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domingo, agosto 25, 2013

Colecção de Documentos - 1806 I


Aprisionamento feito no Tejo do bergantim de guerra inglês “Richmond”

Nota para Lord visconde Strangford, dirigida por Antonio de Araujo de Azevedo


10 de Junho de 1806





      O abaixo-assinado, ministro e secretário de estado dos negócios estrangeiros e da guerra, tendo a honra de receber a nota de Lord visconde Strangford, encarregado dos negócios de sua majestade britânica, de 7 do corrente, em resposta à que lhe havia dirigido na data de 3, relativamente ao bergantim de guerra inglês “Richmond” não pude deixar de fazer algumas observações sobre o conteúdo na resposta do sr. encarregado de negócios, a fim de manifestar a justiça e fundamento com que o príncipe regente seu amo fez embargar o dito bergantim. Ele deve pois dizer a Lord Strangford, que não foi só em consequência da declaração do mestre do bergantim português “Santo Antonio”, a qual será talvez exagerada, que se procedeu ao embargo, foi porque o comandante inglês entrou neste porto, trazendo em sua companhia aquela embarcação portuguesa como apresada, foi porque ele declarou na ocasião da sua entrada (como constou logo pela parte que deu o comandante do porto), que vinha examinar aqui os seus papeis, o que com efeito assim praticou: foi finalmente porque ele, depois de ter examinado os ditos papéis e por consequência antes de poder saber se eles continham coisa alguma contrária aos princípios, que devem observar na sua navegação os navios de comércio das potências neutrais, lhe pôs um mestre de presa e marinheiros ingleses a bordo, procedimento que não pode deixar de ser reputado por muito irregular e violento. Sem discutir sobre o método que devem as potências beligerantes no exame das embarcações neutrais, é indubitável que elas não têm o direito algum para proceder a este exame dentro do território da potência a que pertencem as embarcações, tanto assim que não têm para registarem em portos neutros, embarcações inimigas. Quanto a dizer o sr. encarregado de negócios, que o governo português devia ter examinado bem o facto, antes de proceder o embargo, e que devia ter recorrido aos meios ordinários, dirigindo-se ao governo de sua majestade britânica para obter justa justificação e o castigo do agressor, se o merecesse, o abaixo assinado deve ponderar-lhe, que no caso presente não havia precisão de mais exame para proceder ao embargo, porque é facto constante, e que o mesmo comandante inglês não impugna na sua carta, o ter ele procedido ao exame dos papeis dentro do porto, e ter metido a bordo da embarcação portuguesa o mestre de presa e marinheiros ingleses. Isto é sem dúvida um atentado; e porventura sustentará alguém que um governo não possa proceder contra os agressores de delitos cometidos no seu próprio território? O embargo do bergantim inglês não é o castigo, que sua alteza real tem de reclamar de sua majestade britânica, é uma medida de represália, exigida pela ofensa do domínio territorial. Sua alteza real tem mandado fazer as mais exactas averiguações sobre, todas as mais circunstâncias do facto, para reclamar do seu antigo amigo e aliado, o rei da Grã-Bretanha, o castigo do sobredito comandante, que sirva de exemplo para evitar violências para o futuro, as quais se repetem frequentemente contra as intensões do mesmo senhor.

      O mês passado sucedeu no Algarve, que vindo um bergantim espanhol, denominado “Casto”, refugiar-se debaixo da artilharia de uma bateria, chamada Barreta, e tendo esta inçado a bandeira portuguesa para sinal de protecção, e atirado sobre os escaleres de uma fragata inglesa que perseguiam o bergantim, se declarou da dita fragata que não o tomaria ali; apesar disso ela se valeu da escuridade da noite, quando a bateria não poderia defender a embarcação espanhola para a levar furtivamente. Outro caso quase idêntico ao que praticou o comandante do bergantim “Richmond” é o que também ultimamente aconteceu com o navio português “Elisa”, que uma fragata inglesa apresou e lhe meteu oficiais ingleses a bordo, estando debaixo da artilharia da fortaleza de S. João da Foz da barra da cidade do Porto, e ainda que a final a libertou, é inegável a ofensa perpetrada contra o território português.

      O desembargo do bergantim inglês, que requer o sr. encarregado de negócios, não pode ter lugar senão depois de concluído o exame sobre as violências por ele cometidas. Sua alteza real já mandou encarregar o seu ministro na corte de Londres para participar ao ministério britânico este facto assim como os outros dois acima referidos, a fim de se proceder a uma justa reparação, para a qual o abaixo-assinado espera que o sr. encarregado de negócios contribua com a participação que está obrigado a fazer á sua corte sobre o procedimento do comandante do bergantim de guerra inglês “Richmond”.

Palácio de Mafra, em 10 de Junho de 1806. = Antonio de Araujo de Azevedo





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