filho e sucessor do Rei Dom Fernando IV, Dom Afonso XI, quando em 1331, em Burguillos, Dom Afonso de la Cerda rendeu homenagem ao Rei de Castela e Leão. Assim foi resolvido o problema originado em 1275 à morte do Infante Dom Fernando de la Cerda, pai de Dom Afonso de la Cerda e filho e herdeiro do Rei Dom Afonso X o Sábio, cujos direitos ao trono foram ignorados pelo Rei Dom Sancho IV, pai do Rei Dom Fernando IV de Castela. Dom Fernando IV de Castela comprometeu-se a que as cláusulas da ‘Sentença Arbitral’ deveriam ser juradas e acatadas pelos ricos-homens, os magnatas, os Mestres das Ordens Militares de Santiago, Calatrava, Templários e Hospital, e pelos concelhos dos seus Reinos.



No Inverno de 1305, encontrando-se Dom Fernando IV na cidade de Guadalajara, o monarca recebeu a homenagem do seu primo Dom Fernando de la Cerda, que agia no nome do seu irmão, Dom Afonso de la Cerda. Este último manifestou por meio do seu irmão que recebera os castelos e senhorios que lhe foram adjudicados na ‘Sentença Arbitral de Torrellas’, e rendeu pela primeira vez homenagem ao Rei Dom Fernando IV.

Tratado de Alcoutim
(31 de Março de 1371)


O Tratado de Alcoutim, referido à época como as Pazes de Alcoutim, foi celebrado em 31 de Março de 1371, entre os Reis Dom Fernando nasceu em 1367 e faleceu a 1383 e o Rei Dom Henrique II de Castela. Pelas suas cláusulas, o soberano de Portugal comprometia-se a manter boas relações com o Rei de França. O tratado foi confirmado no mesmo ano em Toro, onde o juraram os Reis, os Nobres e os Prelados de Castela. No ano seguinte foi celebrado um novo acordo, o ‘Tratado de Tui’ em 1372, que modificava as condições propostas em Alcoutim.



Tratado Anglo-Português
(1373)


O Tratado Anglo-Português de 1373 foi assinado entre o Rei Eduardo III da Inglaterra e o Rei Dom Fernando I e Dona Leonor de Portugal. Estabeleceu um tratado de "perpétua amizade, sindicato [e] aliança" entre as duas nações marítimas. É o mais antigo tratado activo no mundo. O tratado Foi reforçado ao longo da História, inclusive em 1386, 1643, 1654, 1660, 1661, 1703, 1815 e por uma declaração secreta em 1899. Apesar do facto de que o tratado esteja, tecnicamente, em vigor há quase 650 anos, não quer dizer que tenha sido sempre posto em prática. Raramente, os dois países se encontraram em guerra, mas isso não quer dizer que nunca se encontraram. Na Guerra Luso-Neerlandesa, os britânicos (e em menor medida, os franceses), que visavam cercear o poder dos Habsburgos, auxiliaram abertamente os holandeses na sua guerra contra Portugal, que estava incorporado na Espanha com a ‘União Ibérica’.

Tratado de Santarém
(1373)


O Tratado de Santarém foi celebrado em 1373 pelos Reis Dom Fernando I de Portugal e o Rei Dom Henrique II de Castela, no contexto das Guerras Fernandinas. Entre outras disposições, o tratado estipulava a expulsão dos apoiantes galegos de Dom Fernando refugiados em Portugal, como Dom Fernán Ruíz de Castro.

Tratado de Elvas
(9 de agosto de 1382)



O Tratado de Elvas foi um tratado de paz assinado, em 9 de agosto de 1382, no Reinado de Dom Fernando I de Portugal que pôs termo à ‘Terceira Guerra Fernandina’ entre Portugal e Castela. O Antipapa Clemente VII enviou uma embaixada presidida por Dom Pedro de Luna, mais tarde Antipapa Bento XIII, para encontrar uma solução para a crise. As negociações, iniciadas secretamente por causa dos ingleses, aliados dos portugueses, foram conduzidas por Dom Pero Sarmento e Dom Pero Fernandez de Vellasco por parte do Rei de Castela, e por Dom Álvaro Peres de Castro e Dom Gonçalo Vasques de Azevedo por parte do soberano português. Uma das cláusulas era que a Infanta Dona Beatriz casaria com o infante Dom Fernando (futuro Rei Fernando I de Aragão), filho do Rei Castelhano João I.

Tratado de Salvaterra de Magos
(2 de Abril de 1383)


O ‘Tratado de Salvaterra de Magros’ foi um acordo celebrado a 2 de Abril de 1383 entre as coroas de Portugal e de Castela. Procurando consolidar a paz entre as duas coroas, o Rei Dom Fernando I de Portugal acordava no casamento de sua filha herdeira, Dona Beatriz de Portugal, com Dom João I de Castela. No entanto, para evitar uma possível união futura dos dois Reinos, ficaram estabelecidas neste acordo pré-nupcial as regras de sucessão ao trono.
As principais cláusulas do diploma estipulavam:

•       "Que os reinos de Portugal, em quanto ser pudesse, nunca fossem juntos aos Reinos de Castela, mas sempre reinos por si, como os possuíram seus antigos avós, o que era grande dúvida se el Rei Dom João e a Infante Dona Beatriz houvesse o Regimento deles, mormente que para tal governança cumpria de haver pessoas que soubessem as condições dos povos".

•       Que "o Reino ficasse desembargado à Infanta Dona Beatriz, e que os naturais do Reino fizessem todos menagem que em tal caso a houvessem a ela por sua Rainha e Senhora", e que o Rei de Castela se pudesse chamar Rei de Portugal, se Dom Fernando viesse a falecer sem herdeiro varão.

•          A sucessão da Coroa portuguesa para os filhos de ambos, caso os viesse a haver.

•         A sucessão da Coroa portuguesa para o Rei de Castela e seus descendentes, não havendo filhos do casamento entre Dona Beatriz e Dom João, não havendo outras filhas legítimas de Dom Fernando, nem descendentes legítimos destas, se Dona Beatriz viesse a falecer primeiro que o Rei Castelhano.

•        A atribuição da ‘Regência do Reino’ "assim na justiça como em todas as outras coisas da maior até à mais pequena que ao Regimento dum Reino pertencem" a Dona Leonor Teles, caso falecesse Dom Fernando sem mais herdeiros e enquanto Dona Beatriz não tivesse filho varão de catorze anos.

•       Havia ainda cláusulas quanto à cunhagem de moeda, convocação das Cortes, guerra, e outras.


Em termos historiográficos, a Crónica de Dom Fernando, é a melhor fonte disponível para esta convenção, Pero Lopez de Ayala também se lhe refere e dá mais um ou outro pormenor na sua Crónica de el Rei Dom João ‘o Primeiro’ de Castela e de Leão, ano quarto, capítulo V, por fim, nas suas Provas da História Genealógica da Casa Real, António Caetano de Sousa fornece-nos documentos em castelhano sobre o tratado. Nas Cortes de Coimbra de 1385, o jurista João das Regras, que apoiava o ‘Mestre de Avis’ como candidato ao Trono de Portugal, defendeu que o desrespeito pelas cláusulas do ‘Tratado de Salvaterra de Magos’ excluía o casal Dona Beatriz e Dom João I de Castela do Trono de Portugal.

Tratado de Monção
(1386)


O Tratado de Monção foi assinado em 1386 pelo Rei João I de Portugal e João de Gaunt, Duque de Lancaster e pretendente ao trono de Castela. Os dois monarcas teriam jurado aliança e amizade perpétuas, com cláusula de mútua ajuda defensiva; o Rei português haver-se-ia comprometido a auxiliar o pretendente na conquista do seu Reino, com uma força de 2.000 lanças, 1.000 besteiros e 2.000 peões, inteiramente financiados à sua custa. O Duque daria a sua filha Dona Filipa de Lencastre em casamento. E quanto à cedência do território, a retirada do pretendente e a renúncia que acabou por fazer dos seus direitos em 1388, tornaram-na falaciosa.

Tratado de Windsor
(1386)


O Tratado de Windsor estabelecido entre Portugal e a Inglaterra, sendo a mais antiga aliança diplomática do mundo ainda em vigor. Foi assinado em Maio de 1386 após os ingleses lutarem ao lado da Casa de Avis na batalha de Aljubarrota e com o sentido de renovar a Aliança Anglo-Portuguesa estabelecida pelos dois países em 1373. A Inglaterra e Portugal estabelecem um Tratado de Aliança em 1373 tendo os ingleses lutado juntamente com a Casa de Avis na Batalha de Aljubarrota contra o Reino de Castela em 1385. Com a vitória na Batalha de Aljubarrota, o exército castelhano fora derrotado com perdas de tal forma graves que impediram Dom João I de Castela de tentar nova invasão nos anos seguintes. Dom João I foi reconhecido como Rei de Portugal, pondo um fim à crise de sucessão de 1383-1385 e à anarquia que grassava no território português. O reconhecimento pelo Reino de Castela dar-se-ia apenas em 1411, com a assinatura do ‘Tratado de Ayllón-Segóvia’.




A aliança Luso-Inglesa foi renovada em Maio de 1386. Portugal e a Inglaterra (Dom João I e Ricardo II, respectivamente) assinaram o ‘Tratado de Windsor’, confirmando formalmente a aliança que haveria de servir de alicerce às relações bilaterais entre ambos durante mais de 600 anos.




O último acto a firmar esta aliança foi o casamento Real entre Dona Filipa de Lencastre, filha de João de Gante, Duque de Lencastre, e com o Rei Dom João I, realizado em 1387. O comércio bilateral floresceu através dos armazéns ingleses no Porto: bacalhau e tecidos eram trocados por vinho, cortiça, sal e azeite. O filho mais novo do casal, Henrique (Príncipe Henrique, o Navegador), liderou a Época Áurea de Portugal através das suas viagens de descobertas marítimas. O tratado de Windsor, ainda válido, estabelece um pacto de apoio mútuo entre Portugal e Inglaterra (hoje o Reino Unido).

•       Durante a dinastia Filipina, de 1580 a 1 de Dezembro de 1640, dada a união ibérica e a guerra entre Espanha e Inglaterra, o tratado foi suspenso, permitindo confrontos como o saque da Nau portuguesa Madre de Deus em 1592.

•      O Reino de Portugal usou-o em 1640, para expulsar os Reis de Espanha (da casa dos Habsburgos).

Tratado de Ayllón
(30 de abril de 1423)


O Tratado de Ayllón foi um tratado de paz entre o Reino de Portugal e o Reino de Castela assinado em 31 de Outubro de 1411 em Ayllón, Segóvia, na sequência da batalha de Aljubarrota. Foi ratificado a 30 de abril de 1423. A batalha de Aljubarrota ocorrera a 14 de agosto de 1385, entre tropas portuguesas sob o comando do Rei João I de Portugal e o seu Condestável Nuno Álvares Pereira, e o exército castelhano do Rei Dom João I de Castela. A Batalha teve lugar no campo de São Jorge, perto da vila de Aljubarrota, entre Leiria e Alcobaça, no centro de Portugal. O resultado foi a derrota castelhana, o fim da crise portuguesa de 1383 a 1385, e a consolidação do Reinado de Dom João I como rei de Portugal, iniciando a dinastia de Avis. A paz definitiva com Castela foi selada apenas em 1411, com a assinatura do tratado de Ayllón, já no Reinado de Dom João II de Castela, após a agressão portuguesa em território castelhano e acções como a Batalha de Valverde em 15 de Outubro de 1385, com a vitória do Condestável Nuno Álvares Pereira em Valverde de Mérida.


Tratado de Medina del Campo
(Outubro de 1431)



O Tratado de Medina del Campo foi um tratado assinado em Medina del Campo em Outubro de 1431 entre o Reino de Castela e o Reino de Portugal para selar a paz após vários confrontos, incluindo a Batalha de Aljubarrota. O tratado foi assinado pelos Reis Dom João I de Portugal e o Rei Dom João II de Castela e foi ratificado em Almeirim, em janeiro de 1432. O controlo do poder por Álvaro de Luna a partir de meados de 1429, e certamente a morte da Princesa Beatriz de Portugal (filha do Rei Dom Fernando I de Portugal e da viúva do Rei Dom João I de Castela) ao remover o último obstáculo para a paz, estabeleceu as condições para a assinatura de um tratado de paz definitiva.


Este tratado foi assinado em Medina del Campo, em Outubro 1431 e foi ratificado em Almeirim, em janeiro de 1432. Marcou o fim de um longo período de confronto e estabeleceu as bases económicas e políticas para um entendimento futuro. Durante vários anos, com base neste último acordo, as relações entre os dois Reinos foram essencialmente amigáveis.

Tratado das Alcáçovas-Toledo
(4 de Setembro de 1479)



O Tratado das Alcáçovas (também conhecido como Paz de Alcáçovas) foi um diploma assinado pelos representantes dos Reis Católicos, Isabel de Castela e Fernando de Castela e Aragão, por um lado, e o Rei Afonso V de Portugal e seu filho Dom João pelo outro, colocando fim à Guerra de sucessão de Castela que durou de 1475 a 1479.


O tratado, assinado na vila portuguesa de Alcáçovas, no Alentejo, em 4 de Setembro de 1479, foi Ratificado pelo Rei de Portugal em 8 de Setembro de 1479 e pelos Reis Católicos em 6 de Março de 1480, na cidade de Toledo, pelo que também ficou conhecido como ‘Tratado das Alcáçovas-Toledo’.



Portugal, na qualidade de principal Estado monárquico empenhado no reconhecimento de direitos sobre as ilhas atlânticas e a costa africana durante a década de 1470, ao seu final viu-se enfrentado com uma série de conflitos com o reino vizinho. Uma vez concluída, na península Ibérica, uma guerra favorável a Castela, os representantes de ambos os Estados firmaram um acordo de paz. Além de formalizar o fim das hostilidades (pelo qual Dona Joana, a ‘Beltraneja’, seu tio e marido o Rei Afonso V de Portugal desistiam para sempre das suas pretensões ao trono de Castela.


O Tratado continha outras cláusulas concernentes à política de projecção externa de ambos os países, num momento em que os dois reinos competiam pelo domínio do Oceano Atlântico e das terras até então descobertas na costa africana. Por essas cláusulas, Portugal obtinha o reconhecimento do seu domínio sobre a ilha da Madeira, o Arquipélago dos Açores, o de Cabo Verde e a costa da Guiné, enquanto que Castela recebia as ilhas Canárias (exploradas por Diego Garcia de Herrera em 1476), renunciando a navegar ao Sul do cabo Bojador, ou seja, do Paralelo 27 no qual se encontravam as próprias ilhas.



Regulamentava também as áreas de influência e de expansão de ambas as coroas pelo Reino Oatácida de Fez, no Norte de África. O Tratado foi o primeiro do género, que regulamentava a posse de terras ainda não descobertas. Reflectia os anseios de Portugal, interessado em garantir direitos sobre a costa da Mina e o Golfo da Guiné, e no prosseguimento da sua exploração da costa africana, na premissa de que por aquela via se conseguiria a esperada passagem para as Índias.


Cláusulas principais:

•      Põe fim às hostilidades da Guerra de Sucessão de Castela de 1475 a 1479. O Rei de Portugal Dom Afonso V renuncia ao trono de Castela e, em troca, os Reis Católicos renunciam ao trono português.

•       Reparte os territórios do Atlântico, entre os dois países. Portugal mantém, o controlo sobre suas possessões da Guiné, a Costa da Mina, Madeira, Açores, Ilha das Flores e Cabo Verde. Castela tem, reconhecida a sua soberania sobre as Canárias.

•           É reconhecida a exclusividade de Portugal sobre a conquista do Reino de Fez


Em paralelo ao tratado das Alcáçovas, se negociaram as chamadas ‘Tercerias de Moura’, que resolviam a questão dinástica castelhana, impondo a Dona Joana de Castela, rival de Dona Isabel pelo trono de Castela, a renúncia a todos os seus títulos castelhanos. Também acordavam o casamento da Infanta Isabel, filha dos Reis Católicos, com o filho do Rei português Dom Afonso. O enorme dote pago pelos pais da noiva representa a indemnização de guerra obtida por Portugal.

•        Signatários do Tratado


Pelo Reino de Aragão e Castela


Dona Isabel I de Castela


Dom Fernando II de Aragão


Pelo Reino de Portugal


Dom Afonso V


Infante Dom João



Tratado de Tordesilhas
(7 de junho de 1494)

O Tratado de Tordesilhas, assinado na povoação castelhana de ‘Tordesilhas’ em 7 de junho de 1494, foi um tratado celebrado entre o Reino de Portugal e o recém-formado Reino da 'Espanha', para dividir as terras "descobertas e por descobrir" por ambas as Coroas fora da Europa.


Este tratado surgiu na sequência da contestação portuguesa às pretensões da Coroa espanhola, resultantes da viagem de Cristóvão Colombo, que um ano e meio antes chegara ao chamado Novo Mundo, reclamando-o oficialmente para Isabel, a Católica. O tratado definia como linha de demarcação do meridiano 370 léguas a oeste da ilha de Santo Antão no arquipélago de Cabo Verde. Esta linha estava situada a meio-caminho entre estas ilhas (então portuguesas) e as ilhas das Caraíbas descobertas por Colombo, no tratado referidas como "Cipango" e Antilhas. Os territórios a leste deste meridiano pertenceriam a Portugal e os territórios a oeste, à Espanha. O tratado foi ratificado pela Espanha a 2 de julho e por Portugal a 5 de Setembro de 1494. Algumas décadas mais tarde, na sequência da chamada "questão das Molucas", o outro lado da Terra seria dividido, assumindo como linha de demarcação, a leste, o anti meridiano correspondente ao ‘Meridiano de Tordesilhas’, pelo ‘Tratado de Saragoça’, a 22 de abril de 1529. No contexto das ‘Relações Internacionais’, a sua assinatura ocorreu num momento de transição entre a hegemonia do Papado, poder até então universalista, e a afirmação do poder singular e secular dos monarcas nacionais (uma das muitas facetas da transição da Idade Média para a Idade Moderna). Para as negociações do Tratado e a sua assinatura, o Rei Dom João II de Portugal designou como embaixador da sua prima de Castela a Dom Rui de Sousa. (...) subsistia ainda a tradição medieval da supremacia política da Santa Sé, que reconhecia a Roma o direito de dispor das terras e dos povos. Adriano IV, papa inglês de 1154 a 1159, havia dado a Irlanda ao Rei da Inglaterra e o Papa Sisto IV as Canárias ao Rei de Castela em 1471 a 1484. Baseava-se isso, em parte, sobre o fato de um ‘Édito de Constantino’ ter conferido ao Papa Silvestre a soberania sobre todas as ilhas do globo, isso porque as terras a descobrir eram todas, então, supostas serem exclusivamente ilhas. O início da ‘Expansão Marítima Portuguesa’, sob a égide do Infante Dom Henrique, levou as Caravelas Portuguesas pelo oceano Atlântico, rumo ao Sul, contornando a costa africana. Com a descoberta da Costa da Mina, iniciando-se o comércio de marfim, escravos, a atenção de Castela foi despertado, iniciando-se uma série de escaramuças no mar, envolvendo embarcações de ambas as Coroas. Portugal, procurando proteger o seu investimento, negociou com Castela o Tratado de Alcáçovas em 1479, obtendo em 1481, do Papa Sisto IV, a ‘Bula Æterni regis’, que dividia as terras descobertas e a descobrir por um paralelo na altura das Canárias, dividindo o mundo em dois hemisférios. A norte, para a Coroa de Castela, e a sul, para a Coroa de Portugal. Somando-se a duas outras bulas anteriores de 1452 a Bula ‘Dum Diversas’ e em 1455 a Bula ‘Romanus Pontifex’, do Papa Nicolau V. ‘Portugal e a Ordem de Cristo’ haviam recebido todas as terras conquistadas e a conquistar ao sul do cabo Bojador e da Gran Canária. Preservavam-se, desse modo, os interesses de ambas as Coroas, definindo-se, a partir de então, os dois ciclos da expansão: o chamado ‘Ciclo Oriental’, pelo qual a Coroa portuguesa garantia o seu progresso para o sul e o Oriente, contornando a costa africana (o chamado "périplo africano"); e o que se denominou posteriormente de ciclo ocidental, pelo qual Castela se aventurou no oceano Atlântico, para oeste. Como resultado deste esforço espanhol, Cristóvão Colombo alcançou terras americanas em 1492. Cientes da descoberta de Colombo, mediante as coordenadas geográficas fornecidas pelo navegador, os cosmógrafos portugueses argumentaram que a descoberta, efectivamente, se encontrava em terras portuguesas. Desse modo, a diplomacia castelhana apressou-se a obter junto ao Papa Alexandre VI, Aragonês de Valência então reunida com Castela, uma nova partição de terras. Assim, em 3 de maio de 1493, a Bula Inter Coetera estabelecia uma nova linha de marcação, um meridiano que separaria as terras de Portugal e de Castela.


O meridiano passava a cem léguas a oeste das ilhas de Cabo Verde. As novas terras descobertas, situadas a Oeste do meridiano a 100 léguas de Cabo Verde, pertenceriam a Castela. As terras a leste, pertenceriam a Portugal. A bula excluía todas as terras conhecidas já sob controlo de um estado cristão. Os termos da Bula não agradaram ao Rei Dom João II de Portugal, que julgava ter direitos adquiridos que a Bula vinha a ferir. Além disso os seus termos causavam confusão, pois um meridiano vinha a anular o que um paralelo tinha estabelecido. Complementarmente, a execução prática da Bula era impossibilitada por sua imprecisão e pela imperfeição dos meios científicos disponíveis à época para a fixação do meridiano escolhido. Assim sendo, o Rei Dom João II abriu negociações directas com os Reis Católicos, Dom Fernando II de Aragão e Dona Isabel I de Castela, para mover a linha mais para oeste, argumentando que o meridiano em questão se estendia por todo o globo, limitando assim as pretensões castelhanas na Ásia. O Rei Dom João II propôs, por uma missão diplomática aos Reis católicos, estabelecer um paralelo das Ilhas Canárias como substituto ao meridiano papal.



Os castelhanos recusaram a proposta, mas se prestaram a discutir o caso. Reuniram-se então, os diplomatas, em Tordesilhas. O seu único herdeiro, o Príncipe Afonso de Portugal estava prometido desde a infância a Dona Isabel de Aragão e Castela, ameaçando herdar os tronos de Castela e Aragão. Contudo o jovem príncipe morreu numa misteriosa queda em 1491 e durante o resto da sua vida o Rei Dom João II tentou, sem sucesso, obter a legitimação do seu filho Bastardo Jorge de Lancastre. Em 1494, na sequência da viagem de Cristóvão Colombo, que o Rei Dom João II recusara, negociou o Tratado de Tordesilhas com os Reis Católicos. Morreu no ano seguinte sem herdeiros legítimos, tendo escolhido para sucessor o Duque de Beja, seu primo direito e cunhado, que viria a ascender ao trono como Dom Manuel I de Portugal. O Tratado estabelecia a divisão das áreas de influência dos países ibéricos, cabendo a Portugal as terras "descobertas e por descobrir" situadas antes da linha imaginária que demarcava 370 léguas (1.770 km) a oeste das ilhas de Cabo Verde, e à Espanha as terras que ficassem além dessa linha. Como resultado das negociações, os termos do tratado foram ratificados por Castela a 2 de Julho e, por Portugal, a 5 de Setembro do mesmo ano. Contrariando a Bula anterior de Alexandre VI, ‘Inter Coetera’ em 1493, que atribuía à Espanha a posse das terras localizadas a partir de uma linha demarcada a 100 léguas de Cabo Verde, o novo tratado foi aprovado pelo Papa Júlio II em 1506. O Tratado teria "um efeito antes moral do que prático". O meridiano foi fixado, mas persistiam as dificuldades de execução de sua demarcação. Os cosmógrafos divergiam sobre as dimensões da Terra, sobre o ponto de partida para a contagem das léguas e sobre a própria extensão das léguas, que diferia entre os Reinos de Castela e de Portugal. Já se afirmou ainda que os castelhanos cederam porque esperavam, por meio de sua política de casamentos, estabelecer algum dia a ‘União Ibérica’, incorporando Portugal. O que é mais provável é que os negociadores portugueses, na expressão de Frei Bartolomeu de las Casas, tenham tido "mais perícia e mais experiência" do que os castelhanos.


Tratado entre Dom Fernando e Dona Isabel, Rei e Rainha de Castela e de Aragão, e Dom João, Rei de Portugal, de 7 de junho de 1494

Dom Fernando e Dona Isabel por graça de Deus, Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, da Sicília, de Granada, de Toledo, de Valência, de Galiza, de Maiorca, de Sevilha, de Sardenha, de Córdova, da Córsega, de Múrcia, de Jaén, do Algarve, de Algeciras, de Gibraltar, das Ilhas de Canária, Conde e Condessa de Barcelona, Senhores de Biscaia e de Molina, Duques de Atenas e de Neopatria, Condes de Rossilhão e da Sardenha, Marqueses de Oristán e de Gociano juntamente com o p’ríncipe Dom João, nosso mui caro e mui amado filho primogénito herdeiro dos nossos ditos Reinos e Senhorios. Em fé do qual, por Dom Henrique Henriques, nosso Mordomo-Mor e Dom Gutierre de Cardenas, Comissário-Mor de Leão, nosso Contador-Mor e o Doutor Rodrigo Maldonado, todos do nosso Conselho, foi tratado, assentado e aceito por nós e em nosso nome e em virtude do nosso poder, com o Sereníssimo Dom João, pela graça de Deus Rei de Portugal e dos Algarves d'Aquém e d'Além-mar em África, Senhor da Guiné, nosso mui caro e mui amado irmão, e com Rui de Souza, Senhor de Sagres e Beringel e Dom João de Souza, seu filho, almotacel-mor do dito sereníssimo Rei nosso irmão, e Arias de Almadana, corrector dos feitos civis de sua corte e de seu foro (juízo), todos do Conselho do dito sereníssimo Rei nosso irmão, em seu nome e em virtude de seu poder, seus embaixadores que a nós vieram, sobre a demanda que a nós e ao dito sereníssimo Rei nosso irmão pertence, do que até sete dias deste mês de Junho, em que estamos, da assinatura desta escritura está por descobrir no mar Oceano, na qual o dito acordo dos nossos ditos procuradores, entre outras coisas, prometeram que dentro de certo prazo nela estabelecido, nós outorgaríamos, confirmaríamos, juraríamos, ratificaríamos e aprovaríamos a dita aceitação por nossos pessoas, e nós desejando Cumprir e cumprindo tudo o que assim em nosso nome foi assentado, e aceito, e outorgado acerca do supradito mandamos trazer diante de nós, a dita escritura da dita convenção e assento para vê-la e examiná-la, e o teor dela de verbo ad verbum é este que se segue:

"Em nome de Deus Todo Poderoso, Padre, Filho e Espírito Santo, três pessoas realmente distintas e separadas, e uma só essência divina".

