Documentos relativos à ocupação da Ilha da Madeira feita pelos Ingleses no ano de 1801
Cópia do termo que o governador da ilha da Madeira assinou com os oficiais que convocou a conselho no dia 24 de Julho de 1801, sobre as propostas que lhe fizeram os comandantes da esquadra e tropa britânica, que se achavam na ilha.
Il.º e Ex.º Sr.-
Devo pôr na presença de V. Ex.ª, para assim chegar á de Sua Alteza Real, o
Príncipe Regente, nosso Senhor, a situação em que se encontra esta colónia dos
seus domínios ultramarinos, em que eu me acho como General dela, por mercê do
mesmo senhor e a de todos habitantes desta ilha. Como porem a incerteza deste
expediente (aliás o mais pronto, pois vai fretado o navio que leva esta
petição), seja contudo arriscado, me lembro de enviar por cópia a v. exª os
termos a que mandei proceder nas criticas e mais delicadas circunstâncias em
que se viu general algum deste estado, desde a sua descoberta para a coroa de
Portugal. Tendo mandado publicar guerra nesta capitania no dia 17 deste mês, na
conformidade das últimas ordens de sua alteza real, se verificou no dia 23 do
corrente a surpresa com que a nação inglesa destinou a este porto a tropa
auxiliar de que faço menção nos mencionados termos. Cumpre representar a v.
ex.ª, para assim o fazer presente a sua alteza real, que toda a dexteridade com
que me tenho conduzido a respeito deste socorro, que em nome de sua majestade
britânica vem a esta ilha para sua defesa em obséquio de sua alteza real,
segundo se me fez constar pelo atestado dos comandantes ingleses, tem consistido em evitar algum rompimento da minha parte, a fim de não dar com ele
motivo a mais graves consequências, quais seriam para já o bombardeamento desta
capital, a que sem duvida se teria procedido, se eu de alguma sorte obstasse ao
desembarque da mencionada tropa, dita auxiliar, porquanto para este se fazer,
pôs a condição de horas , com o pretexto ou motivo de que a ilha poderia ser
muito imediatamente atacada pelos
inimigos com quem estávamos em guerra. Tudo tem sido necessário disfarçar, e no
entanto tenho dado as possíveis ordens às milícias e mais (atenuadas) forças da
ilha, pelos seus respectivos chefes para a primeira voz acudirem à capital da
ilha, a título da mesma defesa dela. Tais as circunstancias em que fico
esperando em todas elas as positivas ordens de sua alteza real, que sempre
cumprirei como humilde e fiel vassalo do mesmo senhor.
Deus Guarde vossa
excelência muitos anos, segundo muito deseja, e pede a felicidade do estado.
Cidade do Funchal, 26 de Julho de 1801.- Ilmo. e Exmo. Sr. Visconde de Anadia.
PS. Confio este ofício
do tenente António Nunes, que desse reino veio comigo, e que julguei o mais
capaz para semelhante expediente.= (Assinado) O Governador e Capitão General da
Ilha da Madeira, Don José Manuel da Câmara.
O secretário do governo faça lavrar ao pé desta uma fiel cópia da tradução das propostas feitas pelo comandante da esquadra e tropa britânica no dia 24 deste mês, cuja tradução se acha feita e assinada pelo cônsul da mesma nação, José Pringle, Vice-cônsul Roberto Cock, e marcador Thomas Murdock
Palácio da fortaleza de São Lourenço, 26 de Julho de 1801. = Com a rubrica do governador =
A Ocupação da Ilha da Madeira pela Grã-Bretanha
24 de Julho de 1801
«Funchal, 24 de Julho de 1801. Sua Majestade Britânica tem visto com o maior pesar o grande perigo que ameaça Portugal, e em consequência da estreita aliança e intima amizade, que á muitos anos tem unido as cortes de Lisboa e Londres, ele deseja na presente perigosa crise prestar todo o socorro e auxilio que nele cabe para a defesa e conservação dos domínios de sua alteza real, o príncipe regente de Portugal. Animado destes sentimentos sua majestade britânica tem mandado uma esquadra de suas naus de guerra, comandado pelo Capitão Bowen, para se empregar na cooperação com o excelentíssimo sr. General da defesa da ilha da Madeira. Esta tropa vem como aliados e irmãos: ela será paga e sustentada á custa da Grã-Bretanha, e os comandantes são restritamente inibidos pelo seu soberano de se ingerirem na forma do governo estabelecido nesta ilha, e eles devem prestar todo o auxílio possível a S. Ex.ª para se poder conservar esta tão importante ilha á coroa de Portugal. Aquela parte da tropa, que não for empregada em guarnecer as praças e fortes, será aquartelada ou acampada no lugar que mais conveniente parecer ao seu coronel comandante, com a aprovação de excelentíssimo senhor governador. O exº sr. General mandará passar as ordens necessárias para o preciso suprimento da tropa e esquadra, bem entendido que tudo será pago logo que o receberem. O Coronel Clinton, e o Comandante Bowen, tornam a repetir que eles têm recebido a mais terminante incumbência de se comportarem do melhor modo possível, depois de efectuado o desembarque da tropa no mais cordial, e de conservarem nas forças, que têm a honra de comandar, a mais rigorosa disciplina e boa ordem; e com o maior gosto os comandantes asseguram ao exº sr. Governador, que eles se empenharam em cumprir as suas instruções a este respeito, e farão tudo o que deles depender para a conservação da mais harmonia e boa inteligência. Como o Coronel Clinton e o Comandante Bowen têm razão de saberem o perigo que ameaça a ilha da Madeira, tão iminente e imediato, e imediato, é necessário tomar os passos mais prontos para se efectuarem as medidas de defesa, sem perder uma só hora: e nestes termos eles se conservarão preparados para executarem o desembarque, logo que S. Ex.ª nisso tiver consentido. E será muito conveniente que este negocio se possa executar até ás duas horas da tarde, para que a tropa posa ficar em terra, e ser acomodada antes da noite.»
(Este papel é uma fiel tradução, feita à presa, da comunicação que foi mandada ao cônsul e vice-cônsul britânico, e a Thomas Murdock pelos comandantes ingleses para ser intimada ao governador da ilha, e logo que este por sua parte a aprovou, passou a ser rectificada pelos ditos comandantes por meio das suas assinaturas. Assim o testificaram o cônsul José Pringle, o vice-cônsul Roberto Cock, Thomas Murdock, e o secretario do governo da Madeira, João Marques Caldeira de Campos.).
A tropa de que acima se trata chegaram ao porto do Funchal, na ilha da Madeira, no dia 24 e Julho de 1801, sendo a força naval composta por uma nau de linha, uma fragata e um bergantim, cobrindo cinco navios de transporte em que iam 3.000 para 4.000 homens de desembarque, destinados, segundo o pretexto acima alegado, "para auxilio de Sua Alteza Real, por ocasião da declaração de guerra por ele feita à Espanha, e que poucos dias antes se havia publicado naquela mesma ilha por ordem do Príncipe Regente”.
Cópia do termo que o governador da ilha da Madeira assinou com os oficiais que convocou a conselho no dia 24 de Julho de 1801, sobre as propostas que lhe fizeram os comandantes da esquadra e tropa britânica, que se achavam na ilha:
No
dia 24 de Julho de 1801, chegou a este porto do Funchal da ilha da Madeira, a
mais antiga colónia dos domínios ultramarinos, pertencentes ao príncipe regente
nosso senhor, uma divisão, composta por uma nau de linha, uma fragata e um bergantim,
digo transporte, cuja força cobria cinco navios em que vem de tropa auxiliar de
3.000 a 4.000 homens, que, segundo o atestado junto, são destinados por sua majestade
britânica para auxílio de sua alteza real, o príncipe regente nosso senhor, por
ocasião da declaração de guerra de Portugal, que poucos dias antes se havia
publicado nesta capitania, segundo as reais ordens do mesmo senhor. Notou-se
que se postaram as ditas forças navais verdadeiramente em linha de combate,
fundeando ao longo desta capital em distância de tiro de espingarda,
amarrando-se por todos os lados. Vieram os comandantes da tropa e da divisão
sobredita ao palácio do governador e capitão general deste estado, e este os
recebeu com a polidez e serenidade de ânimo, que era própria desta aliás tão
critica e circunstanciada situação; e em nome de sua alteza real, o príncipe
regente nosso senhor, agradeceu aos sobreditos oficiais, que o deverão pôr na
presença de sua alteza real britânica, todos os bons ofícios daquela nação,
desde tão longos tempos amiga e aliada. Por ocasião deste tão notável
acontecimento o mesmo excelentíssimo senhor governador e capitão general deste
estado, todos os seus ajudantes de ordens, o comandante da artilharia, Agostinho
José Marques Rosa, o desembargador juiz de fora e auditor, José Filipe Ferreira
Cabral, e mais oficiais de patente do corpo de artilharia, não se achando na
capital o bispo e corregedor (andando um em visita e o outro em correição), e
perante todos propôs se devia ou não permitir o desembarque de toda aquela
tropa, bem que protestavam seus comandantes que ficaria toda ela e seus
respectivos oficiais como tropa auxiliar debaixo das ordens e comando do mesmo governador
e capitão general deste estado. Convieram todos sem discrepância de voto, que
sem dúvida se devia permitir o desembarque da dita tropa auxiliar, e nesta
conformidade mandou dar as providencias mais oportunas para que ele se fizesse sem
tumulto, destinando-lhe os lugares mais apropriados para os seus indispensáveis
alojamentos. Isto feito, mandou vir á sua presença o general deste estado o
juiz do povo, e lhe intimou ordem, em nome de sua alteza real, o príncipe
regente nosso senhor, para que intimasse aos habitantes da capital todo o
sossego e harmonia possível com a sobredita tropa auxiliar. Pelo que ordenou
finalmente se formasse este importantíssimo termo para constar na presença de
sua alteza real do procedimento que houve nesta sua capitania, a respeito do auxílio,
que em nome de sua majestade britânica vem dirigido ao mesmo senhor para defesa
desta colónia, em seu augusto nome, caso de poder ser atacada por força
inimiga.