Manifesto e notório seja a todos quantos este público instrumento virem, dado na vila de Tordesilhas, aos sete dias do mês de Junho, ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quatrocentos e noventa e quatro anos, em presença de nós os Secretários e Escribas e Notários públicos dos abaixo assinados, estando presentes os honrados Dom Henrique Henriques, mordomo-mor dos mui altos e mui poderosos príncipes senhores Dom Fernando e Dona Isabel, por graça de Deus, Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, da Sicília, de Granada, etc., e Dom Gutierre de Cárdenas, Comendador-mor dos ditos senhores Rei e Rainha, e o Doutor Rodrigo Maldonado, todos do Conselho dos ditos Senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, da Sicília e de Granada, etc., seus procuradores bastantes de uma parte, e os honrados Rui de Souza, Senhor de Sagres e Beringel, e Dom João de Souza, seu filho, almotacel-mor do mui alto e mui excelente Senhor Dom João, pela graça de Deus, Rei de Portugal e Algarves, d'Aquém e d'Além-mar, em África, e Senhor da Guiné; e Arias de Almadana, corregedor dos feitos cíveis em sua corte, e do seu Desembargo, todos do Conselho do dito Rei de Portugal, e seus embaixadores e procuradores bastantes, como ambas as ditas partes o mostraram pelas cartas e poderes e procurações dos ditos Senhores seus constituintes, o teor das quais, de ‘verbo ad verbum’ é este que se segue:

Dom Fernando e Dona Isabel, por graça de Deus, Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, da Sicília, de Granada, de Toledo, de Valência, da Galiza, da Maiorca, de Sevilha, de Sardenha, de Córdova, da Córsega, de Múrcia, de Jaén, de Algarve, de Algeciras, de Gibraltar, das Ilhas de Canária, Conde e Condessa de Barcelona, e Senhores de Biscaia e de Molina, Duques de Atenas e de Neopatria, Condes de Rossilhão e da Sardenha, Marqueses de Oristán e de Gociano, etc. Em fé do que, o sereníssimo Rei de Portugal, nosso mui caro e mui amado irmão, nos enviou como seus embaixadores e procuradores a Rui de Souza, do qual são as vilas de Sagres e Beringel, e a Dom João de Souza, seu almotacel-mor, e Arias de Almadana seu corregedor dos feitos cíveis em sua Corte, e de seu Desembargo, todos do seu Conselho para entabular e tomar assento e concórdia connosco ou com nossos embaixadores e procuradores, em nosso nome, sobre a divergência que entre nós e o sereníssimo Rei de Portugal, nosso irmão, há sobre o que a nós e a ele pertence do que até agora está por descobrir no mar Oceano. Em razão do que, confiando de vós Dom Henrique Henriques, nosso mordomo-mor e Dom Gutierre de Cárdenas, Comendador-mor de Leão, nosso contador-mor, e o Doutor Rodrigo Maldonado, todos de nosso Conselho, que seis tais pessoas, que zelareis nosso serviço e que bem e fielmente fareis o que por nós vos for mandado e encomendado, por esta presente Carta vos damos todos nossos poderes completos naquela maneira e forma que podemos e em tal caso se requer, especialmente para que por nós e em nosso nome e de nossos herdeiros, e sucessores, e de todos nossos reinos e senhorios, súbditos e naturais deles, possais tratar, ajustar e assentar e fazer contrato e concórdia com os ditos embaixadores do sereníssimo Rei de Portugal, nosso irmão, em seu nome, qualquer concerto, assento, limitação, demarcação e concórdia sobre o que dito é, pelos ventos em graus de Norte e de Sul e por aquelas partes, divisões e lugares do céu, do mar e da terra, que a vós bem visto forem e assim vos damos o dito poder para que possais deixar ao dito Rei de Portugal e a seus reinos e sucessores todos os mares, e ilhas, e terras que forem e estiverem dentro de qualquer limitação e demarcação que com ele assentarem e deixarem. E outrossim vos damos o dito poder, para que em nosso nome e no de nossos herdeiros e sucessores, e de nossos reinos e senhorios, e súbditos e naturais deles, possais concordar e assentar e receber, e acabar com o dito Rei de Portugal, e com seus ditos embaixadores e procuradores em seu nome, que todos os mares, ilhas e terras que forem ou estiverem dentro da demarcação e limitação de costas, mares e ilhas, e terras que ficarem por vós e por vossos sucessores, e de nosso senhorio e conquista, sejam de nossos reinos e sucessores deles, com aquelas limitações e isenções e com todas as outras divisões e declarações que a vós bem visto for, e para que sobre tudo que está dito, e para cada coisa e parte disso, e sobre o que a isso é tocante, ou disso, dependente, ou a isso anexo ou conexo de qualquer maneira, possais fazer e outorgar, concordar, tratar e receber, e aceitar em nosso nome e dos ditos nossos herdeiros e sucessores de todos nossos Reinos e Senhorios, súbditos e naturais deles, quaisquer tratados, contractos e escrituras, como quaisquer vínculos, actos, modos, condições e obrigações e estipulações, penas, sujeições e renúncias, que vós quiserdes, e bem outorgueis todas as coisas e cada uma delas, de qualquer natureza ou qualidade, gravidade ou importância que tenham ou possam ter, ainda que sejam tais que pela sua condição requeiram outro nosso especificado e especial mandado e que delas se devesse de fato e de direito fazer singular e expressa menção e, que nós, estando presentes poderíamos fazer e outorgar e receber. E outrossim vos damos poder suficiente para que possais jurar e jureis por nossas almas, que nós e nossos herdeiros e sucessores, súbditos, naturais e vassalos, adquiridos e por adquirir teremos, guardaremos e cumpriremos, e terão, guardarão e cumprirão realmente e com efeito, tudo o que vós assim assentardes, capitulardes, jurardes, outorgardes e firmardes, livre de toda a cautela, fraude, engano, ficção e simulação e assim possais em nosso nome capitular, assegurar e prometer que nós em pessoa seguramente juraremos, prometeremos, outorgaremos e firmaremos tudo o que vós em nosso nome, acerca do que dito é assegurardes, prometerdes e acordardes, dentro daquele lapso de tempo que vos bem parecer, e que o guardaremos e cumpriremos realmente, e com efeito, sob as condições, penas e obrigações contidas no contrato das bases entre nós e o dito sereníssimo Rei nosso irmão feitos e concordados, e sobre todas as outras que vós prometerdes e assentardes, as quais desde agora prometemos pagar, se nelas incorrermos, para tudo o que a cada coisa ou parte disso, vos damos o dito poder com livre e geral administração, e prometemos e asseguramos por nossa fé e palavra real de ter, guardar e cumprir, nós e nossos herdeiros e sucessores, tudo o que por vós, acerca do que dito é, em qualquer forma e maneira for feito e capitulado, jurado e prometido, e prometemos de o ter por firme, bom e sancionado, grato, estável e válido e verdadeiro agora e em todo tempo, e que não iremos nem viremos contra isso nem contra parte alguma disso, nem nós nem nossos herdeiros e sucessores, por nós, nem por outras pessoas intermediárias, direta nem indirectamente, sob qualquer pretexto ou causa, em juízo, nem fora dele, sob obrigação expressa que para isso fazemos de todos os nossos bens patrimoniais e fiscais, e outros quaisquer de nossos vassalos e súbditos e naturais, móveis e de raiz, havidos e por haver. Em testemunho do que mandamos dar esta nossa carta de poder.

Dada na vila de Tordesilhas aos cinco dias do mês de Junho, ano de nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quatrocentos e noventa e quatro. Eu El-Rei - Eu a Rainha - Eu Fernando Alvarez de Toledo, secretário do Rei e da Rainha, nossos Senhores, a fiz escrever a seu mandado.

Dom João, por Graça de Deus Rei de Portugal e do Algarves, d'Aquém e d'Além-mar em África, e senhor de Guiné, etc. A quantos esta nossa carta de poderes e procuração virem, fazemos saber, que em virtude do mandado dos mui altos e mui excelentes e poderosos príncipes, o Rei Dom Fernando e a Rainha Dona Isabel, Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, de Sicília, de Granada, etc., nossos mui amados e prezados irmãos, foram descobertas e achadas novamente algumas ilhas, e poderiam adiante descobrir e achar outras Ilhas e terras sobre as quais tanto umas como outras, achadas e por achar, pelo direito e pela razão que nisso temos, poderiam sobrevir entre nós todos e nossos reinos e senhorios, súbditos e naturais deles, que Nosso Senhor não consinta, a nós apraz pelo grande amor e amizade que entre todos nos existe, e para se buscar, procurar e conservar maior paz e mais firme concórdia e sossego, que o mar em que as ditas Ilhas estão e forem achadas, se parte e demarque entre nós todos de alguma boa, certa e limitada maneira; e porque nós no presente não podemos entender nisto pessoalmente, confiando a vós Rui de Souza, Senhor de Sagres e Beringel, e D. João de Souza nosso almotacel-mor, e Arias de Almadana, corregedor dos feitos cíveis em nossa corte e do nosso desembargo, todos do nosso Conselho, pela presente carta vos damos todo nosso poder, completo, autoridade e especial mandado, e vos fazemos e constituímos a todos em conjunto, e a dois de vós e a cada um de vós in solidum se os outros por qualquer modo estiverem impedidos, nossos embaixadores e procuradores, na mais ampla forma que podemos e em tal caso se requer e geral especialmente; e de tal modo que a generalidade, não derrogue a especialidade, nem a especialidade à generalidade, para que, por nós, e em nosso nome e de nossos herdeiros e sucessores, e de todos os nossos reinos e senhorios, súbditos e naturais deles possais tratar, concordar e concluir e fazer, trateis, concordeis e assenteis, e façais com os ditos Rei e Rainha de Castela, nossos irmãos, ou com quem para isso tenha os seus poderes, qualquer concerto e assento, limitação, demarcação e concórdia sobre o mar Oceano, ilhas e terra firme, que nele houver por aqueles rumos de ventos e graus de Norte e Sul, e por aquelas partes, divisões e lugares de seco e do mar e da terra, que bem vos parecer. E assim vos damos o dito poder para que possais deixar, e deixeis aos ditos Rei e Rainha e a seus reinos e sucessores todos os mares, ilhas e terras que estiverem dentro de qualquer limitação e demarcação que com os ditos Rei e Rainha ficarem e assim vos damos os ditos poderes para em nosso nome e no dos nossos herdeiros e sucessores e de todos os nossos reinos e senhorias, súbditos e naturais deles, possais com os ditos Rei e Rainha, ou com seus procuradores, assentar e receber e acabar que todos os mares, ilhas e terras que forem situados e estiverem dentro da limitação e demarcação das costas, mares, ilhas e terras, que por nós e nossos sucessores ficarem, sejam nossos e de nossos senhorios e conquista, e assim de nossos reinos e sucessores deles, com aquelas limitações e isenções de nossas ilhas e com todas as outras cláusulas e demarcações que vos bem parecerem. Os quais ditos poderes damos a vós os ditos Rui de Souza e Dom João de Souza e o licenciado Arias de Almadana, para que sobre tudo o que dito é, e sobre cada coisa e Parte disso e sobre o que a isso é tocante, e disso dependente, e a isso anexo e conexo de qualquer maneira, possais fazer, e outorgar, concordar, tratar e distratar, receber e aceitar em nosso nome e dos ditos nossos herdeiros e sucessores e todos nossos reinos e senhorios, súbditos e naturais deles em quaisquer capítulos, contractos e escrituras, com quaisquer vínculos, pactos, modos, condições, penas, sujeições e renúncias que vós quiserdes e a vós bem visto for e sobre isso possais fazer e outorgar e façais e outorgueis todas as coisas, e cada uma delas, de qualquer natureza e qualidade, gravidade e importância que sejam ou possam ser posto que sejam tais que por sua condição requeiram outro nosso especial e singular mandado, e se devesse de fato e de direito fazer singular e expressa menção e que nós presentes, poderíamos fazer e outorgar, e receber. E outrossim vos damos poderes completos para que possais jurar, e jureis por nossa alma, que nós e nossos herdeiros e sucessores, súbditos e naturais, e vassalos, adquiridos e por adquirir, teremos guardaremos e cumpriremos, terão, guardarão e cumprirão realmente, e com efeito, tudo o que vós assim assentardes e capitulardes e jurardes, outorgardes e firmardes, livre de toda cautela, fraude e engano e fingimento, e assim Possais em nosso nome capitular, assegurar e prometer que nós em pessoa asseguraremos, juraremos, prometeremos e firmaremos tudo o que vós no sobredito Nome, acerca do que dito é assegurardes, prometerdes e capitulardes, dentro daquele prazo e tempo que vos parecer bem, e que o guardaremos e cumpriremos realmente e com efeito sob as condições, penas e obrigações contidas no contrato das pazes entre nós feitas e concordadas, e sob todas as outras que vós prometerdes e assentardes no nosso sobredito nome, os quais desde agora prometemos pagar e pagaremos realmente e com efeito, se nelas incorremos. Para tudo o que e cada uma coisa e parte disso, vos damos os ditos poderes com livre e geral administração, e prometemos e asseguramos com a nossa fé real, ter e guardar e cumprir, e assim os nossos herdeiros e sucessores tudo o que por vós, acerca do que dito é em qualquer maneira e forma for feito, capitulado e jurado e prometido; e prometemos de o haver por firme, sancionado e grato, estável e valedouro, desde agora para todo tempo e que não iremos, nem viremos, nem irão nem virão contra isso, nem contra parte alguma disso, em tempo algum; nem por alguma maneira, por nós, nem por si, nem por intermediários, direta nem indirectamente, e sob pretexto algum ou causa em juízo nem fora dele, sob obrigação expressa que para isso fazemos dos ditos nossos reinos e senhorios e de todo os nossos bens patrimoniais, fiscais e outros quaisquer de nossos vassalos e súbditos e naturais, móveis e de raiz, havidos e pôr haver.

Em testemunho e fé do que vos mandamos dar esta nossa carta por nós firmada e selada com o nosso selo, dada em nossa cidade de Lisboa aos oito dias de Março. Rui de Pina a fez no ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quatrocentos e noventa e quatro.

EL REY.

E logo os ditos procuradores dos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, de Sicília, de Granada, etc., e do dito Senhor Rei de Portugal e dos Algarves, etc., disseram: que visto como entre os ditos senhores seus constituintes há certa divergência sobre o que a cada uma das ditas partes pertence do que até hoje, dia da conclusão deste tratado está por descobrir no mar Oceano; que eles portanto para o bem da paz e da concórdia e pela conservação da afinidade e amor que o dito senhor Rei de Portugal tem pelos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Aragão, etc., praz as Suas Altezas, e os seus ditos procuradores em seu nome, e em virtude dos ditos seus poderes, outorgaram e consentiram que se trace e assinale pelo dito mar Oceano uma raia ou linha direta de pólo a pólo; convém a saber, do pólo Árctico ao pólo Antárctico, que é de norte a sul, a qual raia ou linha e sinal se tenha de dar e dê direta, como dito é, a trezentas e setenta léguas das ilhas de Cabo Verde em direção à parte do poente, por graus ou por outra maneira, que melhor e mais rapidamente se possa efectuar contacto que não seja dado mais. E que tudo o que até aqui tenha achado e descoberto, e daqui em diante se achar e descobrir pelo dito senhor Rei de Portugal e por seus navios, tanto ilhas como terra firme desde a dita raia e linha dada na forma supracitada indo pela dita parte do levante dentro da dita rala para a parte do levante ou do norte ou do sul dele, contanto que não seja atravessando a dita raia, que tudo seja, e fique e pertença ao dito senhor Rei de Portugal e aos seus sucessores, para sempre. E que todo o mais assim ilhas como terra firme, conhecidas e por conhecer, descobertas e por descobrir, que estão ou forem encontrados pelos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Aragão, etc., e por seus navios, desde a dita raia dada na forma supra indicada ondo pela dita parte de poente, depois de passada a dita raia em direção ao poente ou ao Norte e Sul dela, que tudo seja e fique, e pertença aos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, etc., e aos seus sucessores para sempre. Item os ditos procuradores prometem e asseguram, em virtude dos ditos poderes, que de hoje em diante não enviarão navios alguns, convém a saber, os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, e de Leão, e de Aragão, etc., por esta parte da raia para as partes de levante, aquém da dita raia, que fica para o dito senhor Rei de Portugal e dos Algarves, etc., nem o dito senhor Rei de Portugal à outra parte da dita raia, que fica para os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão etc., a descobrir e achar terra nem ilhas algumas, nem o contratar, nem resgatar, nem conquistar de maneira alguma; porém que se acontecesse que caminhando assim aquém da dita rala os ditos navios dos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, etc., achassem quaisquer ilhas ou terras dentro do que assim fica para o dito senhor Rei de Portugal e dos Algarves, que assim seja e fique para o dito senhor Rei de Portugal e para seus herdeiros para todo o sempre, que Suas Altezas o hajam de mandar logo dar e entregar. E se os navios do dito Senhor de Portugal, acharem quaisquer ilhas e terras na Parte dos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, e de Leão, e de Aragão, etc., que tudo tal seja e fique para os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, e de Leão, etc., e para seus herdeiros para todo o sempre, e que o dito senhor Rei de Portugal o haja logo de mandar. Dar e entregar, item: para que a dita linha ou raia da dita partilha se haja de traçar e trace direita e a mais certa que possa ser pelas ditas trezentas e setenta léguas das ditas ilhas de Cabo Verde em direção a parte do poente, como dito é fica assentado e concordado pelos ditos procuradores de ambas as ditas partes, que dentro dos dez primeiros meses seguintes, a contar do dia da conclusão deste tratado hajam os ditos senhores seus constituintes de enviar duas ou quatro caravelas, isto é, uma ou duas de cada parte, mais ou menos, segundo acordarem as ditas partes serem necessárias, as quais para o dito tempo se acham juntas na ilha da grande Canária: e enviam nelas, cada urna das ditas partes, pessoas, tanto pilotos como astrólogos, e marinheiros e quaisquer outras pessoas que convenham, mas que sejam tantas de uma parte como de outra e que algumas pessoas dos ditos pilotos, e astrólogos e marinheiros, e pessoas que sejam dos que enviarem os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, e de Aragão, etc., vão no navio ou navios que enviar o dito senhor Rei de Portugal e dos Algarves, etc., e da mesma forma algumas das ditas pessoas que enviar o referido senhor Rei de Portugal vão no navio ou navios que mandarem os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, e de Aragão, tanto de uma parte como de outra, para que juntamente possam melhor ver e reconhecer o mar e os rumos e ventos e graus de Sul e Norte, e assinalar as léguas supraditas, tanto que para fazer a demarcação e limites concorrerão todos juntos os que forem nos ditos navios, que enviarem ambas as ditas partes, e levarem os seus poderes, que os ditos navios, todos juntamente, continuem seu caminho para as ditas ilhas de Cabo Verde e daí tomarão sua rota direta ou poente até às ditas trezentas e setenta léguas, medidas pelas ditas pessoas que assim forem, acordarem que devem ser medidas sem prejuízo das ditas partes e ali onde se acabarem se marque o ponto, e sinal que convenha por graus de Sul e de Norte, ou por singradura de léguas, ou como melhor puderem concordar a qual dita raia assinalem desde o dito pólo Árctico ao dito pólo Antárctico, isto é, de Norte a Sul, como fica dito, e aquilo que demarcarem o escrevam e firmem como os próprios as ditas pessoas que assim forem enviadas por ambas as ditas partes, as quais hão-de levar faculdades e poderes das respectivas partes, cada uma da sua, para fazer o referido sinal e delimitação feita por eles, estando todos conformes, que seja tida por sinal e limitação perpetuamente para todo o sempre para que nem as ditas partes, nem algumas delas, nem seus sucessores jamais a possam contradizer, nem tirá-la, nem removê-la em tempo algum, por qualquer maneira que seja possível ou que possível possa ser. E se por acaso acontecer que a dita raia e limite de pólo a pólo, como está declarado, topar em alguma ilha ou terra firme, que no começo de tal ilha ou terra, que assim for encontrada onde tocar a dita linha se faça alguma marca ou torre: e que o direito do dito sinal ou torre se sigam daí para diante outros sinais pela tal ilha ou terra na direção da citada raia os quais partam o que a cada uma das partes pertencer dela e que os súbditos das ditas partes não ousem passar uns à porção dos outros, nem estes à daqueles, passando o dito sinal ou limites na tal ilha e terra. Item: por quanto para irem os ditos, navios dos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, etc. dos reinos e senhorios até sua dita porção além da dita raia, na maneira que ficou dito é forçoso que tenham de passar pelos mares desta banda da raia que fica para o dito senhor Rei de Portugal, fica por isso concordado e assentado que os ditos navios dos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, etc., possam ir e vir e vão e venham livre, segura e pacificamente sem contratempo algum pelos ditos mares que ficam para o dito senhor Rei de Portugal, dentro da dita raia em todo o tempo e cada vez e quando Suas Altezas e seus sucessores quiserem, e por bem tiverem, os quais vão por seus caminhos direitos e rotas, desde seus reinos para qualquer parte do que esteja dentro de sua raia e limite, onde quiserem enviar para descobrir, o conquistar e contratar, e que sigam seus caminhos direitos por onde eles acordarem de ir para qualquer ponto da sua dita parte, e daqueles não se possam apartar, salvo se o tempo adverso os fizer afastar, contanto que não tomem nem ocupem, antes de passar a dita raia, coisa alguma do que for achado pelo dito senhor Rei de Portugal na sua dita porção, e que, se alguma coisa acharem os seus ditos navios antes de passarem a dita raia, conforme está dito, que isso seja para o dito senhor Rei de Portugal, e Suas Altezas o hajam de mandar logo dar e entregar. E porque poderia suceder que os navios, e gentes dos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, etc., ou por sua parte terão achado, até aos vinte dias deste mês de junho em que estamos da conclusão deste tratado, algumas ilhas e terra firme dentro da dita raia, que se há-de traçar de pólo a pólo por linha recta ou final das ditas trezentas e setenta léguas contadas desde as ditas ilhas de Cabo Verde para o poente, como dito está, fica acordado e assentado, para desfazer qualquer dúvida, que todas as ilhas e terra firme, que forem achadas, e descobertas de qualquer maneira até aos ditos vinte dias deste dito mês de junho, ainda que sejam encontradas por navios, e gentes dos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, etc., contanto que estejam dentro das primeiras duzentas e cinquenta léguas das ditas trezentas e setenta léguas, contadas desde as ditas ilhas de Cabo Verde ao poente em direção à dita raia, em qualquer parte delas para os ditos pólos, que forem achadas dentro das ditas duzentas e cinquenta léguas, traçando-se uma raia, ou linha reta de pólo a pólo, onde se acabarem as ditas duzentas e cinquenta léguas, seja e fique para o dito senhor Rei de Portugal e dos Algarves, etc., e para os seus sucessores e reinos para sempre, e que todas as ilhas e terra firme, que até os ditos vinte dias deste mês de junho em que estamos, forem encontradas e descobertas por navios dos ditos senhores Rei e Rainha de Castela, e de Aragão, etc., e por suas gentes, ou de outra qualquer maneira dentro das outras cento e vinte léguas, que ficam para complemento das ditas trezentas e setenta léguas, em que há de acabar a dita raia, que se há de traçar de pólo a pólo, como ficou dito, em qualquer parte das ditas cento e vinte léguas para os ditos pólos, que sejam achadas até o dito dia, sejam e fiquem para os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, etc., e para os seus sucessores e seus reinos para todo o sempre, conforme é e há de ser seu tudo o que descobrirem além da dita fala das ditas trezentas e setenta léguas, que ficam para Suas Altezas, como ficou dito, ainda que as indicadas cento e vinte léguas estejam dentro da dita raia das ditas trezentas e setenta léguas, que ficam para o dito senhor Rei de Portugal e dos Algarves, etc., como dito está. E se até os ditos vinte dias deste dito mês de junho não for encontrada pelos ditos navios de Suas Altezas coisa alguma dentro das ditas cento e vinte léguas, e dali para diante o acharem, que seja para o dito senhor Rei de Portugal, como no supra capítulo escrito está contido. E que tudo o que ficou dito e cada coisa e parte dele, os ditos Dom Henrique Henriques, Mordomo-Mor, e Dom Gutierre de Cárdenas, Contador-Mor, e do Doutor Rodrigo Maldonado, procuradores dos ditos mui altos e mui poderosos Príncipes ou Senhores o Rei e a Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, da Sicília, de Granada, etc., e em virtude dos seus ditos poderes que vão incorporados, e os ditos Rui de Souza, e Dom João de Souza, seu filho, e Arias de Almada procuradores e embaixadores do dito mui alto e mui excelente príncipe o senhor Rei de Portugal e dos Algarves, de aquém e além em África e senhor de Guiné, e em virtude dos seus ditos poderes que vão supra incorporados, prometeram e asseguraram em nome dos seus ditos constituintes, que eles e seus sucessores e reinos, e senhorios, para todo o sempre, terão, guardarão e cumprirão realmente, e com efeito, livre toda fraude e penhor, engano, ficção e simulação, todo o contido nesta capitulação, e cada uma coisa, e parte dele, quiseram e outorgaram que todo o contido neste convénio e cada uma coisa e parte disso será guardada e cumprida e executada como se há-de guardar, cumprir e executar todo o contido na capitulação das pazes feitas e assentadas entre os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, etc., e o Senhor Dom Afonso Rei de Portugal, que em santa glória esteja, e o dito senhor Rei que agora é de Portugal, seu filho, sendo príncipe o ano que passou de mil quatrocentos e setenta e nove anos, e sob aquelas mesmas penas, vínculos, seguranças e obrigações, segundo e de maneira que na dita capitulação das ditas pazes está contida. E se obrigaram a que nem as ditas pazes, nem algumas delas, nem seus sucessores para todo o sempre irão mais nem se voltarão contra o que acima está dito e especificado, nem contra coisa alguma nem parte disso direta nem indirectamente, nem por outra maneira alguma, em tempo algum, nem por maneira alguma pensada ou não pensada que seja ou possa ser, sob as penas contidas na dita capitulação das ditas pazes, e a pena cumprida ou não cumprida ou graciosamente remida, que esta obrigação, e capitulação, e assento, deixe e fique firme, estável e válida para, todo o sempre, para assim terem, e guardarem, e cumprirem, e pagarem em tudo o supradito aos ditos procuradores em nome dos seus ditos constituintes, obrigaram os bens cada um de sua dita parte, móveis, e de raiz, patrimoniais e fiscais, e de seus súbditos e vassalos havidos e por haver, e renunciar a quaisquer leis e direitos de que se possam valer as ditas partes e cada uma delas para ir e vir contra o supradito, e cada uma coisa, e parte disso realmente, e com efeito, livre toda a fraude, penhor e engano, ficção e simulação, e não o contradirão em tempo algum, nem por alguma maneira sob o qual o dito juramento juraram não pedir absolvição nem relaxamento disso ao nosso Santíssimo Padre, nem a outro qualquer Legado ou prelado que a possa dar, e ainda que de motu proprio a dêem não usarão dela, antes por esta presente capitulação suplicam no dito nome ao nosso Santíssimo Padre que haja Sua Santidade por bem confiar e aprovar esta dita capitulação, conforme nela se contém, e mandando expedir sobre isto suas Bulas às partes, ou a quaisquer delas, que as pedir e mandam incorporar nelas o teor desta capitulação, pondo suas censuras aos que contra ela forem ou procederem em qualquer tempo que seja ou possa ser. E assim mesmo os ditos procuradores no dito nome se obrigaram sob a dita pena e juramento, dentro dos cem primeiros dias seguintes, contados desde o dia da conclusão deste tratado, darão uma parte a esta primeira aprovação, e ratificação desta dita capitulação, escritas em pergaminho, e firmadas nos nomes dos ditos senhores seus constituintes, e seladas, com os seus selos de cunho pendentes; e na escritura que tiverem de dar os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, de Aragão, etc., tenha de firmar e consentir e autorizar o mui esclarecido e ilustríssimo senhor o Príncipe Dom João seu filho. E tudo o que dito é, outorgaram duas escrituras de um mesmo teor uma tal qual a outra, as quais firmaram com seus nomes e as outorgaram perante os secretários e testemunhas abaixo assinadas para cada uma das partes a sua e a qualquer que se apresenta, vale como se ambas as duas se apresentassem, as quais foram feitas e outorgadas na alta vila de Tordesilhas no dito dia, mês e ano supraditos Dom Henrique, comendador-mor - Rui de Souza, Dom João de Souza o Doutor Rodrigo Maldonado. Licenciado Arias. Testemunhas que foram presentes, que vieram aqui firmar seus nomes ante os ditos procuradores e embaixadores e outorgar o supradito, e fazer o dito juramento, o Comendador Pedro de Leon, o Comendador Fernando de Torres, vizinhos da vila de Valladolid, o Comendador Fernando de Gamarra, Comendador de Lagra e Cenate, contínuos da casa dos ditos Rei e Rainha nossos senhores, e João Soares de Siqueira e Rui Leme, e Duarte Pacheco, contínuos da casa do Senhor Rei de Portugal para isso chamados, E eu, Fernando Dalvres de Toledo secretário do Rei e da Rainha nossos Senhores e de seu Conselho, e seu escrivão de Câmara, e Notário Público em sua Corte, e em todos os seus Reinos e Senhorios estive presente a tudo que dito está declarado em um com as ditas testemunhas, e com Estevão Baez, secretário do dito Senhor Rei de Portugal, que pela autoridade que os ditos Rei e Rainha nossos senhores lhe deram para dar sua fé neste auto em seus Reinos, que esteve também presente ao que dito está, e a rogo e outorgamento de todos os procuradores e embaixadores que em minha presença e na sua aqui firmaram seus nomes, este instrumento público de capitulação fiz escrever, o qual vai escrito nestas seis folhas de papel de formato inteiro e escritas de ambos os lados e mais esta em que vão os nomes dos supraditos e o meu sinal. E no fim de cada página vai rubricado o sinal do meu nome e o do dito Estevão Baez, e em fé disso pus aqui este meu sinal, que é tal. Em testemunho de verdade Fernão Alvares. E eu, dito Estevam Baez, que por autoridade que os ditos senhores Rei e Rainha de Castela, de Leão, etc., me deram para fazer público em todos os seus Reinos e Senhorios, juntamente com o dito Fernão Dalvres, a rogo e requerimento dos ditos embaixadores e procuradores a tudo presente estive, e em fé a certificarão, disso aqui com o meu público sinal assinei, que é tal. A qual dita escritura de assento, e capitulação e concórdia supra incorporada, vista e entendida por nós e pelo dito príncipe Dom João, nosso filho. Nós a aprovamos, louvamos e confirmamos, e outorgamos, ratificamos, e prometemos ter, guardar e cumprir todo o supradito nela contido, e cada uma coisa, e parte disso, realmente e com efeito livre toda fraude, cautela e simulação, e de não ir, nem vir contra isso, nem contra parte disso em tempo algum, nem por alguma maneira que seja, ou possa ser, e para maior firmeza, nós, e o dito Príncipe Dom João nosso filho, juramos por Deus, pela Santa Maria, e pelas palavras do Santo Evangelho, onde que quer mais amplamente estejam impressas, e pelo sinal da cruz, na qual corporalmente colocamos nossas mãos directas em presença dos ditos Rui de Souza e Dom João de Souza, e o licenciado Arias de Almada, embaixadores e procuradores do dito e Sereníssimo Rei de Portugal, nosso irmão, de o assim ter e guardar e cumprir, e a cada uma coisa, e parte do que a nós incumbe realmente, e com efeito, como está dito, por nós e por nossos herdeiros e sucessores, é pelos nossos ditos Reinos e Senhorios, e súbditos e naturais deles, sob as penas e obrigações, vínculos e renúncias no dito contrato de capitulação e concórdia supra escrito contidas: por certificação e corroboração do qual firmamos nesta nossa carta nossos nomes e a mandamos selar com o nosso selo de cunho pendente em fios de seda em cores.

Dada na vila de Arevalo, aos dois dias do mês de julho, ano do nascimento de Nosso Senhor Jesus Cristo de mil quatrocentos e noventa o quatro.

Eu, El-Rei – Eu, a Rainha – Eu, o príncipe – E eu Fernão Dalvres de Toledo, secretário d'El-Rei, e da Rainha nossos senhores, a fiz escrever por sua ordem.




Tratado de Sunda Kalapa
(21 de Agosto de 1522)


O Tratado de Sunda Kalapa foi um tratado assinado em 21 de Agosto de 1522 entre o Reino de Sunda e Portugal, com vista a uma aliança militar e construção de um forte, assinalado com um padrão de pedra, conhecido como o Padrão Luso Sundanês. Devido ao crescente domínio islâmico em Demak e Cirebon, o Rei Hindu de Sunda Sri Baduga, Prabu Siliwangi, procurou a ajuda junto dos Portugueses em Malaca. Para isso em 1512 e de novo em 1521 enviou o seu filho, o Príncipe da Coroa Prabu Surawisesa, Ratu Samian (Sang Hyang) de Malaca, a fim de convidar os portugueses a assinar um ‘Tratado de Paz’ para o comércio de pimenta e construir uma fortaleza no seu principal porto, em Sunda Kalapa (actual Jacarta). Em 1522 os portugueses estavam prontos para formar uma coligação com o Rei de Sunda, a fim de obter acesso ao lucrativo comércio de pimenta, o que aconteceu no mesmo ano em que foi concluída a ‘Circum-Navegação’ do português Fernão de Magalhães. O comandante da fortaleza de Malaca era então Dom Jorge de Albuquerque. Em 1522 este enviou um navio a Sunda Kalapa, o ‘São Sebastião’ Capitaneado por Henrique Leme, com valiosos presentes para o Rei de Sunda. Duas fontes escritas descrevem a celebração do Tratado em pormenor. Uma delas é o documento português original de 1522, com o texto do tratado e assinaturas das testemunhas, o outro é um relato do evento por João de Barros, no seu livro Da Ásia, só impresso em 1777/1778. De acordo com estas fontes, o Rei saudou-os calorosamente à chegada. O Principe da coroa havia sucedido a seu pai que reinou de 1512 a 1521, e era agora Rei Prabu Surawisesa com o título Ratu Samiam (Sang Hyang).



João de Barros chamou-lhe Rei Samião. Este Governante de Sunda concordou num ‘Acordo de Amizade’ com o Rei de Portugal e decidiu conceder uma fortaleza na foz do Ciliwung, rio onde os portugueses poderiam carregar muitos navios com pimenta como pretendiam. Além disso, prometeu que a partir do dia em que a construção da fortaleza se iniciasse, a cada ano doaria mil sacos de pimenta ao Rei Português (mais de 20 toneladas). O contrato foi escrito por duas vezes, uma cópia para o Rei de Sunda e uma para o Rei de Portugal, que foram assinados em 21 de Agosto de 1522. Os principais adjuntos do Rei foram o Mandarim Padam Tumangu, a Mandarina Sangydepaty e Benegar, bem como o Xabândar da terra chamado Fabian. "Pelo dito dia" disseram os Mandarins e outros homens notáveis, em conjunto com Dom Henrique Leme e seu séquito, foi para o local onde a fortaleza deveria ser construída na foz do rio, na "terra chamada Sunda Kalapa". Ali se ergueu em memória uma pedra, chamada padrão, no subdistrito Tugu, no norte de Jacarta. Era um costume do português erguer um padrão ao descobrir uma nova terra. Os portugueses não conseguiriam cumprir a promessa de voltar no ano seguinte para a construção da fortaleza por causa de problemas em Goa, na Índia. Só retornariam ao mar de Java em Novembro de 1526, com seis navios de Bintan sob o comando de do Capitão Francisco da Sá.

Tratado de Saragoça
(22 de Abril de 1529)


O Tratado de Saragoça, também referido como Capitulação de Saragoça, foi um tratado de paz entre Espanha e Portugal assinado em 22 de Abril de 1529 pelo Rei Dom João III e pelo imperador Carlos V, na cidade de Saragoça. O tratado delimitava as zonas de influência portuguesa e espanhola na Ásia para solucionar a chamada "Questão das Molucas", em que ambos os Reinos reclamavam para si aquelas ilhas, considerando-as dentro da sua zona de exploração estabelecida no ‘Tratado de Tordesilhas’ de 1494. O conflito nascera em 1520, quando as explorações de ambos os Reinos atingiram o Oceano Pacífico, dado que não fora estabelecido um limite a leste. Em 1494 Espanha e Portugal firmaram o Tratado de Tordesilhas, que dividia o mundo em duas zonas de influência: a espanhola e a portuguesa. Este tratado definia um meridiano no Oceano Atlântico, concedendo a parte ocidental a Espanha e a oriental a Portugal. Em 1511 Afonso de Albuquerque conquistou Malaca para Portugal, então o centro do comércio asiático. Aí, ao saber da localização até então secreta das chamadas "ilhas das especiarias" (as ilhas Banda, nas Molucas, única fonte mundial de noz moscada e cravinho e objectivo central das viagens no Índico) enviou uma expedição comandada por Dom António de Abreu até Banda, onde foram os primeiros europeus a chegar no início de 1512. Dom Abreu partiu depois para Ambão enquanto o seu Vice-Comandante o Capitão Francisco Serrão naufragou junto a Ternate, onde obteve a autorização para construir um forte-feitoria português: o Forte de São João Baptista de Ternate, iniciado em 1522. Cartas do capitão Serrão a Fernão de Magalhães, seu amigo e possivelmente primo, descrevendo as "Ilhas das Especiarias", ajudaram Magalhães a persuadir a coroa Espanhola a financiar a sua viagem de circum-navegação.



Em 1520, as ilhas Molucas, "berço de todas as especiarias", foram visitadas pela frota do Almirante Fernão de Magalhães, vinda de oeste, ao serviço da Coroa Espanhola. Antes que os dois pudessem encontrar-se nas Molucas, o Capitão Serrão morreu na ilha de Ternate, quase ao mesmo tempo em que Magalhães era morto em combate nas Filipinas. Após a expedição de Magalhães de 1519 até 1522, o Imperador Carlos V enviou uma expedição comandada por Dom García Jofre de Loaísa, para tomar e colonizar as ilhas, alegando que se encontravam na sua zona de demarcação do meridiano de Tordesilhas. A expedição chegou com dificuldade às Molucas, onde os espanhóis fundariam o forte de Tidore. O conflito com os portugueses já estabelecidos na ilha foi inevitável, resultando na derrota espanhola após um ano, e abrindo quase uma década de escaramuças pela sua posse. Em 1524 organizou-se a Junta de ‘Badajoz-Elvas’ para solucionar a questão. Para determinar a localização correcta do Meridiano de Tordesilhas, que dividiria o mundo em dois hemisférios equivalentes, cada coroa nomeou três astrónomos ou cartógrafos, três pilotos e três matemáticos, que se reuniram várias vezes em Badajoz e Elvas, sem chegar a acordo. Lopo Homem, cartógrafo e cosmógrafo português participou na Junta, tal como Diogo Lopes de Sequeira. A representação espanhola incluía o cartógrafo Diogo Ribeiro. Sobre esta Junta existe na Torre do Tombo uma carta de autoria de Lopo Homem, aludindo à querela entre os dois soberanos acerca dos direitos que cada um tinha a determinadas terras e navegações. Os meios da época eram insuficientes para o cálculo exacto da longitude e cada grupo atribuía as ilhas aos respectivos soberanos. O Rei Dom João III e o Imperador Carlos V acordaram em não enviar mais ninguém buscar especiarias às Molucas enquanto não se esclarecesse em que hemisfério se encontravam as ilhas. Entre 1525 e 1528 foram enviadas várias expedições portuguesas para conhecer o território. Os Capitães Gomes de Sequeira e Diogo da Rocha foram enviados pelo governador de Ternate. O capitão Jorge de Meneses ao norte das Molucas, sendo os primeiros europeus a chegar às Ilhas Carolinas, que então nomearam "Ilhas de Sequeira". Em 1526 o Capitão Jorge de Meneses aportou na ilha Waigeo na Papua-Nova Guiné. A 11 de Março de 1526, o Imperador Carlos V casou-se com Dona Isabel de Portugal, reforçando os laços entre as coroas e facilitando o acordo sobre as Molucas. Era do interesse do imperador evitar problemas para poder centrar-se na política europeia. Além disso, os espanhóis ainda não sabiam como transportar as especiarias das Molucas para a Europa navegando para o Oriente (a rota Manila-Acapulco seria descoberta por Andrés de Urdaneta apenas em 1565.



Pelo Tratado de Saragoça definiu-se a continuação do meridiano de Tordesilhas no hemisfério oposto, a 297,5 léguas do leste das ilhas Molucas, cedidas pela Espanha mediante o pagamento, por Portugal, de 350.000 ducados de ouro. Ressalvava-se que em todo o seu tempo se o imperador ou sucessores quisessem restituir aquela avultada quantia, ficaria desfeita a venda e cada um "ficará com o direito e a acção que agora tem". Como é evidente, tal nunca sucedeu, até porque o imperador precisava desesperadamente do dinheiro português para financiar as suas guerras contra o seu arqui-rival Francisco I de França e a Liga de Cognac que o suportava. A delegação portuguesa enviada pelo Rei Dom João III incluía entre outros Dom António de Azevedo Coutinho, Dom Diogo Lopes de Sequeira, Dom Lopo Homem e Dom Simão Fernandes. Foram plenipotenciários, por parte de Portugal, Dom António Azevedo Coutinho e, por parte de Espanha, Dom Mercúrio de Gattinara, Conde Gattinara, Garcia de Loyosa, Bispo de Osmã, e Dom Garcia de Padilla, comendador de Calatrava. Medições posteriores comprovaram que, pelo anti meridiano de Tordesilhas, as ilhas Molucas, bem como as Filipinas, encontravam-se em território pertencente a Portugal, o que de pouco adiantou já que durante o século XVII essas disputadas ilhas acabariam em mãos holandesas em troca das capitanias da Nova Holanda (Itamaracá, Paraíba e Pernambuco). A perda das Molucas posteriormente também representaria o início da expansão do poderio holandês no sudeste asiático.

Tratado de Baçaim
(23 de Dezembro de 1534)


O Tratado de Baçaim foi assinado pelo Sultão Bahadur Xá de Guzerate e Portugal em 23 de Dezembro de 1534, a bordo do Galeão 'São Mateus'. Com base nos termos do acordo, Portugal obteve o controlo da cidade de Baçaim, assim como dos seus territórios, ilhas e mares. As sete ilhas de Bombaim (Colaba, Pequena Colaba (Ilha da Mulher Velha), Bombaim, Mazagão, Worli, Matunga e Mahim), a ilha de Salsete, Damão e Diu, Taná, Kalyan e Chaul foram outros dos territórios que ficaram sob o controlo português.

Período Nanban
(De 1543, até sua exclusão quase total 1637 e 1641)



O Comércio Nanban (japonês:南蛮貿易, nanban-boeki, "Comércio com os bárbaros do Sul") ou Período do Comércio Nanban (japonês: 南蛮貿易時代, nanban-bōeki-jidai, "Período do comércio com bárbaros do Sul") na história do Japão compreende o período que vai da chegada dos primeiros europeus, oriundos de Portugal, em 1543, até sua exclusão quase total do arquipélago entre 1637 e 1641, com a promulgação do "Sakoku" (o Édito de Exclusão). Nanban (南蛮 literalmente: “bárbaros do Sul”) é uma palavra sino-japonesa que originalmente designava as pessoas do sul e Sudeste asiáticos. Segue um uso chinês, que diz cercar-se por "bárbaros" nas quatro direcções, sendo os do sul denominados 'Nanman'. No Japão, a palavra passou a ter um novo significado quando passou a designar os europeus, os primeiros dos quais foram os portugueses, que aportaram no país em 1543. A palavra depois abarcou os espanhóis, os holandeses (embora estes fossem geralmente chamados por "Komo" - 紅毛 - significando "cabelos vermelhos") e os ingleses. A palavra 'Nanban' foi naturalmente empregue para os novos forasteiros, uma vez que estes surgiam em navios vindos do sul, e seus modos foram considerados pouco sofisticados pelos japoneses. Os japoneses inicialmente reprovavam os modos dos estrangeiros recém-chegados. Um registro japonês contemporâneo relata:

"Comem com seus dedos, em vez de usarem os pauzinhos, como nós. Manifestam seus sentimentos, sem qualquer autocontrole. São incapazes de entender a nossa escrita."

Logo depois, entretanto, os japoneses adoptaram muitas das tecnologias e práticas culturais daqueles visitantes, seja na área militar (como o arcabuz, armaduras em estilo europeu, e embarcações), religiosos (Cristianismo), arte decorativa e na linguagem (integração ao japonês de termos de origem portuguesa e ocidentais). Muitos estrangeiros foram auxiliados por ‘Regentes Nipónicos’, e às vezes suas habilidades foram reconhecidas ao ponto de serem promovidos ao grau de samurais (como William Adams), e a cessão do feudo da Península de Miura, ao sul de Edo. Na Renascença os europeus se admiraram com o Japão, que consideravam ‘Rico em Metais Preciosos’, especialmente em razão dos relatos de Marco Polo (no qual chamava o país de Cipango) que diziam de templos e palácios em ouro, como também pela existência de outros minerais característicos de solos vulcânicos, encontrados à superfície em tempos onde as técnicas de mineração profunda eram inexistentes. O Japão tornar-se-ia, nesse período, num importante exportador de cobre e prata. O Japão também era olhado como uma sofisticada sociedade feudal, de cultura cosmopolita e dotada de uma avançada tecnologia pré-industrial. Era, o mais povoado e mais urbanizado do que qualquer país ocidental de então (tinha, no século XVI, cerca de 26 milhões de habitantes, contra 16 na França e 4,5 milhões da Inglaterra). Suas "universidades" budistas eram maiores que qualquer das instituições de ensino do Ocidente, a exemplo das universidades de Salamanca ou de Coimbra. Alguns observadores europeus contemporâneos escreveram que os japoneses "superam não apenas todos os demais povos orientais, eles ultrapassam também aos europeus" (Alessandro Valignano, 1584). Os primeiros visitantes europeus ficaram impressionados com a habilidade dos artesãos e ferreiros nipónicos. Isto se deve ao facto de o Japão ser bastante pobre em recursos naturais comuns na Europa, especialmente o ferro. Assim, os japoneses passariam a ser reconhecidos pela forma económica com que empregavam os recursos de que dispunham.



O que havia em pequena quantidade, eles aprenderam a usar com especialização. A coragem guerreira do japonês também foi notada: "Um decreto real espanhol de 1609 especificamente dirigido aos comandantes espanhóis no Pacífico dizia para "não arriscar a reputação de nossos braços e enfrentar um soldado japonês". Tropas samurais japonesas foram depois empregues nas Ilhas Molucas pelos holandeses para enfrentar os ingleses. Após os primeiros contactos de 1543, ‘Naus Lusas’ começaram a chegar ao Japão. À época, as trocas comerciais e em particular o comércio português em Goa era já costumeiro (desde cerca de 1515), consistindo entre 3 a 4 Naus que deixavam Lisboa com prata para comprar algodão e especiarias na Índia. Entre essas Carracas, só uma se dirigia para a China, com ordem para comprar directamente a seda, também em troca da prata ibérica. Com a fundação do porto de Nagasaki, através das iniciativas combinadas do convertido Daimyo Omura Sumitada junto com seu amigo Português e confessor, o missionário jesuíta Gaspar Vilela, em 1571, a extensão do comércio Português e sua influência no Japão, particularmente em Kyushu, aumentaria dramaticamente nos próximos 30 anos. Promovendo a sua presença no porto estratégico, depois da ajuda portuguesa ao Daimyo Sumitada para repelir um ataque no porto pelo clã Ryūzōji em 1578, incidente que por sua vez levou Sumitada a ceder Nagasaki "em perpetuidade" para a Companhia de Jesus, dois anos depois. Oportunamente, a carga dos primeiros navios portugueses (em geral cerca de quatro pequenas embarcações ao ano) aportavam no Japão, com carga basicamente oriunda da China (seda, porcelana). Os japoneses almejavam esses bens, mas estavam proibidos de realizar qualquer contacto com a China pelo Imperador, como punição pelos ataques dos piratas Waco. Proporcionava-se assim, uma nova oportunidade para os portugueses actuarem como intermediários no comércio asiático. Ao tempo da aquisição de Macau, em 1557, e com o formal reconhecimento de uma parceria comercial pelos chineses, a Coroa de Portugal começou a ‘Regulamentar o Comércio com o Japão’, concedendo privilégios de navegação e autoridade ao licitante que melhor oferta desse pela ‘Capitania Anual do Japão’, cujo efeito era conferir os direitos comerciais exclusivos para enviar uma só Carraca àquele país oriental todos os anos.



As Carracas eram Naus muito grandes, com uma calagem entre mil e mil e quinhentas toneladas, cerca do dobro ou triplo do tamanho de um Galeão regular ou de um grande junco. Esse comércio continuou, com poucas interrupções, até cerca de 1638, quando foi proibido o desembarque de padres no solo nipónico. O comércio lusitano foi sendo cada vez mais desafiado por contrabandistas chineses em seus juncos e pelos próprios japoneses em seus ‘shuinsen’ a partir de 1592 (cerca de dez navios ao ano), além de embarcações espanholas oriundas de Manila a partir de 1600 (um navio ao ano), dos holandeses a partir de 1609, e ingleses desde 1613 (um navio ao ano). Uma das muitas coisas nas quais os japoneses estavam interessados eram as armas de fogo portuguesas. Os três primeiros europeus a chegarem ao Japão no ano de 1543 foram os comerciantes Portugueses António da Mota, António Peixoto e Francisco Zeimoto (também presumivelmente Fernão Mendes Pinto), chegaram em um navio chinês no sul da ilha de Tanegashima, onde apresentaram suas armas para o comércio com a população local. Uma vez que as armas de fogo Portuguesas foram introduzidas em Tanegashima, no Japão estes arcabuzes receberam o nome de Tanegashima. Naquela época o Japão estava no meio de uma guerra civil, o chamado período Sengoku (‘Período do país em guerra’). Estritamente falando, os japoneses já estavam familiarizados com armas de pólvora (inventada e trazida a partir de China) cerca de 270 anos antes da chegada dos Portugueses. As armas portuguesas no entanto eram leves, possuíam um mecanismo melhor e eram mais fáceis de mirar. O famoso Daimyo que praticamente unificou o Japão, Oda Nobunaga, fez uso extensivo das armas de fogo (arcabuz) desempenhando um papel fundamental na ‘Batalha de Nagashino’. Dentro de um ano, ferreiros japoneses, conseguiram reproduzir o mecanismo e começaram a produzir em massa as armas portuguesas. E apenas 50 anos mais tarde, seus exércitos eram equipados com um número de armas talvez maior que qualquer exército contemporânea na Europa.