João
Marques Caldeira de Campos, secretário do governo o fez, subscreveu e assinou.
Seguem-se
as assinaturas dos indevidos presentes ao conselho, principiando pela do
governador e capitão general.
Cópia de um outro termo, que o governador da ilha da Madeira assinou com os oficiais, que convocou a concelho no dia 25 de Julho de 1801, por causa das novas pretensões da tropa britânica, que se achava na referida ilha:
No dia 25 de Julho de 1801 ordenou o excelentíssimo senhor deste estado, em nome de sua alteza real, o príncipe regente, nosso senhor, que tendo atendido novas e atendivas circunstancias, a respeito das pretensões dos comandantes de mar e terra, destinados por sua majestade britânica em socorro desta ilha, seguindo a inteligência do primeiro termo, a que mandou proceder por ocasião do seu desembarque; se devia proceder a uma nova deliberação, acerca das medidas futuras em tão críticas e delicadas situações. Propôs o excelentíssimo general deste estado, se apesar das pretensões dos referidos comandantes da tropa britânica auxiliar, que tendiam a guarnecer simultaneamente com a pouca tropa da ilha as fortalezas, que a estarem em pé de defesa, deveriam afiançar a segurança dela, quando as sobreditas pretensões pareciam denotar ideias, senão claras, pelo menos equivocas, a respeito daquele seu primeiro desígnio; se deveriam ou não permanecer no primeiro acordo, sustentando a dextralidade com que se havia olhado esta surpresa, desde o primeiro momento em que se verificou, anuindo portanto a esta instância, assas decidida pela mencionada tropa auxiliar. Convocados pois todos oficiais abaixo assinados unanimemente votaram, que o plano começado a respeito da moderação com que tinha sido, recebido e tratado, os comandantes britânicos e a sua tropa auxiliar, se devia seguir, com o mais coerente e o mais indispensável. Fez a base desta deliberação, não só o procedimento da capital do reino, a respeito desta mesma nação aliada desde tanto tempo, mas muito particularmente o reflectir-se, que dando-se o mais ligeiro lugar a um rompimento da nossa parte, se comprometia o nome augusto do príncipe regente, nosso senhor e veríamos a ter mais um inimigo, quando nos preparamos a esperar e combater outro. Em consequência de todo o expedido ordenou o mesmo, excelentíssimo general deste estado se fizesse este termo, que assinou com os oficiais convocados.
E
eu, João Marques Caldeira de Campos, secretário do governo, o fiz, subscrevi e
assinei.- (Assinados) Don José Manoel da Camara, governador e capitão general da
ilha da Madeira e Porto Santo; Antonio Alberto de Andrade Perdigão, coronel
ajudante de ordens; Agostinho José Marques Rosa, comandante tenente-coronel;
José Joaquim Esmeraldo, coronel das milícias do Funchal; Agostinho José de
Ornelas Esmeraldo Vasconcelos, tenente-coronel comandante das milícias; Leão
Henriques Correia e Camara, sargento-mor ajudante de ordens; Pedro João de
Vasconcelos, sargento-mor; Antonio Francisco Martins Pestana, sargento-mor;
Francisco João Barreto, sargento-mor das milícias; Agostinho
Domingos de Gusmão, sargento-mor das milícias; João Pedro de Ornelas e
Vasconcelos, sargento-mor agregado das milícias; Antonio Rodrigues de Sá, sargento-mor
da artilharia; João Manuel de Athoguia e Vasconcelos, comandante da fortaleza
de São Tiago; José Caetano César de Freitas, capitão ajudante de ordens; o
desembargador juiz de fora auditor, José Filipe Ferreira Cabral; João Marques Caldeira
de Campos.
= O secretário do governo, João Marques Caldeira de Campos =.
= O secretário do governo, João Marques Caldeira de Campos =.
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