As armas foram de extrema importância na unificação do Japão sob Toyotomi Hideyoshi e Tokugawa Ieyasu, bem como na invasão da Coreia em 1592 e 1597. Os europeus trouxeram pelo comércio não apenas armas, mas também sabão, tabaco e outros produtos desconhecidos no Japão Feudal. Os navios europeus (Galeões) foram bastante influentes na indústria de construção naval do Japão, e de fato estimulou muitos empreendimentos japoneses no exterior. O Bakufu estabeleceu um sistema de empreendimentos comerciais em navios licenciados chamados navios de selo vermelho ( shuinsen?), que navegavam todo o Leste e Sudeste da Ásia para comercializar. Estes navios incorporaram muitos elementos dos Galeões, tais como as velas, o leme e a disposição das armas. Eles levaram muitos comerciantes e aventureiros japoneses para os portos do sudeste asiático, tornando-os influentes nos assuntos locais, como o aventureiro Yamada Nagamasa no Sião, ou mais tarde tornando-os ícones populares japoneses como Tenjiku Tokubei. No início do século XVII, o Bakufu construiu vários navios de concepção puramente Nanban, geralmente com a ajuda de peritos estrangeiros, como o Galeão San Juan Bautista, que atravessou o Pacífico duas vezes em embaixadas para Nueva España (México). Dois incidentes em particular, o primeiro registado em Novembro de 1608 em Macau e outro na sequência desse, em Janeiro de 1610, marcariam os dois mais graves confrontos entre portugueses e japoneses neste período e o início de um crescendo de hostilidade mútua, a partir do final do primeiro decénio do século XVII. No primeiro incidente, uma trupe de homens japoneses, a serviço numa embarcação pertença do Daimyo Arima Shuri-No-Tayo Hanurobu, Senhor do Han (feudo) de Arima, é acusada pelas gentes do porto de Macau de causarem graves distúrbios na área, imputando aos ditos vassalos de Arima as ofensas de andarem ostensivamente armados pelas ruas de Macau, acossando, insultando, agredindo e roubando os locais, e chegando mesmo a afrontar um ouvidor (magistrado) português então de passagem pela região, correndo a pedir auxílio ao Governador Português, o Capitão-Mor André Pessoa, que prontamente mobilizou a guarnição militar da praça por modo a restaurar a ordem pública na província sob sua autoridade. Aos homens de Arima, juntam-se nessa hora, outros japoneses oriundos de diversas outras embarcações então ancoradas em Macau. A 30 de Novembro de 1608, após violentos combates nas ruas de Macau opondo os meliantes japoneses à guarnição portuguesa sob o comando de André Pessoa, logrou esta cercar os amotinados nipónicos num pequeno quarteirão do porto, após o que, e tendo o Capitão-Mor Pessoa prometido poupar a vida dos que se rendessem (oferta alegadamente aceite apenas por uma pequena facção entre os sublevados) a larga maioria dos insurrectos japoneses foi morta, tendo apenas um pequeno grupo escapado com vida, graças à intervenção na hora do então Bispo de Macau. Na sequência deste primeiro incidente, e comandando o próprio Capitão-Mor André Pessoa a nave fretada nesse ano de 1610 para Nagasaki, uma vez chegada esta ao porto japonês, o Daimyo Arima Hanurobu, ordena então uma inspecção à embarcação portuguesa com o propósito de lhe confiscar a carga a título de compensação pelas vidas dos seus servos mortos pela guarnição Portuguesa de Macau dois anos antes. Porém é insultado pelo capitão, o qual recusa veementemente toda e qualquer atribuição de responsabilidades pelos incidentes verificados em Macau. O navio português era o ‘Nossa Senhora da Graça’. (também referida nalgumas fontes como ‘Madre de Deus’.) Reportando este incidente ao Shogun Tokugawa, este ordena então a Arima Hanurobu que prenda o Capitão e sua embarcação pelo acto de desafio. As forças de Arima partem então em perseguição do ‘Nossa Senhora da Graça’, que entretanto e por ordem do Capitão Pessoa, procurando evitar um confronto de consequências imprevisíveis e potencialmente desastrosas para ambas as partes, zarpara para Sul, tendo, efeito dos fracos ventos do dia, ficado imobilizado ao largo da costa de Fukuma, onde a Batalha subsequente viria a ocorrer. A batalha acontece durante a primeira semana de 1610. Arima Hanurobu tinha aproximadamente 3,000 Samurais, que atacaram sem sucesso devido à superioridade do armamento do ‘Nossa Senhora da Graça’ que, apesar da enorme desproporção de meios humanos em confronto, facilmente repeliu todas as investidas das embarcações de Arima. Porém, o ‘Nossa Senhora da Graça’ acabaria por perecer na sequência da explosão acidental de uma granada portuguesa no próprio convés da Nau, em pleno terceiro dia de batalha, e quando os portugueses já se davam por vitoriosos. A deflagração da granada, tendo ateado fogo às velas, causou, de imediato, grande consternação entre a tripulação e demais homens a bordo, tendo então, o Capitão-Mor André Pessoa, e apercebendo-se da impossibilidade de salvar a sua Nau, descido ao paiol da embarcação munido de uma tocha e feito explodir a nave. Este evento terá, à época, causado grande impressão entre os japoneses que interpretaram no gesto de Pessoa um acto de grande bravura e nobreza. O afundamento do ‘Nossa Senhora da Graça’ passou, desde então, a integrar o folclore de Nagasaki, sendo ainda hoje celebrado no festival tradicional dito "Nagasaki Kunchi", celebrado todos os anos entre os dias 7 e 9 de Outubro. Os holandeses, que, ao invés de serem chamados "Nanban" receberam o apelido de "Kōmō" (Jp: 紅毛, literalmente "cabelo vermelho"), chegaram ao Japão em 1600, a bordo do ‘Liefde’. Seu piloto era William Adams, o primeiro inglês a chegar àquele país. Em 1605, foram enviados dois tripulantes do Liefde ao Reino de Patani por Tokugawa Ieyasu, para aceitarem o comércio holandês com o Japão. O chefe do entreposto comercial holandês em Patani, Victor Sprinckel, recusou a oferta, pois estava já bastante ocupado com a oposição portuguesa no Sudoeste asiático.



Em 1609, entretanto, o holandês Jacques Specx aportou com duas embarcações em Hirado e, com intercessão de Adams, obteve privilégios comerciais de Ieyasu. Os flamengos também se engajaram na pirataria e combate naval para debilitar a presença portuguesa e as embarcações espanholas no Pacífico e, ao final das contas, tornaram-se os únicos ocidentais a terem acesso permitido no Japão, através do pequeno enclave de Dejima, uma minúscula ilha artificial originalmente concebida para concentrar a comunidade portuguesa de Nagasaki, logo a partir de 1638, ano em que se dá a expulsão definitiva da generalidade dos portugueses e espanhóis ainda então presentes em território nipónico, e daí pelos próximos dois séculos. Depois que o país foi pacificado e unificado por Tokugawa Ieyasu, em 1603, o Japão fechou-se progressivamente para o mundo exterior, principalmente por causa da ascensão do cristianismo. Em 1650, com excepção do posto comercial de ‘Dejima em Nagasaki’, pertencente á Holanda, e algum comércio com a China, os estrangeiros estavam sujeitos à pena de morte, e cristãos eram perseguidos. As armas foram quase completamente erradicadas em prol das mais "civilizadas" espadas. Viajar para o exterior e a construção de navios de grande porte também foram proibidos. Daí começou um período de reclusão, paz, prosperidade e progresso conhecido como o ‘Período Edo’. Os "bárbaros" voltariam 250 anos mais tarde.

Viagem do Japão
(1550 e 1639)



Viagem do Japão foi o nome dado à rota comercial estabelecida pelos portugueses entre 1550 e 1639 ligando Goa, ‘Capital do Estado Português da Índia’ ao Japão. Esta lucrativa viagem anual era realizada sob monopólio da coroa, e ficava a cargo de um Capitão-Mor. O cargo de Capitão-Mor da viagem do Japão era atribuído oficialmente pelo Governador, como recompensa por serviços prestados. As grandes Naus envolvidas neste comércio eram referidas como ‘Nau do Trato’, ‘Nau da Prata’, ‘Nau da China’, e ficaram conhecidas entre os japoneses como ‘Kurofune’ (navio negro), termo que viria a designar todos os navios ocidentais que aportavam no Japão no período Edo. Após a chegada ao Japão em 1543, mercadores e aventureiros portugueses envolveram-se num lucrativo comércio na ilha de Kyushû, sem porto fixo, em navios próprios e juncos chineses. Devido à proibição das relações entre a China e o Japão, agiam como intermediários. A importância deste comércio levou a que, em 1550, fosse criada uma viagem anual sob monopólio da Coroa. Para tal era designado um Capitão-Mor, um cargo cobiçado atribuído pelas autoridades oficiais como recompensa por serviços prestados.



O direito a realizar a "viagem do Japão" foi por vezes doado pela Coroa a entidades como a cidade de Macau, Cochim, Malaca. Mais tarde, era leiloado em Goa pelo lance mais elevado. Dada a longa distância entre Goa e o Japão, inicialmente a viagem partia de Malaca. Após várias tentativas de criar uma escala intermédia na China, em 1554 Dom Leonel de Sousa, Capitão-Mor da viagem do Japão, conseguiu um acordo com Oficiais de Cantão para legalizar o comércio português, na condição de pagarem direitos alfandegários especialmente estipulados. A partir de 1557, os portugueses conseguiram o estabelecimento oficial em Macau. A cidade passou a integrar a rota da ‘Nau do Trato’, num comércio triangular que terminava no Japão. Aí, em 1570, após um acordo com o Daimyo local, fundaram a cidade de Nagasaki. A Nau partia de Goa em Abril ou Maio, carregada com tecidos, objectos de cristal e vidro, relógios da Flandres e vinhos portugueses. Dom Leonel de Sousa, foi um fidalgo natural do Algarve, que se notabilizou como segundo Capitão-Mor de Macau em 1558 (cargo equivalente ao de Governador), após ter sido o responsável por um acordo com as autoridades locais de Cantão conhecido como o ‘Primeiro Acordo Luso-Chinês de 1554’ que permitiu a legalização das actividades comerciais portuguesas na China mediante o pagamento de impostos. Este acordo abriu uma nova era nas relações sino-portuguesas, uma vez que de 1522 a 1554 os portugueses estavam oficialmente impedidos de comerciar. Até aí várias embaixadas tinham falhado e o comércio era realizado como contrabando e combatido pelas autoridades, que os consideravam ‘folanji’ combatendo-os como piratas. Dom Leonel de Sousa chegou à costa de Guangdong em 1552, onde soube que todos os estrangeiros podiam comerciar mediante o pagamento de impostos aos chineses, excepto os ‘Folanji’, como eram chamados os europeus pejorativamente e em particular os portugueses, então tomados por piratas. Solicitou então que se cumprissem as premissas de paz e o pagamento de impostos, comprometendo-se a mudar este "nome".



Em 1554 Dom Leonel de Sousa, Capitão-Mor da viagem do Japão, junto com o Capitão-Mor de Chaul, fizeram um acordo com oficiais de Cantão para legalizar o comércio português, na condição de pagarem direitos alfandegários especialmente estipulados. O único testemunho escrito deste acordo é uma carta de Dom Leonel de Sousa de 1556 ao Infante Dom Luís, onde afirma que os portugueses comprometiam-se a pagar as taxas devidas e a não erguer fortificações. A carta, um dos mais importantes documentos da história das relações Sino-portuguesas, descreve as prolongadas negociações com o superintendente da marinha de Cantão, o ‘Haitao Wang Po’, identificado nas fontes chinesas como tendo, aceitado um suborno dos portugueses para secar a sua carga deixando-os pagar impostos em Cantão. Ambos os lados se mostraram disponíveis para encontrar uma solução para o impasse, uma vez que o porto de Cantão também enfrentava um empobrecimento desde que fora fechado. Dom Leonel de Sousa tentou negociar o pagamento de apenas 10% das taxas, ao que o Mandarim Wan Po contrapôs os obrigatórios 20% mas incidindo apenas sobre metade da carga, o que Dom Leonel de Sousa levou em frente com ajuda do rico mercador Simão d'Almeida, e à margem do Governo de Pequim. A este tratado seguir-se-ia o reconhecimento de Macau como entreposto oficial português em 1557.

Acordo Luso-Chinês
(1554)


O acordo Luso-Chinês de 1554 foi o primeiro acordo obtido entre os portugueses com as autoridades locais de Cantão, que permitiu a legalização das suas actividades comerciais na China mediante o pagamento de uma taxa, abrindo caminho para o estabelecimento de Macau como entreposto português três anos depois. Este acordo negociado por Leonel de Sousa, Capitão-Mor da viagem do Japão, abriu uma nova era nas relações sino-portuguesas uma vez que, desde 1522 os portugueses estavam oficialmente impedidos de comerciar. Várias embaixadas tinham falhado e o comércio era realizado como contrabando e combatido pelas autoridades, que os consideravam ‘folanji’ combatendo-os como piratas. Desde a chegada ao Japão em 1542, os portugueses tinham iniciado um intenso comércio entre Goa e Malaca com o Japão. Para esta longa viagem convinha uma escala no caminho, que era feita nas costas do sul da China onde se haviam estabelecido na ilha de Sanchoão. Desde confrontos em 1521 e 1522 com o irmão de Dom Fernão Pires de Andrade tinham sido barrados de comerciar abertamente e, em 1550 as autoridades de Pequim tinham reforçado o ‘haijin’, fechando os portos ao comércio externo. Leonel de Sousa Capitão-Mor da viagem do Japão, chegou à costa de Guangdong em 1552, onde soube que todos os estrangeiros conseguiam comerciar mediante o pagamento de taxas, excepto os "Folanji", como eram chamados os europeus pejorativamente e em particular os portugueses, então tomados por piratas.



Solicitou então que se cumprissem as premissas de paz e o pagamento de impostos, comprometendo-se a mudar este "nome". Em 1554 Leonel de Sousa, junto com o Capitão-Mor de Chaul, fizeram um acordo com oficiais de Cantão para legalizar o comércio português, na condição de pagarem direitos alfandegários especialmente estipulados. O único testemunho escrito deste acordo é uma carta de Leonel de Sousa de 1556 ao infante Dom Luís, onde afirma que os portugueses se comprometiam, pagar as taxas devidas e a não erguer fortificações. A carta, um dos mais importantes documentos da história das relações Sino-portuguesas, descreve as prolongadas negociações com o superintendente da marinha de Cantão, o ‘Haitao Wang Po’, identificado nas fontes chinesas como tendo aceitado um suborno dos portugueses para secar a sua carga deixando-os pagar impostos em Cantão. Ambos os lados se mostraram disponíveis para encontrar uma solução para o impasse, uma vez que o porto de Cantão também enfrentava um empobrecimento desde que fora fechado ao comércio externo. Leonel de Sousa tentou negociar o pagamento de apenas 10% das taxas, ao que Wan Po contrapôs os obrigatórios 20% mas incidindo apenas sobre metade da carga, o que Leonel de Sousa levou em frente com ajuda do rico mercador Simão d'Almeida, e à margem do governo de Pequim. A este tratado seguir-se-ia o reconhecimento de Macau como entreposto oficial português em 1557.

Tratado de Haia
(12 de Junho de 1641)


O tratado de Haia de 1641 foi uma trégua de dez anos firmada entre o Reino de Portugal e a República Neerlandesa. Trata-se também de um Tratado de Aliança Defensiva e Ofensiva entre ambas as partes. O tratado incluía a formação de uma frota conjunta destinada a atacar o Reino da Espanha. Na prática a trégua, que originalmente estava firmada para todos os territórios de ambos impérios, limitou-se ao continente europeu. Os neerlandeses adquirem sua independência da Espanha em 1579, resultando em uma guerra contra o Império Espanhol. Em 1580 é formada a ‘União Ibérica’ que unificou os Reinos da Espanha e de Portugal. A seguir, o Reino da Espanha fechou os portos portugueses para os neerlandeses e proibiu o comércio entre as colónias luso-espanholas e a República Neerlandesa. Os neerlandeses, visando restabelecer o comércio com as colónias portuguesas sob domínio espanhol, ocupam o Nordeste brasileiro e a Angola, o que resulta em conflitos entre o Império Neerlandês e o Império da União Ibérica. Em 1640, a União Ibérica chegou ao fim, graças a ascensão ao trono português de Dom João IV de Portugal. Neste mesmo ano, começou a Guerra da Independência de Portugal. Dom João IV enviou embaixadores para à França, Inglaterra e à República Neerlandesa, visando a formar parcerias com estes países em sua luta contra a Espanha. O tratado foi assinado em Haia, em 12 de Junho de 1641 por representantes dos ‘Estados Gerais dos Países Baixos’ e por Dom Tristão de Mendonça Furtado, embaixador do Rei Dom João IV de Portugal. Em 18 de Novembro de 1641, o tratado foi ratificado pelo Rei de Portugal e em 22 de Novembro do mesmo ano pelos Estados Gerais.


Os principais pontos do tratado foram:

A aceitação de uma trégua durante um prazo de 10 anos.

Cessação das hostilidades entre as forças neerlandesas e portuguesas, incluindo a das empresas privadas (a Companhia Neerlandesa das Índias Orientais e a Companhia Neerlandesa das Índias Ocidentais), em todas as colónias e territórios ultramarinos.

Ambas as partes se comprometem a respeitar a vida, bens e atividades empresariais dos súbditos do oponente, propriedades apreendidas do lado contrário no transcurso da guerra permaneceriam em poder de quem fora seu dono no momento da firmação do tratado.

Respeito da liberdade religiosa de cada um dos signatários.

Pacto de não-agressão não-invasão; socorro mútuo diante de ataques de terceiros.

Não se pode transportar mercadorias do Brasil para Portugal.

Proibição do comércio para ambas as partes com a Espanha.

Fomação de uma aliança contra o Rei de Espanha e de seus súbditos, criação de uma armada conjunta para atacar a Espanha: cada país contribuiria 15 navios de guerra e 5 grandes fragatas, Portugal contribuiria ainda 10 galeões. A recompensa obtida por esta frota é repartida entre o número de navios envolvidos.


A trégua, que na prática, foi respeitada no continente europeu, foi ignorada por ambas as partes no resto do mundo, em 1645 os portugueses tomaram dos neerlandeses parte da costa do Brasil, e em 1648 apossaram-se da Angola e da ilha de São Tomé, em 1650 os neerlandeses tomaram o Cabo da Boa Esperança.

Tratado de Taborda
(26 de janeiro de 1654)



Foi a capitulação, neerlandesa, aos portugueses, assinada no Campo do Taborda, no Recife, as 23:00 horas da segunda-feira 26 de janeiro de 1654. O tratado chamou-se Taborda, pois este foi feito nas terras da casa do pescador Manuel Taborda. A situação dos neerlandeses no Brasil desde o final de 1653, já era inviável, depois de tantas derrotas em Batalhas com os portugueses, as condições no Recife eram precárias, devido ao estado de sítio declarado pelas forças de terra e de mar portuguesas. Diante deste cenário os neerlandeses iniciaram as negociações de capitulação. O chefe do ‘Conselho de Justiça do Brasil Neerlandês’, Gislbert de With foi um dos negociadores deste acordo, que aceito junto ao ‘Governo-geral Neerlandês’ em 24 de janeiro de 1654 e no dia seguinte foi traduzido e entregue aos portugueses e por estes que aceitaram o ‘Acordo’. As condições principais deste Tratado eram que a ‘Companhia Neerlandesa das Índias Ocidentais’, abdicava de todas as posses no Brasil e que os neerlandeses deixariam o solo brasileiro. A evacuação neerlandesa do Recife só aconteceu a partir de abril de 1654.



Este acordo tinha várias cláusulas, que procuraram resolver as condições existentes dos neerlandeses nas terras brasileiras, como, os casamentos entre neerlandeses casados com brasileiras ou portugueses e as suas distintas posses ou propriedades, a comunicação deste acordo aos sítios distantes da capital neerlandesa. Por exemplo: a cláusula 13ª ordenava o envio de uma embarcação com suficiente capacidade para embarcar pessoas e os seus bens. Graça a esta cláusula Matias Beck, situado no Forte Schoonemborch, teve conhecimento deste acordo em 1º de maio de 1654, através dos portugueses, e desta forma foi um dos últimos neerlandeses a deixar o Brasil.

Tratado dos Pireneus
(1659)




O Tratado dos Pirenéus foi um acordo de paz assinado em 1659 entre a França e a Espanha no âmbito da guerra dos trinta anos e no qual era reconhecido ao Rei Dom Filipe IV de Espanha como Rei de Portugal e da Catalunha. Quando após a morte do Rei Luís XIII de França, o Cardeal Júlio Mazarino foi chamado pela Rainha viúva às funções de ministro, para o lugar de Richelieu, a ‘Guerra da Restauração em Portugal’ limitava-se a pequenas escaramuças de fronteira, a que a ‘Batalha do Montijo’, ganha por Dom Matias de Albuquerque, veio dar novo movimento. Com a subida de Mazarino este queria acabar com a guerra entre a Espanha e a França, e aquela impunha como condição o abandono do auxílio que Portugal recebia indirectamente de França, em voluntários. De resto, não tendo havido qualquer batalha decisiva, logo que as tropas espanholas se voltassem contra Portugal, o assunto ficaria resolvido.



A vitória portuguesa nas Linhas de Elvas animou Dona Luísa de Gusmão a enviar o Conde de Soure a França para pedir auxílio, embora à custa da coroa portuguesa, e, ao mesmo tempo, solicitar a formação da Liga Formal, porque tanto se empenhara Dom João IV. Quando o embaixador chegou teve conhecimento das conversações com a Espanha e procurou mesmo assim avistar-se com o cardeal, mostrando-lhe como Portugal não deveria ser excluído do tratado de paz, apoiado pelo Marechal Turenne. De nada valeram as promessas de Dona Luísa de conceder-lhe o Arcebispado de Évora e seus rendimentos e ainda a oferta de um milhão de cruzados. Na ilha dos Faisões, no rio Bidassoa, começaram os preliminares do tratado de paz, representado o Rei de Espanha por Dom Luís de Haro, o vencido das ‘Linhas de Elvas’, sendo o Tratado assinado e ficando o Reino de Portugal excluído por se considerar que teria de voltar à obediência do Rei Dom Filipe III de Portugal. Pelo artigo LX, o Rei de Espanha declara consentir a reposição das relações com a França, com a finalidade de evitar a continuação da guerra.



O Rei Luís XIV concordaria que se lhe fossem concedidos três meses para poder mandar a Portugal um emissário que iria acertar as relações com o monarca e, no caso de as suas diligências não darem resultado, comprometia-se o Rei de França a não dar auxílio a Portugal, directa ou indirectamente, não permitindo o recrutamento de voluntários nos seus estados, nem a consentir a passagem dos que pudessem vir de outros países em socorro de Portugal. Mazarino, em cumprimento do tratado, enviou a Lisboa o Marquês de Chouppes, a fim de obter que Portugal se reduzisse ao estado do ano 1640, não tendo conseguido absolutamente nada, apesar dos seus esforços em convencer a Rainha Regente a aceitar as propostas da Espanha com o engodo de os Duques de Bragança passarem a desempenhar as funções de “Governadores” e Vice-Reis Perpétuos de Portugal, sob a fiança do Rei Luís XIV.

Tratado de Haia
(6 de Agosto de 1661)


O Tratado de Haia (também conhecido como a Paz de Haia) foi um tratado de paz firmado entre Portugal e a ‘República das Sete Províncias Unidas dos Países Baixos’ (atual Holanda, ou até mesmo Países Baixos), assinado na Haia em 6 de Agosto de 1661. Com a assinatura do tratado, os territórios conquistados pela Holanda no Brasil, renomeados como Nova Holanda (ou Brasil Holandês) foram formalmente devolvidos a Portugal em troca de uma indemnização de quatro milhões de cruzados. Após a reconquista de Nova Holanda e com o fim da Primeira Guerra Anglo-Neerlandesa, a República Holandesa exige a colónia de volta em maio de 1654. Portugal não cede à exigência da República Holandesa. Johan de Witt não concorda com a atitude holandesa por achar o comércio mais importante do que a possessão de territórios. Por este motivo é assinado um tratado de paz em 6 de Agosto de 1661 na Haia pelo qual a Nova Holanda foi vendida à Portugal por oito milhões de florins (equivalente a 63 toneladas de ouro). Portugal cedeu o Ceilão (actual Sri Lanka) e as Malabar à República Holandesa e concedeu privilégios sobre o comércio açucareiro. Em troca a República Holandesa reconheceu a total soberania portuguesa sobre o Brasil e a Angola. O tratado foi ratificado em 24 de maio de 1662 pelos Estados Gerais e em 3 de Novembro de 1662 pelo Reino de Portugal. Apesar disso o tratado foi violado pela conquista holandesa de Malabar e por esta razão a paz foi definitivamente selada em 1663.

Tratado de Lisboa
(13 de Fevereiro de 1668)


O Tratado de Lisboa foi um tratado assinado a 13 de Fevereiro de 1668 entre Portugal com Dom Afonso VI de Portugal e Espanha com Dom Carlos II de Espanha que viria a pôr fim à Guerra da Restauração. Por este tratado, a Espanha reconhece a Restauração da Independência de Portugal e devolvem-se prisioneiros e conquistas, com excepção da cidade de Ceuta, em Marrocos, que ficará na posse de Espanha. Recorde-se que a vila de Olivença, ocupada pelas tropas espanholas há 11 anos, foi então devolvida a Portugal.

Tratado Provisional de Lisboa
(1681)


Em Lisboa, era assinado o ‘Tratado Provisional’ ou de ‘Lisboa’ entre Portugal e Espanha, em 1681 pelo qual os espanhóis reconheciam a posse portuguesa da colónia de Sacramento, localizada no Rio da Prata (atualmente, Uruguai). Sacramento, havia sido fundada por Portugal, em 1680, no entanto foi invadida, posteriormente, pelos espanhóis. Em 1687 a Espanha procurou reforçar seu posicionamento no rio da Prata, fundando os ‘Sete Povos das Missões’, núcleos de povoamento, nos quais haviam jesuítas espanhóis e índios guaranis, que serviam de barreira humana para o avanço português. Em 1750, o ‘Tratado de Madrid’ anulou as relações de posse dessas regiões estabelecidas pelo ‘Tratado de Lisboa’ e, através do princípio do "uti possidetis", oficializou uma troca, na qual Portugal passou a conquistar, oficialmente, Os ‘Sete Povos’ e a Espanha, por sua vez, a Colónia de Sacramento.

Tratado de Lisboa
(18 de junho de 1701)


O Tratado de Lisboa de 1701 foi um acordo assinado em Lisboa em 18 de Junho daquele ano, pelo qual se estabelecia uma aliança diplomática e militar na eminência da ‘Guerra de Sucessão Espanhola’ que teria início brevemente. Nos termos do tratado, o Rei Pedro II de Portugal garantia o seu apoio a Dom Filipe V de Espanha em detrimento do pretendente ao trono Carlos da Áustria. A Espanha cedia a Portugal a Colónia do Sacramento (atualmente parte do Uruguai) e apoiava os seus direitos contra eventuais reclamações económicas e territoriais por parte de Inglaterra e das Províncias Unidas (Países Baixos). O acordo foi rompido dois anos depois, durante o curso da guerra, quando Portugal retirou o seu apoio a Dom Filipe V e passou a apoiar a aliança anglo-holandesa. Desde os finais do século XVII que o débil estado de saúde de Dom Carlos II de Espanha e a ausência de descendência suscitou o interesse das principais potências europeias pela questão da sucessão. A Inglaterra e as Províncias Unidas encaravam com receio a possibilidade de que Luís de França, filho do Rei Luís XIV, ocupasse o trono espanhol, unindo as coroas francesa e espanhola. Em 1698, Inglaterra e França assinaram o Primeiro ‘Tratado de Partição’ (Tratado de Haia), onde se acordava que o trono espanhol seria ocupado por José Fernando da Baviera, neto do Imperador Leopoldo I.



A morte de José Fernando em 1699 aos sete anos conduziu ao ‘Segundo Tratado de Partição’ (Tratado de Londres), assinado em 1700, no qual França, Inglaterra e Províncias Unidas acordaram que o trono fosse para Carlos da Áustria e que os territórios espanhóis em Itália fossem dados à França. No entanto, Carlos II, discordando com a ideia de dividir o império espanhol, testou a favor de Filipe de Anjou, filho de Luís de França, na condição deste renunciar à sucessão do trono francês. Mas após Filipe ter sido coroado em Novembro de 1700, o seu avô Luís XIV declarou que manteria os direitos de sucessão do neto à coroa francesa. Prevendo uma guerra entre os seus partidários e os de Carlos da Áustria, Filipe começou então a procurar aliados entre os países europeus. Os portugueses Manuel Teles da Silva, Francisco de Távora e Mendo de Foios Pereira, em nome do Rei Pedro II, e o embaixador francês em Portugal, Pierre Rouillé de Marbeuf, em representação de Filipe V, assinaram o tratado em 18 de junho de 1701, nos seguintes termos:

Portugal reconhecia Filipe V como Rei de Espanha e encerraria os portos portugueses aos navios de países que se opunham a esta sucessão.

Espanha indemnizaria Portugal pelas perdas sofridas de escravos nas Índias.

Em caso de guerra e escassez em Portugal, Espanha levantaria a proibição de vender pão aos portugueses.

Ambas as partes comprometiam-se a combater o tráfico de tabaco.

Espanha apoiaria Portugal por diplomaticamente ou, em caso de guerra, também militarmente, nas eventuais reclamações que Inglaterra ou Províncias Unidas pudessem levantar devido ao apoio aos navios franceses durante a passada ‘Guerra dos Nove Anos’, nos conflitos territoriais que pudessem vir a ocorrer com estes países na Índia, Brasil ou nas costas de África, ou no pagamento das dívidas aos holandeses segundo o Tratado de Haia de 1661.

Se o Rei de Inglaterra, Guilherme II negasse a manutenção da Rainha Catarina de Bragança, a viúva de Carlos II, a pensão desta seria paga em partes iguais por Espanha, França e Portugal.

Espanha cederia A Portugal a Colónia do Sacramento, revogando o acordo hispano-português de 1681.

Em caso de guerra, nenhuma das partes, acordaria tréguas, sem o consentimento do outro.

O tratado seria válido durante 20 anos.


A aliança formada pelo tratado seria rompida pouco depois. Dom Pedro II acusou Dom Filipe V de não pagar as indemnizações devidas e de não respeitar a soberania portuguesa sobre a Colónia do Sacramento, e o Rei Luís XIV de ter enviado penas uma pequena parte da ajuda acordada a Portugal para fazer frente à presença de frotas inglesas e holandesas na costa portuguesa. Convencido de que França pretendia anexar Espanha como mais uma das suas províncias, o Rei português mudou de lado na guerra e passou a apoiar o pretendente Carlos da Áustria. Em maio de 1703 Portugal assinou um novo tratado em Lisboa, pelo qual se juntou à ‘Grande Aliança’, formada pela Inglaterra, Províncias Unidas e o Sacro Império Romano-Germânico, declarando Carlos da Áustria como legítimo Rei de Espanha e autorizando a aliança a usar Portugal como base para as operações dos seus exércitos contra Espanha.

Tratado de Methuen
(17 de Dezembro de 1703)


O Tratado de Methuen, também referido como Tratado dos Panos e Vinhos, foi um tratado assinado entre a Inglaterra e Portugal, em 17 de Dezembro de 1703. Foram os seus negociadores o embaixador extraordinário britânico John Methuen, por parte da Rainha Ana da Inglaterra, e Dom Manuel Teles da Silva, Marquês de Alegrete. Pelos termos, os portugueses se comprometiam a consumir os têxteis britânicos e, em contrapartida, os britânicos, os vinhos de Portugal. Com três artigos, é o texto mais reduzido da história diplomática europeia:

I.

Sua Majestade ElRey de Portugal promete tanto em Seu proprio Nome, como no de Seus Sucessores, de admitir para sempre daqui em diante no Reyno de Portugal os Panos de lã, e mais fábricas de lanifício de Inglaterra, como era costume até o tempo que foram proibidos pelas Leis, não obstante qualquer condição em contrário.

II.

He estipulado que Sua Sagrada e Real Magestade Britânica, em seu proprio Nome e no de Seus Sucessores será obrigada para sempre daqui em diante, de admitir na Grã-Bretanha os Vinhos do produto de Portugal, de sorte que em tempo algum (haja Paz ou Guerra entre os Reynos de Inglaterra e de França), não se poderá exigir de Direitos de Alfândega nestes Vinhos, ou debaixo de qualquer outro título, directa ou indirectamente, ou sejam transportados para Inglaterra em Pipas, Toneis ou qualquer outra vasilha que seja mais o que se costuma pedir para igual quantidade, ou de medida de Vinho de França, diminuindo ou abatendo uma terça parte do Direito do costume. Porem, se em qualquer tempo esta dedução, ou abatimento de direitos, que será feito, como acima he declarado, for por algum modo infringido e prejudicado, Sua Sagrada Magestade Portuguesa poderá, justa e legitimamente, proibir os Panos de lã e todas as demais fábricas de lanifícios de Inglaterra.

III.

Os Exmos. Senhores Plenipotenciários prometem, e tomam sobre si, que seus Amos acima mencionados ratificarão este Tratado, e que dentro do termo de dois meses se passarão as Ratificações.

No século XVIII, Portugal encontrou em terras brasileiras a primeira riqueza que instigava a realização das grandes navegações: os metais preciosos. Além de atender a uma antiga expectativa, a exploração da economia aurífera do espaço colonial poderia determinar a recuperação económica lusitana, bem como a dinamização de uma economia que se encontrava gravemente enfraquecida pelos anos de dominação espanhola e a grave crise açucareira que atingiu o Brasil no século anterior. Contudo, contrariando a essa possibilidade, observamos que a riqueza retirada do Brasil e enviada a Portugal não resultou nesse processo de recuperação. Pior do que isso, a extracção aurífera veio reforçar a dependência económica que os portugueses tinham em relação ao espaço colonial brasileiro e, na medida em que o ouro se escasseava, a crise económica Portuguesa voltava a se fortalecer. Mas afinal, como poderíamos compreender essa situação, no mínimo, contraditória? Entre os vários factores que possam ser trabalhados, acreditamos que o Tratado de Methuen ou Tratado de Panos e Vinhos tem grande valia para que possamos entender o quadro económico experimentado em Portugal ao longo do século XVIII.



Assinado junto à Inglaterra, esse acordo estabelecia que Portugal teria facilidades na compra dos tecidos ingleses e que a Inglaterra se valeria de facilidades semelhantes para comprar a produção de vinho lusitana. Ao longo do tempo, a vigência desse acordo impeliu grande parte dos produtores agrícolas de Portugal a utilizarem suas terras cultiváveis para a produção de vinho. Afinal de contas, a disponibilidade do mercado inglês imposta pelo tratado garantia lucro aos produtores. No entanto, essa mesma prática impedia que a economia portuguesa se voltasse para o desenvolvimento de outras atividades que pudessem dinamizar a sua economia. Além disso, devemos salientar que a demanda portuguesa por tecidos era bem maior que a riqueza produzida pela venda do vinho à Inglaterra. Desse modo, os portugueses acumularam grandes dívidas geradas pela necessidade crescente de se consumir os produtos ingleses manufacturados. No contexto do século XVIII, esse desequilíbrio económico era suprido, com o envio das barras de ouro e as pedras preciosas que eram extraídas no Brasil. Com isso, a riqueza colonial brasileira mascarava a deficiência económica de sua metrópole. Em diferentes ocasiões, esses efeitos produzidos pelo Tratado de Methuen foram criticados por diversos estudiosos que percebiam o impasse gerado.



Na segunda metade do século XVIII, o Marquês de Pombal, principal ministro do Rei Dom José I, tomou medidas cujo objetivo seria de reverter essa situação. Contudo, o desinteresse da aristocracia portuguesa impedia que um projecto de modernização económica se estabelecesse naquelas terras. Ao alcançarmos os finais do século XVIII, momento em que a economia mineradora já apresentava sérios sinais de desgaste, a economia portuguesa sentia o retorno de uma grave crise económica. De tal modo, vemos que a assinatura do ‘Tratado de Methuen’, somado a outros factores ligados à política e à economia portuguesa, explicam como essa nação não veio a se fortalecer em um período em que a prosperidade trazida pelo ouro deveria abrir tantas outras portas.

Tratado de Madrid (I)
(13 de Janeiro de 1750)


Portugal e Espanha assinaram o Tratado que, na prática, ‘criou’ o atual Rio Grande do Sul. Com efeito, antes do Tratado de Madrid, o meridiano de Tordesilhas excluía a região onde é hoje o Estado, já que cortava o Brasil entre Belém do Pará e Laguna. Ou seja, o território gaúcho era posse espanhola. O Tratado de Madrid revogou Tordesilhas, dando assim à Coroa Portuguesa o direito formal à posse do chão que de fato já fora seu, porque desde 1680, quando foi fundada a Nova Colônia do Santíssimo Sacramento, às margens do Rio da Prata, pelos portugueses, estes já “iam e vinham” dentro do território. Tanto é que, em 1737, treze anos antes da assinatura do Tratado, o Brigadeiro José da Silva Pais, ao retornar da Colónia do Sacramento, fundou o presídio Jesus Maria José, segunda povoação portuguesa no Sul, origem da atual cidade do Rio Grande. Na época, a única presença espanhola era a dos jesuítas, que fundaram os ‘Sete Povos das Missões’, com os padres Roque Gonzalez de Santa Cruz, Afonso Rodrigues e Juan Dei.



Voltando ao Tratado, ele foi assinado para pôr fim às disputas luso-espanholas na América, promovendo a troca da Colónia do Sacramento pelas Missões. Portugal havia fundado Sacramento, dentro de território espanhol, para obter e manter a livre navegação no Rio da Prata. No panejamento do Tratado, destacou-se a actuação de um brasileiro, paulista de nascimento, o diplomata Alexandre de Gusmão, que era membro do Conselho Ultramarino e Escrivão da Puridade (secretário) do Rei Dom João V. A importância do ‘Tratado de Madrid’ para a história do Rio Grande do Sul é muito grande, porque, inclusive antes da assinatura formal, o mesmo:

- Permutou a Colónia do Sacramento pelo território dos ‘Sete Povos das Missões’.

- Revogou o ‘Tratado de Tordesilhas’, e com isso anulou o meridiano que dividia o Brasil entre Portugal (leste) e Espanha (oeste), adquirindo, o nosso território, a configuração de hoje, praticamente.

- Consagrou o princípio do Uti-Possidetis (quem tem a posse tem o domínio), deu à Espanha a navegação exclusiva no Rio da Prata.

- Provocou a reacção indígena guarani, com o cacique José (Sepé) Tiarajú, surgindo a Guerra Guaranítica de 1752 a 1756. Sepé foi morto três dias antes da última batalha, a de Caibaté, onde morreram combatendo mais de 1.700 índios.

- Motivou a vinda de casais açorianos para o sul do Brasil. Em 1752, foi fundada Porto Alegre.

- Motivou o aumento do poderio militar português no sul.

- Causou a mudança da capital do Vice-Reino de Salvador (BA) para o Rio de Janeiro.

- Criou a Capitania D’El Rey de São Pedro do Rio Grande do Sul; deu a Portugal a posse da Amazônia.

- Motivou a construção do Forte Príncipe da Beira, da Fortaleza de Macapá e do Forte de Tabatinga, entre outros.

- Definiu o Rio Uruguai como fronteira oeste do Brasil com a Argentina.
Paralelamente, outros fatos importantes ocorreram no ano de 1750, e, a partir dele, todos com reflexos no Brasil, a saber:

- A Coroa Portuguesa passa para Dom José I, sucessor de Dom João V.

- O Rei Dom José I nomeia Dom Sebastião José de Carvalho e Melo, futuro Marquês do Pombal, como 1º ministro, conferindo-lhe plenos poderes.

- Pombal adopta medidas para fortalecer o poder Real.

- Na Europa, diminuem os privilégios do clero e da nobreza; inicia na Inglaterra a Revolução Industrial.


Mas a aplicação das determinações do Tratado de Madrid sofreu muita oposição, principalmente na demarcação das fronteiras e particularmente por parte dos índios guaranis, insuflados pelos jesuítas. Antes da sua confirmação, ocorrida em Badajoz em 1801, os seguintes 
Tratados intermediários ocorreram:

- Tratado de El Pardo em 1761: suspende o de Madrid, e com isso a demarcação das fronteiras. A Espanha declara guerra à Portugal.  

- Tratado de Paris de 1763, põe fim à guerra.

- Tratado de Santo Ildefonso de 1777, acaba com as lutas no sul, entre portugueses e espanhóis. A Colónia do Sacramento e as Missões passam para a Espanha e Portugal fica com a Ilha de Santa Catarina. O território de São Pedro do Rio Grande fica cortado ao meio, no sentido longitudinal, passando o limite nas imediações da Santa Maria atual. 

- Tratado de Badajoz de 1801, põe fim à nova guerra entre Portugal e Espanha (Guerra das Laranjas). Confirma, finalmente, o Tratado de Madrid. Antes, os luso-brasileiros-gaúchos haviam invadido os Sete Povos das Missões, expulsando os espanhóis. O que foi conquistado continuou português. As fronteiras da Capitania com as possessões espanholas, a oeste, ficam sendo, praticamente, as de hoje, excepto os atuais limites com o Uruguai, que seria criado posteriormente. O Tratado de Madrid, de certa forma, provocou mais lutas, ao invés de acabar com elas. A verdade é que os espanhóis nunca concordaram em perder o território da Capitania de São Pedro para Portugal, assim como não aceitaram ceder aos portugueses a Parte Oriental (atual Uruguai). Daí as invasões de Dom Pedro Cevallos em 1762 e de Dom Vertiz y Salcedo em 1773, este vencido em Pantano Grande pelo herói Major, depois Brigadeiro, Rafael Pinto Bandeira, que criou a “guerra à gaúcha”. A situação só ficaria resolvida em 1828, pelo Tratado do Rio de Janeiro, com a criação da República Oriental do Uruguai como estado-tampão, e a consequente delimitação das fronteiras. O ano de 1750 não assinalou apenas ser a metade cronológica do século 18, também foi um divisor de águas. Nas relações do Reino de Portugal com o Reino da Espanha, marcou a revisão do ‘Tratado de Tordesilhas’ que, desde o final do século XV, separou os interesses dos dois Reinos Ibéricos pelo mundo. E esta revisão deu-se pela assinatura em janeiro de 1750 do Tratado de Madrid, mais tarde retomado, revisado e aperfeiçoado pelo ‘Tratado de Santo Ildefonso de 1777’. O Tratado, o representante português, o Visconde de Cerveira, instruído pelo secretário do Rei Dom João V, o luso-brasileiro Alexandre de Gusmão, propôs que um novo critério fosse adoptado para a delimitação das fronteiras entre os dois impérios. Nada mais de tentar inutilmente seguir ao meridiano de Tordesilhas que ninguém mais obedecia, mas encontrar, dentro das modernas normas do direito internacional, limites concretos, acidentes geográficos facilmente identificáveis, “como são a origem do curso dos rios e os montes mais notáveis”. Além disso concordaram em seguir o princípio denominado do ‘utis possidetis’, em que se reconhecia como parte integrante do Reino aquele território que já estivesse ocupado maioritariamente por alguns dos seus súbditos.



A proposta compreendia numa mudança figurativa da linha da fronteira, a substituição de uma linha recta (a de Tordesilhas) por uma curva (a sinuosidade das margens dos rios). No que refere as questões fronteiriças do Mato Grosso e da Amazônia não houve maiores problemas. A vastidão da área selvática, desolada e escassamente povoada, praticamente não produziam atritos entre os lusos e os espanhóis. Tanto é que o Governador-Geral do Grão-Pará, Dom Mendonça Furtado, irmão do Marquês de Pombal, nem compareceu ao encontro do comissário espanhol para acertar os acordos dos limites em meio aquela mata toda. Fato que ele atribuiu a má vontade dos jesuítas que não lhe cederam a tempo os índios remeiros, atiçando a fúria do poderoso irmão contra os padres da Companhia de Jesus. Na fronteira sul dos dois impérios a situação entretanto foi outra. O verdadeiro entrave histórico a qualquer acordo tinha sido a existência da cidade portuguesa de Colónia do Sacramento fundada em 1680, em frente a Buenos Aires. Ela não só marcava a presença lusa no Rio da Prata, como actuava como um centro de contrabando na tentativa de obter parte da prata, originada das minas de Potosí, que por ali desaguava em barcos. Colónia do Sacramento foi palco de árduas e renhidas disputas até que ambas as partes convenceram-se da necessidade de fazer uma permuta. Como os espanhóis, desde o século XVII, graças às penetrações jesuítas vindas do Paraguai, mantinham o controlo de quase a metade do território que hoje pertence ao estado do Rio Grande do Sul, eles propuseram trocá-la pela posse definitiva da Colónia do Sacramento, que ainda continuava na guarda dos portugueses. Uma só cidade por metade de uma província. No que toca aos grandes rios pode-se dizer que acertou-se que o Rio Amazonas, quase na sua integridade, pertenceria à Portugal e, em troca, reconheceria que o Rio da Prata ficaria no controle definitivo da Espanha. As missões, a região que hoje pertence ao estado argentino de Missiones e a República do Paraguai, formavam até a metade do século XVIII, o notável complexo socioeconómico das missões jesuíticas. Enormes aldeamentos muito bem edificados, dotados de infra-estrutura autónomas, voltada para o cultivo da erva-mate e com vastas estâncias para a criação de gado, regidos por um padre jesuíta e povoados maioritariamente por índios guaranis, dominaram aquelas vastas extensões de terra por dois séculos. Reconhecidas como um extraordinário exemplo social, sem no entanto proporem-se a ser comunidades comunistas, as missões, desde então, foram objecto de vastos e divergentes estudos e tornaram-se a mais bem-sucedida síntese do projecto de catequização dos indígenas. A pérola mais valiosa do que o padre Montoya chamou de “a conquista espiritual”. A primeira implantação deste projecto no lado que hoje pertence ao Brasil, deu-se em 1610 na região de Guaíra, no atual estado do Paraná, onde ficaram até 1628, retirando-se para mais ao sul, para as chamadas reduções do Tapê, a fim de fugir das investidas que os mamelucos paulistas. Em 1626 o jesuíta Roque Gonzalez, com a imagem da Nossa Senhora da Conquista em punho, travessou o Rio Uruguai em direção ao Rio Grande do Sul, fundando a redução de São Nicolau. Terminou sendo martirizado, juntamente com o padre Alonso, pelos guaranis em 1628. Sabe-se que a ambição dos jesuítas era instalar uma rede de reduções que, saindo do interior do Paraguai, chegassem a atingir o litoral atlântico. O Projecto que não se concretizou devido aos sucessivos assaltos dos mamelucos paulistas que vinham capturar a mão-de-obra guarani, amansada pelo catecismo e pelo sedentarismo. No século XVIII, os jesuítas retomaram a construção das missões do lado esquerdo das margens do Rio Uruguai, formando os chamados ‘Sete Povos das Missões’ (São Nicolau, São Luis, São Lourenço, Santo Ângelo, São João, São Miguel e São Borja). Era exactamente esta área que a Espanha entregou para o Império Português. A Era Pombal, 1750 também assinalou uma profunda alteração na política interna de Portugal, com reflexo em todo o seu império colonial. Foi a data em que Dom Sebastião de Carvalho, o Conde de Oeiras, mais tarde Marquês de Pombal, tornou-se o ’primeiro-ministro’ do Reino de Portugal. Morreu o Rei Dom João V, tendo agora o Rei Dom José I como soberano, e com ele o ministro tirânico. Centralista e autoritário, Pombal, que boa parte da historiografia classifica como “déspota esclarecido”, praticou, durante os 27 anos que esteve á frente do Governo, a mais completa concentração do poder por parte do estado que Portugal até então conheceu. O Reino Português arrasado pelo terremoto que destruiu Lisboa em 1755, e vendo, impotente, os proveitos do ouro brasileiro ano a ano a diminuírem, não podia, segundo ele, vacilar. Era-lhe insuportável a existência de uma casta aristocrática independente da vontade do Rei, e uma poderosa ordem religiosa, como era a Companhia de Jesus, completamente autónoma, vivendo como um estado dentro do estado. “Pombal não admitia nenhuma tirania além da sua”. A alta nobreza, ele neutralizou com a prisão e brutal execução pública dos Marqueses de Távora e do Duque de Aveiro, provavelmente envolvidos num atentado ao Rei Dom José I, ocorrido em Setembro de 1758. Atacou-lhes a seguir, como detalhou Maria Tucci Carneiro, o espírito de casta, através do Alvará da ‘Lei Secretíssimo’ de Outubro de 1768, e pela Carta de Lei de 1773 que (retomando as antigas posições do padre António Vieira a favor da “gente da Nação” como designavam os judeus e muitos dos conversos), abolia a separação existente entre cristãos-velhos (em geral gente da nobreza) e os cristãos-novos (pertencentes à burguesia e às classes médias mercantis), repreendendo fortemente a prática dos casamentos fechados, exclusivos dos assim autodesignados Puritanos, famílias das grandes linhagens que se gabavam de não serem “infectos”, isto é, de não correr em suas veias qualquer sangue judeu ou mouro, orgulhosas de serem “fidalgo e cristão velho de tempo imemorial sem fama ou rumor em contrário”. Desta forma, complementado pelos alvarás de 1755 e 1757 que diziam que “o comércio não prejudica a fidalguia de quem o exerça”, Pombal abriu caminho para a igualdade social e política entre aristocratas e burgueses, dando foros de nobreza às gentes das práticas mercantis. O dinheiro vindo do mercado deixou de ser estigmatizado prenunciando o capitalismo burguês moderno. Nas colónias tais medidas conduziram a gradativa superação dos entraves que coibiam os miscigenados, os mulatos e cafuzos, de ascenderem na estrutura administrativa e jurídica, bem como estimulou a tolerância para com a mistura racial, especialmente no Brasil. A campanha anti jesuítica, a vez de os jesuítas sentirem a pesada mão do ministro chegou no ano seguinte. Em 3 de Setembro de 1759, adoptando de maneira intransigente os princípios do estado secular, ele os prescreveu de todo o Reino de Portugal, sequestrando-lhes os bens, fechando-lhes os colégios e as missões, prendendo ou expulsando a maioria dos padres. Somente do Brasil mais de 500 deles foram desterrados e muitos conduzidos presos, acusados de viverem à custa dos indígenas, que Pombal emancipou definitivamente. O pretexto encontrado por Pombal era que os jesuítas, além de viverem de privilégios e isenções, estavam sabotando o ‘Tratado de Madrid’, negando-se a abandonar as missões, insuflando os guaranis à resistência. Lançou também sobre eles a suspeitas de terem maquinado diabolicamente, com os invisíveis fios da intriga, o atentado contra o Rei Dom José I. Não satisfeito, Pombal activou o corpo diplomático para convencer os monarcas da França e da Espanha a associarem-se na liquidação da Companhia de Jesus em seus respectivos reinos, o que eles fizeram entre 1764 e 1767, marcando assim a definitiva vitória do moderno estado secular, um dos axiomas básicos do Iluminismo, sobre aquela sobrevivência da teocracia contra-reformista. No campo da propaganda política patrocinou ele igualmente a publicação de uma enorme obra em três volumes, a “Dedução Cronológica”, que imputava aos jesuítas todas as desgraças que ocorreram em Portugal nos últimos dois séculos. 



O ataque que determinou que fosse feito aos ‘Sete Povos das Missões’, complexo das reduções jesuíticas situadas no Oeste do Rio Grande do Sul, foi celebrizado num poema épico chamado o Uraguay, composto pelo jovem Basílio da Gama, que enaltecia o feito pombalino. Basílio da Gama foi para o Marques do Pombal o que Virgílio foi para Octávio Augusto. Atribui-se boa parte da lenda sobre os grandes tesouros que os jesuítas teriam amealhado nas reduções americanas às falsas informações que Pombal gostava de divulgar pelo resto da Europa. Inclusive o filósofo Voltaire dedica-lhes, talvez influenciado pela propaganda negativa pombalina, uma longa e denegridora passagem na sua célebre novela, aparecida em 1759, sobre as atribulações que o jovem Cândido sofre nas mãos dos jesuítas no Paraguai.

O Tratado de Madrid (II)
(Limites)



A consolidação e expansão da presença portuguesa em terras brasileiras na centúria de Setecentos, levantou problemas na definição fronteiriça com a área de influência espanhola no continente sul-americano, uma vez que os limites impostos pelo velho Tratado de Tordesilhas (linha meridiana situada a 370 léguas a oeste de Cabo Verde) já não se adequavam às novas realidades de ocupação do território. Esta situação, potencialmente perigosa e geradora de conflitos entre as potências ibéricas conduziu à necessidade de negociações com Espanha, por forma a alterar esse limite. O resultado dessas negociações viria a dar origem ao denominado Tratado de Madrid, também conhecido por Tratado dos Limites, assinado em 1750. Do lado português as negociações foram conduzidas por Alexandre de Gusmão que conseguiu a alteração dos limites impostos em Tordesilhas em troca da cedência à Espanha da colónia de Sacramento, na margem esquerda do rio da Prata, ficando assim estabelecidas, nas suas linhas essenciais, as actuais fronteiras do Brasil.

“Tratado de Limites das conquistas entre os muito altos e poderosos senhores Dom João V, Rei de Portugal, e Dom Fernando VI, Rei de Espanha, assinado em 13 de janeiro de 1750, em Madrid, e ratificado em Lisboa a 26 do dito mês, e em Madrid a 8 de fevereiro do mesmo ano”.

Em nome da Santíssima Trindade.

“Os sereníssimos Reis de Portugal e Espanha, desejando eficazmente consolidar e estreitar a sincera e cordial amizade, que entre si professam, e consideraram que o meio mais conducente para conseguir tão saudável intento é tirar todos os pretextos, e alhanar os embaraços, que possam adiante alterá-la, e particularmente os que se podem oferecer com o motivo dos limites das duas coroas na América, cujas conquistas se têm adiantado com incerteza e dúvida, por se não haverem averiguado até agora os verdadeiros limites daqueles domínios, ou a paragem donde se há-de imaginar a linha divisória, que havia de ser o princípio inalterável da demarcação de cada coroa. E considerando as dificuldades invencíveis, que se ofereceriam se houvesse de assinalar-se esta linha com o conhecimento prático que se requer; resolveram examinar as razões e dúvidas, que se oferecessem por ambas as partes, e à vista delas concluir o ajuste com recíproca satisfação e conveniência”.


Por parte da Coroa de Portugal alegava-se que, havendo de contar-se os 180 graus da sua demarcação desde a linha para o oriente, ficando para Espanha os outros 180 para o ocidente, e devendo cada uma das nações fazer os seus descobrimentos e colónias nos 180 graus da sua demarcação, contudo, se acha, conforme as observações mais exactas e modernas dos astrónomos e geógrafos, que começando a contar os graus para o ocidente da dita linha, se estende o domínio espanhol na extremidade asiática do mar do Sul, muitos mais graus, que os 180 da sua demarcação, e por conseguinte tem ocupado muito maior espaço, do que pode importar qualquer excesso, que se atribua aos portugueses, no que talvez terão ocupado na América meridional ao ocidente da mesma linha, e princípio da demarcação espanhola. Também se alegava que, pela escritura de venda com pacto de retrovendendo, outorgada pelos procuradores das duas coroas em Saragoça a 22 de abril de 1529, vendeu a coroa de Espanha a Portugal tudo o que por qualquer via ou direito lhe pertencesse ao ocidente de outra linha meridiana, imaginada pelas ilhas das Velas, situadas no mar do Sul a 17 graus de distância de Maluco, com declaração, que se Espanha consentisse, e não impedisse aos seus vassalos a navegação da dita linha para o ocidente, ficaria logo extinto e resoluto o pacto de retrovendendo, e que quando alguns vassalos de Espanha, por ignorância ou por necessidade, entrassem dentro dela, e descobrissem algumas ilhas, ou terras, pertenceria a Portugal o que nesta forma descobrissem. Que sem embargo desta convenção, foram depois os espanhóis a descobrir as Filipinas, e com efeito se estabeleceram nelas pouco antes da união das duas coroas, que se fez no ano de 1580, por cuja causa cessaram as disputas que esta infracção suscitou entre as duas nações, porém tendo-se depois dividido, resultou das condições da escritura de Saragoça um novo título, para que Portugal pretendesse a restituição, ou o equivalente de tudo o que ocuparam os espanhóis ao ocidente da dita linha, contra o capitulado na referida escritura.



“Quanto ao território da margem setentrional do rio da Prata, alegava que, com o motivo da fundação da Colónia do Sacramento, excitou-se uma disputa entre as duas coroas, sobre limites: a saber, se as terras, em que se fundou aquela praça, estavam ao oriente ou ao ocidente da linha divisória, determinada em Tordesilhas; e enquanto se decidia esta questão, se concluiu provisionalmente um tratado em Lisboa a 7 de maio de 1681, no qual se concordou que a referida praça ficasse em poder dos portugueses; e que nas terras disputadas tivessem o uso e aproveitamento comum com os espanhóis. Que pelo artigo VI, da paz, celebrada em Utrecht entre as duas coroas em 6 de fevereiro de 1715, cedeu S. M. C. toda a acção, e direito, que podia ter ao território e colónia, dando por abolido em virtude desta cessão o dito ‘Tratado Provisional’. Que devendo, em vigor da mesma cessão, entregar-se à Coroa de Portugal todo o território da disputa, pretendeu o governador de Buenos Aires satisfazer unicamente com a entrega da praça, dizendo que pelo território só entendia o que alcançasse o tiro de canhão dela, reservando para a Coroa de Espanha todas as demais terras da questão, nas quais se fundaram depois a praça de Montevidéu e outros estabelecimentos, que esta inteligência do governador de Buenos Aires foi manifestamente oposta ao que se tinha ajustado, sendo evidente que por meio de uma cessão não devia ficar a Coroa de Espanha de melhor condição do que antes estava, no mesmo que cedia, e tendo ficado pelo ‘Tratado Provisional’ ambas as nações com a posse, e assistência comum naquelas campanhas, não há interpretação mais violenta do que o supor que por meio da cessão de S. M. C. ficavam pertencendo privativamente à sua Coroa. Que tocando aquele território a Portugal por título diverso da linha divisória, determinada em Tordesilhas (isto é, pela transacção feita no Tratado de Utrecht, em que S. M. C. cedeu o direito, que lhe competia pela demarcação antiga), devia aquele território independentemente das questões daquela linha ceder-se inteiramente a Portugal com tudo o que nele se houvesse novamente fabricado, como feito em solo alheio. Finalmente, que suposto pelo artigo VII do dito ‘Tratado de Utrecht’, se reservou S. M. C. a liberdade de propor um equivalente à satisfação de S. M. F. pelo dito território e colónia, contudo, como há muitos anos passou o prazo assinalado para oferecê-lo, tem cessado todo o pretexto, e motivo, ainda aparente, para dilatar a entrega do mesmo território. Por parte da Coroa de Espanha se alegava que, havendo de imaginar-se a linha de norte a sul a 370 léguas ao poente das ilhas de Cabo Verde, conforme o tratado concluído em Tordesilhas a 7 de junho de 1494, todo o terreno que houvesse nas 370 léguas desde as referidas ilhas até o lugar, aonde se havia de assinalar a linha, pertenceria a Portugal, e nada mais por esta parte, porque desde ela para o ocidente se hão-de contar os 180 graus da demarcação de Espanha, e ainda que, por não estar declarado de qual das ilhas de Cabo Verde se hão-de começar a contar as 370 léguas, se ofereça dúvida, e haja interesse notável, por estarem todas elas situadas a leste Oeste com a diferença de quatro graus e meio, também é certo que, ainda cedendo Espanha, e consentindo que se comece a contar desde a mais ocidental, que chamam de Santo Antão, apenas poderão chegar as 370 léguas à cidade do Pará, e mais colónias, ou capitanias portuguesas, fundadas antigamente nas costas do Brasil, e como a Coroa de Portugal tem ocupado as duas margens do rio das Amazonas, ou Marañón, subindo até a boca do rio Javari, que entra nele pela margem austral, resulta claramente ter-se introduzido na demarcação de Espanha tudo quanto dista a referida cidade da boca daquele rio, sucedendo o mesmo pelo interior do Brasil com internação, que fez esta Coroa até o Cuiabá e Mato Grosso. Pelo que toca à Colónia do Sacramento, alegava que, conforme os mapas mais exactos, não chega com muita diferença à boca do rio da Prata a paragem, onde se deveria imaginar a linha, e conseqüentemente a referida colónia com todo o seu território cai ao poente dela, e na demarcação de Espanha; sem que obste o novo direito, com que a retém a Coroa de Portugal em virtude do Tratado de Utrecht, porquanto nele se estipulou a restituição por um equivalente; e ainda que a Corte de Espanha o ofereceu dentro do termo prescrito no artigo VII, não o admitiu a de Portugal; por cujo fato ficou prorrogado o termo, sendo como foi proporcionado e equivalente; e o não tê-lo admitido foi mais por culpa de Portugal que de Espanha. Vistas e examinadas estas razões pelos dois sereníssimos monarcas, com as réplicas que se fizeram de uma e outra parte, procedendo com aquela boa-fé e sinceridade que é própria de príncipes tão justos, tão amigos e parentes, desejando manter os seus vassalos em paz e sossego, e reconhecendo as dificuldades e dúvidas, que em todo o tempo fariam embaraçada esta contenda, se se houvesse de julgar pelo meio da demarcação, acordada em Tordesilhas, assim porque se não declarou de qual das ilhas de Cabo Verde se havia de começar a conta das 370 léguas, como pela dificuldade de assinalar nas costas da América meridional os dois pontos ao sul, e ao norte, donde havia de principiar a linha, como também pela impossibilidade moral de estabelecer com certeza pelo meio da mesma América uma linha meridiana; e finalmente por muitos embaraços, quase invencíveis, que se ofereceriam para conservar sem controvérsia, nem excesso, uma demarcação regulada por linhas meridianas, e considerando, ao mesmo tempo, que os referidos embaraços talvez foram pelo passado a ocasião principal dos excessos, que uma e outra parte se alegam, e das muitas desordens que perturbaram a quitação dos seus domínios, resolveram pôr termo às disputas passadas e futuras, e esquecer-se, e não usar de todas as acções e direitos que possam pertencer-lhes em virtude dos referidos ‘Tratados de Tordesilhas, Lisboa, Utrecht’ e da ‘Escritura de Saragoça’, ou de outros quaisquer fundamentos que possam influir na divisão dos seus domínios por linha meridiana, e querem que ao diante não se trate mais dela, reduzindo os limites das duas monarquias aos que se assinalaram no presente tratado, sendo o seu ânimo que nele se atenda com cuidado a dois fins: o primeiro e principal é que se assinalem os limites dos dois domínios, tomando por balizas as paragens mais conhecidas, para que em nenhum tempo se confundam, nem dêem ocasião a disputas, como são a origem e curso dos rios, e os montes mais notáveis; o segundo, que cada parte há-de ficar com o que atualmente possui; à excepção das mútuas cessões, que em seu lugar se dirão; as quais se farão por conveniência comum, e para que os confins fiquem, quanto for possível, menos sujeitos a controvérsias. Para concluir este ajuste, e assinalar os limites, deram os dois sereníssimos Reis aos seus ministros, de uma e outra parte, os plenos poderes necessários, que se inseriram no fim deste tratado: a saber Sua Majestade Fidelíssima a Sua Excelência o Senhor Tomás Silva Teles, Visconde de Vilanova de Cerveira, do Conselho de S. M. F., e do de Dom Guerra, mestre de campo general dos Exércitos de S. M. F. e seu embaixador extraordinário na Corte de Madrid, e Sua Majestade Católica a Sua Excelência o Senhor Dom José de Carvajal e Lencastre, gentil-homem de Câmara de S. M. C. com exercício, ministro de Estado, e decano deste Conselho, governador do Supremo de Índias, presidente da Junta de Comércio e Moeda e superintendente geral das Postas e Estafetas de dentro e fora de Espanha, os quais depois de conferirem, e tratarem a matéria com a devida circunspecção e exame, e bem instruídos da intenção dos dois sereníssimos reis seus amos, e seguindo as suas ordens, concordaram no que se contém dos seguintes artigos:

Artigo I

O presente tratado será o único fundamento e regra que ao diante se deverá seguir para a divisão e limites dos dois domínios em toda a América e na Ásia; e em virtude disto ficará abolido qualquer direito e acção, que possam alegar as duas coroas por motivo da bula do papa Alexandre VI, de feliz memória, e dos Tratados de Tordesilhas, de Lisboa e Utrecht, da escritura de venda outorgada em Saragoça e de outros quaisquer tratados, convenções e promessas; o que tudo, enquanto trata da linha da demarcação, será de nenhum valor e efeito, como se não houvera sido determinado ficando em tudo o mais na sua força e vigor; e para o futuro não se tratará mais da dita linha, nem se poderá usar deste meio para a decisão de qualquer dificuldade que ocorra sobre limites, senão unicamente da fronteira, que se prescreve nos presentes artigos, como regra invariável, e muito menos sujeita a controvérsias.

Artigo II

As ilhas Filipinas e as adjacentes, que possui a Coroa de Espanha, lhe pertencem, para sempre, sem embargo de qualquer pertença que possa alegar por parte da Coroa de Portugal, com o motivo do que se determinou no dito Tratado de Tordesilhas, e sem embargo das condições contidas na escritura celebrada em Saragoça a 22 de abril de 1529; e sem que a Coroa de Portugal possa repetir cousa alguma do preço que pagou pela venda celebrada na dita escritura, a cujo efeito S. M. F., em seu nome, e de seus herdeiros, e sucessores, faz a mais ampla e formal renunciação de qualquer direito, que possa ter pelos princípios expressados ou por qualquer outro fundamento, às referidas ilhas e à restituição da quantia que se pagou em virtude da dita escritura.

Artigo III

Na mesma forma, pertencerá à Coroa de Portugal tudo o que tem ocupado pelo rio das Amazonas, ou Marañón, acima e o terreno de ambas as margens deste rio até as paragens que abaixo se dirão; como também tudo o que tem ocupado no distrito de Mato Grosso, e dele para parte do oriente, e Brasil, sem embargo de qualquer pretensão que possa alegar, por parte da Coroa de Espanha, com o motivo do que se determinou no referido Tratado de Tordesilhas; a cujo efeito S. M. C., em seu nome, e de seus herdeiros e sucessores, desiste e renuncia formalmente a qualquer direito e acção que, em virtude do dito tratado, ou por outro qualquer título, possa ter aos referidos territórios.

Artigo IV

Os confins do domínio das duas Monarquias, principiarão na barra, que forma na costa do mar o regato, que sai ao pé do monte de Castilhos Grande, de cuja fralda continuará a fronteira, procurando em linha recta o mais alto, ou cumes dos montes, cujas vertentes descem por uma parte para a costa, que corre ao norte do dito regato, ou para a lagoa Mirim, ou del Meni; e pela outra para a costa, que corre do dito regato ao sul, ou para o rio da Prata; de sorte que os cumes dos montes sirvam de raia do domínio das duas coroas: e assim continuará a fronteira até encontrar a origem principal, e cabeceiras do rio Negro; e por cima deles continuará até a origem principal do rio Ibicuí, prosseguindo pelo álveo deste rio abaixo, até onde desemboca na margem oriental do Uruguai, ficando de Portugal todas as vertentes, que baixam à dita lagoa, ou ao rio Grande de São Pedro; e de Espanha, as que baixam aos rios que vão unir-se com o da Prata.

Artigo V

Subirá desde a boca do Ibicuí pelo álveo do Uruguai, até encontrar o do rio Peipiri ou Pequiri, que desagua na margem ocidental do Uruguai; e continuará pelo álveo do Peipiri acima, até a sua origem principal; desde a qual prosseguirá pelo mais alto do terreno até a cabeceira principal do rio mais vizinho, que desemboque no rio Grande de Curitiba, por outro nome chamado Iguaçu. Pelo álveo do dito rio mais vizinho da origem do Peipiri, e depois pelo do Iguaçu, ou rio Grande de Curitiba, continuará a raia até onde o mesmo Iguaçu desemboca na margem oriental do Paraná; e desde esta boca prosseguirá pelo álveo do Paraná acima; até onde se lhe ajunta o rio Igurei pela sua margem ocidental.

Artigo VI

Desde a boca do Igurei continuará pelo álveo acima até encontrar a sua origem principal; e dali buscará em linha recta pelo mais alto do terreno a cabeceira principal do rio mais vizinho, que desagua no Paraguai pela sua margem oriental, que talvez será o que se chamam de Corrientes, e baixará pelo álveo deste rio até a sua entrada no Paraguai, desde a qual boca subirá pelo canal principal, que deixa o Paraguai em tempo seco; e pelo seu álveo até encontrar o pântano, que forma este rio, chamados a lagoa dos Xarais, e atravessando esta lagoa até a boca do rio Jauru.

Artigo VII

Desde a boca do Jauru pela parte ocidental prosseguirá a fronteira em linha recta até a margem austral do rio Guaporé defronte da boca do rio Sararé, que entra no dito Guaporé pela sua margem setentrional; com declaração que se os comissários, que se hão de despachar para o regulamento dos confins nesta parte na face do país, acharem entre os rios Jauru e Guaporé outros rios, ou balizas naturais, por onde mais comodamente, e com maior certeza se possa assinalar a raia naquela paragem, salvando sempre a navegação do Jauru, que deve ser privativa dos portugueses, e o caminho, que eles costumam fazer do Cuiabá para o Mato Grosso; os dois altos contraentes consentem, e aprovam, que assim se estabeleça, sem atender a alguma porção mais ou menos no terreno, que possa ficar a uma ou a outra parte. Desde o lugar, que na margem austral do Guaporé for assinalado para termo da raia, como fica explicado, baixará a fronteira por todo o curso do rio Guaporé até mais abaixo da sua união com o rio Mamoré, que nasce na província de Santa Cruz de la Sierra, atravessa a missão dos Moxos, e formam juntos o rio chamado da Madeira, que entra no das Amazonas ou Marañón, pela sua margem austral.

Artigo VIII

Baixará pelo álveo destes dois rios, já unidos, até a paragem situada em igual distância do dito rio das Amazonas, ou Marañón, e da boca do dito Mamoré; e desde aquela paragem continuará por uma linha Leste Oeste até encontrar com a margem oriental do Javari que entra no rio das Amazonas pela sua margem austral; e baixando pelo álveo do Javari até onde desemboca no rio das Amazonas ou Marañón, prosseguirá por este rio abaixo até boco mais ocidental do Japurá, que desagua nele pela margem setentrional.

Artigo IX

Continuará a fronteira pelo meio do rio Japurá, e pelos mais rios que a ele se ajuntam, e que mais se chegarem ao rumo do norte, até encontrar o alto da Cordilheira de Montes, que mediam entre o Orinoco e o das Amazonas ou Marañón; e prosseguirá pelo cume destes montes para o oriente, até onde se estender o domínio de uma e outra monarquia. As pessoas nomeadas por ambas as coroas para estabelecer os limites, conforme é prevenido no presente artigo, terão particular cuidado de assinalar a fronteira nesta parte, subindo pelo álveo da boca mais ocidental do Japurá: de sorte que se deixem cobertos os estabelecimentos, que atualmente tiveram os portugueses nas margens deste rio e do Negro, como também a comunicação ou canal, de que se servem entre estes dois rios: e que se não dê lugar a que os espanhóis, com o pretexto ou interpretação alguma, possam introduzir-se neles, nem na dita comunicação; nem os portugueses subir para o rio Orinoco, nem estender-se para as províncias povoadas por Espanha, nem para os despovoados, que lhe hão-de pertencer, conforme os presentes artigos; para o qual efeito assinalaram os limites pelas lagoas e rios, endireitando a linha da raia, quanto puder ser, para a parte do norte, sem reparar no pouco mais ou menos no terreno, que fique a uma ou a outra Coroa, com tanto que se logrem os fins expressados.

Artigo X

Todas as ilhas, que se acharem em qualquer dos rios, por onde há-de passar a raia, conforme o prevenido nos artigos antecedentes, pertencerão ao domínio a que estiverem mais próximas em tempo seco.

Artigo XI

Ao mesmo tempo que os comissários nomeados por ambas as coroas forem assinalando os limites em toda a fronteira, farão as observações necessárias para formar um mapa individual de toda ela; do qual se tirarão as cópias, que parecerem necessárias, firmadas por todos, que se guardarão pelas duas cortes para o caso que ao diante se ofereça alguma disputa, pelo motivo de qualquer infracção; em cujo caso, e em outro qualquer, se terão por autênticas, e farão plena prova. E para que se não ofereça a mais leve dúvida, os referidos comissários porão nome de comum acordo aos rios, e montes que o não tiver, e assinalarão tudo no mapa com a individuação possível.

Artigo XII

Atendendo à conveniência comum das duas nações, e para evitar todo o género de controvérsias para o diante, se estabelecerão as mútuas cessões conteúdas nos artigos seguintes.

Artigo XIII

Sua Majestade Fidelíssima em seu nome, e de seus herdeiros e sucessores, cede para sempre à Coroa de Espanha a Colónia do Sacramento, e todo o seu território adjacente a ela, na margem setentrional do rio da Prata, até os confins declarados no artigo IV, e as praças, portos e estabelecimentos, que se compreendem na mesma paragem; como também a navegação do mesmo rio da Prata, a qual pertencerá inteiramente à Coroa de Espanha; e para que tenha efeito, renuncia S. M. F. todo o direito e acção, que tinha reservado à sua Coroa pelo Tratado Provisional de 7 de maio de 1681, e sua posse, direito e acção que lhe pertença, e possa tocar-lhe em virtude dos artigos V e VI do Tratado de Utrecht de 6 de fevereiro de 1715, ou por outra qualquer convenção, título e fundamento.

Artigo XIV

Sua Majestade Católica em seu nome, e de seus herdeiros e sucessores, cede para sempre à Coroa de Portugal tudo o que por parte de Espanha se acha ocupado, por qualquer título ou direito possa pertencer-lhe em qualquer parte das terras, que pelos presentes artigos se declaram pertencentes a Portugal, desde o Monte de Castilhos Grande, e sua fralda meridional, e costa do mar, até a cabeceira, e origem principal do rio Ibicuí, e também cede todas e quaisquer povoações e estabelecimentos, que se tenham feito por parte de Espanha no ângulo de terras, compreendido entre a margem setentrional do rio Ibicuí e a oriental do Uruguai, e os que possam ter-se fundado na margem oriental do rio Peipiri, e a aldeia de Santa Rosa, e outra qualquer que se possa ter estabelecido por parte de Espanha na margem oriental do rio Guaporé. E Sua Majestade Fidelíssima cede na mesma forma a Espanha todo o terreno que corre desde a boca ocidental do rio Japurá, e fica entre meio do mesmo rio, e do das Amazonas ou Marañón, e toda a navegação do rio Içá, e tudo o que se segue desde este último rio para o ocidente, com a aldeia de São Cristóvão e outra qualquer que por parte de Portugal se tenha fundado naquele espaço de terras; fazendo-se as mútuas entregas com as qualidades seguintes.

Artigo XV

A Colónia do Sacramento se entregará por parte de Portugal sem tirar dela mais que a artilharia, armas, pólvora e munições, e embarcações do serviço da mesma praça; e os moradores poderão ficar livremente nelas, ou retirar-se para outras terras do domínio português, com os seus efeitos e móveis, vendendo os bens de raiz. O governador, oficiais e soldados levarão também todos os seus efeitos, e terão a mesma liberdade de venderem os seus bens de raiz.

Artigo XVI

Das povoações ou aldeias, que cede S. M. C. na margem oriental do rio Uruguai, sairão os missionários com todos os móveis e efeitos levando consigo os índios para os aldear em outras terras de Espanha; e os referidos índios poderão levar também todos os seus bens móveis e semoventes, e as armas, pólvoras e munições, que tiverem em cuja forma se entregarão as povoações à Coroa de Portugal com todas as suas casas, igrejas e edifícios, e a propriedade e posse do terreno. As que se cedem por Sua Majestade Fidelíssima e Católica nas margens dos rios Pequiri, Guaporé e das Amazonas, se entregarão com as mesmas circunstâncias que a Colónia do Sacramento, conforme se disse no artigo XIV; e os índios de uma e outra parte terão a mesma liberdade para se irem ou ficarem, do mesmo modo, e com as mesmas qualidades, que o hão-de poder fazer os moradores daquela praça; excepto que os que se forem perderão a propriedade dos bens de raiz, se os tiverem.

Artigo XVII

Em consequência da fronteira, e limites determinados nos artigos antecedentes, ficará para a Coroa de Portugal o monte de Castilhos Grande com a sua falda meridional; e o poderá fortificar, mantendo ali uma guarda, mas não poderá povoá-lo, ficando às duas nações o uso comum da Barra ou enseada, que forma ali o mar, de que se tratou no artigo IV.

Artigo XVIII

A navegação daquela parte dos rios, por onde há-de passar a fronteira, será comum às duas nações; e geralmente, onde ambas as margens dos rios pertencerem à mesma Coroa, será privativamente sua a navegação; e o mesmo se entenderá da pesca nos ditos rios, sendo comum às duas nações, onde o for a navegação; e privativa, onde o for a uma delas a dita navegação: e pelo que toca aos cumes da cordilheira, que hão-de servir de raia entre o rio das Amazonas e o Orinoco, pertencerão a Espanha todas as vertentes, que caírem para o Orinoco, e a Portugal todas as caírem para o rio das Amazonas ou Marañón.

Artigo XIX

Em toda a fronteira será vedado, e de contrabando, o comércio entre as duas nações, ficando na sua força e vigor as leis promulgadas por ambas as coroas que disto tratam; e, além desta proibição, nenhuma pessoa poderá passar do território de uma nação para o da outra por terra, nem por água, nem navegar em todo ou parte dos rios, que não forem privativos da sua nação, ou comuns, com pretexto, nem motivo algum, sem tirar primeiro licença do governador, ou superior do terreno, aonde há-de ir, ou sem que vá enviado pelo governador do seu território a solicitar algum negócio, para o qual efeito levará o seu passaporte, e os transgressores serão castigados com esta diferença: se forem apreendidos no território alheio, serão postos em prisão e nela se manterão pelo tempo que quiser o governador ou superior que os fez prender; porém, se não puderem ser colhidos, o governador ou superior da terra em que entrarem formará um processo com justificação das pessoas e do delito, e com ele requererá ao juiz dos transgressores, para que os castigue da mesma forma: exceptuando-se das referidas penas os que navegando nos rios, por onde vai a fronteira, fossem constrangidos a chegar ao território alheio por alguma urgente necessidade, fazendo-a constar. E para tirar toda a ocasião de discórdia, não será lícito nos rios, cuja navegação for comum, nem nas suas margens levantar género algum de fortificação, nem pôr embarcação de registro, nem plantar artilharia, ou por outro qualquer modo estabelecer força, que possa impedir a livre e comum navegação. Nem tampouco seja lícito a nenhuma das partes visitar, ou registrar, ou obrigar que venham à sua margem as embarcações da parte oposta; e só poderão impedir e castigar aos vassalos da outra nação, se aportarem na sua margem; salvo em caso de indispensável necessidade, como fica dito.

Artigo XX

Para evitar alguns prejuízos, que poderiam ocasionar-se, foi concordado que nos montes, onde em conformidade dos precedentes artigos ficar posta a raia nos seus cumes não será lícito a nenhuma das duas potências erigir fortificação sobre os mesmos cumes, nem permitir que os seus vassalos façam neles, povoação alguma.

Artigo XXI

Sendo a guerra ocasião principal dos abusos, e motivo de se alterarem as regras mais bem concertadas, querem Suas Majestades Fidelíssima e Católica que, se (e que Deus não permita) se chegasse a romper entre as duas coroas, se mantenham em paz os vassalos de ambas, estabelecidos em toda a América meridional, vivendo uns e outros como se não houvera tal guerra entre os soberanos, sem fazer-se a menor hostilidade, nem por si sós, nem juntos com os seus aliados. E os motores e cabos de qualquer invasão, por leve que seja, serão castigados com pena de morte irremissível; e qualquer presa que fizerem, será restituída de boa-fé, e inteiramente. E, assim mesmo, nenhuma das nações permitirá o cómodo de seus portos, e menos o trânsito pelos seus territórios da América meridional, aos inimigos da outra, quando intentem aproveitar-se deles para hostilizá-la; ainda que fosse em tempo que as duas nações tivessem entre si guerra em outra região. A dita continuação de perpétua paz e boa vizinhança não terá só lugar nas terras e ilhas da América meridional, entre os súbditos confiantes das duas monarquias, senão também nos rios, portos e costas, e no mar Oceano, desde a altura da extremidade austral da ilha de Santo Antão, uma das de Cabo Verde, para a parte do sul; e desde o meridiano, que passa pela sua extremidade ocidental para a parte do poente: de sorte que a nenhum navio de guerra, corsário, ou outra embarcação de uma das duas coroas seja lícito dentro dos ditos termos em nenhum tempo atacar, insultar ou fazer o mínimo prejuízo aos navios e súbditos da outra; e de qualquer atentado, que em contrário se cometa, se dará pronta satisfação, restituindo-se inteiramente o que acaso se tivesse apresado, e castigando-se severamente os transgressores. Outrossim, nem uma das duas nações admitirá, nos seus portos e terras da dita América meridional, navios, ou comerciantes, amigos ou neutrais, sabendo que levam intento de introduzir o seu comércio nas terras da outra, e de quebrantar as leis, com que os dois monarcas governam aqueles domínios. E para a pontual observância de todo o expressado neste artigo, se farão por ambas as cortes os mais eficazes encargos aos seus respectivos governadores, comandantes e justiças; bem entendido, que ainda em caso (que não se espera) que haja algum incidente, ou descuido, contra o prometido e estipulado neste artigo, não servirá isso de prejuízo à observância perpétua e inviolável de tudo o, mais que pelo presente tratado fica regulado.

Artigo XXII

Para que se determinem com maior precisão, e sequer haja lugar à mais leve dúvida ao futuro nos lugares por onde deve passar a raia em algumas partes, que não estão nomeadas e especificadas distintamente nos artigos antecedentes, como também para declarar a qual dos domínios hão-de pertencer as ilhas que se acharem nos rios que hão-de pertencer de fronteira, nomearão ambas as Majestades, quanto antes, comissários inteligentes: os quais, visitando toda a raia, ajustem com a maior distinção e clareza as paragens por onde há-de correr a demarcação, em virtude do que se expressa neste tratado, pondo marcos nos lugares que lhes parecer conveniente; e aquilo em que se conformarem, será válido perpetuamente em virtude da aprovação e ratificação de ambas as Majestades. Porém, no caso em que se não possam concordar em alguma paragem, darão conta aos sereníssimos reis, para decidirem a dúvida em termos justos e convenientes. Bem entendido que o que os ditos comissários deixarem de ajustar não prejudicará de sorte alguma o vigor e observância do presente tratado; o qual, independentemente disso, ficará firme e inviolável, nas suas cláusulas e determinações, servindo no futuro de regra fixa, perpétua e inalterável, para os confins do domínio das duas coroas.

Artigo XXIII

Determinar-se-á entre as duas Majestades o dia em que se hão-de fazer as mútuas entregas da Colônia do Sacramento com o território adjacente e das terras e povoações compreendidas na cessão, que faz S. M. C., na margem oriental do rio Uruguai; o qual dia não passará do ano, depois que se firmar este tratado: a cujo efeito, logo que se ratificar, passarão Suas Majestades Fidelíssima e Católica, as ordens necessárias, de que se fará troca entre os ditos plenipotenciários; e pelo que toca à entrega das mais povoações, ou aldeias, que se cedem por ambas as partes, se executará ao tempo, que os comissários nomeados por elas chegarem às paragens da sua situação, examinando e estabelecendo os limites; e os que houverem de ir a estas paragens serão despachados com mais brevidade.

Artigo XXIV

Declara-se que as cessões contidas nos presentes artigos não se reputarão como determinado equivalente umas de outras, senão que se fazem respeitando ao total do que se controvertia e alegava, ou reciprocamente se cedia, e àquelas conveniências e comodidades que ao presente resultavam a uma e outra parte; e em atenção a isto se reputou justa e conveniente para ambas a concórdia e determinação de limites que fica expressada, e como tal a reconhecem e aprovam Suas Majestades em seu nome, e de seus herdeiros e sucessores, renunciando qualquer outra pretensão em contrário; e prometendo na mesma forma que em nenhum tempo, e com nenhum fundamento, se disputará o que fica assentado e concordado nestes artigos; nem com pretexto de lesão, nem outro qualquer, pretenderão outro ressarcimento, ou equivalente dos seus mútuos direitos e cessões referidas.

Artigo XXV

Para mais plena segurança deste tratado, convieram os dois altos contraentes em garantir reciprocamente toda a fronteira e adjacências dos seus domínios na América meridional, conforme acima fica expressado; obrigando-se cada um a auxiliar e socorrer o outro contra qualquer ataque, ou invasão, até que com efeito fique na pacífica posse, e uso livre e inteiro do que se lhe pretendesse usurpar; e esta obrigação, quanto às costas do mar, e países circunvizinhos a elas, pela parte de S. M. F. se estenderá até as margens do Orinoco de uma e outra banda; e desde Castilhos até o estreito de Magalhães. E pela parte de S. M. C. se estenderá às margens de uma e outra banda do rio das Amazonas ou Marañón; e desde o dito Castilhos até o porto de Santos. Mas, pelo que toca ao interior da América meridional, será indefinida esta obrigação; e em qualquer caso de invasão, ou sublevação, cada uma das coroas ajudará e socorrerá a outra até se reporem as cousas em estado pacífico.

Artigo XXVI

Este tratado com todas as suas cláusulas e determinações será de perpétuo vigor entre as duas coroas; de tal sorte, que ainda em caso (que Deus não permita) que se declarem guerra, ficará firme e invariável durante a mesma guerra, e depois dela, sem que nunca se possa reputar interrompido, nem necessite de revalidar-se. E presentemente se aprovará, confirmará e ratificará pelos dois Sereníssimos reis, e se fará a troca das ratificações no termo de um mês, depois da sua data, ou antes se for possível.

Em fé do que, e em virtude das ordens e plenos poderes que nós abaixo assinados recebemos de nossos amos, el-rei fidelíssimo de Portugal e el-rei católico de Espanha, assinamos o presente tratado e lhe fizemos pôr o selo de nossas armas. Feito em Madrid a treze de Janeiro de mil setecentos e cinquenta.

(Ass.) Visconde Tomás da Silva Teles e d. Joseph de Carvajal y Lancaster.»



Tratado de El Pardo
(1761)

O Tratado de El Pardo em 1761 tornou nulas, todas, as disposições e feitos decorrentes do Tratado de Madrid de 1750, que havia falhado em promover a paz nas colónias espanhola e portuguesa. O território dos Sete Povos das Missões não pode ser ocupado pacificamente pelos portugueses. Isso porque havia nele grandes aldeamentos indígenas organizados por jesuítas espanhóis; e os índios guaranis, guardando antigos rancores dos bandeirantes protestaram contra a transferência dessa região para os domínios portugueses. Por outro lado, Marquês de Pombal e os colonos portugueses não queriam entregar a Colónia do Sacramento aos espanhóis.

Tratado de Paris
(10 de Fevereiro de 1763)


O Tratado de Paris foi um tratado assinado a 10 de Fevereiro de 1763 entre a Grã-Bretanha, França, Portugal e Espanha e que pôs fim à Guerra dos Sete Anos. O tratado gerou grandes trocas de territórios coloniais entre as potências europeias, em especial na América do Norte e Caraíbas: a Grã-Bretanha obtém da França o Canadá, Nova Escócia, São Vicente, Dominica, Tobago, Granada e Minorca; a França recupera Guadalupe, Santa Lúcia e Gorea, as suas colónias na Índia (embora sem o direito de nelas construir fortificações) e obtém garantias sobre os seus direitos de pesca na Terra Nova; a Espanha recebe da França a Luisiana, troca a Flórida por Havana e recupera Manila e as Filipinas.

Tratado de Santo Ildefonso
(1 de Outubro de 1777)



Tratado de Santo Ildefonso foi o acordo assinado em 1 de Outubro de 1777 na cidade espanhola de San Ildefonso, na província espanhola de Segóvia, na Comunidade Autónoma de Castela e Leão, com o objetivo de encerrar a disputa entre Portugal e Espanha pela posse da colónia sul-americana do Sacramento, situação que se prolongava desde a Paz de Utrecht e a guerra de 1735 a 1737. O tratado foi intermediado pela Inglaterra e pela França, que tinham interesses políticos internacionais na pacificação das relações entre Portugal e Espanha. Com a assinatura do tratado, a Rainha de Portugal, Dona Maria I, e o Rei da Espanha, Dom Carlos III, praticamente revalidaram o Tratado de Madrid de 1750 e concederam fundamento jurídico a uma situação de fato, os espanhóis mantiveram a colónia e a região dos ‘Sete Povos das Missões’, que depois passou a compor grande parte do estado do Rio Grande do Sul e do Uruguai, em troca, reconheceram a soberania dos portugueses sobre a margem esquerda do rio da Prata, cederam pequenas faixas fronteiriças para compensar as vantagens obtidas no sul e devolveram a ilha de Santa Catarina, ocupada poucos meses antes. A assinatura do tratado constituiu, na América, um recuo em relação à doutrina defendida por Dom Alexandre de Gusmão, consagrada no ‘Tratado de Madrid’, que concedia maiores vantagens a Portugal. Dona Gusmão conseguira, com o apoio da Rainha da Espanha, princesa portuguesa, promover uma solução negociada para o conflito entre os dois países na América depois da morte do Cardeal da Mota, principal ministro do Rei Dom João V. Em 1761, com a assinatura do ‘Tratado de El Pardo’, anulou-se o Tratado de Madrid. A exemplo do que ocorrera após a assinatura do ‘Tratado de Madrid’, não tiveram êxito os trabalhos de demarcação e, poucos anos mais tarde, os gaúchos Manuel dos Santos Pedroso e José Borges do Canto tomaram a região dos ‘Sete Povos das Missões’.

Tratado de El Pardo
(11 de Março de 1778)



O Tratado de El Pardo foi assinado em 11 de Março de 1778 entre a Rainha Dona Maria I de Portugal e o Rei Dom Carlos III de Espanha. Com base nos termos do tratado, a Rainha Maria cedeu as ilhas de Annobon e Bioko (Formosa) para o Rei Carlos, assim como a costa do Golfo da Guiné entre a foz do rio Níger e a do Ogooué, no atual Gabão. Em troca desses territórios, Portugal adquiria faixas de territórios na América do Sul para o Brasil (grande parte do atual pampa gaúcho). A Ilha de Formosa (chamada Fernão do Pó durante o Estado Português) foi oficialmente reconhecida e rebaptizada como Fernando Poo.

Primeira Liga da Neutralidade Armada
(13 de Julho de 1782)

A Liga da Neutralidade Armada de 1780 a 1783, mais conhecida na literatura lusófona por Liga dos Neutros, foi uma coligação de Estados europeus, liderados pela Rússia, formada durante a ‘Guerra da Independência Americana’ com o objectivo de proteger a liberdade do comércio marítimo face às buscas e apreensões abusivas que eram conduzidas em alto-mar pela ‘Marinha Real Britânica’ que seguia uma política de buscas ilimitadas alegadamente para suprimir o contrabando francês.



A Guerra da Independência Americana trouxe grande instabilidade ao comércio marítimo internacional, com frequentes violações dos direitos soberanos dos Estados neutrais, resultantes de incidentes de aparente quebra de neutralidade e pelos excessos de fiscalização a que eram submetidos os navios por parte dos beligerantes. A maior parte dos incidentes tinha como protagonista a ‘Marinha Real Britânica’, já que a Grã-Bretanha era ao tempo a potência naval dominante. Nesse contexto, por iniciativa da Czarina Catarina II da Rússia, que a 11 de Março de 1780 (28 de Fevereiro, no calendário em uso na Rússia) emitiu uma declaração em que afirmava a neutralidade armada do Império Russo no âmbito daquele conflito, foi assinada uma convenção internacional que pretendia defender os direitos das partes contratantes para que os navios neutros possam livremente navegar de porto em porto e nas costas das nações em guerra para que os efeitos e mercadorias pertencentes aos súbditos das potências em guerra, sejam livres a bordo das embarcações neutras, exceptuados os géneros de contrabando. A convenção era operacionalizada com as respectivas marinhas de guerra, às quais cabia proteger o comércio marítimo do conjunto dos países neutros aderentes. Nos termos da declaração inicial, era declarado o direito dos Estados neutrais exercerem o comércio marítimo com nacionais dos Estados beligerantes sem estarem sujeitos a quaisquer constrangimentos excepto absterem-se de traficar armas ou materiais de óbvia e imediata utilização militar. Para esse efeito a Rússia, e posteriormente os Estados aderentes ao pacto, não reconheceriam o bloqueio de costas, mas apenas o bloqueio de portos devidamente identificados e, ainda assim, apenas quando pelo menos um navio de guerra do Estados bloqueante estivesse no porto ou na sua proximidade imediata. Para fazer respeitar esta declaração, o Império Russo enviou três Esquadrões da Marinha Imperial Russa, um para o Mediterrâneo, outro para Atlântico e outro para o Mar do Norte. A posição Russa foi de imediato seguida pela Dinamarca e pela Suécia, que aceitaram a proposta russa de assinar um convénio de mútua protecção, formando assim o núcleo inicial da Liga. Estes Estados permaneceram fora da guerra, reafirmando a sua neutralidade em relação ao conflito, mas ameaçaram com retaliação conjunta se qualquer navio com a bandeira dos Estados aderentes fosse molestado. O sucesso imediato da Liga levou à adesão de outras potências europeias e quando o Tratado de Paris em 1783, pôs termo ao conflito em 1783, já tinham aderido a Prússia, o Sacro Império Romano Germânico, os Países Baixos, Portugal, o Reino das Duas Sicílias e o Império Otomano. Tendo os Britânicos frequentemente desrespeitado a neutralidade de Portugal, utilizando as águas portuguesas para operações de guerra, em 1780 o governo português tomou várias providências reforçando as suas forças navais para poder fiscalizar mais eficazmente as águas sob sua soberania. Face à ‘Superioridade Naval Britânica’, as medidas foram de todo inúteis. Em consequência, procurando o apoio de outros ‘Estados Neutrais’, Portugal aderiu à ‘Liga dos Neutros’ a 13 de Julho de 1782, assinando o convénio com o Império Russo a 24 de Julho daquele mesmo ano. Portugal retirou bons proveitos daquela aliança, que viria a constituir um dos factores da prosperidade a que o Brasil ascendeu naquele período. Como a ‘Marinha Real Britânica’ tinha um poderio naval que era vastamente superior ao das marinhas dos estados da ‘Liga’ combinadas, a aliança era do ponto de vista militar aquilo que a própria Catarina II reconheceria como uma "nulidade armada" e não uma "neutralidade armada". Contudo, no contexto internacional da época, o peso diplomático da Liga foi suficiente para funcionar com dissuasor de um eventual ataque, já que a França e os Estados Unidos da América tinham sido rápidos em proclamar a sua adesão aos novos princípio da liberdade do comércio marítimo. A Grã-Bretanha, isolada nesta matéria, preferiu não antagonizar a Rússia, optando assim por respeitar, sem reconhecer, os princípios proclamados pela Liga, não interferindo com os navios dos seus membros. Enquanto ambos os lados da ‘Quarta Guerra Anglo-Neerlandesa’ tacitamente compreenderam que ela era uma tentativa de manter os Países Baixos fora da Liga, A Grã-Bretanha não considerou a Liga como hostil. A ideia de uma ‘Liga dos Neutros’ para proteger a navegação comercial foi novamente tentada durante as ‘Guerras Napoleónicas’, novamente por iniciativa russa, desta feita do Czar Paulo I da Rússia. Esta Segunda Liga da Neutralidade Armada, ou Liga do Norte, formada em 1800 durante a fase final da Guerra da Segunda Coligação falhou quando os britânicos decidiram não a respeitar, considerando mesmo a adesão um acto hostil, de que resultou o ataque à Dinamarca e a destruição da sua marinha na ‘Batalha de Copenhaga’.

Tratado de Badajoz
(6 de Junho de 1801)


O Tratado de Badajoz, também referido como Paz de Badajoz, foi celebrado na cidade espanhola de Badajoz, em 6 de Junho de 1801, entre Portugal, por uma parte, e a Espanha e a França coligadas, pela outra. Este diploma colocava fim à chamada ‘Guerra das Laranjas’, embora tenha sido assinado por Portugal sob coacção, já que o país encontrava-se ameaçado pela invasão de tropas francesas estacionadas na fronteira, em Cidade Rodrigo. Pelos seus termos, bastante severos para Portugal, estabelecia-se:

Portugal fecharia os portos de todos os seus domínios às embarcações da Grã-Bretanha (art. II).

A Espanha restituía a Portugal as fortificações e territórios conquistados de Juromenha, Arronches, Portalegre, Castelo de Vide, Barbacena, Campo Maior e Ouguela, com artilharia, espingardas e munições de guerra (art. III).

A Espanha conservava, na qualidade de conquista, a praça-forte, território e população de Olivença, mantendo o rio Guadiana como linde daquele território com Portugal (art. IV).

Eram indemnizados, de imediato, todos os danos e prejuízos causados durante o conflito pelas embarcações da Grã-Bretanha ou pelos súbditos de Portugal, assim como dadas as justas satisfações pelas presas feitas ilegalmente pela Espanha antes do conflito, com infracções do território ou debaixo do tiro de canhão das fortalezas dos domínios portugueses (art. V).

Os termos do tratado foram ratificados pelo Príncipe-Regente de Portugal, Dom João, no dia 14, e pelo Rei Dom Carlos IV de Espanha, a 21 do mesmo mês, mas foram rejeitados pelo primeiro cônsul da França, Napoleão Bonaparte. A manutenção das suas tropas em território espanhol, forçou Portugal a aceitar alterações à redacção do Tratado. Desse modo, a 29 de Setembro desse mesmo ano era assinado um novo diploma, o chamado ‘Tratado de Madrid’ que, se por um lado formulou imposições mais severas a Portugal, por outro, evitou uma nova violação do seu território. Por ele, eram mantidos os termos de Badajoz, mas Portugal, adicionalmente, obrigava-se a pagar à França um montante de 20 milhões de francos. Com relação aos domínios coloniais na América do Sul, por este novo diploma Portugal cedia ainda metade do território do Amapá à França, comprometendo-se a aceitar como fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa, o rio Arawani (Araguari) até à foz. Estas condições adicionais foram estabelecidas e ditadas por Napoleão. O Tratado de Badajoz não estabeleceu a soberania portuguesa sobre os ‘Sete Povos das Missões’, que seria tomado aos espanhóis pela população colonial, sem conhecimento da Coroa, alguns dias depois do, tratado ser assinado. Somente em 1804 um acordo entre o Vice-Rei do Rio da Prata e o Governador do Rio Grande reconheceria a soberania portuguesa na área. Após a batalha de Trafalgar em 1805, na qual a ‘Marinha Real Britânica’ derrotou as ‘Marinhas da França e da Espanha’, Napoleão fracassou na tentativa de invadir a Grã-Bretanha e decretou o Bloqueio Continental em 1806. Diante da recusa Portuguesa em acatar os seus termos, foi assinado o ‘Tratado de Fontainebleau’ a 27 de Outubro de 1807, ocorrendo a subsequente invasão franco-espanhola de Portugal, o que deflagrou a chamada ‘Guerra Peninsular’.



O Rei Dom João VI de Portugal, retirando-se para o Brasil em 1807, declarou nulo, a 1 de maio de 1808, o Tratado de Badajoz por Ex justa causa, devido à invasão do território português, deixando por conseguinte de reconhecer a ocupação Espanhola de Olivença que, no entanto, se mantém até aos dias de hoje (violando o Tratado de Viena). A ‘Questão de Olivença’ é o nome pelo qual é conhecido o diferendo entre Portugal e Espanha quanto à soberania sobre Olivença. A administração e soberania espanhola de Olivença e territórios adjacentes não são reconhecidas por Portugal, estando a fronteira por delimitar nessa zona. Em 1801, através do ‘Tratado de Badajoz’, denunciado em 1808 por Portugal, o território foi anexado por Espanha. Em 1817, quando subscreveu o diploma resultante do Congresso de Viena em 1815, a Espanha reconheceu a soberania portuguesa, comprometendo-se à retrocessão do território o mais prontamente possível. No entanto, tal nunca chegou a acontecer. Derrotadas as ambições franco-napoleónicas, reuniu-se o ‘Congresso de Viena’, aberto em Setembro de 1814. Nele se encontravam representadas não apenas as principais potências da Europa à época (Grã-Bretanha, Áustria, Prússia e Rússia), mas também Portugal, Espanha, Suécia, assim como a vencida França. Constituíam o Comité dos Oito que seria o órgão principal do Congresso. Os trabalhos prolongar-se-iam até ao ano seguinte, sendo a Acta Final assinada em 9 de Junho. Junto das assinaturas dos representantes da Áustria (Metternich), da França (Talleyrand), da Grã-Bretanha, da Prússia, da Rússia e da Suécia, vinha a de Dom Pedro de Sousa Holstein, futuro Duque de Palmela, chefe da delegação portuguesa. A Espanha, que não o fez de imediato, viria também a subscrever a Acta, a 7 de Maio de 1817. Do Congresso de Viena haveria de emergir uma nova ordem europeia que, sustentada no estabelecido na Acta Final, por quase meio século regularia as Relações Internacionais no continente e preservá-lo-ia da guerra. Foi nesse cenário, ao eclodir a Guerra Peninsular, que se registou a invasão do reino de Portugal, em 20 de Maio de 1801, por tropas espanholas sob o comando de Manuel Godoy, que rapidamente conquistaram as praças de Olivença, Juromenha e outras no Alto-Alentejo: o episódio ficaria conhecido como a ‘Guerra das Laranjas’. O Governador da Praça-forte de Olivença à época, Júlio César Augusto Chermont, teria dado ordens de que não se disparasse, não tendo oferecido resistência à invasão, à semelhança do que ocorreu com a vizinha Fortaleza de Juromenha. Surpreendido, mal preparado e subjugado pela desproporção de forças, Portugal foi compelido a assinar o ‘Tratado de Badajoz’, a 6 de Junho do mesmo ano, cedendo às exigências de Napoleão Bonaparte e de Carlos IV de Espanha, reconhecendo à Espanha, em seu Art. III:

"Sua Magestade Católica conservará na qualidade de conquista, para uni-la perpetuamente a seus domínios e vassalos, a praça de Olivença, seu território e povoações desde o [rio] Guadiana; de sorte que este rio seja o limite de seus respectivos Reinos."

O ‘Tratado de Badajoz’ estipulava que a violação de qualquer um dos seus artigos, por qualquer uma das partes contratantes, conduziria à sua anulação, o que veio a suceder com a assinatura do ‘Tratado de Fontainebleau’ em 27 de Outubro de 1807 e subsequente invasão franco-espanhola de Portugal. O Príncipe-Regente, ao chegar ao Brasil, declarou nulo o diploma de Badajoz a 1 de Maio de 1808, deixando, por conseguinte, de reconhecer a ocupação espanhola de Olivença. Desde o término da Campanha do Rossilhão que durou desde 1793 a 1795, que a França e a Espanha planeavam invadir Portugal e reparti-lo entre si. Dos acordos celebrados entre estes dois países resultou a invasão de Portugal por tropas espanholas, auxiliadas por forças francesas. Consumada a investida sobre o Alentejo, a 20 de Maio de 1801 o governador da Praça de Olivença entrega-se ao exército ocupante, sem esboçar resistência, o mesmo fazendo o governador de Juromenha. Em situação de fraqueza diplomática e sob ameaça de força, o governo português teve de ceder à exigência do Rei Dom Carlos IV de Espanha, assinando o duplo ‘Tratado de Badajoz’ de 6 de Junho e o ‘Tratado de Madrid’ de 29 de Setembro de 1801. Para além de se submeter às gravosas pretensões francesas, “Portugal viu-se sujeito a reconhecer à Espanha a posse da ‘Praça de Olivença’, seu território e povos desde o Guadiana”, passando este rio a constituir fronteira entre os dois países, na referida região. Se a Espanha possuísse algum argumento válido para justificar a sua ocupação do Território de Olivença fundamentá-lo-ia no Tratado de Badajoz de 1801. Acontece que este tratado, juntamente com o ‘Tratado de Madrid’ do mesmo ano, perdeu o seu valor jurídico, considerando-se nulo e de nenhum efeito. O Tratado de Badajoz foi negociado entre as duas partes no conflito: Portugal, na condição de estado invadido; a França e a Espanha, conjuntamente, como estados invasores. Pondo fim às negociações, foi redigido um duplo tratado de paz que seria assinado alternadamente entre Portugal e a Espanha e entre Portugal e a França, valendo ambos como um só tratado como textos diplomáticos conexos. Tal se afirma no Preâmbulo do tratado onde se diz:

"Havendo-se concordado entre si os Plenipotenciários das três Potências beligerantes, convieram em formar dois Tratados, sem que na parte essencial seja mais do que um, pois que a garantia é recíproca, e não haverá validade em algum dos dois quando venha a verificar-se a infracção em qualquer dos Artigos que neles se expressam."

Reforçando o princípio da unicidade dos Tratados de Badajoz e fundamentando as reivindicações portuguesas sobre a sua nulidade está o Artigo IV, onde se estipula o seguinte:

"Se neste ou outro Artigo houver infracção, se dará por nulo o Tratado que agora se estabelece entre as três Potências, compreendida a mútua garantia, segundo se expressa nos Artigos do presente."

A reciprocidade da validade ou da invalidade dos dois tratados é claramente expressa no Artigo VIII do texto francês, ao afirmar-se que “toute infraction à ce Traité será regardée par le Premier Consul comme une infraction au Traité actuel” o que significa que qualquer infracção ao tratado luso-francês constituía infracção ao tratado luso-espanhol, já que ambos constituíam um único tratado. São várias as razões da nulidade do Tratado de Badajoz. Para além do incumprimento do prazo de ratificação por parte da França, conforme se estipulava no Artigo IX, o que levou à assinatura do Tratado de Madrid de 29 de Setembro de 1801, são as seguintes as causas da nulidade do Tratado de Badajoz. As circunstâncias em que Portugal assinou o ‘Tratado de Badajoz’, com os exércitos franceses e espanhóis a ameaçarem incrementar as acções de força contra o território português que tinham parcialmente ocupado, violam o princípio segundo o qual os negócios jurídicos só são válidos verificando-se a livre manifestação da vontade das partes. Portugal assinou o ‘Tratado de Badajoz’, não no exercício da sua plena liberdade, mas coagido a fazê-lo sob ameaça de força. O Tratado de Badajoz de 1801 era um “Tratado de Paz”, o que expressamente ficou definido no seu preâmbulo. No Artigo I estipulava-se:

"Haverá paz, amizade e boa correspondência entre Sua Alteza Real o Príncipe Regente de Portugal e dos Algarves, e Sua Majestade Catholica El Rei de Hespanha, assim por mar como por terra, em toda a extensão dos seus Reinos e Domínios."



Apesar de ter sido agredido e invadido pelas forças franco-espanhola, sem qualquer motivo que não fosse a sua decisão de se recusar a abandonar a sua aliança com a Grã-Bretanha, Portugal teve de aceitar a Paz em circunstâncias desonrosas e humilhantes. Em troca da aceitação da Paz, que se verificou sob ameaça de maiores represálias, Portugal anuiu às exigências da Espanha e da França, entre as quais se encontrava o reconhecimento da posse espanhola de Olivença. Conforme se estipulava no seu Artigo IV, a violação da Paz implicava a nulidade do ‘Tratado de Badajoz’. E, com efeito, tal veio a suceder em 1807, quando a Espanha e a França assinaram o ‘Tratado de Fontainebleau’, pelo qual previam a divisão de Portugal em três partes, ocupando o país poucos meses depois, para dar execução a esse projecto. Se a Espanha pudesse afirmar algum direito à posse do Território de Olivença, perdia-o irrevogavelmente, ao anular, por sua responsabilidade, o único documento de valor jurídico em que poderia fundamentar a sua soberania sobre aquela nesga de terra alentejana. Em resultado da invasão de Portugal por forças franco-espanhola, o que levou a Família Real a transferir a sede da Monarquia Portuguesa para o Brasil, o Príncipe Regente, Dom João, fez publicar um Manifesto, com data de 1 de Maio de 1808, considerando “nullos e de nenhum vigor” os ‘Tratados de Badajoz’ e de ‘Madrid’ de 1801. A 31 de Março de 1814 as forças aliadas entravam em Paris, obrigando à abdicação de Napoleão Bonaparte. As hostilidades resultantes das guerras napoleónicas foram suspensas por uma convenção assinada a 23 de Abril, à qual aderiu o Príncipe Dom João em 8 de Maio do mesmo ano. A 30 de Maio de 1814 é assinado o Tratado, cujo conteúdo, em língua francesa, é o seguinte:

“Les Puissances, reconnaissant la justice des réclamations formées par S. A. R. le prince régent de Portugal e du Brésil, sur la ville d’Olivenza et les autres territoires cédés à Espagne par le traité de Badajoz de 1801, et envisageant la restitution de ces objets, comme une des mesures propres à assurer entre les deux royaumes de la péninsule, cette bonne harmonie complète et stable dont la conservation dans toutes les parties de l’Europe a été le but constant de leurs arrangements, s’engagent formellement à employer dans les voies de conciliation leurs efforts les plus efficaces, afin que la rétrocession desdits territoires en faveur du Portugal soi effectuée, et les puissances reconnaissent, autant qu’il dépend de chacune d’elles, que cet arrangement doit avoir lieu au plus tôt”.

Com relação aos interesses portugueses sobre a vila de Olivença, a Ata Final do Congresso de Viena, no seu Artº 105, prescrevia:

"Les Puissances, reconnaissant la justice des réclamations formées par S. A. R. le prince régent de Portugal e du Brésil, sur la ville d’Olivenza et les autres territoires cédés à la Espagne par le traité de Badajoz de 1801, et envisageant la restitution de ces objets, comme une des mesures propres à assurer entre les deux royaumes de la péninsule, cette bonne harmonie complète et stable dont la conservation dans toutes les parties de l’Europe a été le but constant de leurs arrangements, s’engagent formellement à employer dans les voies de conciliation leurs efforts les plus efficaces, afin que la rétrocession desdits territoires en faveur du Portugal soi effectuée; et les puissances reconnaissent, autant qu’il dépend de chacune d’elles, que cet arrangement doit avoir lieu au plus tôt." ("As potências, reconhecendo a justiça das reclamações formuladas por S.A.R. o Príncipe-Regente de Portugal e do Brasil, sobre a vila de Olivença e os outros territórios cedidos à Espanha pelo Tratado de Badajoz de 1801, e visando a restituição desses objetos, como uma das medidas apropriadas a assegurar entre os dois reinos da península [Ibérica], aquela boa harmonia completa e estável que deve ser mantida entre todas as partes da Europa, … de seus arranjos, se engajam formalmente a empregar dentro das vias de conciliação os seus esforços os mais eficazes, a fim de que a retrocessão dos ditos territórios em favor de Portugal seja efectuada; e as potências reconhecem, ainda que isso de qualquer uma delas, que este arranjo deva ter lugar o mais prontamente possível.")

Tratado de Madrid
(29 de Setembro de 1801)


O Tratado de Madrid foi celebrado na cidade espanhola de Madrid, em 29 de Setembro de 1801, entre Portugal, por uma parte, e a França, pela outra. Por esse diploma, Portugal obrigava-se a manter os termos do Tratado de Badajoz com a Espanha mas, adicionalmente, comprometia-se a pagar à França uma indemnização de 20 milhões de francos. Com relação aos domínios coloniais na América do Sul, por este diploma Portugal cedia ainda metade do território do Amapá à França, comprometendo-se a aceitar como fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa, o rio Arawani Araguari até à foz. Estas condições adicionais foram estabelecidas e ditadas por Napoleão.

Convenção Secreta
(Transferência da Monarquia Portuguesa para o Brasil-22 de Outubro de 1807)


A Convenção Secreta sobre a Transferência da Monarquia Portuguesa para o Brasil foi um tratado internacional celebrado entre Portugal e Grã-Bretanha em 22 de Outubro de 1807, também denominado "Convenção secreta sobre a transferência para o Brasil da sede da Monarquia Portuguesa, e ocupação da temporária da Ilha da Madeira por tropas britânicas". Sua assinatura, em Londres, se deu no contexto das Invasões Francesas, mais especificamente, foi celebrado alguns dias antes da primeira invasão, quando as tropas napoleónicas já se aproximavam das fronteiras portuguesas através do território espanhol. Posteriormente, a pretensão portuguesa concretizou-se com o apoio naval britânico durante a transferência da corte portuguesa para o Brasil, assim como Portugal correspondeu aos anseios britânicos de abertura dos portos brasileiros a suas mercadorias.

Convenção de Sintra
(30 de Agosto de 1808)



Na tarde de 22 de Agosto de 1808, depois das sucessivas derrotas do exército francês nas batalhas da Roliça e do Vimeiro, Junot envia o General Kellermann a apresentar-se no quartel-general do exército britânico (então situado na aldeia do Vimeiro), a fim de pedir tréguas. Estas foram concedidas no mesmo dia, sob a forma dum armistício assinado entre o Tenente General Wellesley e o General de Divisão Kellermann, segundo o qual discutir-se-iam nos dias seguintes as estipulações para um acordo definitivo para a retirada das tropas francesas de Portugal. Entre outras disposições, este armistício estabelecia o Rio Sizandro como fronteira entre as tropas britânicas e as francesas, enquanto as tropas portuguesas deveriam ficar atrás da linha entre Leiria e Tomar. Finalmente, depois de vários dias de discussões, e enquanto isso os exércitos britânico e português mantinham-se atrás das ditas linhas de demarcação, este acordo definitivo foi assinado em Lisboa, a 30 de Agosto de 1808, pelo Quartel-Mestre-General George Murray, da parte do exército britânico, e pelo General Kellermann, da parte do exército francês. No mesmo dia, também em Lisboa, Junot, na qualidade de general-em-chefe do exército francês, ratificou o texto da Convenção, que foi igualmente ratificada, um dia depois, em Torres Vedras, pelo, seu homólogo o general-em-chefe Sir Hew Dalrymple, da parte do exército britânico. Em data incerta, mas certamente entre o dia 31 de Agosto e o 1.º de Setembro, o texto desta Convenção foi também ratificado pelo Almirante Charles Cotton, da parte da marinha britânica, a bordo do ‘Hibernia’, navio de guerra a partir do qual Cotton comandou a esquadra britânica, que bloqueou o porto de Lisboa durante o contexto da chamada Primeira Invasão Francesa. Como se indica, nenhum dos intervenientes assinou ou ratificou a ‘Convenção em Sintra’. O facto de ter ficado conhecida como ‘Convenção de Sintra’, havendo inclusive várias hipóteses sobre o sítio onde supostamente teria sido assinada (entre os quais o Palácio de Queluz ou o Palácio de Seteais, deriva de um mal entendido, que surgiu não em Portugal (onde o texto da Convenção tardou muito a se tornar conhecido) mas sim na Inglaterra, depois do texto da mesma ter sido publicado (a 16 de Setembro de 1808) num número extraordinário do periódico The London Gazette, antecedido não só pelo texto do armistício acima referido mas também por uma carta do General Hew Dalrymple ao governo britânico, datada de 3 de Setembro de 1808, quando o quartel-general britânico já tinha passado a Sintra (ou seja, depois da ratificação da Convenção, pois o armistício assinado a 22 de Agosto impedia tal movimentação). Assim, como a referida carta de Dalrymple foi remetida de Sintra, a Convenção, que provocaria imensas críticas (chegando ao ponto do governo britânico ter de mandar chamar de volta os principais intervenientes para serem questionados por uma comissão de inquérito), passaria a ficar conhecida pela própria imprensa britânica, alguns meses mais tarde, como ‘Convention of Cintra’. Inevitavelmente, esta expressão acabou por passar para o mundo lusófono, sobretudo através de muitos textos publicados na imprensa britânica, que foram logo naquela época traduzidos e transcritos no Correio Brasiliense, jornal mensal publicado em Londres por Hipólito da Costa. Em termos militares, o acordo traduzia-se em benefícios mútuos: O General Junot, sem linhas de comunicação confiáveis com a França, retirava suas tropas sem maiores perdas e em segurança. Os ingleses ganhavam o controle da capital, Lisboa, e da temida linha de defesa da barra do rio Tejo, sem necessidade de combate. Contudo, apesar de muitas discussões entre os comissários britânicos (Tenente-Coronel Lord Proby e Major-General William Carr Beresford) e o francês (o próprio General Kellermann) que tinham sido nomeados para supervisionarem a execução da Convenção, a forma final deste acordo permitiu que os franceses levassem consigo não só as suas armas e bagagens mas também uma quantidade indeterminada, mas certamente muito grande, de bens saqueados em Portugal. Com este acordo, os franceses ganharam tempo e voltariam a invadir Portugal um ano mais tarde.

Texto da Convenção

Convenção Definitiva para a evacuação de Portugal pelo exército francês

Os Generais Comandantes em Chefe dos Exércitos britânico e francês em Portugal, tendo determinado negociar e concluir um Tratado para a evacuação de Portugal pelas tropas francesas, sobre a base do Acordo que se ajustou a 22 deste mês para uma suspensão de hostilidades, nomearam os Oficiais abaixo mencionados para negociar o mesmo em seus nomes, a saber: da parte do General em Chefe do exército britânico, o Tenente Coronel Murray, Quartel-Mestre-General, e da parte do General em Chefe do exército francês, Monsieur Kellermann, General de Divisão; aos quais deram autoridade para negociar e concluir uma Convenção para este efeito, sujeita às suas respectivas ratificações, e à do Almirante comandante da frota britânica na foz do Tejo. Estes dois oficiais, depois de trocarem os seus plenos poderes, concordaram nos artigos que se seguem:

Art. I. Todas as praças e fortes no Reino de Portugal ocupadas pelas tropas francesas serão entregues ao exército britânico no estado em que se encontram no momento da assinatura da presente Convenção.

Art. II. As tropas francesas evacuarão Portugal com as suas armas e bagagem; não serão consideradas como prisioneiras de guerra e, uma vez chegadas à França, terão a liberdade para [voltar a] servir.

Art. III. O Governo inglês fornecerá os meios de transporte para o exército francês, que desembarcará em qualquer um dos portos de França entre Rochefort e Lorient, inclusive.

Art. IV. O exército francês levará consigo toda a sua artilharia de calibre francês, com os cavalos do seu trem, e os [respectivos] carros munidos de 60 balas por peça. Toda a demais artilharia, armas e munições, tal como os arsenais navais e militares, serão entregues ao exército e à marinha britânica no estado em que possam estar no momento da ratificação desta Convenção.

Art. V. O exército francês levará consigo todos os seus equipamentos e tudo o que se compreende debaixo da denominação de propriedade do exército; ou seja, a sua caixa militar e as carruagens agregadas ao comissariado e aos hospitais de campanha; em alternativa, permitir-se-lhe-á negociar, por sua conta, aquela parte da mesma que o Comandante em Chefe julgue desnecessário embarcar. Da mesma forma, todos os indivíduos do exército serão livres para vender a sua propriedade particular, seja qual for, com plena segurança futura para os seus compradores.

Art. VI. Os cavalos da cavalaria serão embarcados, tal como os dos Generais e dos outros oficiais de todas as graduações. É contudo perfeitamente entendido que os meios de transporte dos cavalos à disposição dos comandantes britânicos são muito limitados; poderão conseguir-se alguns transportes adicionais no porto de Lisboa; os cavalos que se embarcarem pelas tropas não excederão o número de seiscentos, e o número embarcado pelo Estado-maior não excederá os duzentos. Em todo o caso, dar-se-á ao exército francês toda a facilidade para negociar os cavalos que lhe pertençam e que não se possam embarcar.

Art. VII. Com o objectivo de facilitar o embarque, este será feito em três divisões, compondo-se a última das quais principalmente pelas guarnições das praças, pela cavalaria, pela artilharia, pelos doentes e pelo equipamento do exército. A primeira divisão embarcará dentro de 7 dias a partir da data da ratificação, ou mais cedo, se possível.

Art. VIII. As guarnições de Elvas e dos seus fortes, bem como as de Peniche e de Palmela, embarcarão em Lisboa; a de Almeida embarcará no Porto ou no ancoradouro mais próximo. Elas serão acompanhadas na sua marcha por comissários britânicos, encarregados de providenciar a sua subsistência e alojamento.

Art. IX. Todos os doentes e feridos que não puderem ser embarcados com as tropas ficam confiados ao exército britânico. Serão cuidados, enquanto permanecerem neste país, às custas do Governo britânico, debaixo da condição da despesa ser paga pela França quando se efectuar a evacuação final. O Governo inglês providenciará o seu regresso para a França, que será feito por destacamentos de cerca de cento e cinquenta ou duzentos de cada vez. Um número suficiente de oficiais médicos franceses ficará para trás para os tratar.

Art. X. Assim que as embarcações utilizadas para levar o exército para a França o tenham desembarcado nos portos especificados, ou em qualquer outro da França para onde as condições do mau tempo as tivessem forçado a dirigir-se, dar-se-ão todas as facilidades para regressarem à Inglaterra sem demora, e com a garantia de não serem capturadas até alcançarem um porto amigável.

Art. XI. O exército francês concentrar-se-á em Lisboa e dentro dum raio de duas léguas de distância da cidade. O exército inglês aproximar-se-á até à distância de três léguas da capital, e colocar-se-á de maneira a manter cerca duma légua de distância entre os dois exércitos

Art. XII. Os fortes de S. Julião, do Bugio e de Cascais serão ocupados pelas tropas britânicas quando se ratificar a Convenção; Lisboa e a sua cidadela [=castelo de S. Jorge], juntamente com os fortes e baterias até ao Lazareto ou Trafaria de uma parte, e até ao forte de S. José de outra parte, inclusive, serão entregues quando embarcar a segunda divisão, tal como será entregue o porto e as embarcações armadas de qualquer tipo, com o seu cordame, velame, mantimentos e munições. As fortalezas de Elvas, Almeida, Peniche e Palmela render-se-ão assim que chegarem as tropas britânicas para ocupá-las. Entretanto, o General em Chefe do exército britânico notificará a presente Convenção às guarnições daquelas praças, tal como às tropas que estão diante delas, para que cessem todas as hostilidades futuras.

Art. XIII. Ambas as partes nomearão comissários para regular e acelerar a execução das disposições acima acordadas.

Art. XIV. No caso de se levantarem dúvidas sobre o sentido de algum artigo, este será explicado a favor do exército francês.

Art. XV. A partir da data da ratificação da presente Convenção, todas as dívidas de contribuições, requisições, ou quaisquer pretensões do Governo francês impostas sobre os súbditos de Portugal, ou sobre outros quaisquer indivíduos residentes neste país, fundadas na ocupação de Portugal pelas tropas francesas no mês de Dezembro de 1807, que não estiverem pagas, ficam canceladas; e remover-se-ão todos os sequestros das suas propriedades móveis ou imóveis, restituindo-se aos próprios donos a liberdade de disporem das mesmas.

Art. XVI. Todos os súbditos da França ou de potências amigáveis ou aliadas à França, domiciliados em Portugal ou acidentalmente neste país, serão protegidos. A sua propriedade de todo o género, móvel ou imóvel, será respeitada, e eles terão a liberdade para acompanhar o exército francês ou para permanecer em Portugal. Em qualquer dos casos, a sua propriedade será garantida, com a liberdade de a reter ou de a vender e passar o seu rendimento para a França ou para qualquer outro país onde queiram fixar a sua residência, sendo-lhes permitido para este fim o prazo de um ano. É plenamente entendido que os navios ficam fora desta disposição, mas somente até deixarem o porto; e que nenhuma das estipulações acima mencionadas possam servir de pretexto a qualquer especulação mercantil.

Art. XVII. Nenhum português será chamado para prestar contas pela sua conduta política durante o período que o exército francês ocupou este país. E todos aqueles que continuaram no exercício das suas funções, ou aqueles que aceitaram empregos debaixo do Governo francês, ficam debaixo da protecção dos comandantes britânicos; as suas pessoas ou propriedades não sofrerão injúrias, pois não puderam optar entre ser ou não obedientes ao Governo francês; ficarão também em liberdade de se aproveitarem das estipulações do artigo XVI.

Art. XVIII. As tropas espanholas detidas a bordo dos navios no porto de Lisboa serão entregues ao Comandante em Chefe do exército britânico, que se obriga a obter dos espanhóis a restituição daqueles súbditos franceses, tanto militares como civis, que possam ter sido detidos na Espanha, sem serem capturados numa batalha ou em consequência de operações militares, mas sim por ocasião das ocorrências do dia 29 do passado mês de Maio e dos dias imediatamente seguintes.

Art. XIX. Haverá imediatamente uma troca estabelecida de prisioneiros de todas as graduações feitos em Portugal desde que começaram as presentes hostilidades.

Art. XX. Fornecer-se-ão reféns com a graduação de oficiais superiores, tanto da parte do exército e da marinha britânica, como da parte do exército francês, como garantia recíproca da presente Convenção. O oficial do exército britânico será restituído quando se cumprirem os artigos relativos ao exército; e o oficial da marinha, quando se desembarcarem as tropas francesas no seu próprio país. O mesmo será feito pela parte do exército francês.

Art. XXI. Permitir-se-á que o General em Chefe do exército francês mande um oficial à França com a notícia da presente Convenção. O Almirante britânico [Charles Cotton] fornecerá uma embarcação para levá-lo a Bordeaux ou a Rochefort.

Art. XXII. O Almirante britânico será solicitado a acomodar Sua Excelência o Comandante em Chefe e os outros oficiais principais do exército francês a bordo dos navios de guerra [britânicos].
Dado e concluído em Lisboa, a 30 de Agosto de 1808.
George Murray, Quartel-Mestre-General
Kellermann, General de Divisão

Nós, o Duque de Abrantes, General em Chefe do exército francês, temos ratificado e ratificamos a presente Convenção Definitiva em todos os seus artigos, para ser executada de acordo com a sua forma e teor.

O Duque de Abrantes

Quartel-General de Lisboa, a 30 de Agosto.

Artigos adicionais à Convenção de 30 de Agosto

Art. I. Os indivíduos com cargos civis no exército [francês] que tenham sido aprisionados pelas tropas britânicas ou pelas portuguesas, em qualquer parte de Portugal, serão restituídos, como habitualmente, sem troca.

Art. II. O exército francês subsistirá através dos seus próprios provimentos até ao dia de embarque; as guarnições, até ao dia da evacuação das fortalezas. O resto dos provimentos será entregue, na forma usual, ao Governo britânico, que se encarrega da subsistência dos homens e cavalos do exército [francês], desde os períodos acima mencionados até à sua chegada à França, debaixo da condição de serem reembolsados pelo Governo francês pelo excesso da despesa em relação à estimativa, que será feita por ambas as partes a partir do valor dos provimentos entregues ao exército britânico. As provisões a bordo dos navios de guerra em posse do exército francês serão tidas em conta pelo Governo britânico, do mesmo modo que os provimentos das fortalezas.

Art. III. O General Comandante das tropas britânicas tomará as medidas necessárias para reestabelecer a livre circulação dos meios de subsistência entre o país e a capital.

Dado e concluído em Lisboa, a 30 de Agosto de 1808.
George Murray, Quartel-Mestre-General
Kellermann, General de Divisão

Nós, o duque de Abrantes, General em Chefe do exército francês, temos ratificado e ratificamos os artigos adicionais à Convenção, para serem executados de acordo com a sua forma e teor.

O Duque de Abrantes

Tratado de Comércio e Navegação
(19 de fevereiro de 1810)


O Tratado de Comércio e Navegação foi um acordo assinado entre Portugal e a Grã-Bretanha em 19 de fevereiro de 1810, com a finalidade de "conservar e estreitar" as relações de aliança entre as duas monarquias. O Tratado era ilimitado, sua duração e as suas obrigações e condições eram perpétuas e imutáveis. Havia, entretanto, a possibilidade de revisão após quinze anos. Essa ressalva, excluía alterações por motivo de mudança de sede da monarquia para Portugal. Em 1810, Dom João VI assinou vários tratados com a Inglaterra, sendo o de maior interesse o de Comércio e Navegação, cuja concessão essencial foi a permissão de entrada de mercadorias inglesas pagando apenas o direito de 15%. As decisões dos decretos de 28 de janeiro e de 11 de junho de 1808 foram revogadas pelo Tratado de 1810, que estabelecia a taxa de 15% para os comerciantes lusos, sobre as mercadorias inglesas, mantinha os 16% sobre as mercadorias portuguesas, e 24% sobre as mercadorias de outras origens. Os ingleses dominaram o mercado brasileiro. Os direitos preferenciais dados pelo Tratado, no Brasil, eram estendidos para portos portugueses na Europa, Ásia e África. Pensado pelos ingleses, desde 1808, entre outras razões, pela abertura do mercado e pela dependência de Portugal relativamente à Inglaterra, os Tratados de 1810 de ‘Comércio e Navegação’ e o de ‘Aliança e Amizade’, fundados sobre "bases de reciprocidade e mútua conveniência" (foram ratificados por Portugal, em 26 de fevereiro, e pela Inglaterra, em 18 de junho). Os acordos comerciais resultam extremamente favoráveis à Inglaterra. A negociação teve início com a carta de plenos poderes concedida pelo Rei Dom João VI ao ministro Dom Rodrigo de Sousa Coutinho. Do lado inglês, o negociador foi o Lorde Strangford que, desde 1807, propunha que se aproveitasse a crise portuguesa para estabelecer um comércio directo anglo-brasileiro. O acordo estabeleceu as regras para o comércio entre o Brasil e a Inglaterra. Algumas já constavam do tratado de 1654, como as referentes à de liberdade de religião e de culto, ao Juiz Conservador, e às "imunidades dos comerciantes ingleses". A manutenção do Juiz Conservador da Nação Inglesa, garantia a protecção da pessoa e do comércio inglês. A ele caberia julgar e decidir, com superioridade da Justiça inglesa sobre a portuguesa, "todas as causas que fossem levadas perante ele pelos vassalos britânicos". A posição de preeminência adquirida pela Inglaterra em relação a Portugal, acentuada após a invasão napoleónica, dirigiu a assinatura dos tratados de 1810 entre as duas monarquias: um, de ‘Amizade e Aliança’, outro, de ‘Comércio e Navegação’. Este último determinou condições as mais favoráveis ao comércio inglês, beneficiando produtos da nascente Revolução Industrial, cuja entrada de mercadorias, produtos e artigos de toda espécie em todos os portos e domínios de Portugal, deixava nas mãos dos ingleses o grosso do comércio de transporte marítimo do Brasil. O artigo 21, do ‘Tratado de Comércio e Navegação’, facultava ao governo português proibir a importação, nos seus domínios, de géneros das ‘Índias Orientais e Ocidentais Britânicas’. Essa faculdade reconhecida a Portugal e baseada no "princípio de polícia colonial", impedia a admissão de artigos produzidos no Brasil, nos domínios britânicos, e manteve o desenvolvimento do comércio entre o Brasil (especialmente o Rio de Janeiro) e a Ásia (Goa e Macau). Alguns produtos brasileiros, como o café e o açúcar, eram proibidos de entrar nos portos ingleses. O artigo 20 desse Tratado passou a permitir a entrada desses produtos brasileiros e de outros similares aos das colónias britânicas, nos portos ingleses, apenas para reexportação. Essa cláusula favoreceu aos comerciantes britânicos estabelecidos no Brasil, cujos produtos constituíam seu principal retorno comercial. Aos britânicos e aos portugueses foi dado o direito de usar a Ilha de Santa Catarina como porto livre para o comércio com os "Estados adjacentes aos domínios portugueses". Nesse ponto, expresso no artigo 22 do Tratado, os ingleses estavam interessados na região do Rio da Prata. O mesmo artigo (15), que concedia os direitos de 15%, regulava a forma de cobrança: as mercadorias eram avaliadas por negociantes britânicos e portugueses, em igual número, aprovados pelas duas monarquias. A assistência alfandegária era prestada pelo Cônsul Geral inglês e pelo Superintendente da Administração do governo português. As tarifas eram informadas em tabelas existentes nas alfândegas e podiam ser revistas a pedido de comerciantes ingleses e portugueses. O artigo 16 do Decreto estabelecia que, na ausência da tabela, o imposto seria cobrado com base nas "facturas juradas" e no preço praticado no local de destino das mercadorias. Esse artifício foi uma tentativa de evitar fraudes e cobranças arbitrárias reclamadas pelos negociantes ingleses no Rio de Janeiro. O artigo 17 responsabilizava o governo português por danos e por avarias em qualquer mercadoria sob a sua guarda. Era, ainda, assegurado aos ingleses, o privilégio português de parcelar os impostos alfandegários em até nove meses. O artigo 5 trata da regulação de direitos e gozos aduaneiros e estabelece valores iguais para as embarcações portuguesas e inglesas, cobrados a partir de listas elaboradas pelas partes e exibidas em cada porto. O mesmo artigo define como sendo embarcações portuguesas aqueles navios construídos nos domínios de Portugal, excluindo do comércio e dos direitos acordados os navios adquiridos de outras nações. 


Tratado de Aliança e Amizade
(1810)


O Tratado de Aliança e Amizade é um tratado assinado por Portugal e Inglaterra em 1810 para extinguir o tráfico negreiro.

No tratado estabeleciam que:

Os dois Reinos (Portugal e Inglaterra) seriam fiéis aliados nos planos políticos e militar.

A Inglaterra renovaria seus direitos sobre a Ilha da Madeira.

Os ingleses que viviam no Brasil teriam ampla liberdade religiosa.

A Inglaterra teria o direito de cortar madeiras e construir navios, bem como o de manter uma esquadra de guerra em nosso litoral.

Os ingleses pagariam tarifas alfandegárias preferenciais.
As mercadorias inglesas, ao entrarem no Brasil, pagariam 15% do valor (ou seja, 15% sobre o valor do produto), as portuguesas, 16% do valor, e as demais nações, 24% do valor. Por causa desse tratado, o Brasil transformou-se numa ‘colónia inglesa’ em termos económicos.

A Inglaterra passou a distribuir, na Europa, os produtos tropicais.

Cedendo à pressão dos ingleses, a Coroa portuguesa comprometia-se a extinguir gradativamente o trabalho escravo (Art. 10.).


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